Ao analisar as leis anti-raciais do ordenamento brasileiro, verifica-se que, do ponto de vista técnico-jurídico, são eficazes, ou seja, são capazes de produzir o efeito desejado, mas a problemática em questão se encontra na herança cultural que carrega a sociedade brasileira, ou seja, de modo que para exterminar e solucionar a problemática das práticas discriminatórias baseadas em preconceito racial se faz necessária uma ressignificação cultural, de sorte que cada cidadão entenda que a cor da pele, ou grupo étnico no qual o outro esta inserido, não deve ser fonte de privilégios ou prejuízos no acesso aos bens jurídicos e sociais. Parece-nos que se deve ter em mente, que a esfera do Direito Penal, apenas por si, não é capaz de totais transformações de práticas sociais tão arraigadas, nem poderia ser elevado a panaceia para as ações discriminatórias do Brasil, muito menos com relação ao a preconceitos secularmente reproduzidos. Não tem a norma penal, a função de melhorar o ser humano, mas apenas impedir que uns agridam o direito dos outros e sempre tendo em vista seu caráter de ultima ratio

Para se estabelecer uma sociedade justa, todos os cidadãos devem desfrutar da liberdade pessoal, de bem-estar básico, de igualdade racial e étnica e de fruir da oportunidade a uma vida digna. John Kenneth Galbraith discorre sobre a ideologia aceitável de uma sociedade justa:

Na sociedade justa, uma regra domina essas questões sociais: As decisões devem ser tomadas com base nos méritos sociais e econômicos do caso específico. Esta não é a era da doutrina, é a era do julgamento prático” (GALBRAITH, John Kenneth , 1996.p.22.)

Desta forma, não basta serem as leis dinâmicas e atenderem os anseios de cada grupo racial, mas parece-nos que seriam necessárias políticas públicas e ações sociais que promovam reflexão e conscientização de que a cor da pele e raças étnicos não diferenciam em nada a espécie humana, e de que somos, com efeito, todos iguais, somos seres pertencentes a uma mesma família humana .Parece-nos pertinente afirmar que a prática cidadã decorrente dos princípios democráticos preconiza que qualquer indivíduo comprometido com a ética pública deveria exterminar o discurso sustentador do preconceito racial e aceitar como reprováveis as atitudes discriminatórias.

Porém, como vimos até aqui, é sabido que grandes partes dos cidadãos brasileiros ainda se valem de tais atitudes preconceituosas e que ainda estamos provavelmente muito longe de termos um país livre de discriminações conforme projeta a Constituição.

Faz-se importante ressaltar que parece haver uma distância muito grande entre o discurso jurídico-constitucional de proteção à multiculturalidade étnico-cultural e a prática social da inclusão do negro na sociedade de forma justa. Depreende-se daí que para se começar de fato a respeitar a dignidade do povo negro, tem-se que assegurar concretamente, para além da tutela penal, mas por meio de sólidas e específicas políticas públicas, os direitos básicos, notadamente os sociais e os econômicos.

Ademais, para diminuir a ignorância sobre o assunto, apresenta-se como sugestão a inclusão das leis penais antidiscriminação nos currículos das faculdades de direito, que atualmente frequentemente não são ensinadas nos bancos acadêmicos, e também sua inclusão nos editais, para que sejam objeto de arguição nos exames de OAB e concursos públicos de ingresso às várias carreiras jurídicas, em que seja relevante o direito penal e a sociologia jurídica, ao menos.

Não existe justificativa plausível, que em um Estado Democrático de Direito haja ainda o preconceito e discriminação da cor da pele. No sistema democrático, ouve-se muito a preconização do governo da maioria, porém, dever-se-ia preocupar para que tal não se torne na prática vigente apenas para uma certa camada social historicamente privilegiada, e sim para todos, conforme é tão almejado na Carta Magna e nos direitos fundamentais do homem.

Há uma tendência nos dias atuais em acabar com a discriminação racial, criminalizando condutas racistas, de sorte a se assegurar o direito e a liberdade de cada grupo étnico de exteriorizar sua cultura sem receio de sofrer desrespeito pelos outros grupos raciais, mesmo que estejam em condição minoritária. A igualdade racial tem sido em especial a partir da década de 60, a razão de árduas caminhadas. Por isso, buscam-se oportunamente proposições e saídas para a questão, que é de grande importância para a promoção de qualidade vida para as minorias do povo brasileiro, sobretudo o negro.

Por isso, os negros querem ser ver a sua história e cultura reconhecidas e respeitadas  pelas políticas públicas, e que estas abram espaço para sua raça que sofre marginalização, sendo, ao contrário, reconhecida com dignidade. Pois, em um mundo cada vez mais multipolar e multicultural sugere um maior número de atores que assumem um papel efetivo na aplicação e conscientização dos direitos dos diversos grupos raciais, entre eles a da raça negra.

Vale ressaltar, que a inclusão social do negro, se faz necessária para ampliar os espaços de atuação na sociedade, não apenas como expositor de sua cultura, mas também como atuante culturalmente, de modo a poder efetivamente exercer sua cidadania com dignidade.

  Portanto, não devemos desistir de tentar conquistar a igualdade entre os grupos aqui existentes em nosso multiétnico país, não podemos abandonar esta luta que, com dificuldades, já vem se estruturando há séculos. Devemos respeitar o que dispõe o artigo II da Declaração Universal dos Direitos Humanos:

Toda pessoa tem capacidade para gozar os direitos e as liberdades estabelecidos nesta Declaração, sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou qualquer outra condição. (Declaração Universal dos Direitos Humanos)

Portanto, devemos almejar a dignidade dos nossos irmãos negros, para que tenham um lugar de respeito na sociedade, e para que sua cultura cada vez mais expressiva e valorada, com liberdade e, acima de tudo, igualdade.

 BIBLIOGRAFIA:

GALBRAITH, John Kenneth – Sociedade Justa: Uma perspectiva humana: Tradução de Ivo Korytowski. Rio de Janeiro: Campus, 1996.

DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS - Adotada e proclamada pela resolução 217 A (III) da Assembleia Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948