BIODIVERSIDADE E ATIVIDADES ANTRÓPICAS
Márcio Negrão*

Durante muito tempo a natureza vem sofrendo ataques sucessivos pelo seu maior agente de degradação, o homem. Este, por sua vez, visando sua própria melhoria de vida, ataca de forma drástica, quase sempre irresponsável e sem medir as sérias conseqüências que pode causar à natureza e a tudo que nela existe. É impressionante que, ainda hoje, seja possível constatar fatos com essa gravidade, porém sua incidência vem diminuindo bastante com o decorrer dos anos devido aos estudos sobre as conseqüências dessa degradação que são constantemente desenvolvidos para que se possa atentar para a necessidade da preservação ambiental, a conscientização das pessoas e o surgimento de grupos determinados a defender o meio ambiente. Hoje são vários os estudos de incentivos globalizados que são desenvolvidos em prol dessa preservação e até mesmo para reconstituição de áreas seriamente atingidas. Uma das áreas de maior importância nesta globalização, ou seja, de maior interesse dos envolvidos nessa campanha é a nossa Amazônia, que embora possua maior parte de sua extensão dentro do território brasileiro, faz parte também, de alguns países vizinhos da América do Sul. A Amazônia tem fundamental importância por ser a principal responsável pelo controle climático do planeta, pelo controle de oxigenação, por abrigar a maior biodiversidade e por ser a maior bacia hidrográfica do mundo. A biodiversidade encontrada na Amazônia possui uma riqueza incalculável, pois, além de toda sua extensão ser composta por florestas, pode-se ter também o enriquecimento da mesma aos ambientes não florestais que são os campos de terra firme, os campos de várzeas, as campinas, os manguezais dentre outros. Como a biodiversidade não está resumida apenas ao tipo de ambiente, como também a ele de um modo geral, como tudo que o envolve, é possível afirmar que, apesar dos poucos estudos científicos já realizados até agora na região, em relação a todo o composto da Amazônia, que ela abriga cerca de 40 mil espécies diferentes de plantas, onde apenas 5% desse total têm seu estudo definido; 1.800 espécies de borboletas; 3.000 espécies de abelhas; 9.000 espécies de peixes; 427 espécies de anfíbios; 371 espécies de répteis; 1.300 de aves; 425 de mamíferos e sem um número ainda definido de insetos.
A Amazônia, antes habitada apenas pelos povos indígenas que extraiam da natureza apenas o que lhes eram necessários ao sustento e sobrevivência, vivendo em perfeita harmonia com o meio, tem hoje uma realidade diferente. Nas ocupações desordenadas, causadas por desmatamentos visando à exploração de madeiras, construção de pastagens para a agropecuária, montagem de fazendas de plantação de soja e outros produtos e na exploração de recursos minerais sem qualquer tipo de controle, tudo isso, sendo executado sem nenhum tipo de planejamento ou cuidado com relação à biodiversidade.
Um dos grandes desafios na atualidade enfrentados pela natureza com relação ao desenvolvimento, é a necessidade de que se faça um planejamento do seu uso para que possa, assim, garantir uma integração de desenvolvimento sócio-econômico com a preservação da biodiversidade. Uma das estratégias eficazes adotada pelo governo brasileiro é a implantação de áreas protegidas. Incluindo nas unidades de conservação em terras públicas ou privadas, as áreas indígenas, áreas de proteção permanente e as terras legais. No entanto, essas formas criadas com o intuito de preservação ecológica, não foram, segundo pesquisas, suficientes para manter essa proteção, pois estas áreas protegidas isoladas perdiam espécies e serviços ecológicos, este isolamento por terras não compatível com a biodiversidade regional levava a extinção e ao colapso o ecossistema natural existente condenando as áreas consideradas protegidas. A partir desse fato, foi constatada uma necessidade em desenvolver novas estratégias de conservação com uma escala especial superior a das áreas protegidas para que haja também, uma inserção política, econômica e cultural.
Partindo desta nova visão, criou-se então, a idéia dos corredores de biodiversidade, que reuni diversas áreas protegidas com outros espaços de menor expansão com um gerenciamento participativo e integrado entre governo e sociedade, visando um desenvolvimento econômico e regional diversificado e com atividades compatíveis e integradas à conservação da biodiversidade.
O estado do Amapá ("Lugar de Chuva" na linguagem Tupi), localizado no extremo norte no Brasil, além de ser um dos nove estados que compõem a Amazônia Brasileira, também é o estado que possui maior extensão de área protegida na faixa tropical, com aproximadamente 72% de seu território dividido em 12 unidades de conservação e cinco áreas indígenas, integrando o conjunto do corredor da biodiversidade do Amapá. A forte quantidade de chuvas que atinge o Estado do Amapá durante o ano e seu relevo diversificado contribui para que o mesmo possua grande diversidade de ecossistemas naturais. Na costa atlântica, é possível encontrar manguezais, verdadeiros berçários para a fauna marinha e estuarina. Ao longo do rio Amazonas eles são substituídos pelas florestas de várzeas, ambientes inundáveis e de fundamental importância social, pois abriga uma das principais riquezas da Amazônia que é o açaí.
O Estado do Amapá está promovendo uma verdadeira mudança na escala da conservação. É um Estado que não sofrerá com a escassez de água, um recurso natural de futuro cada vez mais incerto. De fato, nesse corredor são preservadas as cabeceiras de seus principais rios. (MITTERMEIER, 2007).


BIOPIRATARIA ? COMBATER PARA PRESERVAR
A Amazônia apresenta mais de uma centena de espécies comestíveis com uma rica e variada biodiversidade podendo ser encontradas no interior de suas florestas diversas plantas, muitas ainda desconhecidas ou não estudadas. Algumas produzem frutos diferentes e com características próprias e únicas, apresentando sabor exótico, jamais encontrado em qualquer outro lugar do mundo. Ao longo do tempo, algumas dessas frutas existentes na Amazônia foram sendo descobertas de forma progressiva pela população da região Norte. O açaí, um dos principais alimentos dessa região, é um elemento energético e vitamínico extraído de uma palmeira de nome açaizeiro que faz parte da tradição cultural alimentar da região Amazônica. A agricultura da população da Amazônia é rudimentar e conserva tradições que não agridem o meio ambiente, mantendo equilibrado o ecossistema, baseando-se no plantio, cultivo e colheita de forma mais natural possível. Dentre as frutas da região, além do açaí citado acima, encontram-se ainda o bacuri, o cupuaçu, o buriti, a graviola, a pupunha e o tucumã, cada uma com suas importâncias e características específicas. Estas são as mais conhecidas frutas regionais, isso não significa que são as únicas, pois a região Amazônica é imensa e muito rica, escondendo em seu interior muitos mistérios a serem descobertos e pesquisados.
 O cupuaçu é o fruto de uma árvore originária da nossa Amazônia, tendo casca dura, de coloração castanha escura, suas sementes ficam envoltas por umas polpas brancas, ácidas e aromáticas, os frutos surgem de janeiro a maio e são os maiores da família dos cacaueiros do qual é parente próximo.
 A pupunha é o fruto da pupunheira, planta de porte magnífico, originária das florestas tropicais do continente americano e muito conhecido até a floresta amazônica.

A Amazônia, com um dos ecossistemas mais diversificados com grande número de animais, frutos, vegetais e recursos minerais, muitos deles ainda desconhecidos e que desperta ainda grande interesse das comunidades científicas e industriais de todo o planeta. Seus recursos naturais exclusivos despertam cobiça por parte dos estrangeiros, fazendo com que eles se infiltrem na floresta em busca dessa matéria prima e produtos a partir da fauna e flora Amazônicos. Não bastando extrair essa matéria prima, também são levados conhecimento, técnica e manuseio aprendidos com os nativos regionais. Posteriormente, após todos os recursos da industrialização que são colocados sobre esses produtos no exterior, ele então volta para o Brasil nas diversas formas de produtos industrializados.
Biopirataria denomina-se a essa atividade clandestina por estrangeiros que após a extração do produto, levam para seu país onde são patenteadas como sendo de sua propriedade. O patrimônio natural e cultural do Brasil tem sido constantemente ameaçado por ação de empresas e grupos organizados, que se utilizam da frágil proteção aos bens de propriedade intelectual do país e partem para uma tentativa de apropriação, porém, ações já foram desenvolvidas partidas da iniciativa privada e do terceiro setor para que se tenha um extermínio dessas práticas.
A humanidade, ao longo dos séculos, sobrevive do colonialismo e da pirataria buscando novos meios produtivos, matérias primas e mercados consumidores. O progresso tecnológico contemporâneo trouxe em seu bojo um aumento populacional e uma maior expectativa de vida, crescendo assim, substancialmente, o consumo de produtos industrializados e a hipersensibilidade aos produtos químicos já existentes. Consequentemente tornou-se imperativa a busca por novas substâncias, pois o processo artificial de síntese de medicamentos dá sinais de escasses e o caminho encontrado pelas indústrias químicas e farmacêuticas é a extração de substâncias a partir de organismos vivos.
Em todos os períodos históricos, é possível encontrar grandes e profundas alterações sociais provocadas pela evolução da produção. Esse novo produto chamado de biotecnologia transformou o Brasil, sede da maior biodiversidade inexplorada do planeta, numa promissora fonte de matérias primedeas consequentemente em alvo do biocolonialismo e da biopirataria.
De acordo como a legislação brasileira atual, a biopirataria não é considerada crime. Os biopiratas presos no Amazonas nos últimos dez anos pela Policia Federal foram enquadrados pela lei por transporte ilegal de animais e plantas, e liberados, logo depois, sob o pagamento de fiança, levando consigo os conhecimentos adquiridos, sem contraprestação.
Alguns exemplos de produtos pirateados:
? Bibiri ? semente usada pelos índios uapixanas como anticoncepcional patenteado pelo Canadá.
? Jaborandi ? planta antídoto contra a dificuldade de salivar, patenteado pela Alemanha.
? Genipapo ? usado na cosmética, patenteado pelos EUA.
? Cumaniol ? anestésico usado pelos índios, patenteado pelo Laboratório Biolink.
? Cupuaçu ? fruta e nome que fazem parte da identidade cultural do povo brasileiro foram patenteados pelo Japão.
? Açaí ? palmeira e fruta amazônica patenteada pela União Européia.
? Muiapuama ? erva afrodisíaca usada contra impotência levada para o Japão.
? Pilocarpo ? planta utilizada no tratamento de glaucoma patenteada na Alemanha.
? Curare ? veneno extraído de planta Amazônica, patenteada pelos ingleses.
? Veneno de Rã tricolor ? trabalhado pelo Laboratório Abbot.

USANDO A PRESERVAÇÃO COMO TEMA TRANSVERSAL EM PCN?s
A escola que pretende formar indivíduos para exercer a cidadania, não pode ignorar a realidade social. Estas questões sociais relevantes e presentes na vida cotidiana de todos, são discutidas e analisadas dentro dos processos educativos que fazem parte dos PCN?s, recebendo o nome de Temas Transversais.
Segundo os PCN?s (2007, p. 27) "A contribuição da escola, portanto, é a de desenvolver um projeto de educação comprometida com o desenvolvimento das capacidades que permitam intervir na realidade para transformá-la".
Uma das questões mais urgente e relevante para toda a humanidade é a situação ambiental, onde cada vez mais, escolas trabalham com seus alunos do 1º e 2º ciclo do ensino fundamental. A educação ambiental nas escolas é uma maneira de integrar e de se entender a realidade partindo da análise do ambiente, isto é, discutindo a realidade a partir dos problemas encontrados no cenário ambiental, visto de forma ampla, nos aspectos históricos, geográficos, biológicos, políticos, econômicos, social e cultural. A situação ambiental depende diretamente da relação do homem com o uso que ele faz dos recursos naturais disponíveis na natureza. O modelo de sociedade atual construído com a industrialização crescente, transformando o mundo num grande centro de produção, distribuição e consumo, são fatores que contribuem para que se tenham conseqüências indesejáveis e que se agravam com muita rapidez.
Trata-se de uma opção de vida por uma relação saudável e equilibrada com o contexto. A educação ambiental deve estimular a solidariedade, a igualdade e o respeito aos direitos humanos, valendo-se de estratégias democráticas e inteiração entre as culturas. (GADOTTI, 2000).


Os problemas ambientais não se restringem apenas à proteção de vida, mas também a qualidade da mesma, as injustiças sociais que também são fatores que contribuem para que grande número da população brasileira tenha baixa qualidade de vida, estão relacionadas diretamente a este modelo de desenvolvimento. É urgente a necessidade de mudança na mentalidade do ser humano, para transformar a consciência da comunidade de modo geral à construção de um mundo mais justo, digno e ecologicamente equilibrado. Essas mudanças poderão ser possíveis partindo da escola, que precisa muito mais cultivar comportamentos do que transmitir conteúdos. Isto é, a escola deve oferecer condições para que o aluno possa compreender os fatos naturais e humanos, de um modo crítico e que permita a eles cultivar atitudes que os possibilitem viver uma relação construtiva consigo mesmo e com o meio, colaborando para que a sociedade seja sociamente justa e ambientalmente sustentável.
A principal função da escola é utilizar através dos PCN?s (Parâmetros Curriculares Nacionais) Temas Transversais, e dentre eles está a Educação Ambiental, contribuindo para a formação de cidadãos plenos, capazes de decidirem e atuarem sobre a realidade de modo ético e comprometida com a vida, com a sociedade local e globalizada. Para que isso ocorra, é muito pouco informar e dar conceitos. É necessário trabalhar com atitudes, com a formação de valores, com o ensino e a aprendizagem de habilidades e procedimentos. Isto é um grande desafio, e a escola não pode estar sozinha nesta tarefa, os padrões de comportamento da família, as informações e as opiniões veiculadas pelos meios de comunicação exercem especial influência sobre as crianças e na sociedade de modo geral. Infelizmente, o discurso e a ideologia veiculada, nos meios de comunicação muitas vezes são conflitantes com a idéia de um desenvolvimento sustentado e de respeito ao meio ambiente. São propostos e estimulados valores de consumismo, desperdício, violência, egoísmo, desrespeito, preconceitos, irresponsabilidade, dentre outros. Ribeiro propõe:
Uma reflexão filosófica sobre a evolução intelectual da humanidade, especialmente no campo das Ciências Biológicas, e as implicações éticas decorrentes dos crescentes avanços de tecnologias de manipulação da vida. Em face disso, os profissionais das diversas áreas devem analisar sua responsabilidade diante desses dilemas éticos. (RIBEIRO, 1999).

A educação Ambiental não pode ser definida como uma área de conhecimento especializada, pois ultrapassa estas áreas formais de conhecimento trabalhadas na escola. É necessário que todos os profissionais que atuam na escola, construindo o fazer pedagógico, se envolvam na questão ambiental, pois, disso depende o futuro da espécie humana e de outras formas de vida no planeta Terra. Estão em jogo valores, ética, cidadania, amor à vida e ao próximo, pluralidade cultural, racionalização do consumo, higiene e saúde, urbanização, saneamento básico, sustentabilidade, diversidade biológica, ocupação do solo e muitos outros Temas Transversais de extrema importância para a realização de um bom e consciente trabalho. Sendo a base e o princípio norteador está a ecologia "estudos do meio ambiente e das relações que os seres vivos mantêm com ele" (BIDERMAN, 2001, p.338).

A preservação ambiental é uma necessidade cada vez mais importante para que se mantenha o equilíbrio ecológico, pois o futuro da humanidade e do nosso planeta depende da harmonia dessa relação entre o homem e a natureza. A sensibilização da sociedade com relação a essa preservação torna-se cada vez mais perceptível, tendo em vista uma maior participação de pessoas físicas e jurídicas, entidades governamentais e não governamentais todos envolvidos com objetivo único de priorizar a continuidade de crescimento necessário ao ser humano.
O tema abordado trata a questão da preocupação mundial como prioridade social na preservação ambiental. A biodiversidade ou corredores de biodiversidade envolve um projeto que compõe desenvolvimento estruturado e planejado com preservação e equilíbrio da natureza.
Estão sendo tomadas várias medidas de gerenciamento, desenvolvimento, execução e apoio dentro deste projeto tendo iniciativa do Governo Estadual, da CI ? BR, dentre outros órgãos estaduais ligados ao meio ambiente, também tem a participação do Governo Federal e órgãos nacionais envolvidos direta ou indiretamente com o tema em questão assim como Ong?s nacionais e internacionais, todos com um só objetivo, o de desenvolver a região amazônica, explorando seu imenso potencial, com equilíbrio, sem agressão e de comum acordo com suas leis de biodiversidade. A biopirataria, problema sério, que causa grande prejuízo à nação brasileira e que está em pauta nas discussões atuais, também está sendo combatida com veemência pelas autoridades brasileiras, que sentiram o problema quando começaram a descobrir que estavam sendo patenteados em outros países, nomes e produtos genuinamente nacionais, causando grande repúdio e revolta por parte de nossa população.
Uma das formas de investimento praticadas para que estas mudanças de fato sejam observadas como realidade é através dos futuros cidadãos. Por isso, a escola é tida como uma das mais importantes instituições para que haja a promoção dessas discussões. A educação pode ampliar e desenvolver no aluno através do cognitivo, o interesse e a capacidade de conviver melhor com o seu ecossistema, sem degradá-lo, tornando-o assim um ambiente agradável e seguro para o convívio de todos.

* Márcio Negrão é Diretor do Instituto Superior de Educação Atual.