BENS PENHORÁVEIS – A tecnologia e os novos métodos de identificação e localização de bens passíveis de penhora[1]

 

Bárbara Araújo de Abreu e Camila Maria Mont’Alverne Frota[2]

Christian Barros[3]

Sumário: Introdução; 1 O Princípio da Patrimonialidade; 2 A evolução do sistema da penhora;3 Ferramentas tecnológicas à disposição da Justiça para identificação e penhora de bens; 4 Considerações finais; Referências bibliográficas.  

RESUMO

No presente trabalho apresentam-se os novos instrumentos à disposição da Justiça para a realização da penhora, a qual, após passar por uma evolução significante, atingiu seu ápice com a chamada penhora on-line e seus desdobramentos. A partir disso, será tratado o princípio da patrimonialidade, demonstrando-se como o mesmo se apresenta no ordenamento jurídico brasileiro, bem como a sua importância para o processo executivo. No Capítulo 3, abordaremos os meios de penhora através de meios eletrônicos que estão à disposição da Justiça. Trataremos o processo referente ao BacenJud, cuja previsão expressa passou a se fazer presente no art. 655-A do Código de Processo Civil, suas vantagens ao processo de execução, os demais métodos de penhora eletrônica disponíveis que nasceram a partir do BacenJud, além de apontarmos suas características e as opiniões de alguns doutrinadores acerca do tema.

Palavras-chave: Responsabilidade patrimonial. Penhora. Instrumentos tecnológicos à serviço da penhora. Penhora Online. BACENJUD.

 

INTRODUÇÃO

De acordo com Araken de Assis, a penhora é o ato executivo que afeta determinado bem à execução, permitindo sua ulterior expropriação, e torna os atos de disposição do seu proprietário ineficazes em face do processo (ASSIS, 2012, p. 696). No mesmo sentido, Humberto Theodoro Junior afirma ser a penhora o primeiro ato por meio do qual o Estado põe em prática o processo de expropriação executiva, tendo ela a função de individualizar o bem, ou os bens, sobre os quais o ofício executivo deverá atuar para dar satisfação ao credor e submetê-los materialmente à transferência coativa (THEODORO, 2007, p. 292).

Cumpre ressaltar que a penhora admite formas variadas de realização, todas especifica e legalmente previstas em nosso ordenamento jurídico. A escolha da via pela qual a penhora será realizada dependerá, principalmente, do objeto sobre o qual recairá e a forma com a qual tal objeto foi alcançado. Cumpre ressaltar, além disso, que ressalvados alguns casos, a penhora deverá recair unicamente sobre o patrimônio do devedor, respeitando, assim, o princípio da patrimonialidade, a partir do qual, segundo Fredie Didier Junior e Paulo Sarna Braga, somente o patrimônio do devedor (CPC, art. 591), ou de terceiro responsável, pode ser objeto da atividade executiva do Estado. (DIDIER, BRAGA, 2010).

O avanço da sociedade e as novas tecnologias presentes no cotidiano de todos obrigaram o Direito a acompanhá-los de modo que inclusive o processo de execução se fizesse diferenciado do que se costumava observar. A Internet tornou-se grande aliada dos magistrados e dos exeqüentes que pleiteiam o pagamento de seus créditos, uma vez que foram beneficiados pela celeridade, pela economia e pela segurança da nova forma de penhora, denominada “penhora on-line” ou “penhora eletrônica”.  A penhora on-line, como é chamada pelos juristas, é a penhora de dinheiro contido nas contas bancárias do executado. A partir da Lei nº 11.232/2006, passou a existir, de forma expressa, se encarregado de regulamentar a penhora de dinheiro ou aplicação monetária em contas de instituições bancárias, tornando possível o bloqueio de numerários e impossibilitando qualquer movimentação na conta. Foi então que se criou o BACENJUD, convênio firmado entre o Superior Tribunal de Justiça e o Banco Central. Através dele, os juízos têm acesso às contas dos executados, podendo executar suas dívidas penhorando valores monetários exatos, anulando, dessa forma, o risco de penhorar bens além ou aquém do que deveriam, como pode acontecer ao ser penhorado um bem móvel ou imóvel, por exemplo. Busca-se, portanto, discutir, também, os meios de penhora eletrônica, que não se limitam apenas ao BacenJud, chegando ao RenaJud, ao InfoJud, ao CCS e ao Cadastro de Conta Única.

1 Princípio da Patrimonialidade

A patrimonialidade significa que a execução deverá recair, unicamente, sobre o patrimônio do devedor. Portanto, a responsabilidade patrimonial do devedor impõe que todos os bens que integrem o seu patrimônio venham a responder por suas dívidas, conforme disposto no Art. 591 do Código de Processo Civil.  Portanto, tanto os bens existentes ao tempo da constituição da dívida como os que o devedor adquiriu posteriormente ficam vinculados à responsabilidade pela execução, isso está justificado pela universalidade do patrimônio do devedor, através da qual não importa se o objeto do devedor a ser penhorado existia ou não ao tempo da constituição da dívida. No entendimento de Araken de Assis, efetivamente a diretriz deriva do art. 591 do CPC, que assenta o princípio da responsabilidade patrimonial do executado. Desse modo, na forma bem discutível da lei, o devedor responde pelo cumprimento da obrigação através de seus bens “presentes e futuros” (ASSIS, 2012, p. 113).

Tratando sobre o patrimônio do devedor, o autor Humberto Theodoro Junior, no livro Curso de Direito Processual Civil, afirma:

 Na realidade, a responsabilidade não se prende à situação patrimonial do devedor no momento da constituição da obrigação, mas da sua execução. O que se leva em conta, nesse instante, são sempre os bens presentes, pouco importando existissem, ou não, ao tempo da assunção do débito. (THEODORO,2007,p.199).

                Desse modo, enquanto o devedor encontra-se inadimplente, o seu patrimônio mantém-se comprometido com a satisfação dos seus débitos. Existe, então, uma submissão dos bens do devedor ao adimplemento das suas obrigações, até mesmo sujeitando-se estes à expropriação.

            O processo de execução meramente patrimonial se desenvolve através do ataque por parte do Estado ao patrimônio do devedor com o objetivo de saldar a dívida existente. Desse modo, conforme afirma o ex-ministro Luis Fux, no livro O Novo Processo de Execução: O Cumprimento da Sentença e a Execução Extrajudicial, que a responsabilidade patrimonial, revela-se um instituto eminentemente processual, porquanto consiste na invasão judicial do patrimônio do devedor para satisfação dos interesses do credor, atividade que se veda ao particular (FUX, 2008, p.75).

            Cumpre ressaltar ainda o fato de que, como observa Humberto Theodoro Junior, o crédito compreende uma obrigação para o devedor e uma responsabilidade para o seu patrimônio. Sendo esta responsabilidade unicamente patrimonial, não existindo execução sobre a pessoa do devedor, mas apenas sobre os seus bens (THEODORO, 2007, p.198). Desse modo, o patrimônio é composto apenas de bens de valor pecuniário, não estando incluídos a honra, a vida e o nome do devedor.

            A partir disso, se mostra incompatível algumas figuras do antigo processo como a submissão da pessoa do devedor ao cumprimento das obrigações, bem como restrições à sua liberdade individual e até mesmo ao seu estado civil, nos casos de não satisfação do débito. Como observa Luis Fux, a adstrição às consequências meramente patrimoniais para os casos de descumprimento das obrigações revelou um admirável passo na construção dos direitos fundamentais do homem, porque nem mesmo a pena criminal pode passar da pessoa do condenado (FUX, 2008, p.76). Dessa forma, fica claro que o devedor não responde pelas suas dívidas com a sua pessoa física, como era realizado em tempos remotos, mas apenas com a sua esfera patrimonial, respeitados, inclusive, determinadas limitações, como a existência de bens do devedor que não estão sujeitos à execução, como os considerados por lei impenhoráveis ou inalienáveis, preservando, principalmente, o mínimo necessário ao sustento humano, bem como resguardando os bens de família.

            Sobre a impossibilidade de se executar alguns bens do devedor, o autor Luis Fux destaca que há bens do devedor que não respondem pelo inadimplemento de suas obrigações, posto que protegidos pelo benefício processual de não se sujeitarem nem à constrição judicial nem à subsequente alienação, e que se denomina impenhorabilidade.

            Desse modo, outra importante característica da responsabilidade patrimonial é a legitimidade passiva da execução. Normalmente o sujeito passivo da execução será aquele vencido na anterior ação de conhecimento ou o devedor que figure como tal no título extrajudicial. Porém, o Art. 568, incisos II a V, elenca outras pessoas como legitimadas a sofrer execução, embora não figurem primitivamente no título, como é o caso do espólio, dos herdeiros, do assuntor da dívida, do fiador judicial e do responsável tributário (THEODORO, 2007, p. 199). Existindo, ainda, a figura da “responsabilidade patrimonial secundária”, na qual a conduta de terceiros poderá levar os bens particulares destes a responderem pela execução como se fizessem parte do patrimônio do próprio devedor, qual sejam, os casos elencados no Art. 592 do CPC.

            No mais, conforme afirma Alexandre Freitas Câmara a responsabilidade patrimonial consiste na ‘sujeitabilidade’, ou seja, na possibilidade de sujeição de um patrimônio às medidas executivas que se dirigem a fazer cumprir a vontade concreta do direito substancial (CAMARA, 2012, p.219).

 

2 A evolução do sistema da penhora

            De acordo com Humberto Theodoro Junior, a penhora visa dar início à transmissão forçada de bens do devedor, para apurar a quantia necessária ao pagamento do devedor, sendo o patrimônio deste, ou de alguém que tenha assumido responsabilidade pelo pagamento da dívida, que deve ser atingido pela penhora, nunca o de terceiros estranhos à obrigação (THEODORO,2007, p. 303).

            Existindo, desse modo, bens patrimoniais disponíveis, porém, impenhoráveis, devido à questões de origem ética-social, humanitária e política, respeitando, dessa forma, o princípio da dignidade humano, o qual deve estar presente em todas as relações sociais. Segundo a lição de Humberto Theodoro Junior, segundo o espírito da civilização cristã de nossos tempos, não pode a execução ser utilizada para causar a extrema ruína, que conduza o devedor e sua família à fome e ao desabrigo, gerando situações aflitivas inconciliáveis com a dignidade da pessoa humana (THEODORO, 2007, p. 303). Porém, nos remetendo à história do processo civil, destaca-se que nem sempre tal princípio foi respeitado, bem como o mínimo existencial humano. Bem como, o fato de que na história antiga, a jurisdicionalidade era mitigada.

            No Direito Antigo em Roma, destaca Humberto Theodoro Junior, com a queda do Império Romano e a implantação dos povos germânicos, passou-se a ter um choque cultural pelo fato de que os bárbaros praticavam hábitos, considerados pelos romanos, rudimentares nas praxes judiciárias quais sejam a execução privada, realizada pelas próprias forças do credor sobre o patrimônio do devedor, sem depender do prévio consentimento do judiciário (THEODORO, 2007, p.9). Ressaltando-se o fato de que a atividade cognitiva era posterior à atividade executiva, a qual não dependia de procedimento judicial para ter validade.

            No Direito Português, especialmente em relação às Ordenações Afonsinas (1446-1521), surgiu a preocupação de resguardas alguns bens de uso doméstico e pessoal além do direito do devedor em escolher os bens a serem penhorados. Nas Ordenações Filipinas (1603-1867), houve a preocupação com a proporcionalidade entre o bem penhorado e a dívida, destacando a possibilidade de penhora dos bens do executado e da família que possuíssem em abundância como cavalos e sementes caso não existissem bens móveis ou propriedades.

    No Direito Brasileiro, após a independência, permaneceram as regras do direito português enquanto não fossem elaboradas leis.  O Código de Processo Civil de 1939 já determinava em seu Art. 942 a impenhorabilidade dos bens indispensáveis ao sustento do executado e da sua família. Outra observação importante faz-se sobre a ação executiva de quantia certa, a qual a partir da citação do réu, para pagamento espontâneo da obrigação, o mesmo tinha apenas vinte e quatro horas para adimplir o débito ou nomear penas a serem penhorados, sob pena de penhora. A penhora se dava, portanto, a partir do descumprimento do prazo independente de novo mandado e caso não houvesse a nomeação dos bens, penhorava-se os bens que o oficial encontrasse.

Atualmente, caso não seja verificada a sentença condenatória, o exeqüente pode requerer ao juiz que requisite informações ao Banco Central e intime o executado para informar a localização dos bens e seus devidos valores, correndo o risco de sofrer multa de 20% do valor atualizado do débito a ser executado, como assim prevê o art. 601 do CPC. Logo, além de ter a obrigação de pagar a quantia devida, o executado deverá indicar o valor que possui em instituição financeira, para que, assim, seja possível realizar o que hoje se conhece como penhora on-line ou penhora eletrônica, ou seja, o bloqueio da conta do executado pelo juiz a fim de que seja pago o que é devido ao exeqüente.

3 Ferramentas tecnológicas à disposição da Justiça para identificação e penhora de bens

A priori, cumpre-se destacar que a penhora on-line é um sistema inovador utilizado pelo Poder Judiciário com o intuito de bloquear contas bancárias a fim de que sejam realizados os pagamentos de débitos por ordem judiciária. Tal bloqueio é realizado nas contas-correntes dos executados de forma eletrônica, garantindo, portanto, maior celeridade no processo de execução. Esse tipo de medida ocorre graças ao chamado BACEN JUD, criado pelo Banco Central e em funcionamento desde 2001. Verifica-se também que tal medida vem sido justificada através do argumento de que, pela preferência da penhora em dinheiro, há maior efetividade na prestação jurisdicional, com respaldo no que prevê o art. 655 do CPC:

Art. 655. Incumbe ao devedor, ao fazer a nomeação de bens, observar a seguinte ordem:

I - dinheiro;

II - pedras e metais preciosos;

III - títulos da dívida pública da União ou dos Estados;

IV - títulos de crédito, que tenham cotação em bolsa;

V - móveis;

Vl - veículos;

Vll - semoventes;

Vlll - imóveis;

IX - navios e aeronaves;

X - direitos e ações.

§ 1º - Incumbe também ao devedor:

I - quanto aos bens imóveis, indicar-lhes as transcrições aquisitivas, situá-los e mencionar as divisas e confrontações;

II - quanto aos móveis, particularizar-lhes o estado e o lugar em que se encontram;

III - quanto aos semoventes, especificá-los, indicando o número de cabeças e o imóvel em que se acham;

IV - quanto aos créditos, identificar o devedor e qualificá-lo, descrevendo a origem da dívida, o título que a representa e a data do vencimento;

V - atribuir valor aos bens nomeados à penhora. (Inciso acrescentado pela Lei nº 8.953, de 13.12.1994)

§ 2º - Na execução de crédito pignoratício, anticrético ou hipotecário, a penhora, independentemente de nomeação, recairá sobre a coisa dada em garantia.

Portanto, a respeito da preferência ao sistema on-line de penhora, o qual prioriza o pagamento do débito em dinheiro, Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart (2007) afirmam:

A penhora de dinheiro é a melhor forma de viabilizar a realização do direito de crédito, já que dispensa todo o procedimento destinado a permitir a justa e adequada transformação de bem penhorado – como o imóvel – em dinheiro, eliminando a demora e o custo de atos como avaliação e a alienação do bem a terceiro.

Além da vantagem da celeridade, é muito importante que destaquemos um outro ponto positivo da penhora on-line: através desse novo método de execução, o exeqüente consegue definir exatamente a quantia que lhe interessa que seja paga pelo executado, ou seja, não corre o risco de ter seu crédito reduzido por conta do pagamento via bens móveis ou imóveis que possuem um valor incerto ou relativo.

Porém é interessante destacar a leitura do artigo supracitado, art. 655, o qual permite ao devedor que seja feita apenas a nomeação dos bens, obedecendo à ordem prevista, sem mencionar o dinheiro depositado em conta. Entretanto, a Lei 11.382/2006 vem corrigir essa questão, dando nova redação ao inciso I, explicitando: “dinheiro, em espécie ou em depósito ou aplicação em instituição financeira.”. É a partir de então que começa a ter espaço o processo de penhora eletrônica em nosso ordenamento jurídico. Assim, com o intuito de aperfeiçoar o sistema de execução, mais especificamente no que tange à execução de título extrajudicial, a Lei mencionada cria o art. 655-A, que é bastante claro e objetivo ao prever:

Para possibilitar a penhora de dinheiro em depósito ou aplicação financeira, o juiz, a requerimento do exeqüente, requisitará à autoridade supervisora do sistema bancário, preferencialmente por meio eletrônico, informações sobre a existência de ativos em nome do executado, podendo no mesmo ato determinar sua indisponibilidade, até o valor indicado na execução.

Ademais, Marinoni e Arenhart (2007) defendem:

Não há dúvida que a penhora on line é a principal modalidade executiva destinada à execução pecuniária, razão pela qual não se pode negá-la ao exeqüente, argumentando-se, por exemplo, não ter o órgão judiciário como proceder a tal forma de penhora ou não possuir o juiz da causa senha imprescindível para tanto. Como é evidente, qualquer uma destas desculpas constituirá violação do direito fundamental do exeqüente e falta de compromisso do Estado ao seu dever de prestar a justiça de modo adequado e efetivo.

A partir de então, foi criado o BACENJUD, desenvolvido pelo Banco Central, num convênio com o Poder Judiciário, abrindo espaço aos magistrados devidamente cadastrados para que solicitem informações acerca de créditos existentes do executado em todas e quaisquer instituições financeiras, assim como também permite que haja bloqueio de ativos em conta corrente ou conta de investimento. O capítulo I da Resolução nº 61, de 07 de outubro de 2008, trata das disposições gerais acerca do BACENJUD, e seu art. 1º o conceitua: “é o sistema informatizado de envio de ordens judiciais e de acesso às respostas das instituições financeiras pelos magistrados devidamente cadastrados no Banco Central do Brasil, por meio da Internet.” E, mais uma vez, sobre o tema, Marinoni e Arenhart (2007, p.271) apresentam a seguinte lição:

Mas a possibilidade de o exeqüente indicar bens à penhora passar a ter real efetividade quando se constata que a nova redação do inciso I do art. 655 - instituída pela Lei 11.382/2006 - esclareceu que o primeiro bem da ordem legal, ou seja, o dinheiro, também pode ser objeto de penhora quando em depósito ou aplicação em instituição financeira. [..] A partir daí, o problema evidente da penhora de dinheiro passaria a ser o de que o exeqüente não pode saber se o executado tem dinheiro depositado e, muito menos, o local da sua realização. Porém, a Lei 11.382/2006 habilmente eliminou tal problema ao instituir o art. 655-A, nos seguintes termos: ‘Para possibilitar a penhora de dinheiro em depósito ou aplicação financeira, o juiz, a requerimento do exeqüente, requisitará à autoridade supervisora do sistema bancário, preferencialmente por meio eletrônico, informações sobre a existência de ativos em nome do executado, podendo no mesmo ato determinar sua indisponibilidade, até o valor indicado na execução’. [...] É preciso deixar claro que o direito à penhora ‘on line’ é corolário do direito fundamental à tutela jurisdicional efetiva. Não há dúvida de que a penhora ‘on line’ é a principal modalidade executiva destinada à execução pecuniária, razão pela qual não se pode negá-la ao exeqüente, argumentando-se, por exemplo, não ter o órgão judiciário como proceder tal forma de penhora ou não possuir o juiz da causa senha imprescindível para tanto. Como é óbvio, qualquer uma destas desculpas constituirá violação do direito fundamental do exeqüente e falta de compromisso do Estado ao seu dever de prestar a justiça de modo adequado e efetivo. 

Acerca do BACENJUD, seu acesso pode ser dado pelo endereço http://www.bcb.gov.br ou pelo http://www3.bcb.gov.br/bacenjud2 , de modo que os únicos usuários são máster, magistrados, servidores e assessores, gerenciadores, mantenedores de contas únicas para bloqueio, mantenedor do cadastro de Varas e Juízos e mantenedores do cadastro de hierarquia dos Tribunais, porém o manual básico disponibilizado nesses endereços prevê apenas as atribuições destinadas aos magistrados e aos servidores.

No momento em que se põe em prática o exposto no art. 655-A, o juiz já requisitará a indisponibilidade do montante que será objeto de penhora posteriormente. Em seguida, o Banco Central se encarregará de fazer o bloqueio e comunicará ao juiz o valor disponibilizado, bem como o banco onde está presente a quantia. As informações disponibilizadas pelo BACENJUD se limitarão à existência ou não de depósito ou aplicação até o valor indicado na execução, tendo em vista o que for apresentado na planilha de cálculo que deve ser atualizada e informada pelo exeqüente.

Para explicar o processo, Elpidio Donizetti (2007) se pronuncia:

Na prática, o juiz não requisita informações, ele dá ordem condicional. Por meio eletrônico, o juiz determina que se indisponibilize até o valor x (da execução) porventura existente em contas de depósitos ou aplicações financeiras no sistema bancário. A autoridade destinatária da ordem informa o valor e a instituição onde se encontra a quantia bloqueada à ordem do juízo. O valor bloqueado por ser inferior ao necessário para pagar ao credor. Por óbvio, pode ocorrer de não haver quantias depositadas o aplicadas em nome do devedor e então a informação será negativa. É assim que se passam as coisas. Feito o bloqueio, tudo se passa do modo mais simples e informal. A quantia permanece à ordem do juízo até a última ação dos atos da execução. [...] A importância fica sob a guarda dos dirigentes do banco depositado, independentemente da lavratura do termo.

Assim, ao serem analisados os autos, caberá ao juiz determinar a penhora de dinheiro em depósito ou aplicação financeira via BACENJUD, caso seja convencido de que há verossimilhança da pretensão do exeqüente no que diz respeito à constrição dos valores em nome daquele que for executado.

De forma mais explicativa, o manual do BACENJUD 2.0 determina como deve ocorrer o sistema de penhora on-line: A priori, é enviada e protocolada a ordem judicial de bloqueio até às 19 horas do primeiro dia pelo  Poder Judiciário, para que, em seguida, o Banco Central consolide as ordens recebidas, gerando arquivos de remessa e os disponibilizando aos bancos, ou instituições financeiras, até às 23 horas. No segundo dia, essas instituições deverão cumprir a ordem de bloqueio, gerando um arquivo de resposta que será enviado ao BACENJUD até às 23h59min desse mesmo dia. Já no terceiro dia, o Banco Central se encarrega de tratar dos arquivos de resposta e de disponibilizar suas informações aos juízos interessados até às 8 horas, para que, a partir daí, o Poder Judiciário acesse as informações e possa protocolar novas ordens cabíveis, como de transferência e desbloqueio, até às 19 horas. Mais uma vez o Banco Central consolida as novas ordens, disponibilizando as instituições financeiras ate às 23 horas. Já no quarto dia, essas mesmas instituições deverão cumprir as novas ordens, gerando arquivos de resposta, enviando ao BACENJUD, novamente até às 23h59min. No quinto e ultimo dia, o Banco Central faz o mesmo processo de antes: trata os arquivos de resposta das novas ordens, disponibilizando as informações necessárias em juízo até às 8 horas. Deve-se salientar que os prazos estipulados pelo manual não precisam ser religiosamente cumpridos, de modo que se fazem presente apenas para garantiar maior celeridade no processo.

Portanto dentre as vantagens do sistema BACENJUD estão a celeridade no processo de execução, a economia processual, tendo em vista o fato de que os custos são reduzidos, e a segurança, vez que a transmissão é criptografada, não há qualquer contato manual no cumprimento das ordens judiciais e há controle das ordens e respostas pelo juízo responsável. (CNJ) Uma crítica bastante pertinente em relação ao sistema BACENJUD diz respeito ao fato de as requisições de informações, bloqueios e transferências de ativos financeiros não atingirem apenas uma conta do devedor. A partir de então, entra-se em mais uma evolução do sistema de penhora: o Sistema Nacional de Cadastramento de Contas Únicas do BACENJUD 2.0, regulamentado pelo Capítulo II da Resolução Nº 61, supracitada, a partir do art. 3º. De acordo com o site do Tribunal Superior do Trabalho, o Sistema Nacional de Cadastramento de Conta Única permite que pessoas físicas e jurídicas façam um cadastramento de uma única conta para recebimento de ordens judiciais de bloqueio do sistema BACENJUD. O interessado deverá encaminhar requerimento ao Ministro Corregedor-Geral da Justiça do Trabalho, que deverá conter declaração de ciência, bem como deverá concordar com as normas relativas ao cadastramento de contas previstas na Consolidação dos Provimentos da Corregedoria-Geral da Justiça do Trabalho (arts. 91 a 105) , como também na Resolução n.º 61/2008 do CNJ. Além disso, o art. 7º dessa Resolução é transparente ao afirmar que a pessoa física ou jurídica que fizer o cadastramento obriga-se a manter valores disponíveis a fim de que seja possível o atendimento das ordens judiciais que vierem a sex expedidas, sob pena de redirecionamento imediato de ordem de bloqueio às demais contas e instituições financeiras onde a pessoa possua valores disponíveis.

Mais um instrumento de penhora eletrônica diz respeito ao Cadastro de Cliente do Sistema Financeiro Nacional, ou CCS, que, de acordo com seu Manual, consiste em um sistema informatizado capaz de identificar onde os clientes executados de instituições financeiras possuem contas de depósitos à vista, de poupança, a prazo e outros bens, direitos e valores, tanto diretamente quanto através de representantes legais ou procuradores. Visa combater a criminalidade e, inclusive, o projeto de lei referente à Lei nº 10.701/2003, que determinou a manutenção de um cadastro geral de correntistas e clientes de instituições financeiras e de seus procuradores, é oriundo da Comissão Parlamentar de Inquérito do Congresso Nacional. Há de se ressaltar que o CCS não contém dados de valor, é apenas um meio de informatização. Não possui, portanto, nenhuma demonstração de movimentação financeira ou de saldos de contas e aplicações. Conclui-se que seu principal objetivo é auxiliar em investigações financeiras realizadas pelas autoridades competentes. Além de possuir relação direta com a Lei nº 10.701/2003, a qual incluiu dispositivo na Lei de Lavagem de Dinheiro, fazendo-se valer seu art. 3º com determinação ao Banco Central supracitada.

Uma observação importante a se destacar acerca do CCS é a questão da Teoria da desconsideração da personalidade jurídica da empresa que fizer seu cadastramento. O Cadastro de Clientes, inegavelmente, é uma ferramenta que permite que seja levantado o véu da personalidade jurídica da empresa com o intuito de que o ato de expropriação atinja os bens do efetivo titular.

O Conselho Nacional de Justiça conceitua mais um meio de penhora on-line, o InfoJud, da seguinte forma: é um sistema desenvolvido pela Secretaria da Receita Federal a fim de possibilitar que sejam realizadas requisições judiciais de informações protegidas por sigilo fiscal. Além disso, ainda atingem as respostas, via meio eletrônico e Certificado Digital. Dentre os pré-requisitos para que seja utilizado o InfoJud estão o prévio cadastro na base específica da Receita Federal do Brasil, possuir Certificado Digital emitido por autoridade certificadora integrante da ICP-Brasil, o Cadastramento Digital ou Torken e o acesso à Internet. É através do InfoJud que o magistrado identifica o CPF dos devedores, localiza seus endereços, identifica seus bens e até mesmo as empresas que estão em seu nome. E os benefícios podem ser divididos entre aqueles que o são para a Justiça – confiabilidade, rapidez, segurança e adequação – e os que o são para a SRF – melhor aproveitamento dos recursos humanos, recursos direcionados para outros serviços e foco no negócio (CNJ)

O Sistema RenaJud também faz parte do rol dos meios eletrônicos de penhora, entretanto ele interliga o Poder Judiciário, o Ministério das Cidades e o Ministério da Justiça - DENATRAN/Base Índice Nacional (BIN) do Registro Nacional de Veículos Automotores - RENAVAM. Para ter acesso ao sistema, o usuário deverá estar cadastrado no Sistema Senha-Rede do SERPRO e habilitado para o Sistema RenaJud-WEB. Nesse tipo de penhora, não é necessário o certificado digital nem o torken, mas exige uma senha. Sua principal funcionalidade diz respeito ao fato de tornar eficaz a identificação de veículos em nome do devedor. Também é possível, através do RenaJud, a localização de veículos, auxiliando na localização do endereço do devedor. De acordo com o Manual disponibilizado pelo Conselho Nacional de Justiça, a finalidade do RenaJud é “possibilitar, em tempo real e em todo o território brasileiro, a identificação da propriedade de veículos, bem como a efetivação das ordens judiciais de restrição no Registro Nacional de Veículos Automotores – RENAVAM.” Dessa forma, constata-se que suas vantagens, também de acordo com o CNJ, consistem em máxima rapidez na identificação de veículos e na efetivação das restrições  judiciais, sua abrangência nacional, a eliminação do trânsito de papéis, o sistema WEB, e uma maior celeridade processual. A partir do RenaJud, também são realizadas algumas restrições: restrição de transferências, de licenciamento – ou IPVA, restrição de circulação e o registro de penhora.

O que vale considerar é que, após tantas inovações, é inaceitável que não haja redução significativa do tempo de atendimento das ordens jurisdicionais. Deve-se, também, ser nítida a redução do uso de papéis ou ofícios judiciais, de modo que se economizem custos e garanta maior segurança às partes do processo, visando garantir a todo e qualquer cidadão o que foi apresentado como principal objetivo das inovações do processo executivo referentes ao sistema de penhora de títulos extrajudiciais: a efetiva entrega da prestação jurisdicional.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante do que foi exposto, é inegável o fato de que a inovação do novo meio de penhora é bastante vantajoso ao magistrado, ao exeqüente e, inclusive, ao curso do processo, que ocorrerá de forma mais célere. O capítulo 2, portanto, destacou como se dava a penhora antigamente, ressaltando o desrespeito a dignidade humana e, principalmente, à penhora não se restringir ao patrimônio do devedor, sendo possível, naquela época, o devedor pagar com a sua própria vida ou com os bens necessários ao sustento de sua família. Além disso, tratou-se de como se iniciou o processo de penhora eletrônica, suas modalidades, como ocorre cada uma e as vantagens atribuídas a cada uma delas, sem deixar de ressaltar a opinião de diversos autores e entendedores do tema em questão. O convênio BacenJud foi criado com o principal intuito de garantir o direito do credor, aliado ao princípio da celeridade processual, haja vista sua praticidade e, atualmente, seu amparo legal devidamente expresso no art. 655-A do Código de Processo Civil. Desde 2001 está vigente o convênio firmado entre o Poder Judiciário e o Banco Central, de modo que aprimore o processo executivo, com um sistema de penhora que prioriza o dinheiro como forma de satisfação da dívida existente. O art. 655 do CPC já dispõe em seu inciso I que se deve dar prioridade ao dinheiro no instante da penhora e, ainda, preferencialmente esta deverá ocorrer por meio eletrônico. Diante disso, comprovam-se as vantagens alegadas pelas partes que integram o convênio criador dessa inovação. Além disso, cumpre-se ressaltar que tal procedimento é uma forma de garantia do exposto no art. 5º da Constituição Federal, o qual prevê a razoável duração do processo e os meios garantidores da celeridade de seu trâmite.

Ademais, não se pode considerar apenas o interesse particular do Estado. Busca-se, através dessas novas formas de alcance à penhora, a satisfação do crédito visando uma eficiente prestação jurisdicional, ou seja, a utilização de tantos meios capazes de viabilizar o provimento jurisdicional tem como principal intuito o interesse público, o interesse de toda a sociedade, na efetividade do processo e na garantia de seus direitos.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

REFERENCIAS  

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[1] Paper apresentado à disciplina Execução no Processo Civil do curso de Direito da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco – UNDB para obtenção de nota parcial.

[2] Alunas do 7º período Noturno do Curso de Direito da UNDB.

[3] Professor da disciplina de Execução no Processo Civil do Curso de Direito da UNDB.