Sandra Cristelo
Professora do 1º Ciclo, Mestre em Ciências da Educação
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O presente artigo tem como objectivo contribuir para que a avaliação formativa, a avaliação desenvolvida em contexto de sala de aula, possa, de facto, melhorar as aprendizagens dos alunos. Existe uma relação intrínseca entre currículo, práticas de ensino e de aprendizagem, e avaliação. Analisam-se, por isso, tendo por base alguma literatura especializada, estes três domínios, à luz do antigo paradigma que dominou o século passado, e que ainda influencia as concepções, as crenças e as práticas de avaliação dos professores e das escolas, bem como da sociedade em geral. Mostra-se a evolução do conceito de avaliação e das suas práticas, bem como as suas insuficiências, e a necessidade de desenvolvimento de uma outra geração de avaliação ? a avaliação respondente construtivista, que responda às exigências educacionais, sociais e culturais actuais. As recentes visões de aprendizagem fazem emergir um novo paradigma, o social-construtivista que influencia o currículo, o ensino e a aprendizagem, e que deverá, consequentemente influenciar a avaliação realizada na sala de aula. Dão-se a conhecer os principais resultados de investigação realizada em Portugal, nos últimos trinta anos, verificando-se que as práticas de avaliação estão, ainda, longe de ser, efectivamente, formativas. Apresentam-se algumas estratégias de implementação para que a avaliação seja verdadeiramente formativa, e, por fim, focam-se algumas dificuldades que se podem encontrar no desenvolvimento deste tipo de avaliação nas salas de aula.

O antigo paradigma
Durante o século passado, o currículo sofreu fortes influências das ideias de eficiência social, que integrava as teorias hereditárias das diferenças individuais e as teorias de aprendizagem associacionista e behaviorista e, por sua vez, a avaliação era caracterizada como "medida científica" (através da qual eram utilizados testes de QI para diferenciar os alunos pelas suas capacidades, e testes objectivos para avaliar conhecimentos). Este antigo paradigma marcou acentuadamente o século XX, mas, ainda hoje, detém uma forte influência nas práticas de ensino e de aprendizagem, e de avaliação nas salas de aula (Fernandes, 2006; Shepard, 2000 a, b).

Decorrente daquelas ideias, considerava-se que: i) a aprendizagem ocorria pela acumulação de porções atomísticas de conhecimento; ii) a aprendizagem estruturava-se de forma sequencial e hierarquizada; iii) a transferência de conhecimento era limitada, e acontecia, apenas, em situações muito semelhantes às aprendidas; iv) os testes eram utilizados frequentemente para garantir que ocorreu aprendizagem, antes de se passar ao objectivo seguinte; e v) a motivação dos alunos era externa à aprendizagem, e baseada no reforço positivo (Shepard, 2000b).

As práticas de avaliação, nesta perspectiva, assentavam basicamente em ideias, como: i) classificar, seleccionar e certificar eram as funções mais importantes da avaliação; ii) os conhecimentos eram o único objecto da avaliação; iii) a avaliação era uma tarefa exclusiva do professor; iv) o contexto, na maior parte das vezes, não era tido em conta; v) prevalecia a quantificação dos resultados; e vi) a avaliação era referida a uma norma ou padrão (Fernandes, 2005).

O conceito de avaliação tem sofrido várias alterações ao longo dos tempos. Essa evolução está intimamente ligada aos contextos históricos e sociais, aos propósitos que se pretendem alcançar com a avaliação, e às convicções filosóficas daqueles que desenvolvem e concretizam avaliações (Guba & Lincoln, 1989).

A partir de um estudo que Guba & Lincoln (1989) realizaram sobre a evolução e as práticas de avaliação, nos últimos cem anos, conseguiram identificar três gerações da avaliação. Na primeira geração, (até aos anos 30 do século passado) o avaliador é visto como um técnico que consegue quantificar as aprendizagens, as aptidões ou a inteligência dos alunos, seguindo um modelo científico, pois a avaliação é, nesta perspectiva, sinónimo de medida. Na segunda geração (dos anos 30 até ao final dos anos 50 do século passado) a avaliação passa a considerar a descrição, e o papel do avaliador é descrever e explicar os desvios aos objectivos estabelecidos. Na terceira geração (início dos anos 70 do século passado) a avaliação inclui, agora, o juízo de valor, de forma a apreciar o valor e o mérito, sendo que o avaliador mantém as funções técnica e descritiva, cumulativamente com a de juiz.

Como realça Shepard (2000 a, b) a avaliação das salas de aula era sinónimo de medida científica das capacidades e dos conhecimentos dos alunos, situando-se, de forma mais ou menos evidente entre as três primeiras gerações de avaliação que Guba & Lincoln (1989) caracterizaram.

As concepções que caracterizam as primeiras três gerações da avaliação ? avaliação como medida, como descrição, e como juízo de valor - ainda possuem um peso considerável nos sistemas educativos actuais (Fernandes, 2005), pois as crenças dos professores, pais e encarregados de educação, dos políticos, e mesmo de alguns especialistas teóricos, derivam ainda dessas teorias antigas da aprendizagem e do currículo (Shepard, 2000a,b).

Algumas limitações do antigo paradigma
Guba & Lincoln (1989) identificaram, a partir desse estudo que realizaram, algumas das limitações das três primeiras gerações de avaliação, como: i) ausência do reconhecimento de pluralidade de valores de todos os stakolders; ii) tendência para considerar uma única visão (a do professor, no caso da avaliação das aprendizagens); e iii) excessiva ligação ao paradigma científico, que não tem em conta, por exemplo, os aspectos contextuais.

Também Gipps & Stobart (2003) referem que esta visão de avaliação, por um lado, não respondeu satisfatoriamente aos problemas de melhoria do ensino, das aprendizagens e das escolas, e por outro, enfatizou demasiadamente os aspectos mensuráveis.

Inúmera literatura nacional e internacional tem referido, ao longo de vários anos, que as práticas de avaliação da sala de aula não têm acompanhado as mudanças ? sociais, culturais, filosóficas, educacionais, políticas e económicas - que as sociedades actuais têm sofrido.

O desenvolvimento das teorias de aprendizagem, o desenvolvimento das teorias curriculares e a democratização dos sistemas educativos são, do ponto de vista de Fernandes (2006), as alterações mais profundas e que são a razão para que se altere a avaliação das aprendizagens dos alunos.
O novo paradigma
Segundo vários autores, emerge um novo paradigma, o paradigma social-construtivista (Shepard, 2000b) pelo qual a avaliação da sala de aula deverá ocupar um papel central no processo de ensino e de aprendizagem.

Actualmente, sabe-se que a aprendizagem ocorre através de um processo mental de construção activa. Esta nova perspectiva de aprendizagem foi um dos contributos mais valioso das teorias de aprendizagem cognitiva e social-construtivista. Estas teorias de aprendizagem consideram assim que: i) as capacidades intelectuais são desenvolvidas social e culturalmente; ii) os alunos constroem conhecimentos num contexto social; iii) a aprendizagem é influenciada pelo conhecimento prévio e pelas perspectivas culturais; iv) a inteligência envolve processos de meta-cognição e de auto-regulação da aprendizagem e do pensamento; v) a compreensão profunda permite a transferência do conhecimento para novas situações; e vi) o desempenho cognitivo dos alunos depende das disposições e da identidade pessoal (Shepard, 2000, a,b).

As constantes mudanças curriculares que ocorreram têm tentado integrar as recentes teorias de aprendizagem, e concorrem igualmente para que, a todos os alunos, sejam garantidas aprendizagens de qualidade.

Algumas dessas mudanças curriculares assentam nos seguintes princípios: i) que todos os alunos podem aprender; ii) que as tarefas propostas devem ser desafiantes e complexas; iii) que todos os alunos devem possuir oportunidades iguais; iv) que a interacção social favorece a aprendizagem, através das rotinas da sala de aula, e do diálogo entre professores e alunos sobre os conteúdos curriculares e disciplinares; v) que deve existir uma relação autêntica entre as aprendizagens dentro e fora da escola; vi) que os alunos podem adoptar determinadas disposições e hábitos de pensamento que favorecem a aprendizagem; e vii) que as práticas democráticas utilizadas no dia-a-dia da sala de aula favorecem uma cidadania activa, responsável e preocupada (Shepard, 2000a, b).

Tendo em conta as mudanças ocorridas, quer a nível do que se considera "aprender", e, decorrentes destas, ao nível das alterações curriculares, também práticas de avaliação na sala de aula como a forma de avaliar; o conteúdo da avaliação, e a sua utilização, terão de ser modificadas.

Guba & Lincoln (1989) propõem assim uma quarta geração da avaliação, como abordagem alternativa às anteriores - a avaliação respondente construtivista, pela qual se reconhece a importância dos diversos direitos, interesses e problemas dos envolvidos e implicados; o avaliador negoceia, com vista a promover o consenso, através de um processo dialéctico e hermenêutico.

Black & Wiliam (1998b) definem a avaliação formativa como a avaliação que inclui todas as actividades que, professores e alunos, levam a cabo na recolha de informação, que possa ser utilizada diagnosticamente para ajustar o ensino e a aprendizagem, com vista à melhoria. Evidenciaram, através de um estudo realizado (Black & Wiliam, 1998a), que a avaliação formativa pode, efectivamente, produzir melhorias substanciais no desempenho dos alunos.

Uma utilização da avaliação formativa na sala de aula, não diz respeito, apenas, ao uso alternativo de determinados instrumentos de avaliação. Como salientam Gipps & Stobart, (2003, p.550) "não é simplesmente a utilização de formas de avaliação alternativa, mas é também uma utilização alternativa da avaliação como parte do ensino e da aprendizagem".

A verdadeira natureza avaliação formativa caracteriza-se por: i) ter uma intenção positiva ao promover a aprendizagem e fazer parte do ensino; ii) ser uma avaliação igualmente ipsativa (e não estritamente uma avaliação criterial) referida ao aluno e às suas circunstâncias, ou seja, ao contexto, ao esforço e ao progresso conseguidos; iii) a informação recolhida pelo professor ter um relevo especial (através de várias técnicas como a observação, discussão informal entre alunos, análise de trabalhos escritos e de outros produtos, e integrar a auto-avaliação dos alunos); iv) a validade e a utilidade serem aspectos mais importantes que a fiabilidade; e v) existir um envolvimento profundo do aluno nas práticas de avaliação (Harlen & James, 1997).

Curiosamente, e apesar dos inúmeros contributos e evidências teóricas nesta área, que mostram a necessidade e a importância de se alterarem as práticas de avaliação da sala de aula, a avaliação que se desenvolve no dia-a-dia das escolas ainda não se pode caracterizar como formativa.

Fernandes (2009) apresenta alguns dos principais resultados da investigação realizada em Portugal, nas últimas três décadas, em avaliação das aprendizagens, no âmbito de programas de mestrado e de doutoramento, e cujas principais conclusões, acerca das práticas de avaliação na sala de aula, se citam:

i) As práticas de avaliação formativa estão longe de fazer parte da vida pedagógica das escolas. A grande maioria dos professores reconhece a sua relevância e importância para ajudar os alunos a aprender, mas utiliza uma diversidade de argu¬mentos que justificam a inconsistência entre as suas concepções e as suas práticas (e.g., falta de formação, necessidade de cumprir o programa);
ii) A avaliação é fundamentalmente um assunto do professor. São poucas as investigações que mos¬tram que existe partilha dos processos de avalia¬ção com os alunos, pais, professores ou outros intervenientes;
iii) A avaliação ainda é um processo pouco transpa¬rente. Os critérios de avaliação, de correcção e de classificação não são, em geral, explicitados nem clarificados com os alunos.
iv) A avaliação tende a ser pouco rigorosa e pouco diversificada. Os testes prevalecem. Foi possí¬vel constatar a utilização de formas alternativas de recolha de informação num reduzido núme¬ro de casos;
v) A avaliação como medida ou como forma de ve¬rificar se os objectivos foram ou não atingidos são as concepções predominantes. Avaliar para aprender ou para melhorar são concepções que apenas uma minoria de professores parece com¬preender e pôr em prática;
vi) A avaliação das aprendizagens não ocorre de for¬ma contínua e sistemática; a avaliação formativa é pouco frequente e mais baseada na intuição dos professores do que na recolha deliberada e propositada de informação;
vii) As concepções e práticas de avaliação dos pro¬fessores parecem estar fortemente dependentes da cultura avaliativa existente nas escolas e na so-ciedade; neste sentido, a formação inicial e con¬tínua dos professores parece ter uma influência limitada;
viii) O objecto de avaliação por excelência é o co¬nhecimento das matérias curriculares avaliado através de testes e outros trabalhos escritos que constituem as estratégias privilegiadas de reco¬lha de informação avaliativa; e
ix) As reformas educativas têm pouco impacto nas práticas dos professores e na sua consciência profissional. Os professores não possuem uma perspectiva crítica sobre os normativos da ava¬liação porque, em geral, não conhecem os seus princípios estruturantes. Talvez por essa razão considerem que os novos diplomas de avaliação vieram, acima de tudo, aumentar o trabalho bu-rocrático (Fernandes, 2009, pp.89-90).

Estratégias de mudança
As estratégias de mudança das práticas de avaliação, por si só não serão eficazes se não fizerem parte de uma mudança das práticas de ensino da sala de aula e das expectativas e crenças que os professores possuem relativamente ao ensino e à forma de ensinar, bem como às crenças que possuem sobre as capacidades de aprendizagem dos alunos (Black & Wiliam, 1998b), ao que Shepard (2000a,b) designa de cultura de aprendizagem.

Para além de outros aspectos, é necessário desenvolver:

i) A avaliação como um processo. A avaliação formativa em vez de ser utilizada como um instrumento deverá ser encarada como um processo que ocorre durante o ensino e a aprendizagem, e que pode e deve ser reajustado de forma interactiva e continuada (ARG, 2002; Gipps & Stobart, 2003; Heritage, 2010);
ii) Uma avaliação que represente o que se faz na sala de aula. A forma e o conteúdo da avaliação da sala de aula devem ser alterados para que esta represente o que se passa na sala de aula sobre o trabalho, as actividades e as tarefas que são propostas aos alunos. A avaliação deve estar em consonância com o tipo de aprendizagens que os alunos experienciam. Algumas formas são a observação, as questões orais, as tarefas relevantes, os projectos, as demonstrações, as colecções do trabalho dos alunos, e a auto-avaliação dos alunos (Shepard, 2000b);
iii) Uma avaliação contínua e dinâmica. Para que a avaliação seja útil ela deve estar no centro do processo de ensino e de aprendizagem, e não no fim. Sendo contínua, formativa e dinâmica a avaliação permite descobrir o que um aluno é capaz de fazer autonomamente (ARG, 2002; Black & Wiliam, 1998b; Harlen & James, 1997; Shepard, 2000 b);
iv) O conhecimento prévio dos alunos. O conhecimento que os alunos possuem nem sempre é tido em conta no processo de ensino e de aprendizagem, e nem é integrado, verdadeiramente, no processo de avaliação (Harlen & James, 1997; Shepard, 2000 b);
v) Feedback. Fornecer feedback ao aluno sobre o seu desempenho conduz a uma auto-regulação e a uma melhoria desse desempenho. O feedback é um aspecto fundamental na avaliação formativa que visa favorecer a aprendizagem (Black & Wiliam, 1998; Boston, 2002; Dwyer, 1998; Fernandes, 2005; Gipps & Stobart, 2003; Harlen & James, 1997; Heritage, 2010; Shepard, 2000 a, b;). Através de feedback descritivo são emitidos juízos acerca do valor ou do mérito, com referência implícita ou explícita a normas (Tunstall & Gipps, 1996, citados por Gipps & Stobart, 2003), devendo este, preferencialmente, ser realizado com o aluno. O feedback pode ser fornecido oralmente ou por escrito, e pode ser fornecido pelo professor, um outro adulto, ou até mesmo por um par. O essencial é salientar o que o aluno pode fazer na construção da sua aprendizagem e evitar a comparação com outros alunos (Black & Wiliam, 1998b) devendo ser construtivo (ARG, 2002);
vi) Transferência. Há uma relação estreita entre a compreensão profunda de um conceito e a capacidade de o utilizar em novas situações. A compreensão de um conceito caracteriza-se pela flexibilidade, conexão e generalização. A avaliação deverá permitir a utilização de aprendizagens complexas e conceitos em contextos diversos e de diferentes formas (ARG, 2002; Shepard, 2000 a, b);
vii) Critérios explícitos. Os alunos devem conhecer e compreender os critérios pelos quais o seu trabalho é avaliado. Desta forma, poderão avaliar o seu próprio trabalho, tal como o faz o professor, e mais importante ainda, podem melhorar o seu desempenho (ARG, 2002; Shepard, 2000 a, b);
viii) Auto-avaliação. A auto-avaliação serve propósitos cognitivos e responsabiliza os alunos pela sua própria aprendizagem, tornando a relação professor-aluno mais colaborativa (ARG, 2002; Black & Wiliam, 1998b; Gipps & Stobart, 2003; Shepard, 2000 a, b);
ix) Avaliação do ensino. A avaliação das aprendizagens, para além de permitir monitorizar e promover a aprendizagem individual dos alunos, deverá também ser utilizada para conhecer e melhorar as práticas de ensino (Black & Wiliam, 1998b; Shepard, 2000 a, b). Poderá incluir avaliações informais ? acerca da compreensão dos alunos, para (re)ajustar os planos de aula e o ensino - e formais ? como estudos críticos de investigação-acção (Shepard, 2000 a, b);
x) Desenvolvimento de uma aprendizagem profissional. Os professores necessitam de exemplos práticos de outros professores sobre como implementar mudanças nas suas salas de aula (Black & Wiliam, 1998b), e necessitam de reflectir sobre as crenças que possuem acerca da avaliação (Shepard, 2000b), explicitando qual o uso que fazem da informação recolhida (Shepard, 2000a) para que consigam planear a avaliação; observar a aprendizagem; analisar e interpretar as evidências da aprendizagem; fornecer feedback aos alunos; e ajudar os alunos na sua auto-avaliação (ARG, 2002).

As mudanças, nesta área, como em todas as outras, não são fáceis, lineares, nem rápidas. É preciso, além de tempo, e de outras condições, envolver os principais intervenientes, e levá-los a experimentar, para que se apropriem, não só teoricamente como na prática, dos benefícios que alunos, professores, e escolas podem e devem usufruir.

Dificuldades
Algumas dificuldades identificadas na implementação de uma avaliação verdadeiramente formativa dizem respeito:
i) à resistência à mudança, mesmo quando as evidências e a experiência demonstram benefícios (ARG, 2008);
ii) ao tempo ? a alteração de práticas requer tempo para os alunos e para os professores (Gipps & Stobart, 2003);
iii) aos próprios alunos ? muitas vezes são os próprios alunos que poderão dificultar a introdução de novas rotinas se estes estiveram habituados a práticas de ensino e de aprendizagem, bem como de avaliação, mais tradicionais (Black & Wiliam, 1998b; Shepard, 2000 a,b);
iv) às barreiras psicológicas e sociais, quer de alguns especialistas, quer de alguns professores (Dwyer, 1998); e
v) à formação dos professores ? muitos professores não possuem formação adequada nesta área, precisando de ajuda para utilizar a avaliação de uma nova forma, integrada no processo de ensino e de aprendizagem (Shepard, 2000b).

Fullan & Hargreaves (2001) referem outros problemas que dificultam a acção do professor na sala de aula, como: a sobrecarga de trabalho, o isolamento, o pensamento de grupo, a competência não aproveitada (e a negligência da incompetência), as limitações do papel do seu papel (e o problema da liderança), e as soluções pobres e reformas falhadas.

Apoiar as inovações individuais de alguns professores e influenciar os pares com essas práticas eficazes poderá ser um dos caminhos possível. Fullan & Hargreaves (2001, p.11) referem que "as soluções requeridas implicam uma abordagem de natureza, simultaneamente, colectiva e individual", colectiva, porque é necessário que se utilize a colegialidade, para aproveitar e disseminar os bons exemplos que existem nas escolas; e individual, porque é preciso que se proteja e promova o indivíduo, a sua criatividade, a sua diferença, e o seu desenvolvimento profissional. Se se pretende que o processo de ensino-aprendizagem-avaliação seja eficaz, as escolas também terão de o ser.

Considerações finais
A literatura nacional e internacional, na área da avaliação das aprendizagens, tem mostrado, desde há muito, que é necessário que a avaliação da sala de aula seja uma avaliação verdadeiramente formativa, e não uma avaliação dita formativa.

As razões para essa alteração, conceptual e prática, da avaliação das aprendizagens são muitas, e de muitas ordens, mas, sobretudo, prendem-se com as recentes teorias da aprendizagem, as novas teorias curriculares, e também como a democratização dos sistemas educativos. No entanto, a razão fundamental é que o processo de avaliação deve servir para que os alunos aprendam.

Com o intuito de contribuir para que avaliação da sala de aula ajude os professores a melhorar o ensino e os alunos a melhorar as suas aprendizagens, focámos as ideias principais que nortearam o antigo paradigma, baseado nas teorias de aprendizagem associacionista e behaviorista, no currículo de eficiência social e na "medida científica" dos conhecimentos dos alunos e, referimos algumas das suas limitações. Apresentámos, por outro lado, as mudanças conceptuais relativamente às novas teorias da aprendizagem (cognitivista e social-construtivista), ao novo desenvolvimento das teorias curriculares e, consequentemente, à avaliação que é utilizada na sala de aula e que melhora a aprendizagem dos alunos - ideias-chave que sustentam a emergência de um novo paradigma ? o paradigma social-construtivista. As práticas de avaliação dos professores, como mostra grande parte da investigação realizada nos últimos trinta anos, ainda não se adequaram às mudanças curriculares a que temos vindo a assistir: a avaliação ainda não é verdadeiramente formativa, na maior parte dos casos, e ainda não faz parte integrante do processo de ensino e de aprendizagem, tal como a melhoria das aprendizagens dos alunos ainda não é considerado o seu propósito fundamental.

Determinadas estratégias poderão ajudar os professores e escolas a desenvolver, nas salas de aula, práticas de avaliação realmente formativas, apesar das dificuldades que qualquer mudança acarreta. Qualquer tentativa de mudança sobre o propósito e forma da avaliação, para que se integre no processo de ensino e de aprendizagem, requer que se (re)conheça o poder das crenças (difíceis de se alterar e que muitas vezes são pouco visíveis) bem como de outras dificuldades, mais ou menos relacionadas com o papel professor.

No nosso entender, uma das soluções mais importantes e viáveis é aliar forças individuais (promovendo e protegendo práticas inovadoras de professores individuais) e forças colectivas (através de uma partilha e de uma aprendizagem espontâneas e não impostas) que aparentemente podem parecer paradoxais e ou contraditórias.


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