ATOS INFRACIONAIS E SUAS EXPRESSÕES SOCIAIS
Eliel Robson Lemes Ribeiro²
Flávia Regina Rodrigues Arroyo³
Graziela dos Santos Alves4
Kheila A. C. Soares 5



RESUMO

Este artigo visa levantar e compreender uma das diversas expressões da questão social: adolescentes autores de atos infracionais. A importância deste estudo se dá pelo fato que, paralelamente ao ato infracional, os adolescentes são vítimas de um sistema excludente, onde a própria sociedade, de certo modo, torna-se refém, e os rotula como marginais. Porém até mesmo por influência do próprio sistema capitalista, os adolescentes são excluídos de determinados níveis de convivência social, buscando assim alternativas ilícitas para conseguir ascender enquanto ser de direito e efetivar a sua cidadania.
Palavras-chave: Atos infracionais; ECA; SINASE; Medidas socioeducativas.

1 Introdução
A sociedade capitalista rotula os adolescentes que estão em conflito com a lei como delinqüente, e pelo senso comum são caracterizadas trombadinhas, bandidos, vistos de forma preconceituosa. No entanto, os adolescentes são indivíduos que estão em desenvolvimento peculiar, e a transgressão as leis, ocorridas através de atos ilícitos, são decorrências de fatores econômicos, sociais e políticos.
Para a compreensão esta expressão da questão social, é preciso entender o contexto social, econômico e cultural que se inserem nesta demanda. È observada características das desigualdades provocadas pelo sistema capitalista societário, excludente, onde não há acesso às políticas sociais, exemplificando a saúde, educação, habitação, lazer, segurança e outros, e quando há acesso, é de forma restrita e seletiva.
A ausência de acesso às políticas sociais decorre outras expressões da questão social, desencadeando exploração do trabalho, injustiça, prostituição, drogadição, desigualdade social e uma série de fatores que somados, proporcionam aos adolescentes a ocorrência de atos contrários à lei.
Para compreender melhor tais afirmativas, este artigo compõe-se: pela fundamentação teórica, onde será abordado acerca da temática, seguido por uma pesquisa de campo, o resultado das análises do Projeto de Intervenção, e após será concluído pelas considerações finais, proporcionando uma ampla visão acerca da questão social abordada.

2 Fundamentação teórica.

2.1 A evolução histórica de medidas punitivas aplicadas aos atos infracionais.

Desde as civilizações antigas, a questão do adolescente infrator é discutida, sendo atribuído tratamento diferenciado em relação a crianças e adolescentes envolvidas em um agir contrário à lei, direcionando-os penalidades, sem a análise do contexto socioeconômico nos quais se inseriam.
No Brasil, desde 1823 há direcionamentos de medidas punitivas para adolescentes que agem contrário a lei. Em 1890, foi elaborado o Código Penal no Brasil, tendo a menor idade como circunstância atenuante na aplicação da pena.
Em 1916, foi homologado o Código Civil, e em 1923 foi concretizado o Primeiro Juizado de Menores no Brasil, seguido pela aprovação do Código de Menores de 1927. Foi o primeiro Código Brasileiro para Assistência e Proteção à Infância e à Adolescência, conhecido como "Código Mello Mattos".
Em 1934 foi homologado a Primeira Constituição Federal a tratar da questão infanto-juvenil. Em 1941, foi elaborado o Código de Processo Penal, e a partir daí o Código de Menores de 1979, que entrou em vigor em 1980, guiado pela Doutrina da Situação Irregular, onde, em suma, os menores passavam a ser objeto da norma quando se encontravam em estado de "patologia social", fora dos padrões estabelecidos.
O contexto histórico do Código de Menores de 1979 remete ao ano de 1943, com a Comissão Revisora do Código de Menores; 1948, com a Declaração Universal dos Direitos do Homem; 1959, com a Declaração dos Direitos da Criança, que evoluiu na década de 80 para a formulação da Doutrina da Proteção Integral; e 1964, com a Ditadura Militar. A Lei 4513/64 criou a Política Nacional do Bem-Estar do Menor, por meio da FUNABEM (órgão gestor) e FEBEM (órgãos executores).
Em 1968 e 1970, estabeleceram-se como marco emblemático: o III e IV Encontro Nacional de Juízes de Menores, culminado com a Doutrina da Situação Irregular, que tinha caráter eminentemente tutelar e visava à criminalização da pobreza.
Porém, em 1979, com o Ano Internacional da Criança, e, no Brasil, nos anos 80, com a abertura política, já se denunciava a condição das crianças e adolescentes privados de seus direitos e garantias. Em 1988, então, a Constituição Federal consagrou a Doutrina da Proteção Integral.
O Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8069, de 13 de julho de 1990) revogou expressamente o antigo Código de Menores e representa um marco divisório extraordinário no trato da questão da Infância e da Juventude no Brasil. O texto constitucional, contemplado no art. 227 da Constituição Federal de 1988, que se antecipou à Convenção das Nações Unidas, na época em fase de discussão, introduziu no Brasil a Doutrina da Proteção Integral, trazendo uma completa transformação no tratamento legal da matéria em todos os aspectos.
Adotou-se a Doutrina da Proteção Integral em detrimento dos princípios da Doutrina da Situação Irregular. Operou-se uma mudança de referenciais e paradigmas na ação da política nacional, com reflexos diretos em todas as áreas, especialmente no plano do trato da questão infracional.
Houve, a partir de então, um rompimento com os procedimentos anteriores, com a introdução no sistema dos conceitos jurídicos de criança e adolescente, em prejuízo da antiga terminologia menor. Esta servia para conceituar aqueles em situação irregular. Com a Lei 8069/1990 ? Estatuto da Criança e do Adolescente foi introduzido no Brasil, em nível infraconstitucional, a Doutrina da Proteção Integral.
A Convenção Sobre os Direitos da Criança, publicada em 20 de novembro de 1989, adotada na Assembléia-Geral das Nações Unidas, considera criança a pessoa até dezoito anos de idade incompletos. Porém o Estatuto da Criança e do Adolescente, "... distinguiu criança de adolescente, considerando a primeira até doze anos de idade incompletos e, o segundo, de doze anos completos a dezoito anos de idade incompletos". (ECA, art. 2º)
O Estatuto da Criança e do Adolescente, fundamentado na Doutrina da Proteção Integral, define como criança a pessoa até doze anos incompletos e adolescentes aquela entre doze e dezoito anos incompletos, cidadãos sujeitos de direitos e em condição peculiar de desenvolvimento.
É preconizado que:

É dever da família, da comunidade, de sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária. Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende: a) primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias; b) precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública; c) preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas; d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude. (ECA, art. IV).

Neste contexto, os mínimos sociais, em sua totalidade geralmente não se efetivam, proporcionando aos adolescentes cometerem atos infracionais, "que é a conduta descrita como crime ou contravenção penal" (ECA, art.103).
Após a ocorrência destes atos, de acordo com o ECA, insere-se medidas e ações socioeducativas, sendo direcionamentos que proporcione ao adolescente a reparação de seus atos, exemplificando: "A advertência consistirá em admoestação verbal, que será reduzida a termo e assinada", (ECA, art. 115), e quanto: "em se tratando de ato inflacional com reflexos patrimoniais, a autoridade poderá determinar, se for o caso, que o adolescente restitua a coisa, promova o ressarcimento do dano, ou, por outra forma, compense o prejuízo da vítima".(ECA, art. 116).
Quando é... "Verificada a prática de ato inflacional, a autoridade competente poderá aplicar ao adolescente as seguintes medidas: I ? advertência; II - obrigação de reparar o dano; III - prestação de serviços à comunidade; IV - liberdade assistida". (ECA, art. 112).
Ainda, constam os parágrafos:

V - inserção em regime de semiliberdade; VI - internação em estabelecimento educacional; VII - qualquer uma das previstas no art. 101, I a VI. § 1º A medida aplicada ao adolescente levará em conta a sua capacidade de cumpri-la, as circunstâncias e a gravidade da infração. § 2º Em hipótese alguma e sob pretexto algum, será admitida a prestação de trabalho forçado. (ECA, art. 112).

Há medidas que direcionam os adolescentes para a "... internação [que] constitui medida privativa da liberdade, sujeita aos princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento", (ECA, art. 121). Em questão ao "... regime de semiliberdade pode ser determinado desde o início, ou como forma de transição para o meio aberto, possibilitada a realização de atividades externas, independentemente de autorização judicial". (ECA, art. 120)
Os objetivos específicos destas ações e medidas pautam-se em acompanhar, auxiliar e orientar o adolescente que cometeu o ato infracional e que tenha recebido, a partir do poder judiciário, uma medida socioeducativa. É proporcionada ao adolescente a oportunidade de compreender suas atitudes, incluindo-o na responsabilidade de seus atos, na medida do possível, para que eles não tenham uma posição passiva frente aos acontecimentos de sua vida.
As medidas socioeducativas conjuntam a proteção especial de média complexidade, que segundo a PNAS, devem ser desenvolvidas no Centro de Referência Especializado e Assistência Social - CREAS, no contexto das medidas em meio aberto, visando à orientação e o convívio sociofamiliar e comunitário. Difere-se da proteção básica por se tratar de atendimento a indivíduos e famílias que estão em violações de direitos sociais e pessoais, portanto, uma grande arma de defesa dos direitos da infância e da juventude.
Com a implantação da Política Nacional de Assistência Social, as diretrizes de sanção a infração se baseia na "Proteção Social Especial de média complexidade considerado serviços de média complexidade aqueles que oferecem atendimentos às famílias e indivíduos com seus direitos violados, mas cujo vínculo familiar e comunitário não foi rompido". (PNAS-2004)
Conforme a PNAS:

São serviços que requerem acompanhamento individual, e maior flexibilidade nas soluções protetivas. Da mesma forma, comportam encaminhamentos monitorados, apoios e processos que assegurem qualidade na atenção projetiva e efetividade na reinserção almejada. Os serviços de proteção especial têm estreita interface com o sistema de garantia de direitos exigindo, muitas vezes, uma gestão mais complexa e compartilhada com o Poder Judiciário, Ministério Público e outros órgãos e ações do Executivo (PNAS, 2004, p. 31)

As diretrizes da lei que norteiam e garante a proteção assegurada através da família, comunidade e estado são o SINASE e ECA, que instrumentalizam as intervenções, oriundo de congressos, seminários e conferências organizadas por instituições do terceiro setor, sociedade civil e profissional da área, que em seu contexto objetiva obter a democratização e efetivação da cidadania para os adolescentes.
Segundo o SINASE:

Em fevereiro de 2004 a Secretaria Especial dos Direitos Humanos (SEDUH), por meio da Subsecretaria Especial de Promoção dos Direitos da criança e do Adolescente (SPDCA), em conjunto com o Conanda e com o apoio do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), sistematizaram e organizaram a proposta do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo ? SINASE. Em novembro do mesmo ano promoveram um amplo diálogo nacional com aproximadamente 160 atores do SGD, que durante três dias discutiram, aprofundaram e contribuíram de forma imperativa na construção deste documento (SINASE), que se constituirá como um guia na implementação das medidas socioeducativas. A implementação do SINASE objetiva primordialmente o desenvolvimento de uma ação socioeducativa sustentada nos princípios dos direitos humanos. Persegue, ainda, a idéia dos alinhamentos conceitual, estratégico e operacional, estruturado, principalmente, em bases éticas e Pedagógicas.(SINASE, 2006, p. 15)

O SINASE, tendo o respaldo do ECA, implementa e norteia as ações que são direcionadas, respaldando aos profissionais que monitoram o cumprimento das medidas socioeducativas quanto a conduta ética de suas ações.
De acordo com o SINASE:

O SINASE é o conjunto ordenado de princípios, regras e critérios, de caráter jurídico, político, pedagógico, financeiro e administrativo, que envolve desde o processo de apuração de ato infracional até a execução de medidas socioeducativas. Este sistema nacional inclui os sistemas estaduais, distrital e municipais, bem como todas as políticas, planos, e programas específicos de atenção a esse público. (SINASE, 2006, p. 23)

Cabe ressaltar que os adolescentes são indivíduos de direitos, que postula e direciona-os como agentes que podem protagonizar as suas próprias historias, e na efetivação destes direitos, que em sua totalidade proporciona o acesso a reflexão de sua singularidade, o SINASE é o elo proporcionador destas ações.
A interligação da tríade comunidade, governo e acompanhamento direcionado pela intervenção profissional de profissionais Assistentes Sociais, somados as políticas publicas que visam o protagonismo juvenil, são ações que vislumbram minimizar os conflitos decorrentes dos atos infracionais cometidos pelos adolescentes.
Conforme SINASE:

Observar rigorosamente o devido processo legal para o adolescente acusado da prática de ato infracional significa elevá-lo efetivamente à posição de sujeito de direitos. Nesse sentido, não pode haver outras considerações que não a defesa intransigente do direito de liberdade do adolescente no processo judicial de apuração de sua responsabilidade. O devido processo legal abarca, entre outros direitos e garantias, aqueles a seguir arrolados: fundamentação de toda e qualquer decisão realizada no curso do processo, entre elas a própria sentença que aplica uma medida socioeducativa, que deve se pautar em provas robustas de autoria e materialidade; presunção de inocência; direito ao contraditório ( direito à acareação, juiz natural imparcial e igualdade de condições no processo); ampla defesa; direito ao silêncio; direito de não produzir provas contra si mesmo; defesa técnica por advogado em todas as fases, desde a apresentação ao Ministério Público; informação sobre seus direitos; identificação dos responsáveis pela sua apreensão; direito de ser ouvido pessoalmente pela autoridade competente; direito de ser acompanhado pelos pais ou responsáveis; assistência judiciária gratuita e duplo grau de jurisdição.(SINASE, 2006, p. 28)

Neste contexto, marginá-los seria a saída mais fácil para indivíduos que estão em transformação psicológica e social, em uma fase que os transforma de crianças para adultos. As medidas socioeducativas buscam nortear caminhos que vislumbrem a reflexão e quebra de paradigmas.
De acordo com o SINASE:

O adolescente deve ser alvo de um conjunto de ações socioeducativas que contribua na sua formação, de modo que venha a ser um cidadão autônomo e solidário, capaz de se relacionar melhor consigo mesmo, com os outros e com tudo que integra a sua circunstancia e sem reincidir na prática de atos infracionais. Ele deve desenvolver a capacidade de tomar decisões fundamentais, com critérios para avalias situações relacionadas ao interesse próprio e ao bem comum, aprendendo com a experiência acumulada individual e social, potencializando sua competência pessoal, relacional, cognitiva e produtiva. (SINASE, 2006, p. 51)

Ressalva-se, numa perceptiva Social, que a autoria de atos infracionais, está na intensificação das políticas neoliberais, que conduziram ao agravamento das desigualdades sociais e territoriais, ao desemprego juvenil. Inclui-se também aos elevados níveis de pobreza e exclusão social, devido aos baixos salários e à degradação das prestações sociais, somados a fragilização de serviços públicos e o efeito da precarização do trabalho sobre a vida das famílias e a educação de crianças e adolescentes.
Segundo Volpi:
Os adolescentes em conflito com a lei, embora sejam componentes de mesmo quadro supracitado, não encontram eco para a defesa dos seus direitos, pois, pela condição de terem praticado um ato infracional, são desqualificados enquanto adolescentes. A segurança é entendida como a fórmula mágica de "proteger a sociedade (entenda-se, as pessoas e o seu patrimônio) da violência produzida por desajustados sociais que precisam ser afastados do convívio social, recuperados e reincluídos". É difícil para o senso comum, juntar a idéia de segurança e cidadania. Reconhecer no agressor um cidadão parece ser um exercício difícil e, para alguns, inapropriado. VOLPI, (1997, p. 9)

A partir destas definições, para que ocorra a delinqüência juvenil, alguns fatores determinantes são considerados, tais como: condições socioeconômicas familiares, miséria, fome, analfabetismo, insuficiência de renda familiar, falta de interação entre pais e filhos, a existência de parentes com problemas psicopatológicos, a defasagem escolar e principalmente a ausência de políticas públicas que proporcione o adolescente a busca de construir outros valores.
Segundo Barbetta:

Por essas razões sugere-se que o tema do adolescente infrator seja considerado na sua relação específica com o sistema de justiça. Isto é, a transgressão da lei é que define e limita a atuação da justiça nesta área. As demais problemáticas que afetam os adolescentes e jovens são objetos da atuação do Estado mediante o conjunto das políticas públicas. (BARBETTA, 1997, p.16)

Após a ocorrência de delinqüência juvenil, a repressão, a segregação, a violência com o autor de ato infracional estão longe de serem instrumentos eficazes de combate à marginalidade. Neste sentido, requer maior estruturação técnico-operacional e atenção especializada, individualizada, acompanhamento sistemático e monitorado. O exemplo desses serviços destaca-se o serviço de orientação e apoio sociofamiliar; plantão social; serviço de habilitação e reabilitação na comunidade, medidas socioeducativas em meio-aberto como a PSC e LA.
Segundo Barbetta:

A aplicação de medidas socioeducativas não pode acontecer isolada do contexto social, político e econômico em que está envolvido o adolescente. Antes de tudo é preciso que o Estado organize políticas públicas para assegurar, com prioridade absoluta, os direitos infanto-juvenis. Somente com os direitos à convivência familiar e comunitária, à saúde, à educação, à cultura, esporte e lazer, e demais direitos universalizados, será possível diminuir significativamente a prática de atos infracionais cometidos por adolescente.( BARBETTA,1997, p. 42)


Dentre as suas ações, a Liberdade Assistida e da Prestação de Serviços à Comunidade, são realizados atendimentos em grupos de adolescentes que moram na mesma região, favorecendo uma melhor interação desses com outros adolescentes de sua comunidade e que estejam em situação semelhante. Desenvolvendo individualmente e em grupo, um novo projeto de vida em sociedade, para que ocorra a ruptura com a prática de atos infracionais.
Segundo Barbetta:

Entendemos que a prestação de serviço à comunidade será cada vez mais efetiva na medida em que houver o adequado acompanhamento do adolescente pelo órgão executor, o apoio da entidade que o recebe, e a utilização real da dimensão social do trabalho realizado. (BARBETTA, 1997, p. 24).


A Prestação de Serviços à Comunidade, está estabelecida no Art. 117 do ECA. Essa medida é aplicada pelo juiz quando o adolescente ou o jovem que comete atos infracionais considerados leves, tais como: lesão corporal, pequenos furtos, depredação ao patrimônio privado ou público, desacato a autoridade, entre outros.
Sua execução, entre várias ações, exemplifica-se: oferta aos adolescentes desenvolver atividades em escolas, na secretaria ou limpeza; nas repartições públicas; e no SENAI fazem cursos profissionalizantes, em horários contrários ao escolar; em caso de educando que estudam; e participam de oficinas pedagógicas.
Outra medida aplicada pelo Juiz é a Liberdade Assistida, estabelecida no ECA:

A liberdade assistida será adotada sempre que se afigurar a medida mais adequada para o fim de acompanhar, auxiliar e orientar o adolescente. § 1º A autoridade designará pessoa capacitada para acompanhar o caso, a qual poderá ser recomendada por entidade ou programa de atendimento. § 2º A liberdade assistida será fixada pelo prazo mínimo de seis meses, podendo a qualquer tempo ser prorrogada, revogada ou substituída por outra medida, ouvida o orientador, o Ministério Público e o defensor. (ECA, art.118)

A Liberdade Assistida é aplicada aos adolescentes e jovens que cometem atos infracionais mais graves, tais como: porte de armas, tráfico de drogas, tentativa de homicídio entre outros. A duração desta medida contempla no mínimo o período mínimo de 6 meses, e não há tempo máximo estipulado para sua execução, contudo, dependendo da situação, pode ser prorrogado até que o jovem complete vinte e um anos.
Como ideologia do SINASE, os adolescentes e jovens em cumprimento de medidas socioeducativas, reúnem-se mensalmente, com o objetivo de ampliar informações, bem como possibilitar troca de experiências. Essa atividade também é estendida às famílias.
De acordo com o SINASE:

A participação da família, da comunidade e das organizações da sociedade civil voltadas a defesa dos direitos da criança e do adolescente na ação socioeducativa é fundamentada para a construção dos objetivos da medida aplicada ao adolescente. As práticas sociais devem oferecer condições reais, por meio de ações e atividades programáticas à participação ativa e qualitativa da família no processo socioeducativo, possibilitando o fortalecimento dos vínculos e a inclusão dos adolescentes no ambiente familiar e comunitário dos adolescentes para que em conjunto ? programa de atendimento, adolescente, e familiares- possam encontrar respostas e soluções mais aproximadas de suas reais necessidades. (SINASE, 2006, p. 55)


È preciso avaliar as questões externas e internas que resultam em atos infracionais. Os adolescentes não nascem atores de atos infracionais, essa é uma identidade que é construída por influências do meio social em que vivem, e após sua ocorrência, o caminho são as medidas socioeducativas como alternativa de quebrar paradigmas.

2.2 A atuação do Serviço Social no contexto das medidas sócio educativas.
Com a implantação da PNAS, o Serviço Social intervém no cumprimento de medidas socioeducativas embasado pela "Proteção Social Especial de média complexidade considerado serviços de média complexidade aqueles que oferecem atendimentos às famílias e indivíduos com seus direitos violados, mas cujo vínculo familiar e comunitário não foi rompido". (PNAS-2004)
Conforme a PNAS:

"São serviços que requerem acompanhamento individual, e maior flexibilidade nas soluções protetivas. Da mesma forma, comportam encaminhamentos monitorados, apoios e processos que assegurem qualidade na atenção projetiva e efetividade na reinserção almejada. Os serviços de proteção especial têm estreita interface com o sistema de garantia de direitos exigindo, muitas vezes, uma gestão mais complexa e compartilhada com o Poder Judiciário, Ministério Público e outros órgãos e ações do Executivo". (PNAS, 2004, p.31)

A atuação se baseia no atendimento e visita às famílias e principalmente aos adolescentes, a fim de conhecer a realidade social de cada situação e com o objetivo de implicar a quebra de paradigmas, sensibilizando-os para a construção de novos valores. No processo do cumprimento, proporcionando ao adolescente a oportunidade de curso profissionalizante visando sua inserção no mercado de trabalho.
O profissional de Serviço Social também incentiva os adoslecentes no retorno à escola, conforme orienta o ECA:

Incube ao orientador, com o apoio e a supervisão da autoridade competente, a realização dos seguintes encargos, entre outros: I - promover socialmente o adolescente e sua família, fornecendo-lhes orientação e inserindo-os, se necessário, em programa oficial ou comunitário de auxílio e assistência social; II - supervisionar a freqüência e o aproveitamento escolar do adolescente, promovendo, inclusive, sua matrícula; III - diligenciar no sentido da profissionalização do adolescente e de sua inserção no mercado de trabalho; IV - apresentar relatório do caso. (ECA, art. 119)

Na instituição APAC, lócus do estágio supervisionado, o trabalho realizado com os adolescentes são direcionados pelos orientadores, profissionais, que compõem uma equipe multidisciplinar, e focando a atuação do Serviço Social, cabem as seguintes atribuições: receber o adolescente encaminhado do ministério público; fazer o cadastramento do adolescente na entidade; definir a entidade em que ele prestará o serviço; estabelecer os critérios necessários para a realização dos serviços, observando a localização quanto às tarefas, locais, horários da instituição.
A equipe multidisciplinar, junto ao Assistente Social avaliam a aptidão do adolescente; encaminha-o para o cumprimento da medida; local e horário para que as tarefas tenham condições de cumprimento da medida; acompanha o trabalho desenvolvido e a freqüência escolar; define calendário de reuniões de acompanhamento das famílias e adolescentes , encaminha relatório da situação do adolescente ao Juiz e o desempenho da entidade ao Ministério Público.
Observou-se que em relação à instrumentalidade, que todos os dados referentes aos adolescentes (sexo, idade, escolaridade, região onde mora, ato infracional, reincidência, situação de cumprimento) e seus familiares (composição familiar, número de pessoas na casa, quem trabalha, tipo de contrato, renda familiar, entre outros).
Há ainda, a elaboração do plano de trabalho plurianual pela equipe multidisciplinar e planejamentos estratégicos para a realização de atividades com os adolescentes e suas famílias.
Para os estagiários, conclui-se que os dados passaram a ser um instrumento essencial na orientação da atuação. Através deles, foi possível conhecer a realidade social dos adolescentes e todo o contexto que envolve os atos infracionais. As ações, funções e instrumentais do Serviço Social, em sua plenitude, facilitaram o diagnostico social levantado na instituição.
Ressalva-se que, o Assistente Social, por meio da realização do estudo social, é o profissional capaz de elaborar investigação-diagnóstica, laudos sociais, perícias, relatórios e acompanhamento de processos da Vara da Infância e Juventude bem como diagnosticar a realidade social da família e sua problemática com vistas à intervenção.

3 - Diagnóstico social

3.1 ? Breve Apresentação da cidade de Birigui.

Numa analise de contexto, a cidade de Birigui, SP, que segundo os dados da resolução n° 6, do IBGE de 03 de novembro de 2010, tem uma população de 108.479 habitantes, tendo como índice de crescimento demográfico ao ano de 1,80%, sendo considerado acima da média nacional.
Ainda, segundo o IBGE, Birigui é uma cidade de grande porte. O setor de indústrias de transformação é composto por pequenas e médias empresas, num total de 1.005 unidades, abrangendo as áreas de calçados, confecções, móveis, metalurgia, embalagens e outras. Este setor emprega 20.871 trabalhadores. Quanto ao APL (Arranjo Produtivo Local), da indústria de calçados infantis, há 45 empresas participantes, recebendo apoio técnico, financeiro e logístico, com o objetivo de cooperação entre os elos da cadeia produtiva.
A cidade compreende vários bairros, e em um deles, no território do bairro Quemil, existe um complexo de instituições denominado "Vivendo e Aprendendo". Em uma das instituições, desenvolve-se o Projeto Construindo Autonomia, da APAC.
Há também o CRAS, uma creche com capacidade para 130 crianças de 4 meses até 4 anos, e o IPIS -Instituto de Promoção e Inclusão Social, originalmente vinculado à APAC, que atende cerca de 100 crianças de 6-12 anos. Possui uma Escola Municipal que atende crianças até a 4ª série E.F. e o Centro Estadual de Educação Tecnológica Paula Souza que contempla o ensino de nível técnico.
O bairro onde acontece o Projeto, bem como seu entorno, possui um número significativo de famílias em situação de vulnerabilidade social, motivo pelo qual foi instalado o primeiro CRAS do município, que atende atualmente 1200 famílias. Postos de Saúde e Escolas de nível médio são acessíveis apenas nos bairros circunvizinhos. Também inexistem áreas específicas para exercício de lazer, cultura ou esporte.

3.2 ? Atuação da Instituição APAC

A APAC foi fundada em 1998, a instituição atualmente atende 85 jovens, que cometeram atos infracionais, sendo que 32 cumprem medida de Prestação de Serviços a Comunidade e 53 adolescentes cumprem a medida de Liberdade Assistida.
Para a execução do diagnóstico social, na instituição, foi aplicado pesquisa por amostragem, estruturada. A coleta de dados aconteceu numa reunião mensal com famílias, sendo aplicado 19 questionários, no dia 31 de março de 2010, das 18:00 hs as 19:00 hs.
Os responsáveis pela aplicação das pesquisas foram os alunos: Eliel Robson Lemes Ribeiro, Flavia Regina Rodrigues Arroyo e Graziele Alves dos Santos, da Universidade Anhanguera ? Uniderp, sob a Supervisão da Assistente Social da Instituição, e Supervisão Acadêmica da Professora local.
Observou-se, nos números coletados na pesquisa, que apresenta em maior proporção nos bairros com maior vulnerabilidade social, lócus proporcionador das condições favoráveis a influenciar os adolescentes a cometerem atos ilícitos. Os bairros Quemil, João Crevelaro e Jardim do Trevo, que apresentaram 11% de concentração de moradia dos usuários possuem infraestrutura urbana precária, e principalmente não proporciona a acessibilidade. Há ausência de politicas publicas, e de forma explicita as múltiplas expressões da questão social. (ver apêndices, gráfico 1).
No que diz respeito ao grau de parentesco com os adolescentes autores de atos infracionais, percebeu-se que a porcentagem de mais de 63% é superior aos pais.
Quanto à renda familiar, 74% do universo pesquisado ganha de 1 a 2 salários mínimos, sendo que, de 1 a 3 pessoas possuem vínculo empregatício. Outros 21% estão desempregados, não possuindo renda alguma. (ver apêndices, figuras 3, 4 e 5).
Acredita-se que criar mecanismos para intervenção no fortalecimento e reconstrução dos laços familiares, efetivar o acesso aos mínimos sociais, promovendo o protagonismo juvenil, será o desafio para que se atinja uma sociedade mais justa, mais igualitária e que possam de fato efetivar os direitos dos cidadãos.

4 - Análise dos resultados do projeto de intervenção

Com o objetivo de proporcionar aos adolescentes a reflexão sobre a questão familiar enquanto a base de construção das relações familiares, objetivando fortalecer seus vínculos, foi desenvolvido na APAC, pelos estagiários de Serviço Social da Universidade Anhanguera - Uniderp, com a supervisão da Assistente Social, um projeto de intervenção. A parceria efetivada para a realização deste projeto foi a própria instituição.
Inicialmente foi proporcionado aos adolescentes e suas respectivas famílias, encontro de socialização, que foi realizado na própria instituição, tendo como responsáveis os acadêmicos, orientados pela supervisora de campo.
As famílias foram acolhidas pela Assistente Social da Instituição e os acadêmicos, em seguida ministrada uma palestra com a temática família, sensibilizando-os da sua importância. A execução do projeto foi de 4 horas, no sábado, dia 29 de novembro de 2010.
Posteriormente, os acadêmicos aplicaram o questionário avaliativo, para que possa medir o impacto da ação, com as seguintes perguntas: Qual a satisfação em participar deste projeto? Você participaria de outro projeto aqui na instituição APAC?
Das 19 famílias que participaram do projeto, 16 totalizando 84%, se sentiram satisfeitas em participar da ação. Ainda, 19 famílias, totalizando 100%. Outras 10 famílias, totalizando 52%, demostram tem interesse em participar de outros projetos desta modalidade na instituição.
Os impactos sociais deste projeto ficou inviável mensurar, uma vez que os adolescentes assistidos pela instituição são rotativos, caracterizando que as medidas socioeducativas possuem duração consideradas curtas. Após concluir a pesquisa, novos adolescentes foram encaminhados pelo Ministério Público diferentes daqueles que participaram do projeto.
Acredita-se que ações voltadas à família, fortalecendo os vínculos, efetivar a cidadania, e atuar de forma comprometida com o público alvo mencionado, é o caminho para que minimize os conflitos sociais e construa oportunidades concretas para que os adolescentes possam ser cidadãos de direitos.

5 - Considerações Finais

Quando há a prática de atos infracionais, a partir do senso comum, os adolescentes são meramente bandidos, trombadinhas e que devem ser presos. Em sua especificidade, são condutas equivocadas e ineficientes. Este fator esta ligado a vários outros fatores, como a falta de compromisso ético e vontade política para tomar as decisões corretas e implementá-las com zelo e constância de propósito em minimizar as problemáticas da questão social.
Para compreender as inúmeras particularidades que englobam os atos infracionais devem ser analisadas as regras impostas de um sistema capitalista excludente, mercantilista, societário e massacrante. Em suas diretrizes inviabiliza o acesso aos mínimos sociais, e somados a ausência de proteção familiar, vícios, exploração e injustiças, propicia à ocorrência dos atos infracionais, fruto da desorganização social que se cronificam em infrações circunstanciais.
O sistema capitalista, classista, autocêntrico, machista e excludente, incorpora ao ato infracional o preconceito, julgando os adolescentes e impondo-lhes punições severas, como separá-los da sociedade e interná-los na fundação CASA. Não se leva em consideração os bastidores da questão social e todo o seu complexo cenário da realidade vivenciada por estes indivíduos.
Para os estagiários, a escolha pela profissão de Serviço social e a realização do estágio, frente à delinquência juvenil, deve-se pelo fato que a temática envolve uma analise de conjuntura diversificada do senso comum.
Sua atuação deve acontecer de forma crítica e comprometida com o protagonismo juvenil, com a realização de direitos e com a ampliação da cidadania. A prática do fazer profissional deve estar embasada como numa atuação que combata todas as formas de violação de direitos, discriminação e subalternidade aos adolescentes.
Conclui-se que os assistentes sociais, orientadores de medidas socioeducativas, devem direcionar sua intervenção a efetivação da dignidade juvenil, e consolidação dos direitos sociais.

6 - Referências

BARBETTA, Alfredo. A implementação das medidas socioeducativas previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente in VOLP, Mário (org) O Adolescente e o Ato Infracional. 2 ed. São Paulo: Cortez, 1997.

BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente (1990). Estatuto da Criança e do Adolescente: Lei n. 8.069, de 13 de Julho de 1990, e Legislação Correlata. 151p. (Série fontes de referência. Legislação; n.71)

BRASIL. Regulamentação da profissão de assistente social. Lei nº 8662. Congresso federal, 1993

BRASIL. Secretaria Especial dos Direitos Humanos - Sistema Nacional de atendimento Socioeducativo ? SINASE. Brasília,2006.

BRASÍLIA. Política Nacional de Assistência Social. Brasilia, 2004.

COSTA, Elaine A.C. et al. O projeto ético-politico profissional do serviço social no cotidiano do trabalho dos assistentes sociais. 2003. 106 f. Monografia (Bacharelado em Serviço Social) ? Faculdades Integradas "Antonio Eufrásio de Toledo", presidente prudente, 2003.

MORAES, Bismael B. Fatores de crime, estatística e espaço prisional. São Paulo:Nova Época, s.d.

PRESIDENTE PRUDENTE. Folheto Informativo Projeto Alerta. Familia, Escola,Comunidade, Futuro, Cidadania, Responsabilidade. Prefeitura Municipal de Assistência Social de Presidente Prudente, SP

ROMERA, Valdêres M. Anotação de aula de oficina de formação profissional II. Faculdades Integrada Antônio Eufrásio de Toledo. Presidente Prudente,2008.

VOLPI, Mário (org). O Adolescente e o Ato Infracional. 2.ed. São Paulo: Cortez, 1997.

VOLPI, Mário (org). Adolescente Privados de Liberdade. A normativa Nacional e
Internacional e Reflexões a cerca da responsabilidade penal. 2.ed. São Paulo: Cortez, 1997.

www.ibge.gov.br/cidadesat/topwindow.htm


7 - Glossário

LA ? Liberdade Assistida.
PSC ? Prestação de Serviços à Comunidade.
ECA ? Estatuto da Criança e do Adolescente.
APAC ? Associação de Promoção de Assistência Comunitária.