ATIVISMO JUDICIAL E INTERPRETAÇÃO JURÍDICA[1] 

Larissa Rodrigues de Amorim Reis[2]

Manoela Amorim Reis[3] 

Sumário: Introdução; 1. Ativismo Judicial e a Sociedade Aberta; 2. A Efetividade e Eficácia da Constituição Brasileira; 3. Ativismo Judicial; Considerações Finais; Referências. 

RESUMO 

O presente trabalho tem por objetivo abordar a questão acerca do ativismo judicial, que denota uma busca sedenta da sociedade por justiça, onde esta não se contenta mais com respostas pontuais. Nesse diapasão, busca-se refletir acerca das ações desse novo judiciário que buscar dar respostas aos questionamentos sociais, na tentativa de suprir as lacunas deixadas pelo poder executivo e pelo poder executivo. 

Palavras-Chave: Ativismo Judicial; Constituição Federal; Sociedade Aberta.

INTRODUÇÃO

O direito constitucional brasileiro sofreu grandes transformações no início do século XXI, além do estudo teórico abriu-se espaço para o estudo da prática, atribuindo-se grande importância ao entendimento emanado do Superior Tribunal Federal, mas até do que ao entendimento doutrinário. Atualmente, vê-se toda uma mobilização da sociedade brasileira a espera da manifestação do STF em relação a algum tema importante que impactará na vida de todos os brasileiros, seja na área de políticas públicas, seja na manifestação de um entendimento de ordem política. A voz do STF é sempre esperada como um farol que norteará as demais decisões do judiciário.

Essa sede de justiça manifestada pela sociedade é fruto da carência de uma justiça efetiva, acessível à todos. Com o passar do tempo, a sociedade ficou mais exigente, não se contentando mais com a inércia da jurisdição e clamando por um judiciário mais ativo, que dê a essa sociedade respostas, através de uma justiça mais célere, eficaz e acima de tudo, mais justa. Essa evolução ocorrida na sociedade, fez com que o judiciário respondesse através do ativismo judicial.

Surge então um novo judiciário, onde este busca suprir as lacunas deixadas pelos Poderes Legislativo e Executivo na elaboração e implementação de Políticas Públicas, numa tentativa de dar respostas à sociedade na velocidade almejada, de maneira eficaz. Esse ativismo judicial traz em seu bojo uma maior concretude do Estado Democrático de Direito, bem como de seus direitos e garantias fundamentais.

Como acontece em todo o processo de mudança, aqui não foi diferente, vieram as críticas ao ativismo judicial, sendo a principal delas a que se refere a politização do judiciário. Os críticos do ativismo judicial afirma que esta postura é uma violação à democracia. Porém, o presente trabalho tem por objetivo analisar se o papel do ativismo judicial é benéfico ou maléfico quando busca suprir estas lacunas oriundas da omissão ou da ineficiência do Estado.

  

  1. 1.      ATIVISMO JUDICIAL E A SOCIEDADE ABERTA

 

O termo sociedade aberta dos intérpretes da Constituição foi trazido por Peter Haberle com o intuito de instituir uma nova hermenêutica constitucional (Barroso, 2009). Nesse contexto, a Constituição pode ser interpretada não pelo juiz, o legislador ou o Estado, mas por todos os cidadãos enquanto partícipes dos processos judiciais. O sujeito que elabora um pedido constitucional ou ainda, quando a aplica em seu dia a dia, é um intérprete da Constituição. Assim, a sociedade aberta enquanto intérprete da Constituição é um catalizador do processo democrático. Surge então, o ativismo judicial, pois ao ser solicitado por qualquer um do povo, o judiciário deve responder pro ativamente para a solução do conflito.

Na verdade, o intérprete da Constituição busca a sua efetividade e assim, afasta a teoria da dificuldade contra majoritária, que se fundamenta no debate onde os órgãos e agentes públicos que não foram eleitos pelo povo afastam as leis elaboradas pelos representantes destes eleitos pela vontade popular. Nesse diapasão, percebe-se a a democracia não se resume a um governo de maioria, pois os direitos das minorias devem ser respeitados, exigindo dessa forma, um papel mais atuante do judiciário.

A função do judiciário deve ser de guardião da democracia, apoiando a sociedade aberta dos intérpretes da Constituição, concretizando os valores constitucionais através do ativismo judicial. Percebe-se portanto, que o objetivo do ativismo judicial é o fortalecimento da democracia e não o contrário.

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  1. 2.      A EFETIVIDADE E EFICÁCIA DA CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA

 

A partir do Século XX iniciou-se uma revolução nas normas constitucionais brasileira, onde os princípios constitucionais se transformaram em comandos de normatização, tendo o ser humano como ponto central de todo o ordenamento jurídico e por conseguinte, tem-se como foco de estudo além da sua eficácia, os direitos e garantias fundamentais.

Tratando-se de ativismo judicial, o magistrado busca nos princípios constitucionais de acesso à justiça e inafastabilidade de jurisdição os meios para garantir a eficácia de sua decisão, igualmente pautadas na norma constitucional.

Apesar de não se poder negar a existência da judicialização de questões políticas, fica claro que não se trata de criação de um modelo (estático) de hegemonia do Poder Judiciário na tomada de decisões. Porém, é inegável que a sociedade brasileira têm levado ao Supremo Tribunal Federal questões importantes que os outros Poderes (Executivo e Legislativo) não resolveram ou não querem resolver. Diante dessas situações, o STF surge como última alternativa para resolução desses conflitos sociais, respondendo sempre que provocado.

  1. 3.      ATIVISMO JUDICIAL

 

O ativismo judicial nasceu da pro-atividade do judiciário em situações de omissão do Poder Legislativo, como forma de concretizar os direitos e garantias fundamentais assegurados na Constituição Federal. Segundo Luís Roberto Barroso em artigo publicado no site da OAB:

“A ideia de ativismo judicial está associada a uma participação mais ampla e intensa do Judiciário na concretização dos valores e fins constitucionais, com maior interferência no espaço de atuação dos outros dois Poderes. (...) A postura ativista se manifesta por meio de diferentes condutas, que incluem: (i) a aplicação direta da Constituição a situações não expressamente contempladas em seu texto e independentemente de manifestação do legislador ordinário; (ii) a declaração de inconstitucionalidade de atos normativos emanados do legislador, com base em critérios menos rígidos que os de patente e ostensiva violação da Constituição; (iii) a imposição de condutas ou de abstenções ao Poder Público, notadamente em matéria de políticas públicas. ”

Um dos exemplos mais corriqueiros do ativismo judicial são os pedidos que chegam ao judiciário de remédios e de tratamentos de saúde, que em sua grande maioria, o juiz obriga o Poder Público a dar a medicação e ou, custear o tratamento. Essa conduta do judiciário pode ser traduzida como ativismo judicial, na medida em que busca garantir o direito à vida, à saúde, à dignidade, etc. de todos os cidadãos que a ele recorrer.

Em vários julgados, o STF decidiu que não pode contrapor o princípio da reserva do possível ao princípio da dignidade da pessoa humana, à vida, à saúde. Pois se assim o fizesse, seria ele responsável por um grave retrocesso social. Optando dessa forma, por uma conduta proativa, de forma a garantir a efetivação do que determina a Constituição Federal. Dessa forma, desde que não ocorra um justo motivo, não pode o Estado alegar a cláusula da reserva legal para se eximir do cumprimento de suas obrigações constitucionais.

Nesse contexto de ativismo judicial, muitas críticas surgem em função da conduta proativa do judiciário. A principal crítica julga que esse tipo de conduta pelo judiciário é uma ameaça à democracia, já que seus membros não foram eleitos pelo povo e portanto, não o representam. Segundo seus críticos, quando o judiciário por exemplo, à decisão do Presidente da república, viola-se a legitimidade democrática, pois o Presidente foi eleito pelo povo e dessa forma, representa a sua vontade. Porém, olvidam os críticos que a legitimidade do judiciário advém da própria Constituição e ao aplicarem o que determina tal instrumento, na verdade está concretizando a vontade da maioria expressa na Carta Magna, pelo Poder Constituinte. Portanto, pode-se afirmar que o ativismo judicial é um importante instrumento para efetivação da democracia.

Outra crítica frequente ao ativismo judicial é a que afirma que este se preocupa em efetivar uma micro justiça em detrimento da macro justiça, almejada por todos os brasileiros. Porém, em função do princípio de inafastabilidade do judiciário, tem o condão de decidir e efetivar a justiça no caso concreto, através da aplicação das normas constitucionais, não havendo nenhum problema em dar aquilo que se pede, ou seja, em realizar a micro justiça.

Conforme ensina Antoine Garapon:

A irrupção do ativismo jurídico só poderá ser compreendida se relacionada a um movimento profundo, do qual ele é apenas uma das manifestações. Não se trata de uma transferência de soberania para o juiz, mas sobretudo uma transformação da democracia. A grande popularidade dos juízes está diretamente ligada ao fato de que foram confrontados com uma nova expectativa política, da qual se sagraram como heróis, e que encarnaram uma nova  maneira de conceber a democracia.[4] 

Assim, os juízes e tribunais são vistos hoje como guardiões dos Direitos Fundamentais e do Princípio da Dignidade humana, configurando-se como uma nova maneira de perceber a democracia.                                          

CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

Percebe-se que o ativismo judicial veio para solucionar o problema da inércia legislativa e tal tema traz em seu bojo questões relativas à omissão do Poder legislativo, de interpretação e efetividade da norma constitucional que tratam dos direitos e garantias fundamentais. Segundo seus críticos, o ativismo judicial traz problemas de legitimidade democrática, de politização da justiça e assegura que falta ao judiciário capacidade institucional para decidir acerca de determinadas matérias. Porém, se houver um sopesamento sério, pode-se perceber que o ativismo judicial traz em si muito mais benefício do que malefícios para a democracia brasileira.

Na verdade o ativismo judicial não objetiva intervir na função legislativa ou executiva do Estado, mas precisa agir quando há flagrante violação constitucional por qualquer um dos poderes. Refutadas todas as críticas postas ao ativismo judicial, em especial a que recai sobre a violação da separação dos poderes, perceber-se que tal ativismo, ao contrário, consubstancia-se num importante instrumento de efetividade da democracia e concretização das determinações constitucionais, quando aliada a tese da sociedade aberta.

Assim, qualquer cidadão que recorrer ao judiciário para ser atendido em seu pedido que está garantido na Constituição Federal, será considerado seu intérprete. E o judiciário por sua vez, terá que responder eficientemente, numa postura ativa. Os poderes Legislativo e Executivo são também representantes da democracia, mas o judiciário atuará sempre que solicitado para suprir as lacunas deixadas pelos primeiros no atendimento à população.

Entende-se que o ativismo judicial acontece tanto quando ele se dá por meio de qualquer juiz ou quando ele se dá por meio do STF, não se confundindo, no entanto seus papéis. Fica claro, que o Poder judiciário não tem por função formular e implementar políticas públicas. Porém, excepcionalmente, quando os órgãos estatais competentes em descumprimento dos seus encargos políticos-jurídicos de forma a comprometer a integridade dos direitos individuais e ou coletivos garantidos na Carta Magna, poderá o judiciário, através do ativismo judicial intervir e decidir, como forma de efetivação da democracia e dos direitos e garantias constitucionais.

A figura do juiz não é mais tida como simples aplicador da lei, mas como um instrumento que por intermédio da Constituição concretiza os direitos através de suas decisões. Diante do exposto, hoje o Juiz/Tribunal deve interpretar de forma construtiva e criativa as normas Constitucionais para aplicação de suas decisões. Nesse contexto, o Judiciário passou a desempenhar um papel de destaque frente à realidade social contemporânea.  Alguns autores afirmam que a mera aplicação do direito torna a criá-lo automaticamente, por meio da interpretação e da Hermenêutica Constitucional adequada.

É inquestionável que o Ativismo Judicial se apresenta como um grande poder nas mãos dos juízes que inquestionavelmente, segundo Ronald Dworkin: “[...] “criam novo direito” toda vez que decidem um caso importante. Anunciam uma regra, um princípio, uma ressalva a uma disposição [...] o Direito é a nossa instituição social mais estruturada e reveladora.”[5] A atividade jurisdicional se concretiza através da Jurisdição Constitucional, que lhes atribui o poder de controle de constitucionalidade.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

 

BARROSO, Luís Roberto. Judicialização, Ativismo Judicial e Legitimidade Democrática. Disponível em:

http://www.oab.org.br/oabeditora/users/revista/1235066670174218181901.pdf  Acesso em: 19/05/2013

BARROSO, Luís Roberto. Curso de direito Constitucional Contemporâneo .2009. São

Paulo: Saraiva , 2009 

DWORKIN, Ronald. O Império do Direito. 1ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 1999. P. 09-15

GARAPON, Antoine. O juiz e a democracia. O guardiao das promessas. Tradução: Maria Luiza de Carvalho. 2ª ed. Rio de Janeiro: Revan, 2001. P.39



[1] Estudo realizado sobre o tema Ativismo Judicial

[2] Aluna do curso de Direito da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco

[3] Aluna do curso de Direito da Universidade Mackenzie

[4] GARAPON, Antoine. O juiz e a democracia. O guardiao das promessas. Tradução: Maria Luiza de Carvalho. 2ª ed. Rio de Janeiro: Revan, 2001. P.39

[5] DWORKIN, Ronald. O Império do Direito. 1ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 1999. P. 09-15