INSTITUTO LUTERANO DE ENSINO SUPERIOR DE ITUMBIARA – ILES/ULBRA

CURSO DE DIREITO

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

VÍTOR FERREIRA DE ANDRADE

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

ASSUNÇÃO DE DÍVIDA

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Itumbiara, dezembro de 2011.

ASSUNÇÃO DE DÍVIDA

 

1. Conceito

 

            A assunção de dívida ou cessão de débito, assim também denominada por parte da doutrina, é matéria tratada na parte especial do Novo Código Civil, de modo que o velho Código Civil de 1916 era omisso nessa matéria. Tal instituto é regulado pelo direito das obrigações, no Capítulo II do Título II nos artigos 299 a 303. É, portanto, uma forma de transmissão das obrigações onde há uma alteração subjetiva, substituindo-se a parte passiva da relação obrigacional.

            Pablo Stolze nos ensina que “a cessão de débito ou assunção de dívida consiste em um negócio jurídico por meio do qual o devedor, com o expresso consentimento do credor, transmite a um terceiro a sua obrigação. Cuida-se de uma transferência debitória, com mudança subjetiva na relação obrigacional” [1].

            Assim dispõe o art. 299 do Código Civil

Art. 299. É facultado a terceiro assumir a obrigação do devedor, com o consentimento expresso do credor, ficando exonerado o devedor primitivo, salvo se aquele, ao tempo da assunção, era insolvente e o credor o ignorava.

Parágrafo único. Qualquer das partes pode assinar prazo ao credor para que consinta na assunção da dívida, interpretando-se o seu silêncio como recusa.

            A primeira noção a ser enfocada é que a assunção não pode ocorrer sem a concordância do credor, pois o credor possui como garantia de adimplemento da obrigação o patrimônio do devedor. Deste modo, a pessoa do devedor é importante para o credor. Assim como o credor não é obrigado a receber coisa diversa do objeto da obrigação, ainda que mais valiosa, não está o credor obrigado a aceitar outro devedor, ainda que mais abastado, bastando dizer que o devedor mais afortunado patrimonialmente que assume a dívida de um terceiro pode não ter a mesma disponibilidade moral para pagar a dívida[2].

            Nesse sentido, é pacífica a jurisprudência do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, senão vejamos no julgamento do Agravo Regimental no Agravo de Instrumento nº 1290626/TO, que teve como relator o Ministro Luis Felipe Salomão:

AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. ASSUNÇÃO DE DÍVIDA. AUSÊNCIA DE ANUÊNCIA EXPRESSA DO CREDOR. ART. 299 CÓDIGO CIVIL. CIRCUNSTÂNCIA RECONHECIDA PELO TRIBUNAL ESTADUAL COM ANALISE DO ACERVO FÁTICO-PROBATÓRIO. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. 1. O Tribunal de origem, no exercício da análise soberana dos elementos fático-probatórios carreados aos autos, consignou não haver anuência expressa do credor quanto à assunção da dívida por terceiro, nos termos do exigido pelo art. 299 do Código Civil. 2. A revisão do entendimento das instâncias ordinárias demandaria reexame de prova, o que se revela defeso em sede de recurso especial ante a incidência da Súmula 7 desta Corte Superior. 3. Agravo regimental a que se nega provimento.

            A importância do consentimento do credor é de tamanha importância, que o silêncio é considerado como recusa, contrariando até mesmo a máxima cotidiana de que            “quem cala consente”. A lei não admite a exoneração do devedor se o terceiro (assuntor), a quem se transmitiu a obrigação, era insolvente e o credor ignorava.  Será também restabelecida a obrigação se a substituição do devedor vier a ser invalidada, restaurando-se o débito com todas as suas garantias, excetuando-se as garantias prestadas por terceiro[3].

 

2. Características e pressupostos

 

            A assunção de dívida possui natureza contratual; é um negócio jurídico bilateral, quer se faça somente entre credor e terceiro, quer se faça com a intervenção expressa do devedor primitivo. Quanto à forma do negócio jurídico, se exigir forma especial, assim deverá ser feito, caso contrário a forma é livre. Podem dela ser objeto dívidas presentes e futuras, admitindo-se também condição. Os possíveis vícios são os dos negócios jurídicos em geral. Trata-se de ato de aquisição e disposição, de tal forma que se deve analisar a capacidade das partes e a legitimação no caso concreto[4].

            Maria Helena Diniz aponte que são pressupostos da assunção: a) existência e validade da obrigação transferida; b) substituição do devedor sem alteração na substância do vínculo obrigacional; c) concordância expressa do credor e d) observância dos requisitos atinentes aos atos negociais, por ser esta a sua natureza jurídica[5].

Depreende-se das características acima, que o objeto da assunção de dívida deve incidir numa obrigação válida, podendo constituir-se sobre a dívida principal ou acessória, e ainda sobre dívidas submetidas a condição, a termo ou até mesmo dívidas vindouras.

 

3. Espécies

 

            A assunção de dívida pode ocorrer de dois modos. Uma delas ocorre por acordo entre o terceiro e o credor. Na falta de disposição legal, utiliza-se a nomenclatura utilizada na doutrina estrangeira. A chamada expromissão do Código italiano é a forma típica da assunção de dívida. Por ela um terceiro (expromitente) contrai perante o credor a obrigação de liquidar o débito, a ideia é de o terceiro assumir espontaneamente o débito de outra[6].

            A expromissão poderá ser: a) liberatória, se houver perfeita solução do débito, pela substituição do devedor na relação obrigacional pelo expromitente, ficando exonerado o devedor primitivo, exceto se o terceiro que assumiu a dívida era insolvente o credor ignorava. Poderá ainda ser, b) cumulativa, se o expromitente entrar na obrigação como novo devedor, ao lado do devedor primitivo, passando a ser devedor solidário, de forma que o credor poderá reclamar o pagamento a qualquer um deles[7].

A outra espécie trata da hipótese de delegação. Nesse caso a assunção ocorrerá por acordo entre o terceiro e o devedor, onde este transfere àquele sua posição de devedor, com a concordância do devedor. As partes podem se desejarem, continuar o devedor primitivo responsável pela dívida, ocorrendo uma assunção imperfeita ou de reforço, tratando-se da figura de um garante. A solidariedade somente existirá caso haja manifestação expressa[8].

 

4. Efeitos

 

            Maria Helena Diniz estabelece que a cessão de débito produz os seguintes efeitos:

1º) Liberação do devedor primitivo, com subsistência do vínculo obrigacional, salvo se o novo devedor, ao tempo da assunção era insolvente o e credor ignorava;

2º) Transferência do débito a terceiro, que se investirá na condicio debitoris;

3º) Cessação de privilégios e garantias pessoais do devedor primitivo, de modo que o novo devedor não terá direito de evocar as exceções pessoais do antigo sujeito passivo;

4º) Sobrevivência das garantias reais (penhor, hipoteca), prestadas pelo devedor originário, que acediam a dívida, com exceção das garantias especiais (aval, fiança) que foram constituídas, em atenção à pessoa do devedor, por terceiro alheio a relação obrigacional, a não ser que ele consinta na sua permanência;

5º) Anulação da substituição do devedor, acarretando a restauração da dívida, ou o retorno das partes ao statu quo ante, com todas as suas garantias, salvo as prestadas por terceiro, a não ser que ele tivesse ciência do vício que maculava a obrigação, pondo fim à assunção.

6º) Possibilidade de o adquirente de imóvel hipotecado tomar a seu cargo o pagamento de crédito garantido, se o credor notificado não impugnar em 30 dias a transferência do débito, entender-se-á dado o seu assentimento.

Para a perfeita concretização da assunção de dívida, são necessários os pressupostos de existência e validade de todos os negócios jurídicos, e ainda a existência e a validade da obrigação que será transmitida, além validade do contrato de transmissão, sem nunca nos esquecermos do consentimento do credor.

 

5. Assunção de dívida e institutos afins

 

Assunção de dívida guarda algumas semelhanças com outros institutos jurídicos, contudo não devem ser confundidos, devendo serem distinguidos para melhor entendimento de suas características e efeitos.

            A maior semelhança observada com cessão de débito é a promessa de liberação do devedor, que se configura quando uma pessoa (promitente) se obriga perante o devedor a desonerá-lo da obrigação, efetuando uma prestação em lugar dele. Porém, a no caso da promessa de liberação esta deve ser efetuada perante o devedor, não tendo o credor nenhum direito de exigir o seu cumprimento, enquanto na assunção de dívida a obrigação é contraída perante o credor que adquire o direito de exigir do assuntor a realização da prestação devida[9].

            A assunção de dívida também se aproxima bastante de uma das modalidades de novação, que é a novação subjetiva por substituição do devedor. Em ambas as situações ocorre a substituição do primitivo devedor por outra pessoa no dever de cumprir a prestação a que o credor tem direito. A distinção teórica entre os institutos consiste em que na novação subjetiva passiva a dívida anterior se extingue, para ser substituída pela subsequente; enquanto que na assunção de dívida é a mesma obrigação que subsiste, havendo mera alteração da pessoa do devedor. A conseqüência primordial resultante dessa distinção, é que na novação, desaparecendo a dívida anterior, perecem as garantias e acessórios do crédito assim novado[10].

            A figura jurídica do objeto do presente trabalho guarda acentuada afinidade com a fiança, pois tanto o fiador quanto o assuntor se obrigam perante o credor a realizar uma prestação devida a outrem. Contudo, se distinguem pelo fato de a fiança constituir, em regra, uma obrigação subsidiária, só respondendo este se o devedor não puder cumprir a prestação prometida, diferentemente do assuntor que não é obrigado subsidiário, mas sim o único obrigado, salvo no caso de assunção cumulativa, em que é um dos obrigados, lado a lado com o devedor primitivo, respondendo solidariamente[11].

            Por fim, são flagrantes as afinidades entre a assunção de dívida e as estipulações em favor de terceiro, tendo em vista que em ambas se pode estabelecer uma vantagem de ordem patrimonial para uma pessoa estranha à convenção entre as partes. Todavia, nas estipulações em favor de terceiro, o estipulante ou promissário cria a favor do terceiro beneficiário o direito a uma nova prestação, mediante obrigação contraída pelo promitente. O caso da assunção de dívida não é um benefício adquirido mediante a atribuição de um direito novo a uma prestação, mas sim resulta imediatamente de sua exoneração da dívida[12].

 

6. Referências Bibliográficas

 

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. vol. 02. 26. ed. São Paulo: Saraiva, 2011.

 

 

GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil. vol. 02. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2004.

 

 

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. vol. 02. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2011.

 

 

VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: teoria geral das obrigações e teoria geral dos contratos. vol. 02. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2004.



[1] GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil. vol. 02. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 272.

[2] VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: teoria geral das obrigações e teoria geral dos contratos. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2004. p. 350-351.

[3] GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil. vol. 02. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 273.

[4] VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: teoria geral das obrigações e teoria geral dos contratos. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2004. p. 353.

[5] DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. vol. 02. 26. ed. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 491-492.

[6] VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: teoria geral das obrigações e teoria geral dos contratos. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2004. p. 353.

[7] DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. vol. 02. 26. ed. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 491-493.

[8] Op. cit. 2004. p. 354.

[9] GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. vol. 02. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 231.

[10] GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. vol. 02. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 232.

[11] Ibidem, p. 232-233.

[12] Ibidem, p. 233-234.