ASSÉDIO MORAL: Analise criminológica do bullying no ambiente de trabalho[1].

                                        Luana Christian de Araújo Muniz[2]

                                        Cleopas Isaias Santos[3]

Sumário: Introdução; 1 Características do bullying no ambiente de trabalho; 2 Caracterização dos sujeitos; 2.1 Vítima/assediado; 2.2 Assediador; 3 Consequência e prevenção do assédio moral; Conclusão; Referencias; Anexos.

 

RESUMO

Em uma sociedade capitalista que visa o lucro acima de tudo, é de fundamental importância abordar uma violência tão pouco conhecida como o bullying no trabalho, também conhecido como assédio moral. Ainda, buscará verificar as consequências do assédio moral no ambiente de trabalho, tanto para a empresa e para o indivíduo, quanto para os sujeitos envolvidos. O presente trabalho foi escolhido em face da sua importância, não só para relações trabalhistas, mas também para o mundo jurídico e buscará analisar o fenômeno do assédio moral.

PALAVRAS-CHAVE:

Assédio moral, Bullying, Workplacebullying, Mobbing.

INTRODUÇÃO:

                    A maioria dos indivíduos passa a maior parte de suas vidas no trabalho sendo, portanto, obrigados a dividir espaço e conviver com pessoas diversas. Sendo assim, o meio de trabalho deve ser o melhor possível, a fim de proporcionar boas relações entre os funcionários e o bom funcionamento das empresas. Nesse contexto, o trabalhador, além de suportar toda a pressão física e psicológica do modelo liberal, ainda esta sujeito a sofrer assédio moral. Essa violência, relativamente recente, tem se acentuado em sociedades capitalistas, objetivando aumentar a produtividade por meio do medo oriundo do bullying no trabalho. Nas últimas décadas, a situação se agravou por conta do sistema de produção adotado, que busca maior lucro possível, em detrimento do trabalho. Ora, apesar de ser um problema identificado relativamente recente, existe desde as primeiras relações de trabalho, trazendo consigo inúmeras conseqüências para a sociedade, devendo, portanto, ser considerado maléfico para a sociedade e os indivíduos, uma vez que é extremamente prejudicial para os indivíduos e, também para a própria economia da sociedade na qual se apresenta.

1 Características do bullying no ambiente de trabalho

                 O bullying no trabalho está presente em todos os países e em quase todas as relações de emprego, porém, o assunto é pouco abordado, e muitas vezes não é tratado porque é considerado irrelevante ou mesmo inofensivo. O fenômeno vem se intensificando nos últimos anos por conta da modificação nas relações de trabalho e da expansão do modelo capitalista de produção, sendo possível perceber um aumento significativo de ocorrências do fenômeno. Isso se reflete no campo jurídico, com a criação de um maior número de leis e discussões existentes na atualidade.

               O bullying é uma realidade mais comum do que podemos imaginar, e sempre existiu, mas não era estudada, sendo que, quando acontecia, a vítima sofria calada e quando não aguentava, pedia mudança de setor ou se demitia (CALHAU, 2011, p. 12). Todos achavam isso comum e, muitas vezes, colocavam a ‘culpa’ do bullying nas vítimas assediadas.

               Há varias outras denominações para o assédio moral no ambiente de trabalho, como por exemplo, workplacebullying, mobbing, bullying no ambiente de trabalho etc., entretanto, independentemente das diversas denominações existentes, a essência do assédio moral é abuso de poder reiteradamente, e é justamente essa repetição de condutas abusivas que gera a violência. O assédio moral pode ocorrer em três sentidos: horizontal, vertical ascendente e vertical descendente.

O bullying no sentido horizontal se dá entre trabalhadores do mesmo nível hierárquico; no sentido vertical descendente, ocorre quando o assediado ocupa um nível hierárquico superior em face de um empregado (assediado) que ocupa um cargo menos importante; Por último, no sentido vertical ascendente, no qual o assediador é um funcionário menos graduado que o assediado, é consequentemente mais raro de acontecer (CALHAU, 2011, p. 105).

                   Tal violência pode ser a expressão, de forma segmentada de uma violência maior fundamentada numa sociedade que “vê na economia a resposta a todos os seus problemas e em uma organização do trabalho cada vez mais sem compromisso com o ser humano, pois sua formula mágica é enfocada na garantia de ganhos de produtividade crescentes no curto prazo” (CALHAU, 2011, p.102). Dessa maneira, o assédio moral constitui uma realidade alarmante na qual o trabalhador, por medo de perder o emprego, acaba por ter sua dignidade ameaçada e sua integridade física e psíquica diminuida. Ainda, haja vista que não só o assediado é prejudicado, mas também os demais funcionários da empresa, mesmo que indiretamente, tais empresas que toleram a prática do bullying internamente, acabam sendo imensamente prejudicas.

              Segundo Maria Aparecida Alkimin (2008), os elementos que caracterizam o assédio moral são: comportamentos atentatórios aos direitos de personalidade praticados por um ou mais assediador (es), que pode ser o empregador/qualquer superior hierárquico ou colega de serviço/subordinado em relação ao superior hierárquico, contra a vítima/assediado, que pode ser um empregado ou superior hierárquico, de maneira reiterada e sistematizada.

2 Caracterização dos sujeitos

2.1 Vítima/assediado

                 Consoante João Sérgio de Castro Tarcitano e Cerise Dias Guimarães (2004, p.27-28), o assediado apresenta o perfil psicológico de uma pessoa com vitalidade plena, e que teme a desaprovação das outras pessoas, tendo tendência a se culpar e, que geralmente, anseia a admiração dos outros oferecendo ajuda. O assediado, ao contrário do que muitos imaginam, não é um empregado negligente ou mesmo preguiçoso, geralmente são empregados com grande potencial e senso de responsabilidade. Ora, é possível perceber com base nisso, que a vítima é escolhida pelo assediador exatamente por ser capacitada, por ter um diferencial.

                 Podem ser vítimas do assédio moral quaisquer funcionários, como por exemplo, representantes sindicais, membros da Comissão Interna de Prevenção de Acidentes, estagiários, workaholics (viciados em trabalho), ascensoristas, vigilantes, escriturários, digitadores etc.(CALHAU, 2011, p. 103). Cabe ressaltar que todos os indivíduos envolvidos na prática do bullying no trabalho, inclusive o assediador, são vítimas dessa violência, sendo afetados em níveis diferentes.

2.2 Assediador

             O sujeito ativo do assédio moral pode ser um ou mais indivíduos. De acordo com João Sérgio de Castro Tarcitano e Cerise Dias Guimarães (2004, p.24-26), é possível caracterizar o assediador moral como uma pessoa perversa e que se utiliza de mecanismos igualmente perversos para se “defender”, possuindo uma personalidade narcisista que ataca a autoestima do outro, transferindo-lhe a dor e as contradições que não admite em si mesmo.

            O assediador sente necessidade de ser admirado, ou em alguns casos, de ocultar sua incompetência. Muitas vezes prejudica alguém considerado fraco ou mais capacitado apenas para causar medo e consequentemente obediência, tanto na vítima como dos outros funcionários da empresa, que dessa forma, acabam se tornando vítimas indiretamente.

3 Consequência e prevenção do assédio moral

           O fenômeno do bullying, ao contrário do que se possa imaginar, em geral, traz consequências prejudiciais para todos os envolvidos, não só para a vítima, apesar de ser a que mais sofre com essa prática. Dentre as inúmeras consequências oriundas de tal conduta degradante, o estresse é a principal e traz consigo, a diminuição da resistência imunológica, acarretando inúmeras enfermidades físicas e psíquicas, sendo que, dependendo da gravidade do caso, a vítima pode agredir violentamente outras pessoas e até mesmo cometer suicídio. De acordo com Lélio Braga (2011, p. 14), o bullying no ambiente de trabalho extremamente competitivo, afeta o andamento normal da empresa, prejudicando não só a vítima, mas também a própria organização interna da empresa. Além disso, é possível que essas empresas percam bons funcionários por conta da prática do assédio moral.

            As consequências dessa experiência na vida do assediado, tem reflexo na personalidade do trabalhador, prejudicando a sua qualidade de vida e, consequentemente, gerando transtornos sociais. Conforme João Sérgio de Castro Tarcitano e Cerise Dias Guimarães (2004, p.6), se, por um lado, a prática do assédio moral fortalece as grandes empresas que viram seu lucro aumentarem, por outro desvalorizam o trabalho, relegando os trabalhadores a um segundo plano. Dessa maneira, o homem passa a ser apenas um “meio” para se atingir determinado fim econômico: o homem deixa de ser o fim ultimo e passa a ser uma mera peça na nova ordem econômica mundial, o capitalismo.

            O assédio moral, como exposto anteriormente, apesar de está fortemente presente em nossa sociedade, é comumente ignorado e banalizado, por insensibilidade ou até mesmo por desconhecimento do fenômeno. Contudo, é um ato extremamente prejudicial para a vítima e para o ambiente de trabalho, uma vez que, causa uma diminuição significativa da produtividade da empresa. Consoante Deggerone (2009, p. 11) há empresas que usam seus funcionários para cometerem o assédio moral, pois o que importa para este é cumprir a meta global e aumentar a produtividade, o que na realidade não acontece.

               Ora, é fundamental ressaltar que, de acordo com João Sérgio de Castro Tarcitano e Cerise Dias Guimarães (2004, p.10-11), devido à variedade de perfis que o fenômeno apresenta, torna-se difícil formar um conceito jurídico, entretanto, há elementos que a doutrina e a jurisprudência consensualmente consideram como caracterizadores do assédio moral, dentre eles estão:

 a) a intensidade da violência psicológica, uma vez que, ela deve ser grave na concepção objetiva de uma pessoal normal; b) o prolongamento no tempo, a conduta deve ser reiterada e capaz de produzir o objetivo; c) a intenção de ocasionar um dano psíquico e/ou moral ao empregado para marginalizá-lo no seu ambiente de trabalho; d) a conversão, em patologia, que pressupõe diagnóstico clínico, dos danos psíquicos.

          A respeito da necessidade da existência do dano psíquico para que haja a caracterização do assédio moral como uma conduta ilícita, a meu ver, é desnecessária, uma vez que, a simples prática de atos visando prejudicar um trabalhador, já deve ser considerada, desde sua gênese, como ofensivo e danoso, independentemente do dano psíquico causado. Além disso, a existência ou não de tal resultado, depende única e exclusivamente da resistência psíquico-física do assediado e, se forem desconsideradas as condutas que não geram danos psíquicos relevantes, em decorrência da resistência da vítima, muitos assediadores não receberão a devida punição.

           O assédio moral pode ser causado por vários fatores, mas os principais são o indivíduo e o ambiente externo que o cerca. O individuo que causa o fenômeno age de maneira cruel, espelhando perfeitamente aquilo que já dizia o famoso filósofo inglês Hobbes, o homem é lobo do próprio homem, ou como dizia Rousseau, a sociedade o corrompe. Tais afirmativas ilustram bem tal fenômeno, que vem se intensificando em todas as sociedades, com o neoliberalismo, com o capitalismo exacerbado, que visa o aumento da produtividade e do lucro, em detrimento do trabalhador, que se torna vítima do processo de produção e escravo do trabalho.

           Esses abusos acabam trazendo efeitos contrários, ao invés de aumentar a produtividade, esses trabalhadores vítimas do assédio moral, produzem menos e frequentemente adoecem por conta do sofrimento emocional. Busca-se aumenta a produção e disciplina por meio do assédio moral, e dessa maneira, atender primeiramente às necessidades do mercado econômico, mesmo que isso signifique prejudicar os trabalhadores.  

           Ora, para haver um ambiente de trabalho sadio, é necessário que as relações trabalhistas nele inserido também sejam. Consequentemente, segundo Deggerone (2004) é essencial que os empregados exercem suas funções de maneira harmônica e permaneçam unidos, a fim de manter a qualidade do ambiente de trabalho. Assim, a produtividade aumentaria naturalmente e os empregados não seriam prejudicados no processo produtivo. Isso, todavia, não acontece quando os empregados são tratados como objetos pelas empresas, o que consequentemente, prejudica a empresa, que terá que arcar com os custos em geral, e para o funcionário assediado, que se torna improdutivo, doente fisicamente e psicologicamente (TARCITANO; GUIMARÃES, 2004, p. 27-33).

                   Dessa forma, o empregador sofre com a queda na produtividade da empresa e na qualidade do serviço prestado, com a menor eficiência, além de outros custos tangíveis oriundos da pratica do assédio moral, como por exemplo, o custo de reparação por danos morais e as despesas para a seleção e treinamento de novos funcionários, sem falar da perda de funcionários valiosos e qualificados e, da reputação da empresa perante a sociedade.

                Para prevenir de forma eficaz o assédio moral, é importante que as empresas promovam a comunicação e a organização interna, proporcionando a realização sadia do trabalho e punição para os que violarem essa condição. O assédio moral dissemina-se tanto mais quanto mais desorganizada /desestruturada for a empresa, ou ainda, quando o empregador finge não vê-lo, tolera-o e/ou mesmo o encoraja (TARCITANO; GUIMARÃES, 2004, p.40). Além disso, é preciso aumentar a divulgação de informações relacionadas ao assédio moral e seus prejuízos, bem como criar espaços onde os assediados possam denunciar a violência sofrida, e para que haja a efetiva punição.

CONCLUSÃO

           Diante do exposto, conclui-se que apesar de não haver uma lei específica tratando do assédio moral, este é tão antigo quanto às relações trabalhistas, sendo que as vítimas de tal violência têm direito a indenização. Ainda, faz-se necessário uma legislação que trate expressamente do assédio moral, a fim de despertar o interesse dos aplicadores do direito e da sociedade, e dessa maneira, prevenir a prática desse crime, considerado muitas vezes irrelevante.

         Cabe ressaltar que, além disso, é fundamental que haja conscientização das várias consequentes provenientes do assédio moral, bem como dos diversos prejuízos para todos os envolvidos na prática do assédio moral. Prejuízos estes gravíssimos, tais como violação da dignidade do trabalhador, diminuição da produtividade para a empresa, e para a sociedade, o alto custo para o Poder Público, por exemplo, os elevados gastos com a previdência social e com empregados precocemente aposentados por incapacidade, consequência do bullying no ambiente de trabalho.

REFERENCIAS

ALKIMIN, Maria Aparecida. Assédio moral na relação de trabalho. 2 ed. Curitiba: Juruá, 2008.

 

CALHAU, Lélio Braga. Bullying: o que você precisa saber: identificação, prevenção e repressão. 3ª ed. Niterói, Rio de Janeiro: Impetus, 2011.

 

DEGGERONE, Jacir. Assédio moral no ambiente de trabalho. 2009. Disponível em: <http://www.unibrasil.com.br/arquivos/direito/20092/jacir-deggerone.pdf> Acesso em: 10/04/2012

 

SILVA, Marco Aurélio Lopes Ferreira da. Assédio moral nas relações trabalhistas sob a ótica civil-trabalhista-constitucional. Campos dos Goitacases. 2007. Disponível em: < http://fdc.br/Arquivos/Mestrado/Dissertacoes/Integra/MarcoAurelioLopes.pdf> Acesso em: 10/04/2012

 

TARCITANO, João Sérgio de Castro; GUIMARÃES, Cerise Dias. Assédio moral no ambiente de trabalho. Juiz de Fora. 2004. Disponível em: <http://www.assediomoral.org/IMG/pdf/assedio_moral_no_trabalho_no_ambiente_de_trabalho.pdf> Acesso em: 10/04/2012

 



[1] Paper apresentado à disciplina de Criminologia, da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco – UNDB.

[2] Aluna do 2º período do Curso de Direito, da UNDB.

[3] Professor Mestre, orientador.