ASPECTOS SOCIAIS E PEDAGÓGICOS DO FILME VEM DANÇAR

A idéia central da trama gira em torno de um grupo de alunos problemáticos que são negligenciados e desprezados pelos professores e a direção da escola, que desconhecem e desacreditam no potencial de cada um deles. Estes mesmos alunos são colocados em uma sala isolada após o horário regular das aulas, chamada de "detenção", todos os dias, com a finalidade de passarem mais tempo na escola, mesmo que na ociosidade.

Ocorre que isso não contribui em nada para uma melhoria de comportamento, pois sequer são orientados a executar alguma tarefa ou atividade durante esse tempo, pois para os professores desta escola, o importante é deixar esses alunos na detenção.

Tal ação da escola mostra-se tão inadequada e ineficaz que os alunos apresentam comportamento agressivo e desrespeitoso, a ponto de um deles em acesso de raiva da diretora, destruir parte do carro dela que estava estacionado na rua. Isso mostra que a falta de uma ação realmente educadora e disciplinadora por parte da escola para com os alunos tidos como problemáticos, pode ocasionar cidadãos marginalizados e inerentemente ligados ao crime.

Um ponto importante na história, já considerado inclusive como um clichê pelos cineastas, pois sempre houve e há um ou outro filme com essa temática, é a transformação final dos alunos-problema em alunos disciplinados e com perspectivas de futuro, causada por um professor que investe tempo, dedicação e esperança.

Inicialmente o professor é tratado com hostilidade, mas isso é compreensível, dadas as circunstâncias em que tais alunos estavam frequentemente envolvidos e eram tratados pela direção e pelos demais professores. Mas, diante da insistência e da paciência dia após dia, mesmo com alguns contratempos e a dificuldade de trabalho em equipe, o professor Pierre Dulaine consegue cativar e adquirir o respeito dos alunos, fazendo-os acreditar que apenas eles mesmos é que são responsáveis por mudar a sua vida e que antes de esperar que alguém acredite neles, é preciso que cada um acredite em si primeiro.

A forma com que o mestre conduziu a situação foi à chave do sucesso de sua empreitada em prol da mudança de comportamento da turma. E é isso que talvez falte hoje em dia nas nossas escolas. Porque é muito fácil criticar o governo, os alunos problemáticos, a falta disso, a falta daquilo e esquecer que, quem escolhe ser professor, escolhe porque no mínimo, identifica-se com o personagem vivido por Antônio Banderas, ou seja, acredita que pode fazer a diferença e contribuir para uma sociedade melhor. Mas infelizmente, a grande maioria dos profissionais dessa categoria age como os outros professores que vimos no filme, criticando os alunos difíceis, afastando-os de um convívio com os demais, fugindo a sua responsabilidade social com esses indivíduos, e pior, debochando daqueles que tentam fazer a diferença. Um professor concursado recém contratado percebe isso logo de início quando um ou outro mais antigo chega e lhe "joga um balde de água fria."

Assim como no filme, que apesar de ser uma obra de ficção, temos situações e realidades muito semelhantes, mas que podem ser transformadas com ações reais e não apenas teorias enfeitadas. Um professor pode sim fazer a diferença junto a seus alunos. Desconheço algum professor que seja carismático ou que chegue sempre junto de seus alunos, que não tenha conseguido bons resultados com eles, mesmo os mais problemáticos da classe. Uma sala de aula é como uma relação matrimonial; para que ambos, aluno e professor, tenham um bom relacionamento, é preciso dar e receber. É preciso compreender as necessidades do outro. Mas obviamente que o primeiro passo é do mestre, porque os alunos estão aprendendo...

Pergunto-me às vezes o que leva um professor que desiste de fazer a diferença somente porque encontrou uma turma ou uma realidade destoante daquela que imaginava. Questiono-me isso porque nas grandes empresas, por melhores que sejam, também existem problemas e situações difíceis. Além do mais, um professor lida geralmente com jovens e adolescentes que ainda estão assimilando e aprendendo sobre a vida, portanto, os erros que cometem, a bagunça que fazem e a falta de responsabilidade que tem, fazem parte do momento da vida que estão vivendo e cedo ou tarde vão amadurecer. Agora se pararmos para analisar, veremos que em grandes corporações existem profissionais que já são adultos, com caráter e personalidade formados, mas que também erram e muito, fazem bagunça, desrespeitam o colega de trabalho, além de problemáticas do dia a dia, e nada disso faz o bom profissional perder qualidade no seu trabalho. O trabalho de um professor não é pior ou tem mais problemáticas que qualquer outro trabalho.

No filme, vemos um profissional que de tão excelente, fazia a diferença, porque muito mais que ensinar dança, conseguia transmitir através dos passos, emoções e atitudes capazes de gerar uma real mudança de comportamento. Isso foi apresentado na cena onde ele é chamado a reunião de pais e mestres que está ocorrendo, para explicar o que está ensinado aos alunos, onde ele pega a diretora pelo braço e explica com passos da dança, que os mesmos favorecem a confiança e o respeito mútuo entre as pessoas.

Pois bem. Conclui-se do filme que, transformar ou provocar uma mudança em alunos, sejam eles problemáticos ou não, é algo possível, mas que requer um pouco mais do professor. A questão é: Os professores estão dispostos a dar um pouco mais de si? E não adianta falar em salário baixo, porque mesmo que o salário fosse alto, sempre teremos alunos problemas e por esse motivo, em algum momento, para o professor indiferente, o salário será tido como baixo novamente...

Esse filme tem um caráter social e pedagógico muito forte e é recomendado a alunos de licenciaturas e professores em início de carreira, mas também aqueles que já atuam na rede de ensino, a fim de reciclar os profissionais. Também é recomendado a jovens e adolescentes, pois mostra que quando uma relação aluno-professor é harmônica e respeitosa, ambos crescem.

Apesar do apelo dramático, da metade para o final, o filme torna-se dinâmico, chegando a um final com belíssimas imagens de dança que levam os espectadores a querer dançar. Faz jus ao título em português: Vem dançar!