ASPECTOS RELEVANTES DO DIREITO FINANCEIRO E DIREITO TRIBUTÁRIO E SUA RELAÇÃO COM A NATUREZA JURÍDICA DO SEGURO DPVAT


Sem a pretensão de muito adentrar no estudo do Direito Financeiro e Tributário, o capítulo que se inicia versará apenas sobre seus aspectos de maior relevo, de forma a permitir uma melhor contextualização da discussão sobre a natureza jurídica do Seguro Obrigatório de Veículos Automotores de Vias Terrestres, o DPVAT.
Tendo em vista algumas de suas peculiaridades, como o caráter de obrigatoriedade de pagamento por parte dos proprietários de veículos automotores de vias terrestres e o respeito ao Princípio da Anterioridade para a alteração de suas normas, a despeito da pouca doutrina que versa sobre o tema, persiste no meio jurídico uma grande indagação quanto ao fato de a natureza jurídica do DPVAT ser ou não tributária. Esta é a razão pela qual se faz tão importante a apresentação dos principais conceitos concernentes à matéria.
A relação entre o Direito Financeiro e o Tributário é bastante estreita, já que o primeiro tem por objeto, dentre outros, as receitas públicas, que compreendem as receitas tributárias.
Doravante, serão, portanto, apresentados os aspectos necessários à dissolução da controvérsia existente com relação ao que se crê seja a natureza jurídica do Seguro DPVAT.


1. Os ingressos e as receitas públicas


Conforme pontua Fabretti (2006, p. 4), o Estado exerce importante atividade financeira, com o precípuo fim de auferir a renda necessária à cobertura das despesas públicas. Para tanto, utiliza-se de diversos meios de arrecadação de dinheiro, através de formas variadas, que se podem caracterizar como ingressos ou receitas públicas.
O que diferencia os ingressos das receitas públicas é a destinação que se dá aos montantes arrecadados. Enquanto os ingressos constituem-se como os valores que não se direcionam aos cofres públicos, as receitas correspondem à importância monetária definitivamente encaminhada ao erário.
Baleeiro (1993, p. 116) exemplifica os ingressos como sendo os movimentos de fundos, ou simples entrada de caixa como as cauções, fianças e depósitos recolhidos ao Tesouro, e também os empréstimos contraídos pelos Estados e as somas que serão restituídas ao depositante ou pagas a terceiros.
Já as receitas públicas são os recursos que pertencem ao Estado e que têm por finalidade a cobertura de suas despesas. É toda entrada de dinheiro no orçamento de uma pessoa de direito público que acarreta um acréscimo patrimonial.
Segundo Torres (2007, p. 185), receita é a soma de dinheiro arrecadada pelo Estado para fazer frente aos gastos públicos.
São três as formas de receitas públicas: as patrimoniais, as tributárias e as creditícias e estas, por sua vez, podem ser classificadas como receitas originárias e derivadas, como receitas de direito privado e de direito público ou ainda como receitas patrimoniais e receitas tributárias. No presente trabalho, será adotada a classificação de Lobo Torres (2007, p. 186), que utiliza a ótica das receitas originárias e derivadas.


2. Receitas originárias


Receitas originárias são aquelas oriundas da exploração do patrimônio estatal, sendo também denominadas de patrimoniais, pois assim se constituem. Tais patrimônios (terras, casas, empresas, direitos) são administrados pelo Poder Público, a quem cabe, semelhantemente a um particular, explorar e administrar seus bens utilizando os meios disponíveis, a fim de se beneficiar de seus frutos, seja através de locação, da venda da produção de bens ou mesmo através de cessão do imóvel ou de seus respectivos direitos.
Para tanto, existe uma série de normas de direito privado, criadas para regular essas negociações.
As receitas originárias compreendem também os preços públicos, as compensações financeiras e os ingressos comerciais, a seguir explanados.


2.1. Preço Público


O preço público possui natureza contratual, estando, portanto, situado dentro do conceito de direito privado, não se subsumindo as normas de direito tributário.
Grande parte da doutrina utiliza o termo tarifa como sinônimo de preço público. Entretanto, alguns estudiosos discordam e tratam de diferenciar as duas denominações. Tal abordagem foi sugerida por Ichihara, (SÃO PAULO. Tribunal de Justiça de São Paulo. Apelação cível n. 510.473-5) que define tarifa como sendo o valor cobrado como remuneração de serviço prestado em regime de concessão ou de direito privado, tendo como base o equilíbrio econômico-financeiro; enquanto o preço público seria o valor fixado pelo Poder Público, como ocorre com o tabelamento de preços, no regime de direito privado.
Para Torres (2007, p. 188), preço público é o ingresso de caráter não-tributário devido ao Estado a título de contraprestação paga por um benefício.
Em outra esteira, Bastos (2002, p. 94) afirma que se trata de uma contraprestação contratualmente assumida, de forma voluntária, relativamente a um serviço ou a um produto.
Justamente por não ter de observar os princípios tributários, o preço público não possui caráter compulsório, havendo relativa flexibilização na fixação do seu valor, que normalmente é cobrado pelo concessionário ou permissionário de serviço público, mas que também pode ser cobrado diretamente pelo Estado.
Desta forma, somente diante da demanda voluntária do interessado para a aquisição de determinado bem ou serviço é que será devido o pagamento do preço público ou da tarifa correspondente.
Vale frisar que, em razão de sua natureza contratual, e diante das características que envolvem a relação obrigacional, aos referidos contratos são aplicáveis os preceitos do Código de Defesa do Consumidor, diferentemente do que ocorrem naqueles serviços que são remunerados por taxa, estes regidos pelo Código Tributário Nacional.


2.2. Compensação Financeira


A compensação financeira é um direito estabelecido no art. 20, § 1º, da Constituição Federal. Tal artigo assegura aos Estados, ao Distrito Federal, aos Municípios e ao órgão da administração direta da União, a participação no resultado ou a compensação financeira na exploração de petróleo ou gás natural, de recursos hídricos para fins de geração de energia elétrica e de outros recursos minerais no respectivo território, plataforma continental, mar territorial ou zona econômica exclusiva.
A natureza jurídica da compensação financeira é de indenização, pois ela é estipulada como uma contraprestação a ser paga em função das despesas que oneram o Poder Público com a extração dos recursos naturais localizados no território pertencente a determinado ente da federação.
A Lei nº. 7.990, de 28/12/89, disciplinou a compensação financeira e discorre sobre a forma de se estabelecer seu valor.


2.3. Ingressos Comerciais


Os ingressos comerciais consistem em uma forma de intervencionismo do Estado e são provenientes da exploração de monopólios, da manutenção de empresas estatais e da loteria concedida a terceiros.


3. Receitas derivadas


As receitas derivadas, que efetivamente interessam ao tema central deste trabalho, são aquelas exigidas compulsoriamente dos particulares, representadas pelos ingressos parafiscais, pelas multas e pelos tributos.
Os ingressos parafiscais provêm da solidariedade social, do interesse de grupos sociais, sendo destinados ao parafisco, ou seja, aos órgãos que não pertencem à administração do Estado, incumbidos de prestar serviços paralelos e não essenciais. A Constituição Federal de 1988 atribuiu a natureza de tributo a esses ingressos, que acabaram por desaparecer.
Já as multas constituem-se como uma sanção pecuniária por ato ilícito.
Conforme o entendimento de Bastos (2002, p. 88), os tributos compõem a principal forma de receita pública, sendo o imposto a sua modalidade mais importante para a atividade financeira do Estado.
Estando já pontuados os aspectos do Direito Financeiro no que concerne às receitas públicas, sua destinação com relação aos cofres públicos e à receita advinda dos tributos, cabe, doravante, a apresentação de alguns aspectos tributários que permitirão uma melhor análise acerca da natureza jurídica do Seguro DPVAT.


4. Princípios Tributários relevantes para o presente trabalho


Antes da apresentação do conceito de Direito Tributário, é importante abordar alguns princípios constitucionais que informam a matéria:


4.1. Princípio da Legalidade


O Princípio da Legalidade rege todo o sistema jurídico brasileiro e encontra-se insculpido no art. 5º, II, da Constituição Federal Brasileira1:
"Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
[...]
II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;
[...]"
Este princípio possui tal relevância para o Direito Tributário que é novamente iterado no art. 150, I, da Magna Carta, que versa a respeito das limitações ao poder de tributar:
Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
I - exigir "ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça;"

Em 1215, na Carta Magna da Inglaterra, o princípio ganhou destaque ao impor a necessidade de obtenção prévia de aprovação dos súditos para a cobrança de tributos.
Amaro (2006, p. 111-112) comenta que a legalidade tributária requer, além da autorização legal para a cobrança de tributos, a definição de todos os aspectos referentes ao fato gerador, para que se tenha uma eficaz quantificação do tributo devido em cada caso concreto.
É igualmente importante trazer a lição de Carrazza (2007, p. 245) que dispõe que nosso ordenamento jurídico é regido não apenas pelo Princípio da Legalidade Tributária, mas sim pelo da Estrita Legalidade, de forma que grande parte dos juristas vem se empenhando para que, salvo as exceções legais, todos os demais tributos somente sejam criados ou aumentados pela via da lei ordinária.
Por sua tamanha importância e relevância, o Princípio da Legalidade constitui-se como um verdadeiro alicerce aos demais princípios que norteiam o Direito Tributário, tais como o Princípio da Anterioridade, da Igualdade e da Capacidade Contributiva, que serão conceituados a seguir.


4.2. Princípio da Anterioridade


Consiste o princípio da anterioridade na vedação da cobrança de tributo instituído ou majorado no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que o instituiu ou aumentou, sendo estabelecido o prazo mínimo de 90 (noventa) dias entre a publicação da lei e a efetivação da cobrança.
Há, no entanto, determinados tributos, como os abaixo arrolados, que possuem regras distintas referentemente ao Princípio da Anterioridade:
a) Empréstimos Compulsórios, que atendem às despesas extraordinárias da União (podem ser cobrados no mesmo exercício fiscal e não respeitam o prazo nonagesimal);
b) Impostos de Importação e Exportação (podem ser cobrados no mesmo exercício fiscal e não respeitam o prazo nonagesimal);
c) Imposto sobre Produtos Industrializados ? IPI (pode ser cobrado no mesmo exercício fiscal);
d) Imposto sobre Operações Financeiras ? IOF (pode ser cobrado no mesmo exercício fiscal e não respeita o prazo nonagesimal);
e) Impostos Extraordinários em caso de guerra externa ou sua iminência (podem ser cobrados no mesmo exercício fiscal e não respeitam o prazo nonagesimal);
f) Contribuição Social para a Seguridade Social (podem ser cobrados no mesmo exercício fiscal).
Segundo Machado (1994, p. 29), o Princípio da Anterioridade visa a possibilitar o planejamento anual das atividades econômicas, com a segurança e certeza do ônus tributário a ser suportado.
Assim como o Princípio da Legalidade, o Princípio da Anterioridade garante aos contribuintes a segurança nas relações jurídicas, assegurando aos cidadãos o direito de ter prévio conhecimento das obrigações tributárias a assumir, provendo-se de meios hábeis de adequar seu orçamento ao custeio dos tributos que deverão honrar.


4.3. Princípio da Igualdade


O Princípio da Igualdade foi empregado como vetor central no texto da Constituição Federal (art. 5º, Caput), que estabelece a isonomia de todos perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, constituindo-se a igualdade como um dos princípios fundamentais da democracia.
Referido princípio é um dos pilares do Estado de Direito, balizando tanto o legislador quanto o aplicador da lei.
Além da isonomia estabelecida no Caput do art. 5º da Constituição Federal, o Constituinte também estabeleceu, no art. 150, II, a vedação com relação à instituição de tratamento desigual àqueles que se encontrem em situação equivalente.
Para Machado (1994, p. 30-31), as dificuldades atinentes ao Princípio da Isonomia surgem no momento em que o legislador deve verificar quais critérios deverá utilizar para o estabelecimento das hipóteses discriminatórias. Segundo o autor, a lei sempre discrimina, sendo crucial a análise de como se fará tal discriminação.
É no âmbito do Princípio da Igualdade que se desenrola a questão do tratamento a ser garantido aos contribuintes, levando-se em conta critérios de certa forma subjetivos. Trata-se de verdadeiro pilar do Direito Tributário.


4.4. Princípio da Capacidade Contributiva


O princípio em estudo trata do dever do legislador de observar e respeitar as diferenças econômicas que existem entre os contribuintes, quando da instituição ou majoração de determinado tributo.
Contrariamente à impressão que gera à primeira vista, o Princípio da Capacidade Contributiva visa a combater a desigualdade no tratamento entre os contribuintes, pois, conforme assevera Rui Barbosa:
A regra da igualdade não consiste senão em quinhoar desigualmente aos desiguais, na medida em que se desigualam. Nesta desigualdade social, proporcionada à desigualdade natural, é que se acha a verdadeira lei da igualdade. O mais são desvarios da inveja, do orgulho, ou da loucura. Tratar com desigualdade a iguais, ou a desiguais com igualdade, seria desigualdade flagrante, e não igualdade real. [...]2

Portanto, a capacidade contributiva do contribuinte deve ser respeitada com o fim de evitar a prática de confisco, bem como para adequar os valores a serem recolhidos, de acordo com a ótica das possibilidades de cada cidadão.


5. Conceito de tributo


Estando pré-estabelecidos os princípios que norteiam o Direito Tributário, convém definir o termo tributo, para o que se transcreve o art. 3º, do Código Tributário Nacional, com a seguinte redação:
"Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada." 3
Uma das principais características a serem extraídas do conceito legal, e que agregam valor ao presente trabalho, diz respeito à compulsoriedade, em função de que o contribuinte tem a obrigação de pagar o tributo instituído por lei.
A cobrança dos tributos é sempre realizada pelos agentes públicos que tiverem competência para efetuá-la, em estrita obediência aos ditames legais, sem qualquer margem de discricionariedade, devendo o pagamento ser efetuado em dinheiro, com raras exceções em prestação de coisas, mas jamais em prestação de serviços.
Em relação ao modo de pagamento do tributo, assevera Rosa Jr. (1998, p. 196) que o art. 3º do CTN é regra direcionada ao legislador, sendo corolariamente necessário que haja lei específica a autorizar o contribuinte a pagar tributo mediante a dação de um bem, devendo esta, ainda, especificar o tributo objeto da dação em pagamento; o tipo de bem que pode ser transferido para o Estado com a extinção do crédito tributário e o critério de apuração do valor do bem a ser dado em pagamento.
Há outra definição legal de tributo que se encontra na Lei 4.320/64, nos seguintes termos:
Tributo é a receita derivada, instituída pelas entidades de direito público, compreendendo os impostos, as taxas e contribuições, nos termos da Constituição e das leis vigentes em matéria financeira, destinando-se o seu produto ao custeio de atividades gerais ou específicas exercidas por essas entidades.4

A despeito de o dispositivo legal ter sido criado antes do Código Tributário Nacional, sua relevância é bastante grande, pois estatui explicitamente que o tributo é uma receita derivada, concedendo uma visão um pouco mais ampla de sua definição, principalmente sob a ótica financeira, que tanto interessa à temática central deste trabalho.
A definição de que trata este item (2.5) será de fundamental importância para os capítulos que se seguem, pois é o próprio conceito de tributo que traz os elementos essenciais para se distinguir a natureza jurídica de determinada cobrança exercida pelo Poder Público, discussão que se afigura como uma das maiores singularidades do Seguro DPVAT.


6. Espécies Tributárias


A classificação doutrinária dos tributos é tema de grande controvérsia, de onde surgem várias correntes que pretendem arrolar as espécies tributárias.
A discussão travada se deve, dentre outros aspectos, pela interpretação literal que poderia ser atribuída ao art. 145 da Constituição Federal, in verbis:5
"A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos:
I - impostos;
II - taxas, em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição;
III - contribuição de melhoria, decorrente de obras públicas."
Pode-se afirmar que o artigo, lido isoladamente, sugere uma compreensão de que os tributos seriam apenas aqueles arrolados de forma taxativa, o que também está em conformidade com o art. 5º do Código Tributário Nacional, que os divide em impostos, taxas e contribuições de melhoria.
No entanto, em um posterior capítulo da Carta Política, são mencionados, nos artigos 148 e 149, respectivamente, os empréstimos compulsórios e as contribuições sociais de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas.
A corrente majoritária, que segue uma sistemática análise da Constituição Federal, assim como o Supremo Tribunal Federal, entendem ser cinco as espécies tributárias, quais sejam: impostos, taxas, contribuição de melhoria, empréstimo compulsório e contribuições especiais.
Essa classificação qüinqüipartite, que incluiu o empréstimo compulsório e as contribuições especiais, acabou por derrogar o artigo 5º do Código Tributário Nacional, que reconhecia apenas três espécies tributárias.
A já mencionada controvérsia que paira sobre o tema tem por expoentes os seguintes doutrinadores:
Geraldo Ataliba (XXXX, p. 123) adota a classificação bipartida, de tributos vinculados e não-vinculados a uma atuação estatal. Para o Jurista, os tributos vinculados seriam ou uma taxa ou uma contribuição, de acordo com a hipótese de incidência do tributo focada na atuação estatal. Os tributos não vinculados, ou seja, os impostos constituem-se quando a hipótese de incidência for um fato qualquer que não configure atuação estatal.
A bipartição também é defendida por Alfredo Augusto Becker (2007, p. 404), que define imposto e taxa a se distinguirem pelas respectivas bases de cálculo, sendo a dos impostos um fato lícito qualquer e a das taxas um serviço ou coisa estatal.
Por outro lado, a classificação tripartite é sustentada por Paulo de Barros Carvalho (2007, p. 35), que assim reconhece o imposto, a taxa e a contribuição de melhoria, afirmando que o empréstimo compulsório pode assumir qualquer dessas configurações e alocando as contribuições como impostos ou taxas, dependendo do caso concreto.
Outra classificação adotada pela doutrina é a quadripartite, que tem como um de seus seguidores o doutrinador Luciano Amaro (2006, p. XXX), que divide os tributos em impostos, empréstimos compulsórios, taxas e contribuições, sendo que as duas últimas admitiriam variadas subdivisões.
A mesma repartição em quatro espécies é feita por Lobo Torres (2003, p. 335), que, no entanto, segue a divisão da CF, entendendo que o tributo compreende o imposto, a taxa, a contribuição e o empréstimo compulsório.
Finalmente, representando a doutrina majoritária, há os adeptos da divisão qüinqüipartite. Entre estes, podem ser citados Hugo de Brito Machado, Ives Gandra da Silva Martins, Kiyoshi Harada e Sérgio Pinto Martins.
A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal também não é unânime acerca da questão da divisão das espécies tributárias, o que se constata através das seguintes decisões:
De feito, a par das três modalidades de tributos (os impostos, as taxas e as contribuições de melhoria), a que se refere o art. 145 para declarar que são competentes para instituí-los a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, os arts. 148 e 149 aludem a duas outras modalidades tributárias, para cuja instituição só a União é competente: o empréstimo compulsório e as contribuições sociais, inclusive as de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas (STF, RE 146.733-9/SP, voto do Rel. Min. Moreira Alves, DJ 29/06/92).

As diversas espécies tributárias, determinadas pela hipótese de incidência ou pelo fato gerador da respectiva obrigação (CTN, art. 4º) são as seguintes:
a) os impostos (CF arts. 145, I, 153, 154, 155 e156); b) as taxas (CF, art. 145, II); c) as contribuições, que podem ser assim classificadas: c.1. de melhoria (CF, art. 145, III); c.2. parafiscais (CF, art. 149), que são: c.2.1. sociais, c.2.1.1. de seguridade social (CF art. 195, I, II, III), C.2.1.2. outras de seguridade social (CF, art. 195, § 4º), c.2.1.3. sociais gerais (o FGTS, o salário-educação, CF, art. 212, § 5º, contribuições para o SESI, SENAI, SENAC, CF art. 240); c.3. especiais; c.3.1. de intervenção no domínio econômico (CF, art. 149) e c.3.2. corporativas (CF, art.149). Constituem, ainda, espécie tributária: d) os empréstimos compulsórios (CF, art. 148). (RE 138.284, voto do Rel. Min. Carlos Velloso, DJ 28/08/92).

Para uma melhor compreensão dos aspectos tributários que podem estar relacionados com o Seguro DPVAT, passa-se aos subitens seguintes, que tratarão de definir as referidas cinco espécies tributárias, em consonância com a orientação da doutrina e jurisprudência dominantes.


6.1. Imposto


A definição legal de imposto se encontra no art. 16, do CTN:
"Imposto é o tributo cuja obrigação tem por fato gerador uma situação independente de qualquer atividade estatal específica, relativa ao contribuinte".
Em uma análise conjunta entre o dispositivo legal em comento e o art. 150, I, da Constituição Federal, pode-se concluir que imposto é um tributo que tem como hipótese de incidência um fato qualquer praticado pelo contribuinte, previsto em lei e que o vincula a uma obrigação tributária.
Os fatos geradores dos impostos são aqueles corriqueiros, como a compra de uma roupa ou a utilização de determinado serviço, que fazem transparecer a capacidade contributiva do consumidor.
Amaro (2006, p. 81) apresenta as três principais características dos impostos, a saber: a) a tipicidade dos fatos praticados; b) a não vinculação a qualquer atuação estatal divisível e referível ao sujeito passivo; c) a não existência de destinação exclusiva da receita para determinado aparelhamento estatal ou paraestatal, ou mesmo para entidades privadas de interesse público.
A competência tributária, segundo a qual se dividem os impostos em federais, estaduais e municipais, bem como as suas respectivas espécies, estão previstas nos artigos 153, 155 e 156, da Constituição Federal.


6.2. Taxa


Diferentemente do imposto, a taxa é um tributo caracterizado pela prestação de um serviço público específico e divisível, ou pelo exercício regular do poder de polícia, não podendo ter base de cálculo própria de impostos, tendo caráter bilateral e sinalagmático.
A taxa possui previsão legal no art. 77, do CTN, que se encontra em perfeita harmonia com o art. 145, II, da Magna Carta.6
O exercício regular do poder de polícia se encontra definido no art. 78, do CTN:
"Considera-se poder de polícia atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranqüilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos.
Parágrafo único. Considera-se regular o exercício do poder de polícia quando desempenhado pelo órgão competente nos limites da lei aplicável, com observância do processo legal e, tratando-se de atividade que a lei tenha como discricionária, sem abuso ou desvio de poder. "
Referentemente ao valor das taxas, Bastos (2002, p. 228) destaca que o montante cobrado deve manter correspondência com o custo do serviço prestado ? o que se denomina de caráter indenizatório, segundo o qual o Estado fica proibido de se valer das taxas como forma de auferir receitas não ligadas ao serviço prestado.
A mensuração de quanto cada contribuinte usa do serviço público disponibilizado é um dos parâmetros para a fixação do valor da taxa, que deve ainda observar a questão da capacidade contributiva.
A doutrina cuida de fazer uma ampla distinção entre o preço público e a taxa, eis que tais institutos não se confundem, já que o preço público constitui-se como uma obrigação contratual assumida voluntariamente.
Um grande problema que se apresenta é a distinção de quando determinado serviço é remunerado por taxa ou por preço público. A doutrina procura qualificar os serviços públicos como sendo "próprios" ou "impróprios", "essenciais" ou "não essenciais", "concessíveis" ou "não concessíveis", "compulsórios" ou "não compulsórios", "inerentes" ou "não inerentes" à soberania do Estado, ressaltando-se que a primeira classificação indicaria as taxas e a segunda os preços públicos.
Em relação à controvérsia existente, assim se posicionou o E. Superior Tribunal de Justiça:
1. O serviço de fornecimento de água e esgoto é cobrado do usuário pela entidade fornecedora como sendo taxa, quando tem compulsoriedade.
2. Trate-se no caso em exame, de serviço público concedido, de natureza compulsória, visando atender necessidades coletivas ou públicas.
3. Não tem amparo jurídico a tese de que a diferença entre taxa e preço público decorre da natureza da relação estabelecida entre o consumidor ou usuário e a entidade prestadora ou fornecedora do bem do serviço, pelo que, se a entidade que presta o serviço é de direito público, o valor cobrado caracterizar-se-ia como taxa, por ser a relação entre ambos de direito público; ao contrário, sendo o prestador do serviço público pessoa jurídica de direito privado, o valor cobrado é preço público / tarifa.
4. Prevalência no ordenamento jurídico das conclusões do X Simpósio Nacional de Direito Tributário, no sentido de que "a natureza jurídica da remuneração decorre da essência da atividade realizadora, não sendo afetada pela existência da concessão. O concessionário recebe remuneração da mesma natureza daquela que o Poder Concedente receberia, se prestasse diretamente o serviço". (RF, julho a setembro. 1987, ano 1897, v.299, p.40).[...] (Resp. 167489/SP, 1ª Turma, Rel. Min. José Delgado, J. 2/06/1998, in D.J. 24/08/1998).

O Excelso Pretório sumulou a controvérsia nos seguintes termos:
"Súmula 545 ? preços de serviços públicos e taxas não se confundem, porque estas, diferentemente daqueles, são compulsórias e têm sua cobrança condicionada à prévia autorização orçamentária, em relação à lei que as instituiu."
Portanto, cabe afirmar que a grande diferença que pode ser apontada para a distinção entre o preço público e a taxa é o fato de o primeiro não tem caráter essencial, mas sim facultativo.


6.3. Contribuição de Melhoria


O fato gerador da contribuição de melhoria é a obra pública que resulta na valorização dos imóveis beneficiados. O referido tributo é cobrado em razão de uma atuação estatal que indiretamente agregue mais valia ao imóvel do contribuinte.
Ela possui como pressupostos a impossibilidade de cobrança antes da execução da obra, não podendo o valor global ser superior aos seus custos. Outro requisito diz respeito à individualização da base de cálculo conforme a valorização de cada imóvel.
Diante destas considerações, Machado (1994, p. 336) afirma que a Contribuição de Melhoria é um tributo vinculado que tem por fato gerador a valorização do imóvel pertencente ao contribuinte, em decorrência da realização de obra pública, com o fim de evitar uma injusta repartição dos benefícios.
Observa-se que o fato gerador da contribuição em comento está sempre condicionado à valorização dos imóveis beneficiados pela obra pública realizada pelo ente tributante. O objetivo de sua instituição é evitar o enriquecimento sem causa do contribuinte e compensar os gastos despendidos pelo Poder Público.


6.4. Empréstimo Compulsório


O empréstimo compulsório encontra-se definido por Torres (2007, p. 424-425) como o dever fundamental consistente na prestação pecuniária que visa à obtenção de receita para as despesas públicas mediante promessa de posterior restituição.
Somente a União Federal pode instituir empréstimo compulsório através de lei complementar, de acordo com o art. 148, I e II, da Magna Carta.7 A devolução do dinheiro ao contribuinte deve estar prevista no próprio ato normativo, apresentando uma afetação constitucional previamente determinada.
Desta forma, somente pode ser instituído o empréstimo compulsório para suprir despesa extraordinária em decorrência de calamidade pública ou guerra externa ou sua iminência, bem como em função de investimento público de caráter urgente e de relevante interesse nacional.


6.5. Contribuições


As contribuições se diferenciam precipuamente dos impostos em razão da sua ligação à execução de uma atividade estatal ou paraestatal específica, sendo certo que não necessariamente haverá, por parte do contribuinte, proveito com relação a estas atuações.
Os tributos em análise possuem como destino do produto da arrecadação o custeio de uma finalidade social geral (contribuições sociais gerais), custeio de seguridade social (contribuições previdenciárias ou contribuições para a seguridade social), custeio de uma atividade de intervenção no domínio econômico (ex. CIDE), custeio de atividade de interesse de categoria profissional e custeio de atividade no interesse de categoria econômica.
De forma sintética, essas são as contribuições para a seguridade social existentes no ordenamento jurídico brasileiro, de acordo com a sua destinação constitucional, sob a ótica de Torres (2007, p.410 - 411):

Contribuições Diretas (previdenciárias)? art. 195, I, a e II Contribuições Indiretas (para os sistemas de saúde, assistência social e de previdência) ? arts. 195, I, b e c, III e IV; arts. 239, 90 do ADCT Contribuições indiretas da competência residual da União ? art. 195, §4º, c.c. 145, I Contribuições para a educação e cultura
Dos empregadores, dos empregados, dos autônomos e dos servidores públicos (INSS, Funrural, SAT e FGTS) Sobre a receita ou faturamento (PIS/Pasep e Cofins); sobre o lucro (CSLL); sobre a receita de concurso de prognósticos; do importador de bens ou serviços do exterior (COFINS ? importação); sobre a movimentação financeira (CPMF). FGTS
(Lei Complementar 110/01) Salário-educação
(art. 212, §§ 5º e 6º); Sistema S (Senai, Sesi, Senac, Sebrae) ? art. 240.

Para o fim específico do presente estudo, a análise do instituto da contribuição social é de extrema relevância, haja vista suas inequívocas ligações com o seguro DPVAT, consoante será oportunamente demonstrado, de modo a possibilitar o entendimento acerca da própria natureza jurídica do referido seguro, no que diz respeito aos seus aspectos tributários.


7. Competência Tributária


A competência tributária é aquela prevista na Constituição Federal, que autoriza cada ente federativo a tributar ou legislar sobre tributos, revestindo-o de poderes para o mister.
Não há que se confundir a competência com a capacidade tributária ativa, tendo em vista que a primeira, por se situar no plano constitucional, é anterior à existência do tributo e a segunda somente será determinada quando o legislador definir o sujeito ativo, no desempenho das competências. Ou seja, a competência diz respeito ao ente federativo que pode instituir algum tributo, enquanto a capacidade ativa se refere à possibilidade da pessoa jurídica de direito público cobrar ou transferir tal encargo.
A Constituição Federal, segundo o entendimento de Amaro (2006, p. 99) não cria tributos, apenas outorga competência tributária, delegando poder para a sua instituição. O instituto próprio para a criação ou instituição de tributos é a lei ordinária, em conformidade com o art. 150, I, da Carta Política.8
Em relação à partilha da arrecadação dos tributos, não fica esta necessariamente destinada ao ente político que exerceu sua competência tributária.
Para Carrazza (2003, p. 451), são características da competência tributária: a) privatividade ? uma vez deferida, a competência tributária é exercida com exclusividade pela pessoa jurídica contemplada; b) indelegabilidade ? é a impossibilidade de transferência da competência tributária; c) incaducabilidade ? a competência não desaparece nem diminui em função do seu não-exercício; d) inalterabilidade ? muito criticada por diversos autores e que consistiria na impossibilidade de alteração da competência, mesmo por Emendas Constitucionais; e) irrenunciabilidade ? o ente político não pode renunciar sua competência; f) facultatividade do exercício ? ninguém pode obrigar o ente contemplado a exercer sua competência, excetuando-se o ICMS e as contribuições de melhoria.
A previsão constitucional dos impostos da União Federal se encontra nos artigos 153 e 154 da Constituição Federal, enquanto a dos Estados Membros e Distrito Federal no artigo 155 e a dos Municípios no artigo 156, respectivamente.


8. Considerações


Ao final do presente capítulo, cabe tecer algumas considerações, com o fim de estabelecer um liame entre todos os pontos até este momento abordados e o objetivo desta monografia.
O Seguro DPVAT tem em comum com o Direito Tributário mais do que a obrigatoriedade de sua cobrança, ou seja, o caráter impositivo de seu pagamento por parte dos proprietários de veículos automotores.
Parte da arrecadação dos prêmios é destinada ao SUS ? Sistema Único de Saúde e ao DENATRAN ? Departamento Nacional de Trânsito, o que evidencia fortes traços de contribuição social, uma das mencionadas espécies tributárias (item 2.6.5).
Passar-se-á, doravante, ao estudo o Direito do Seguro, que definirá outros pontos de intersecção com o Seguro DPVAT, para que, ao final, aponte-se uma plausível conclusão acerca de sua natureza jurídica.

BIBLIOGRAFIA


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