AS TEORIAS NO PROCESSO DA AQUISIÇÃO DA LINGUAGEM
Merielen Patricio dos Santos


RESUMO

O estudo desse artigo visa destacar a importância do processo da aquisição da linguagem, com base nos fundamentos de teorias de vários estudiosos e da prática com a análise do filme "A Maçã". Explicita as teorias que podem ser utilizadas nesta análise, comparando-as com a prática, vista nas gêmeas do filme. Mostra também, que algumas teorias não condizem com o que observado na prática, como a de Skinner e de Chomsky. Outras, como o sócio-interacionismo, de Vygotsky, o qual considera essencial no processo da aquisição da linguagem a constante interação social e troca comunicativa, pôde ser comprovada, pois se percebe que neste processo existe um período (até 6 anos) onde a aquisição da linguagem pode acontecer normalmente com crianças que estavam fora do convívio social. No entanto, após essa idade, a aquisição da linguagem pode ficar completamente comprometida e por mais que retomem o contato com o meio social, o prejuízo no processo da aquisição da linguagem já terá ocorrido.

PALAVRAS-CHAVE: período crítico, aquisição, linguagem, interação.

1. INTRODUÇÃO
Este artigo apresenta o tema As Teorias no Processo da Aquisição da Linguagem.
Os estudos do processo de aquisição da linguagem acontecem desde o século XIX, mas ainda é embrionário e pouco se sabe sobre o assunto. Por isso há necessidade de aprofundamento e novas descobertas sobre esse processo, pois se percebe que ao longo dos anos, muitas pessoas vêm sofrendo vários distúrbios de linguagem. Fato discutido principalmente, no processo da aquisição da linguagem em pessoas isoladas e fora do convívio social. O que faz refletir sobre o quão importante e complexo é o processo da aquisição da linguagem no desenvolvimento do ser humano.
Tem como objetivos refletir sobre o processo de aquisição da linguagem em pessoas isoladas do convívio social, como as gêmeas do filme "A Maçã", analisando algumas concepções de prática e teorias de estudiosos sobre o assunto comparando os dois aspectos.
O presente estudo faz-se necessário considerando a linguagem como primeira forma de socialização e para o entendimento e aceitação das pessoas, independente de suas dificuldades ou limitações.

2. ANÁLISE DO FILME A MAÇÃ

No filme "A Maçã", da diretora Samira Makhmalbaf, teve como roteirista, seu pai, Mohsen Makhmalbaf, famoso cineasta iraniano e lhe rendeu alguns prêmios como a Mostra Internacional de Cinema de Cannes.

"A Maçã" conta a história de duas irmãs gêmeas que viviam aprisionadas em sua casa. Aconteceu na periferia de Valisar, Tehran, na década de 90, em pleno verão. As meninas eram mal alimentadas e proibidas de sair à rua, ou de ter contato com o mundo, pelo pai, um senhor desempregado e extremamente obediente ao Alcorão. Por esse motivo justificava temer pela pureza de suas filhas. A mãe, uma senhora com deficiência visual, sempre coberta pelo véu, era conivente com o marido.
Esse aprisionamento e exclusão causaram-lhes várias consequências como o prejuízo na aquisição da linguagem, pois apenas balbuciavam e pronunciavam algumas palavras com extrema dificuldade e pouca clareza. Também tinham dificuldades motoras como andar, além disso, gerou-lhes um mecanismo que ao serem libertas, retornavam rapidamente à casa. Elas tornaram-se antissociais não sabendo como agir com as pessoas.
Os vizinhos, revoltos com a situação, reuniram-se e fizeram um abaixo assinado, denunciando a família para a assistência social. Após a visita e a ajuda de uma assistente social, as meninas começaram a conhecer o mundo, receberam um espelho que fez com que reconhecessem sua própria imagem. Também provaram uma maçã, a qual foi a grande motivadora da libertação das meninas. Iniciaram o convívio social, ainda que discretamente, após verem um menino puxando uma maçã. Assim, saíram as ruas, conheceram novas pessoas e brincaram com outras crianças.
A maçã entra em cena várias vezes e simboliza a libertação e pode ser relacionada com o fruto proibido que uma vez provado, faz com que instinto e o desejo de tê-lo novamente mais alto.
Esse filme nos leva a uma reflexão sobre as teorias de alguns estudiosos quanto às perspectivas de aquisição da linguagem.

3. TEORIAS DA AQUISIÇÃO DA LINGUAGEM EM RELAÇÃO AO FILME A MAÇÃ

O Processo da Aquisição da Linguagem vem sendo estudado desde o século XIX, porém, ainda muito pouco se sabe.
A constatação de que as crianças apresentam intenções comunicativas desde seus primeiros meses de vida influenciou os estudiosos da linguagem a pesquisar a fala espontânea da criança em interação com o mundo.
Segundo Pinker (1994) a aquisição da linguagem normal é garantida até os seis anos. Ela é comprometida entre os seis anos e a puberdade e rara daí pra frente, o que foi possível comprovar com casos estudados por ele, como o da menina Isabele, um caso que obteve êxito. Isabele conviveu com sua mãe surda e cérebro lesada, enclausurada em um quarto escuro. Mãe e filha foram libertas quando a menina tinha seis anos e meio. Retornando ao convívio social, em pouco mais de dois anos, ela obteve a aquisição da linguagem igual ao de crianças da mesma idade, com condições normais de desenvolvimento, comprovando então a sua teoria.
Já no caso de Genie, descoberta em 1970 com quase 14 anos que tinha vivido toda sua vida confinada e agredida fisicamente, não teve a mesma sorte. Quando resgatada ao convívio social, aprendeu a falar de modo rudimentar e o processo de aquisição da linguagem aconteceu bem mais lentamente do que em uma criança nas condições normais, comprovando mais uma vez sua teoria de que após os seis anos de idade, a aquisição da linguagem fica completamente comprometida.
No caso das gêmeas do filme "A Maçã", pode-se perceber que a teoria de Pinker tem fundamentos, uma vez que, por mais que as meninas retomaram o contato com o meio social, o prejuízo no processo da aquisição da linguagem já havia ocorrido.
Skinner (1957) diz que aprender a língua seria um processo mecânico de repetição, onde a linguagem é um comportamento verbal, é adquirido e social. Essa teoria Behaviorista não é de toda sem lógica, pois esse processo pode ser percebido nas pessoas com deficiência auditiva. No entanto, o processo não é semelhante o das meninas do filme, pois o aprisionamento causou-lhes comprometimentos que não são sanados apenas com processos mecânicos de repetição.
Outra teoria importante para refletirmos é a do Inatismo que diz:

A linguagem uma dotação genética, e é o resultado do desencadear de um dispositivo inato, inscrito na mente e não um conjunto de comportamentos verbais. (CHOMSKY, 1959)

Chomsky (1959), defensor dessa teoria ,diz que todos já tem na mente uma Gramática Universal e que a aquisição da linguagem não depende da interação social. Teoria contrária se percebe no filme "A Maçã", onde as meninas aprisionadas e fora do convívio social por 11 anos, tiveram a aquisição da linguagem completamente comprometida.
Na teoria construtivista ou epigenética Piaget (1979) propõe que a criança constrói seu conhecimento através da experiência com o mundo físico:

A visão cognitivista construtivista (Piaget) entende a aquisição da linguagem como dependente do desenvolvimento da inteligência da criança. Sob esse ponto de vista, a linguagem surge quando a criança desenvolve a função simbólica. (FREITAS, 2007)

Scarpa (2003) é citada por Freitas, deixando claro que é necessária a mediação do outro entre a criança e o mundo. Então, a criança não espera passivamente o conhecimento, mas constrói tal conhecimento a partir das relações estabelecidas através dessa mediação. Relação que pode ser percebida nas gêmeas do filme, pois depois de muito tempo fora do convívio social, as meninas não conseguiriam retomar ao convívio e se adaptar ao mundo, mas o mundo teria que se adaptar as suas limitações.
Enquanto Piaget entende a aquisição da linguagem como dependente do desenvolvimento da inteligência da criança, para Vygotsky é o próprio processo de aprender que gera e promove o desenvolvimento das estruturas mentais superiores.
Então o Interacionismo de Vygotsky se baseia nas trocas comunicativas entre a criança e o adulto, o desenvolvimento da linguagem e o pensamento têm origem social através dessa interação.
Para Freitas (2007) a visão interacionista social (Vygotsky) considera os fatores sociais, comunicativos e culturais para a aquisição da linguagem, estudando as características da fala dos adultos. Segundo esse ponto de vista teórico, a interação social e a troca comunicativa são pré-requisitos básicos para a aquisição da linguagem. Assim, quanto mais ricas as interações, maior e mais sofisticado será o desenvolvimento.
Esse fato se percebe claramente nas meninas do filme "A Maçã". Depois de onze anos isoladas do convívio social, as meninas retornam a socialização, mas precisam de ajuda para que sua integração aconteça da mesma forma, acontece com a aquisição da linguagem, pois elas sozinhas não teriam chances nenhuma de recuperar tudo o que perderam naqueles onze anos, mas com a ajuda de outras pessoas (assistente social, o menino, as crianças), puderam ao menos dar início a uma socialização e a aquisição da linguagem, ainda que com dificuldades.
Mais uma vez, situação que condiz com as teorias Vygotsky (1998), que diz que a interação social exerce um papel fundamental no desenvolvimento cognitivo. Para ele, cabe ao educador e a sociedade ajudar na integração daquele que tem limitações ou dificuldades, adequando-se a essas limitações.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Para se estudar a aquisição da linguagem é preciso adentrar em suas teorias, pois foram a partir delas que se iniciaram estudos sobre o assunto. Cada teoria tenta melhorar, explicar, expor suas ideias e pressupostos de como as crianças adquirem a linguagem e é nelas, portanto, que se pode fundamentar para seguir adiante neste mundo tão complexo que é a aquisição da linguagem.
No Brasil e no mundo, muitas pesquisas sobre aquisição da linguagem têm sido realizadas nos últimos anos, porém ainda há muito a pesquisar sobre esse processo.
A relação entre a teoria e prática mostra que existe um período crítico para a aquisição da linguagem e que é necessário um convívio social, sendo a interação social e a troca comunicativa, pré-requisitos básicos para a aquisição da linguagem. O que pôde ser confirmado nas gêmeas do filme, que por mais que as meninas retomaram o contato com o meio social, o prejuízo no processo da aquisição da linguagem já havia ocorrido, pois foram onze anos aprisionados, sem contato com o mundo.
Com os estudos entre teoria e prática percebe-se então, que para que a aquisição da linguagem aconteça sem prejuízos, é necessário o convívio social, a integração entre o ser e o meio, e condições normais de desenvolvimento. Além disso, cabe ao educador e à sociedade ajudar na integração daquele que tem limitações ou dificuldades, adequando-se a essas limitações.

REFERÊNCIAS:
A MAÇÃ, (Doc). Direção: Samira Makhmalbaf ? Roteiro: Mohsen Makhmalbaf. Coleção Cult Filmes. Irã: 1998. 60 minutos.

PANKE, Noêmia Hepp. Aquisição de Linguagem. Apostila do Curso de Pós-Graduação Lato-Sensu. Comunicação, Produção e Revisão Textual. UNIARP ? Caçador. 2011.

SCARPA, Ester Miriam. Aquisição da linguagem. In: MUSSALIM, Fernanda; BENTES, Anna Christina. Introdução à linguística, v.2. São Paulo: Cortez, 2001.

FREITAS, Gabriela Castro Menezes de. PUCRS. Artigo on-line.
www.pucrs.br/edipucrs/online/pesquisa/artigo7.html. Acessado em 15/03/2011.

www.malhaatlantica.pt/ecae-cm/linguística.htm