As sanções decorrentes do assédio moral no âmbito
do Direito do Trabalho

Palavras-Chave: sanção, teoria da sanção, assédio moral, Direito do trabalho, Direito como instituição imaginária da sociedade

Introdução

Muito se tem escrito ultimamente sobre a questão do assédio moral, especialmente no âmbito do direito do trabalho, mas nem por isso diminui a preocupação e o interesse de estudiosos, juristas e magistrados sobre o tema. Há uma série de questões que ainda permanecem em discussão, especialmente porque não há lei federal regulamentadora do assédio moral no Brasil. No vácuo legislativo a doutrina busca se valer de estudos de diferentes áreas do conhecimento para identificar conceitos, características, modos de proceder do assediador e especialmente suas conseqüências sociais.
O tema ganhou relevância na doutrina nacional quando em 2004, com a Emenda Constitucional n. 45, alargou-se a competência da Justiça do Trabalho, possibilitando que essa apreciasse e julgasse, conforme o artigo 114 ,IV da Constituição Federal, "ações de indenização por dano moral ou patrimonial, decorrentes da relação de trabalho". O assédio moral foi considerado um caso em que cabia indenização por dano moral e logo os magistrados passaram a sentenciar nesse sentido. As decisões tornaram-se incrivelmente mais rápidas se comparadas às decisões no âmbito civil por indenizações, o que levou diversos trabalhadores a pleitearem ao atacado seus direitos.
A legislação do trabalho existente, em especial a Consolidação das Leis do Trabalho, buscou proteger o corpo do trabalhador, tão explorado, maltratado e desrespeitado durante todo o processo de industrialização. As legislações trabalhistas procuraram ao longo do século XIX e XX a proteger o corpo, porém a alma não foi protegida. A CLT possui um conteúdo datado de 1943, porém grande parte de seus textos consolidados são da década de 10, em que não estavam muito desenvolvidos os estudos da psique, nem estabelecida uma patologização do sofrimento da alma. A legislação trabalhista é marcada por essa transformação no mundo da ciência e também sofre com a dificuldade de proteger os trabalhadores dos serviços, pois foi criada para a proteção do emprego fabril. Se o mundo das fábricas castigava principalmente o corpo, o mundo dos serviços castiga mais a psique. A exploração do psíquico fez com que o corpo sofresse, criando novas doenças do trabalho que o direito existente não tinha instrumentos legais para proteger. Uma das muitas formas de exploração da alma se chama de assédio moral, apesar de estar realmente pouco ligado a regras morais e mais a uma violência psíquica que pode ter conseqüências graves e não apenas atingir a moral ou morais sociais.
O assédio moral não pode ser analisado somente do prisma do Direito, sendo necessário uma pluridisciplinariedade no seu estudo, englobando áreas como: psicologia do trabalho, sociologia do trabalho, medicina do trabalho, dentre outras. Isso aponta para uma complexidade do tema que vem da sua relação com o mundo do trabalho, o que torna ainda mais complexa uma boa regulamentação do tema no âmbito do Direito.
O que quase todos os estudiosos do tema concordam é que o assédio moral deve ser coibido socialmente e também judicialmente. O que não há consenso é de como coibir tal prática e a questão da sanção surge como um dos pontos mais difíceis na coibição do assédio moral. Praticamente não há discussão sobre a forma de sanção para condutas de assédio moral. Os juízes, ao se depararem com casos de assédio moral no âmbito do trabalho, condenam as empresas a pagarem indenizações, dificilmente aplicando outras sanções para esse caso. A sociedade tem se colocado contra as sanções indenizatórias de valores altos e considerado os juízes, por essa prática, como arbitrários e como pessoas que se posicionam contra a economia nacional. Com as indenizações decorrentes de assédio moral a sociedade passa em seu imaginário social a entender a figura do juiz de maneira dicotômica: ou é o juiz "Robin Hood" ou é o juiz "mata-patrão". Ao mesmo tempo o judiciário trabalhista se sente absolutamente incomodado com a questão, não sabendo que posição tomar ao tarifar a indenização de assédio moral, uma vez que não tem um parâmetro legislativo. Alguns critérios para indenização foram criados e aplicados pela jurisprudência, porém não há um consenso entre os magistrados se a indenização deve ser realmente uma sanção ou se deve ser mera indenização ao dano moral.
O objetivo desse artigo é tratar da questão da sanção no assédio moral, entendendo aqui como sanção inclusive as indenizações decorrentes. Parte-se de um conceito alargado de sanção, que engloba não apenas o conceito técnico/jurídico, mas o instituído socialmente. Adota-se o prisma de uma teoria do Direito e não de um direito dogmático, por isso a questão não será tratada do plano meramente legislativo ou jurisprudencial. A casuística também foi afastada para a tentativa de se pensar o assédio moral como uma questão política e filosófica, porém não se nega aqui seu caráter histórico e sua dimensão espacial. Escapa dos objetivos do artigo tratar da: gênese, nomenclatura, definição, práticas, formas/tipos/modalidades e conseqüências do assédio moral; por falta de espaço e não de interesse. Sobre esses temas já existe uma bibliografia extensa e de qualidade que poderá ser consultada . O artigo parte de alguns lugares comuns do tratamento do tema do assédio moral, para depois apresentar questões sobre a sanção de indenização e sua pouca eficácia. Por fim o artigo busca analisar propostas legislativas, destacando o tema da sanção, e propor sanções e políticas públicas para tentar superar as abundantes práticas de desrespeito.