1. INTRODUÇÃO
Durante muito tempo se discutiu a relevância dos primeiros anos de vida da criança como a base para um desenvolvimento saudável de suas habilidades cognitivas, afetivas e sociais. Neste contexto, considerando a escola como um primeiro espaço socializador fora do ambiente familiar da criança, se faz necessário oferecer-lhe condições para que se sinta segura e protegida. Por isso, se observarmos, sobretudo, as relações interpessoais vivenciadas pelas crianças em sala de aula, nós poderemos entender quais as possibilidades desta citada relação contribuir para a construção de um futuro adulto com afetividade bem ou mal estruturada. Sem esquecer também os fatores sociais, culturais e neurológicos como elementos que podem ou não interferir significantemente no comportamento e na motivação das crianças durante a execução das atividades pedagógicas e do seu viver em constante conexão com os outros.
Desde o surgimento das escolas destinas à Educação Infantil a afetividade esteve pouco presente no contexto escolar dessas crianças, meninos e meninas eram tratados como adultos e sem a compreensão da necessidade das trocas afetivas enquanto elemento mediador da socialização. Havia as exceções, por exemplo, Comenius (2010) em sua Didactica Magna recomendava que os professores fossem mais suaves para com aqueles que não conseguiam aprender mais rápido.
Este foi um começo frágil para as questões que envolvem o relacionamento com afetividade em sala de aula. Na maioria das vezes, os professores e alunos eram colocados em posições antagônicas, que não se misturavam e que não necessitavam relacionar-se entre si. Com o passar dos anos essa visão autoritária postulada para a Educação Infantil começou a ser quebrada, destacando-se a necessidade das trocas afetivas entre alunos e professores como um componente facilitador da relação em sala de aula.
Sendo assim, vários elementos nos incentivaram a realizar esta pesquisa: as notícias e relatos docentes sobre as dificuldades que encontram para "chegar junto" do aluno, os índices de violência em sala de aula, além da grande quantidade de livros que abordam a importância da afetividade em sala de aula. Entretanto, parece existir um vazio de sentimentos entre alunos e docentes das séries iniciais. A partir destes fatos, investigamos: De que forma a afetividade interfere na motivação dos alunos das séries de Educação Infantil em relação ao desejo de aprender?
Deste modo, admitimos a necessidade da interação social como fator fundamental nos processos psicológicos, reconhecendo a importância da relação entre o afeto e a motivação como elementos indissociáveis do ambiente escolar. Portanto, nossa proposta foi baseada na análise da contribuição dessa temática aplicada à Educação Infantil.
Entendemos que esta pesquisa se justifica devido à necessidade permanente que todo ser humano possui de ser amado, como nos diz Fromm (2006, p. 57) "O amor não é principalmente uma relação com certa pessoa. Ele é uma atitude, uma orientação de caráter que determina como alguém se relaciona com o mundo como um todo, e não com um ?objeto? de amor". Então, eis a necessidade da afetividade prevalecer nas relações humanas de um modo geral e na escola em particular, para que a criança mediante relações interpessoais positivas tenha um desenvolvimento saudável e adequado não só na escola, como também em todo âmbito social.
Existem crianças que não apresentam interesse pela escola, nem motivação para aprender, possivelmente porque não se sentem valorizadas ou aceitas enquanto alguém produtivo. Diversos fatores podem influenciar neste senso de produtividade e realização, mas, o que buscamos foi entender o alcance do aspecto afetivo na relação professor-aluno, como meio relevante para o nível de motivação das crianças na aula.

2. OBJETIVOS
2.1 Objetivo Geral
? Investigar as relações afetivas na sala de aula entre professores e alunos da Educação Infantil, assim como analisar se a qualidade da relação contribui para a motivação e o desejo de aprender por parte da criança.

2.2 Objetivos Específicos
? Compreender como se estabelecem os vínculos afetivos em sala de aula.
? Verificar como o docente dispõe da afetividade na construção de conhecimentos às crianças.
? Analisar a motivação das crianças na aula em virtude da qualidade do fator afetivo na relação educador-educando.

3. REVISÃO DA LITERATURA
3.1 Aspectos introdutórios
É evidente a relação estabelecida entre a cognição e a afetividade, constituindo-se assim como fator essencial na vida escolar das crianças. Cabendo, pois ao professor, sobretudo da Educação Infantil, estar ciente dos problemas que poderá enfrentar visto que muitas crianças revelam rejeição à escola devido a uma infância tumultuada e cheia de carências e privações.
Para que essa necessidade de afeição seja encarada na escola infantil como um elemento norteador da prática docente, precisamos, sobretudo, compreender os conceitos que se encontram postulados acerca da afetividade, motivação, bem como a relação estabelecida entre esses dois aspectos, para que assim se compreenda a necessidade dos vínculos afetivos estarem presentes dentro da sala de aula.
Muitas são as tentativas de conceituar o afeto e o amor. Poetas, estudiosos e cientistas, vem há muito tempo tentando descrever esses sentimentos, porém vejamos os termos que melhor definem um conceito para a afetividade.
Tomemos, então, como ponto inicial da discussão a definição de afetividade dada por Ferreira (2000, p.14) onde este a determina como sendo o
Conjunto de fenômenos psíquicos que se manifestam sob a forma de emoções, sentimentos e paixões, acompanhados sempre da impressão de dor ou prazer, de satisfação ou insatisfação, de agrado ou desagrado, de alegria ou tristeza.

Sendo assim, podemos dizer que as emoções nas crianças são uma forma de comunicação, que pode ser usada como uma maneira de se relacionar com o meio ao qual se encontra exposta.
Nesse sentido, é necessário compreender também, o que adotamos como conceito de interação social. Segundo as perspectivas de Wallon, explicitadas em Galvão (2003, p.73):
Se considerarmos como interação social somente as situações em que há encadeamento entre as ações dos parceiros em direção a um objetivo comum, deixaremos de tratar como tal inclusive formas de interações entre coetâneos, como situações muito comuns no primeiro ano de vida, quando, por exemplo, uma criança realiza alguma ação (empurrar um carrinho, balançar um chocalho) e a outra permanece observando.

Então, diante do exposto, sensíveis aos componentes expressivo-emocionais das condutas infantis, não restringiremos o conceito de interação à cooperação, pois, neste caso ela inexistiria. Por outro lado, admitimos nas ações dessas crianças uma relação de complementaridade, de contato indireto, quando quem empurra o carrinho se exibe para o outro, que por sua vez, observa como se participasse da ação, acompanhando-a através de expressões faciais e outras variações de posturas.
Logo, ainda segundo Galvão (2003, p.74), compreendemos que "A passagem dessa percepção corporal ? que se dá sob a forma de atitudes posturais ? à capacidade de representação mental se fará mediante a intervenção da linguagem [...]". Ou seja, as emoções são relevantes para as crianças enquanto forma de linguagem durante os seus primeiros anos, por isso, é necessário que haja uma compreensão por parte dos professores no sentido de perceberem que a comunicação emocional nas crianças, será substituída gradativamente por uma forma mais racional de comunicação. Aos poucos, elas vão incorporando novas maneiras de se relacionar com os outros, bem como passam a utilizar outras formas de saciar suas vontades.
Ainda neste contexto, se apresenta bastante relevante a ser observado na prática pedagógica o destaque dado por Galvão (2010), ao ressaltar que apesar de exibirem uma linguagem verbal bem desenvolvida, as crianças menores de seis anos, ainda utilizam a linguagem emocional. É através do choro, das expressões corporais e faciais que o professor poderá perceber o seu aluno de uma forma mais atenta e completa.
Ainda de acordo com Galvão (2010, p.4) "[...] se a criança está ao sabor de suas emoções, ela não tem condições neurológicas de controlá-las [...]". A partir daí, é válido destacar o valoroso papel do professor na compreensão do grau de maturidade neurológica da criança, para que este não considere certas atitudes tomadas pelos alunos como indisciplina, manha, ou atrevimento. É preciso antes de tudo que o mestre tenha consciência da importância da afetividade para o desenvolvimento emocional da criança, mas também, é necessário que o mesmo considere os fatores biológicos como parte integrante desse desenvolvimento.
Muitos são os questionamentos acerca da importância da emoção nos relacionamentos pessoais, sobretudo no trato com as crianças, chegando a se deixar de lado esse aspecto em detrimento da razão. A esse respeito Goleman (2007, p.30) destaca que:
São as nossas emoções, dizem os pesquisadores, que nos orientam quando diante de um impasse e quando temos que tomar providências importantes demais para que sejam deixadas a cargo unicamente do intelecto. [...] Uma visão da natureza humana que ignore o poder das emoções é lamentavelmente míope. A própria denominação homo sapiens, a espécie pensante, é enganosa á luz do que hoje a ciência diz acerca do lugar que as emoções ocupam em nossas vidas.

É válido ressaltar que amor e o ódio compõem a vida afetiva do ser humano e estão sempre juntos, interferindo em nossos pensamentos e ações. Por isso, a compreensão das emoções e dos sentimentos é essencial para o entendimento da afetividade como parte da vida e dos relacionamentos humanos, bem como para a compreensão de que as emoções causam efeitos intensos e imediatos no organismo enquanto que os sentimentos são mais amenos e duradouros.
Desde muito cedo, ainda bebês, surge nas crianças a empatia. É através dela que serão desenvolvidas as suas emoções, pois, de acordo com Goleman (2007, p.120) "Praticamente desde o dia em que nascem, os bebês ficam perturbados quando ouvem outro bebê chorando - uma reação que alguns encaram como o primeiro indicador da empatia que se desenvolverá até a idade adulta". Sendo assim, podemos dizer que os exemplos de empatia surgem na infância, através dos pais que devem se encontrar em sintonia com os sentimentos dos seus filhos.
Tratando de um âmbito anterior a fase escolar, vale destacar que a família exerce um importante papel na construção das emoções nas crianças, pois é no seio da família que damos inicio a nossa aprendizagem emocional, é em meio a intimidade da vida familiar que de acordo com Goleman (2007, p.208):
[...] aprendemos como nos sentir em relação a nós mesmos e como os outros vão reagir a nossos sentimentos; aprendemos como interpretar e manifestar nossos sentimentos e como reagir a eles; aprendemos como interpretar e manifestar nossas expectativas e temores. Aprendemos tudo isso não somente através do que os nossos pais fazem e do que dizem, mas também através do modelo que oferecem quando lidam, individualmente, com os seus próprios sentimentos e com aqueles sentimentos que se passam na vida conjugal. Alguns pais são professores emocionais talentosos, outros, são atrozes.

Por isso, é importante que os pais compreendam que a forma como estes tratam seus filhos (com uma disciplina rígida ou forte compreensão, indiferença ou simpatia) trará uma intensa conseqüência para a vida afetiva da criança, e que dependendo da forma como são executadas as ações familiares, essas irão contribuir para um desenvolvimento emocional bem ou mal construído por parte da criança.

3.2 Caminhos para a construção da afetividade em sala de aula
O importante é entendermos que a afetividade é essencial no crescimento pessoal do ser, embora não esteja indiferente a fatores biológicos, sociais e cognitivos, e que dependerá dos valores e costumes da sociedade sob a qual o indivíduo está inserido.
Neste contexto, percebendo que o desenvolvimento infantil é envolto de afetividade e que esta se dá em meio às interações sociais vivenciadas pelas crianças, admitimos que em um primeiro momento elas devessem ser estabelecidas no ambiente familiar, pois assim como nos afirma Fromm (2006, p. 54) "As atitudes da mãe e do pai em relação ao filho correspondem às necessidades dele. A criança precisa de amor e do cuidado maternos incondicionais, fisiológica e psiquicamente". Desta forma, no círculo familiar serão vividas as primeiras posturas de expressão e comunicação da criança, e posteriormente, ao entrar na escola, ela estará inserida em mais um meio no qual deve se constituir ao realizar novas interações.
Sendo o foco deste estudo a importância da afetividade na Educação Infantil, as idéias de Henri Wallon constituem-se como referencial próprio para análise desta conjuntura, pois, sua teoria tem por objeto a gênese dos processos psíquicos que compõem a pessoa. Sendo assim, Galvão (2003, p.71) nos traz que Wallon
Baseia-se numa visão não fragmentada do desenvolvimento humano, buscando compreendê-lo do ponto de vista do ato motor, da afetividade e da inteligência, assim como do ponto de vista das relações que o indivíduo estabelece com o meio.

Por sua vez, é fundamental que a afetividade se encontre inserida dentro das práticas escolares desde muito cedo, visto que esse ambiente é um formador de opiniões, difusor de idéias e local de formação de seres humanos completos, não só no aspecto cognitivo, mas especialmente no afetivo e social, como elementos necessários para a vida humana.
Dentro da concepção walloniana, a escola deve ser vista como co-participante e co-responsável do processo de formação da criança, onde o educador não deve ser apenas um transmissor de conteúdos programáticos, mas principalmente um agente transformador, com um olhar sócio-crítico da realidade. Ainda nesta perspectiva, Galvão (2003, p.85) atenta que:
Componentes indissociáveis da ação humana, as manifestações emocionais têm importante impacto nas dinâmicas de interação que se criam nas situações escolares. O conhecimento das funções, das características e da dinâmica das emoções pode ser muito útil para que o educador entenda melhor situações comuns ao cotidiano escolar [...].

Considerando que os professores possuem padrões pessoais e profissionais, mas não são imutáveis, cada um apresenta características próprias de atuação, um estilo particular que pode interferir positiva ou negativamente sobre o clima na sala de aula. De acordo com Paniagua; Palácios (2007) vistos como adultos de referência pelas crianças, os professores da Educação Infantil precisam proporcionar segurança afetiva aos alunos para que eles possam interagir com os colegas, brincar, explorar, sentir-se valorizados, respeitados, motivados a aprendizagem, sentir que podem contar com o adulto e obter dedicação e afeto. Porém, é importante ressaltar que não se trata de dar respostas imediatas a tudo que lhes for solicitado pelos pequenos, mas passar a idéia de que compreendem suas necessidades e vão atendê-las quando for necessário.
Existem variados graus de disponibilidade e manifestação de afeto em sala de aula, entretanto não há regras de ações que sejam compatíveis a todos os grupos de crianças e ambientes escolares da Educação Infantil, visto que, o contexto cultural de cada pessoa é diferente. Porém, supõe-se que algumas atitudes sejam representativas para caracterizar a disponibilidade do professor em interagir com as crianças, ou seja, utilizar a linguagem do corpo, se colocar no nível dos alunos, empregar mensagens verbais que podem transmitir afeto, ter uma postura receptiva até mesmo com um olhar, assim como destaca Paniagua; Palácios (2007, p.134-135):
Os olhares do adulto também proporcionam muita informação afetiva: eles podem pairar sobre o grupo, evitando pousar nas crianças, ou procurar ativamente a troca com todos e com cada um; podem comunicar reconhecimento e afeto, ou ser basicamente olhares de vigilância e controle.

A relevância deste estudo é pautada na idéia de que o nível de motivação das crianças na aula procede da qualidade do fator afetivo na relação professor-aluno. Desta maneira, cabe expor também que a contribuição para com a auto-estima das crianças na aula pode ser relacionada com a sensibilidade do adulto, a capacidade de prestar atenção e interpretar adequadamente os sinais emocionais infantis, além do seu conhecimento sobre o desenvolvimento infantil. Tratou-se de uma busca por teorizar o aprendizado alcançado na análise dos dizeres e práticas de professores e alunos, para contribuir com os espaços de Educação Infantil.

4. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
O presente estudo privilegiou a pesquisa qualitativa que na visão de Minayo (2008) apresenta algumas vantagens, dentre as quais destacamos: permitir realizar análises que vão além de meras descrições, proporcionar interpretações de formas diferentes para os dados obtidos, permitir contato direto do pesquisador com o local de estudo e apresentar possibilidades de levar em conta os sentidos atribuídos pelos sujeitos pesquisados.
Para tanto, esta pesquisa foi norteada pela perspectiva metodológica do estudo etnográfico, visto que esse tipo de trabalho nos oferece vantagens, como as trazidas por André (2005, p.33) que enfatiza "a possibilidade de fornecer uma visão profunda e ao mesmo tempo ampla e integrada de uma unidade social complexa, composta por muitas variáveis", bem como a capacidade de descrição da realidade, sua facilidade de dar novos sentidos a situação estudada e por último, proporcionar maior preocupação com os participantes, através da aplicação de princípios éticos.
Os sujeitos desta investigação foram duas professoras e vinte e três alunos procedentes de duas turmas da Educação Infantil, de uma escola da rede municipal do Recife pertencente à Região Político Administrativa (RPA) 5. A escolha desta instituição se deu justamente pelo fato da escola oferecer o nível de ensino necessário para realização desta pesquisa, bem como pela facilidade de comunicação com a gestora e as professoras participantes deste estudo. Para identificá-los foi estabelecida uma nomeação para cada sala ? Turma A (TA) e Turma B (TB) ?, assim como para as respectivas docentes ? Professora A (PA) e Professora B (PB) ?, além de instituída a letra C de criança e uma numeração de 1 a 11 para as pertencentes à Turma A e de 1 a 12 para as pertencentes à Turma B, seguida da informação a qual turma compete. Exemplo: Criança 5 Turma A (C5TA).
Este estudo foi divido em três fases, a saber: "exploratória ou de definição dos focos de estudo; fase de coleta de dados ou de delimitação do estudo; e fase de análise sistemática dos dados e elaboração de relatórios", em concordância com Nisbett e Watts (1978, apud ANDRÉ, 2005, p. 47).
Na fase exploratória foi definido o tema, o problema da pesquisa e as unidades de análise. Em seguida foi realizado um levantamento bibliográfico acerca da necessidade de afetividade nas práticas de Educação Infantil, onde foram identificadas as diversas formas de compreensão dos autores a respeito do tema, fato que norteou a elaboração do nosso estudo.
No que concerne a coleta de dados, foram delimitadas as técnicas de pesquisa bem como os instrumentos necessários para obter informações que atendessem as características do estudo etnográfico.
Sendo assim, foi utilizada como técnica de investigação dez observações em turno integral, sendo cinco para cada turma, analisadas as ações das docentes para com os alunos dentro e fora da sala de aula, assim como, as reações das crianças em cada contexto, registradas em um diário de campo. A fim de coletar o inventário dos discursos das crianças, foram realizadas conversas informais com as mesmas, gravadas em áudio e posteriormente transcritas. E ainda, para perceber as concepções das docentes sobre o tema pesquisado e confrontar com a prática já observada, foi realizada com as professoras uma dinâmica de associação de palavras envolvendo afetividade.
Em se tratando da etapa de análise dos dados, na visão de André (2005) ela está presente em todo o percurso da pesquisa, entretanto, foi mais sistemática após a fase de coleta dos dados, onde foi realizada uma apreciação mais formal sobre os conteúdos das informações obtidas. Então, a partir dos dados coletados foram organizadas quatro categorias de análise, a saber: o estabelecimento dos vínculos afetivos na sala de aula; as concepções de afetividade e a sua disposição na transmissão dos conhecimentos; repercussões das atitudes das professoras no pensamento e expressões das crianças; e ainda, a afetividade e motivação como elementos indissociáveis da aprendizagem.
Por fim, na fase de elaboração do relatório, foram consideradas as observações de Minayo (2008) quando adverte sobre algumas das características que deve ter o pesquisador quando realiza um estudo etnográfico: tolerância à ambigüidade, sensibilidade e capacidade de comunicação. Para tanto, foi realizada uma discussão inicial que proporcionou a elaboração do relatório parcial, este foi submetido a uma análise critica que deu origem a confecção deste artigo.

5. ANÁLISE DE RESULTADOS
5.1 O estabelecimento dos vínculos afetivos na sala de aula
Para compreender a forma como laços afetivos são construídos na sala de aula, foram realizadas observações diretas em duas turmas do Grupo V, nas quais foi notado que eles apareceram bastante definidos, porém, com características antagônicas que variaram de acordo com o perfil das docentes responsáveis palas classes analisadas.
Na Turma A os traços afetivos apareceram em diferentes ações efetuadas pela professora. O relacionamento dela com os alunos apresentou-se de forma calma e tranqüila, com correções quando necessário, mas sem traços evidentes de agressividade em suas ações. Em quase todos os momentos a professora referia-se às crianças com palavras doces e carinhosas, principalmente nos momentos que antecederam as atividades. Fato que pode ser evidenciado através de um trecho de uma de suas falas:
- Vão sentar gatonas que já vamos começar a atividade. Vamos lá amores, guardando os brinquedos. (PA)

Este tipo de ação apresentada pela professora testifica a hipótese de Cunha (2008) ao assegurar que a prática docente necessita de uma maior dinâmica afetiva do professor para com os alunos, como resposta a compreensão da necessidade de mover-se em busca de soluções para as dificuldades apresentadas pelos mesmos.
Em contrapartida, na Turma B, foi percebido um relacionamento afetivo bastante conturbado na relação professor-aluno, gritos e ameaças eram ações constantes dentro da sala de aula. Aspectos que contribuíram para o desenrolar de rotinas bastante agressivas do ponto de vista das emoções.
Em determinado dia de observação, duas crianças encontravam-se na sala de aula, rindo muito. Então, a professora da Turma B olhou para elas e gritou com tom de ameaça: - Parem com isso meninas! Vou mandar vocês para diretoria. (PB)

Esse tipo de comportamento termina por refletir bastante no desempenho do grupo, que atua de acordo com os padrões de atitudes apresentados pela professora. Gritos eram comuns tanto da parte dela para com os alunos, quanto deles para com ela e entre si. Essas ações podem ser plenamente justificadas através da afirmação de Lindgren (1971, p.329), em conformidade com idéias já defendidas por Wallon, quando nos diz que: "O comportamento de um grupo de crianças pode ser fortemente modificado pelo tipo de liderança que recebem dos adultos. A personalidade do professor é também um fator importante para o tipo de clima que ele cria na sala de aula."
Com perfis diferentes, as professoras das duas turmas investigadas apresentaram atitudes em comum que foram percebidas ao longo dos dias de observação, como por exemplo, o ato de corrigir publicamente, exemplificado em duas situações, a saber:
Situação 1: Dispostas em fila, no hall principal da escola, as crianças da Turma A aguardavam o ritual de entrada (Oração). A professora se encontrava presente a frente da fila, quando identificou duas alunas conversando e brincando. Logo, olhou-as, segurou uma das meninas pelo braço, retirou-a da fila e falou em alto tom de voz: - Todo dia é a mesma coisa, você ainda não aprendeu que na fila tem que se ter respeito? Você agora vai ficar bem aqui na minha frente para eu poder olhar bem para essa sua carinha e ver se você ainda vai continuar a teimar, porque se continuar você já sabe o que vai acontecer. (PA)

Situação 2: Localizados na sala de aula, os alunos da Turma B estavam fazendo uma atividade, quando, por acidente um menino bateu com o lápis no braço de uma colega que começou a chorar. Diante da situação a professora perguntou gritando: - O que eu faço com você? Desse jeito você vai crescer um menino feio. (PB)

Diante do exposto, é possível perceber que ambas as docentes não souberam interagir afetivamente no momento de corrigir seus alunos, fazê-los refletir. O corrigir publicamente, principalmente na Educação Infantil, é uma ação que constrange e que intimida as crianças, é desfavorável à motivação, à aprendizagem e lhes causa traumas que poderão influenciar em sua vida adulta.
Outra atitude perceptível em ambas as docentes foi o fato de terem se demonstrado impacientes, sob desistência de educar. No caso da Professora A, esta desistência se aplicava especificamente a um fato isolado de aluno que não costuma se envolver nas atividades junto com o grupo. Já com relação à Professora B, a postura se sobrepunha a toda classe, em virtude dela não conseguir, muitas vezes, ter a atenção dos alunos. Eis duas situações presenciadas:
Situação 3: Na sala de aula, os alunos da Turma A copiavam uma atividade proposta no quadro e um menino encontrava-se sentado, agarrado a sua bolsa, pensativo, olhando para a porta. Observando-o a professora falou: - Acorda rapaz olha a atividade no quadro. Tu não tem jeito! Acorda para Jesus homem, nem parece que vive nesse mundo. Ai meu Deus, tem que ter muita paciência, porque esse ai é de outro mundo mesmo. (PA)

Situação 4: Ao terminar de explicar um assunto de Matemática, na Turma B, a professora percebeu a expressão confusa, olhar distante de algumas crianças que não perguntavam nada. Sendo assim, às questionou: - Você entenderam? Os alunos balançaram a cabeça que não. Então, ela os liberou para merendar, após ter comentado: - Eu imaginei. (PB)

O fato exemplificado na fala da Professora A, pode ser justificado a partir da verificação da ausência de compreensão dos sinais emocionais transmitidos pela criança. Para Oliveira (2008) o educador necessita reconhecer as suas próprias emoções, mas também as emoções alheias, pois ele precisa compreender o que se passa com a criança para poder melhor ajudá-la. O comportamento dessa criança pode ser explicado através do que Oliveira (2008, p.85) nos diz:
Algumas crianças tímidas demonstram também comportamento de medo, tais como falar diante de um grupo. [...] Do ponto de vista intelectual essas crianças são muitas vezes prejudicadas, pois constroem um mundo a parte da sala de aula.

Sendo assim, cabe ao professor proporcionar atividades que auxiliem na quebra do medo, da timidez e da inibição, ajudando-as no processo de construção do conhecimento bem como na vinculação de laços afetivos.
No que se refere unicamente à Professora B, além das particularidades já evidenciadas, foi possível reconhecer mais duas características específicas dessa docente: expressão da autoridade com agressividade e o não cumprimento da palavra.
Situação 5: Os alunos da Turma B estavam conversando, correndo e brincando na sala de aula, sem demonstrar interesse pela atividade proposta. Ao perceber a insatisfação das crianças, a docente gritou: Sentem! É prova! Quero ver quem não vai fazer?! (PB)

Essa expressão de autoridade com agressividade pode ser considerada como um reflexo da necessidade que a Professora B tem de controlar a turma, deixando um pouco de lado a aprendizagem como uma experiência muito pessoal. Fato que pode ser justificado através da afirmação de Lindgren (1971, p.335) quando nos diz que: "Em alguns professores há uma tendência a ficarem envolvidos nos detalhes de direção e controle da sala, como uma proteção contra o fato de se envolverem pessoalmente no processo de ensino e aprendizagem".
Situação 6: As crianças da Turma B conversavam, brincavam e não terminavam a atividade. Diante do ocorrido, a professora advertiu: - Só vai descer para a recreação quem mostrar o caderno com tudo feito. A seguir, olhando para o grupo disse: - Vamos descer, deixa para lá, amanhã vocês terminam. (PB)

O não cumprimento da palavra traz como conseqüência o descrédito, que favorece a insegurança das crianças em relação à pessoa que está a sua frente. Por vezes, a Professora B fez ameaças aos alunos, entre as quais: mandar para diretoria se eles não parassem de perturbar, enviar bilhetes para os pais caso não se comportassem, ou ainda, recusou alguns pedidos dos alunos de sair para beber água ou ir ao banheiro em momentos importantes para se prestar atenção na atividade que era explicada, porém, durante o estudo em questão, o cumprimento dessas advertências não era realizado e comumente as crianças saiam de sala. Todavia saber dar um não é uma forma de educar as emoções, desde que não se volte atrás com a palavra.
Ainda sobre a postura das professoras frente aos alunos, foi possível perceber a existência de dois modelos de atuação, são eles: modelo democrático e modelo permissivo. Sendo o primeiro aplicado exclusivamente a Professora A, enquanto que o segundo foi sobreposto ao perfil apresentado pela Professora B, como exemplificados em mais situações, a saber:
Situação 7: As crianças da Turma A, juntamente com a professora, foram até o pátio da escola ensaiar para uma coreografia. Antes de dar início à atividade, a docente falou: - A gente veio aqui para ensaiar uma dança para o dia do folclore, mas vocês não são obrigados a participar. Vocês decidem se vão querer participar ou não. Se for participar entra na roda e faz bonito, mas se não for participar pode ficar sentadinho ali, porque não vai poder ficar correndo não. (PA)

Situação 8: Em meio a uma atividade proposta na Turma B, muitos foram os pedidos para ir ao banheiro e beber água.Com a intenção de manter todas as crianças na sala, a professora não permitiu a saída de ninguém. Mesmo assim, um aluno saiu da sala... a docente o olhou, esperou que ele retornasse e então, falou: - Você pensa que está onde? E o garoto respondeu: - Na minha casa. Prontamente, a professora sentou em sua cadeira e ignorou a situação, enquanto outras crianças entraram e saíram da sala sem perguntar nada a ela.

Ao atuar de forma democrática, a Professora A promove a existência do diálogo em sala de aula, que favorece a reflexão, a tomada de decisão, a construção do conhecimento e perpassa reciprocidade na interação professor-aluno. Por outro lado, a postura permissiva da Professora B, na visão de Cunha (2008) cria no processo educativo uma falsa sensação de liberdade e de livre escolha. Porém, na realidade impede a promulgação da autonomia excluindo, assim, de forma pragmática o afeto nas relações de ensino e aprendizagem.

5.2 As concepções de afetividade e a sua disposição na transmissão dos conhecimentos
No intuito de perceber a concepção de afetividade apresentada pelas professoras das Turmas A e B, foi realizada uma dinâmica de associação de palavras, na qual foi pretendido relacionar termos ao tema estabelecido.
Como resultado, as docentes apresentaram certa compreensão acerca do tema, contudo, bastante diferenciada uma da outra, de forma que suas idéias apresentaram-se refletidas nas ações presenciadas no dia-a-dia da sala de aula, ao longo deste estudo. No quadro 1, estão dispostas as respostas prestadas pelas docentes, quando solicitadas que associassem palavras ao termo afetividade.
QUADRO 01
Respostas das Professoras A e B na Dinâmica de Associação de Palavras
PROFESSORA
A PROFESSORA
B

AFETIVIDADE COMPREENSÃO; AFETO
COMPANHEIRISMO; AMOR
LIBERDADE; INTEGRAÇÃO AMIZADE; ATITUDE
UNIÃO; LIBERDADE
SORTE; CUMPRICIDADE (Sic)

Com relação à Professora A, foi possível perceber que ela apresenta um conceito formado de maneira coerente com o real significado da palavra, e mediante as observações foi visto que apesar de alguns deslizes, a docente procura inserir esses elementos em sua prática pedagógica. Fato que reflete de forma bastante positiva no dia-a-dia da sala de aula. Como resultado da dinâmica, esta professora ofereceu uma opinião bastante ampla acerca da afetividade, ressaltando desde atitudes até um sentimento, que é justamente o reflexo dessas ações. A esse respeito, La Taille (1992, apud CUNHA, 2008, p.34) nos diz que: "O afeto é uma mola propulsora das ações, e a razão está a seu serviço. Ele medeia o registro das informações e as transforma em conhecimento."
Ao apontar a compreensão, a liberdade e a integração como características ligadas à afetividade, a Professora A, justifica a sua postura frente à turma a qual é responsável. A democracia, como já foi visto, é o modelo de atuação adotado por ela, fator essencial para um bom desempenho afetivo dentro da sala de aula. Não se pode dizer que há afetividade em uma sala que é autoritária ao invés de democrática. Cunha (2008, p. 83) nos afirma que: "A sala de aula representa para o professor a prática. A prática de sua condição acadêmica e afetiva." Para exemplificar a utilização dos conceitos afetivos adotados pela docente, eis um trecho retirado de uma das observações:
Situação 9: Na Turma A, uma criança disse à professora que estava com dor de cabeça e com dor na barriga. A docente logo abraçou a menina e disse: - Sente aqui e coma este biscoito, até esperar a hora da merenda chegar. Certo amorzinho. (PA)

Com essa atitude, a professora demonstrou o companheirismo, o afeto e o amor pela criança, fazendo uso de proximidade afetiva através da interação com a aluna. Proporcionando, assim, um suporte afetivo que deve ser o fio condutor das relações que acontecem na sala de aula. Pois de acordo com Saltini (2008, p.100) "A criança deseja e necessita ser amada, aceita, acolhida e ouvida para que possa despertar para a vida da curiosidade e do aprendizado".
No que se refere à disposição da afetividade na transmissão dos conhecimentos, foi possível perceber que a Professora A, no decorrer das atividades procurou fazer uso dos conceitos supracitados na difusão dos conteúdos para os alunos. Ao apresentar uma postura consciente, ela buscou promover uma integração entre as crianças e o meio, apresentando grande flexibilidade para atuar em torno desses elementos, como pode ser visto no exemplo a seguir:
Situação 10: Ao propor uma atividade na Turma A, a professora falou: - Vamos guardar os brinquedos, porque agora nós vamos fazer uma atividade com um joguinho. É para brincar com o jogo, mas ao mesmo tempo vão fazer uma atividade e aprender. (PA)

De acordo com Saltini (2008, p.106) a promoção de atividades que integram a criança ao ambiente é de importância fundamental. Pois nela
Não se criam bloqueios à atuação da criança, mas sim incita-se à pesquisa, criam-se situações em que ela se sinta desafiada e estimulada a buscar o conhecimento. Dá-se prioridade ao pensar, ligando o conhecimento tanto ao interesse quanto a projetos de ação sobre o mundo. Isso é o afeto expresso através da verdadeira liberdade de ação.

Sendo assim, foi identificado na Professora A, uma postura que deixa transparecer, o carinho, a compreensão e a preocupação por enxergar os seus alunos como seres que necessitam ser amados, aceitos e acolhidos na escola. Neste sentido, e como elemento facilitador e motivador da aprendizagem, segundo as perspectivas de Wallon, Galvão (2003, p.85) ressalta que: "[...] o êxito de um professor na sala de aula depende, em grande parte, da atmosfera que ele cria".
Em contrapartida, tendo analisado as respostas da Professora B, é perceptível certa incoerência na associação das palavras ao tema delimitado. Ao ligar termos antagônicos como união e sorte à palavra afetividade ela demonstra que ainda não formulou um conceito específico para o tema em estudo. Talvez, por este fator não tenha conseguido fazer uso da afetividade em sua prática pedagógica. A postura da Professora B, amplamente exemplificada ao longo desta pesquisa, pode ser justificada através da afirmação de Saltini (2008) quando considera que os educadores, muitas vezes parecem não entender como ocorre o desenvolvimento e como a cognição e a afetividade estão relacionadas nesse processo.
Outro ponto que vale destacar é que a Professora B apresenta uma falsa idéia de liberdade. Para ela, esta ação é sinônimo de permissividade, que como já foi visto, governa sua conduta em sala de aula. A esse respeito Saltini (2008, p. 25) nos adverte que: "A liberdade deixada à criança é sempre ilusória. [...] A excessiva e desvairada liberdade tanto escolar como familiar só promoverá uma insegurança quando não hostilidade e rebeldia."
Apesar de apontar a cumplicidade e amizade como elementos ligados a afetividade, estas ações foram pouco perceptíveis em suas atitudes. As interações conturbadas com as crianças, na sala de aula, não ofereceram espaço para o estreitamento dos laços afetivos, fator esse que deixou a desejar na qualidade das relações que foram estabelecidas no cotidiano escolar. De acordo com Saltini (2008, p.100):
O papel do professor é específico e diferenciado dos da criança. Ele prepara e organiza o microuniverso onde as crianças buscam e se interessam. A postura desse profissional se manifesta na percepção e na sensibilidade aos interesses das crianças que em cada idade diferem em seu pensamento e modo de sentir o mundo.

Dessa forma, podemos dizer que o uso da afetividade na transmissão dos conhecimentos para as crianças é quase inexististe na Turma B. O pouco conhecimento a respeito do impacto das emoções sobre o aprendizado e a motivação, acabou por justificar a postura permissiva da Professora B, os gritos, a falta de controle, a impaciência e desistência do ato de educar. Pois, ainda não há por parte dela uma concretude da necessidade de se introduzir o afeto nas relações que acontecem na sala de aula.

5.3 Repercussões das atitudes das professoras no pensamento e expressões das crianças
Mediante a compreensão das idéias de Wallon, de que a criança se desenvolve no espaço afetivo, tomando por base relações que estabelece com o meio no qual está inserida e com as pessoas que a cercam, buscou-se, inicialmente, identificar os sentimentos dos alunos das Turmas A e B a respeito do ambiente escolar. Para tanto, foram feitas às crianças as seguintes perguntas: "O que você mais gosta de fazer na escola? E o que você não gosta?".
Neste momento, o interesse não foi apenas obter citações de atividades desenvolvidas pelas crianças, mas sim perceber a forma como reagiam às indagações, pela expressão e comunicação.
Sendo assim, diante das respostas dos 11 alunos da Turma A, dois grupos puderam ser formados. O primeiro e o maior grupo com 9 crianças relacionou ações envolvendo aprendizagem como sendo preferência do que fazer na escola, em detrimento de outras.
Gosto de fazer trabalho e não gosto de brincar na escola. (C7TA)
Gosto de estudar Matemática. Não gosto de fazer trabalho em dupla. (C8TA)
Gosto de aprender. Não gosto quanto os meninos batem em mim. (C11TA)

As falas dos alunos da Turma A "C7", "C8" e "C11" caracterizam as respostas deste primeiro grupo, o qual expressou segurança, alegria, postura muscular relaxada e olhar tranqüilo ao comunicar-se. Com a mesma forma de reação à indagação, porém contrárias ao desejo de aprender, 2 crianças compõem o segundo grupo.
Gosto de lanchar. Eu não gosto de estudar. (C1TA)
Gosto de desenhar animais. Não gosto de estudar. (C9TA)

No que se refere aos alunos da Turma A é possível considerar como sentimento positivo ligado ao ambiente escolar, um alto índice de satisfação pelas atividades que lhes são propostas para aprendizagem, fato identificado tanto por meio das expressões verbais quanto das expressões não-verbais. Para melhor explicar esta última foi ponderado o que Chabot; Chabot (2008) dizem ao tratar as expressões não-verbais como sendo expressões faciais e corporais, afirmando ainda que as expressões faciais refletem as emoções sentidas por alguém.
Ainda sobre o que gostam ou não de fazer na escola, foram questionados os 12 alunos da Turma B, os quais foram divididos em três grupos a partir de suas respostas. O primeiro deles contendo 6 crianças, que associaram o que lhes agrada à ações que envolvem aprendizagem.
Gosto de fazer tarefa. Não gosto de brincar, eu brinco menos aqui. (C3TB)
Gosto de brincar, estudar e largar. Não gosto de ir pra o computador. (C5TB)
Gosto de tarefa, não gosto de perturbar. (C6TB)

Sendo assim, deve ser destacado que os discursos de "C3", "C5" e "C6" representam bem o primeiro grupo que mostrou uma postura confiante, falas enfáticas, bem como, gestos descontraídos. Ao contrário, outras 4 crianças da Turma B, as quais foram classificadas como o segundo grupo expressaram inibição e ansiedade, invertendo a resposta anteriormente dada demonstrando necessidade de agradar.
Gosto de estudar, brincar e recreio. Não gosto de fazer tarefa. (C1TB)
Gosto de estudar e brincar. Não gosto de fazer tarefa. (C2TB)

As falas dos alunos da Turma B "C1" e "C2" foram as respostas finais de ambas as crianças, uma vez que, no momento inicial "estudar" não fazia parte do que gostavam na escola. A respeito de suas posturas ao se expressarem, cabe destacar para caracterizá-las, o que afirma Oliveira (2008) ao tratar de inibição e timidez, quando a criança tímida tende a não olhar nos olhos do interlocutor, mantém o corpo curvado quando anda e/ou não ousa falar livremente.
Então, eis que 2 crianças formaram o terceiro grupo. Com espontaneidade e alegria expressaram não se sentirem atraídas pelo contexto vivenciado em sala de aula.
Gosto de perturbar. Não gosto de tarefa. (C8TB)
Gosto de brincar. Não gosto de ficar na sala. (C11TB)

No que tange a reação dos alunos da Turma B, a satisfação pela busca da aprendizagem teve menos representatividade se comparada à Turma A.
No intuito de compreender se os sentimentos já expostos sobre o que agrada e desagrada na escola, tem influência provinda da relação professor-aluno de cada turma, foi perguntado às crianças: "Você gostaria de passar um dia com sua professora fora da sala de aula? Quais as coisas que você mais gosta em sua professora? E o que não gosta?".
Como resultado das indagações, de 11 alunos da Turma A, 7 aceitaram passear com a professora, de forma entusiasmada, enquanto apenas 4 recusaram mediante motivos alheios à docente. Ainda desta turma, 7 crianças relacionaram gostar da professora por ela lhes passar ensinamentos, em contraposição de 2 crianças que citaram o ato da docente deixar brincar na sala, 1 criança comentou sobre a professora ter gestos afetivos e 1 criança não soube responder. Já sobre o que não gostam na docente, 6 alunos falaram do ato dela brigar, em detrimento de outras ações mencionadas por 4 alunos como não deixar recrear ou passar tarefa, além de 1 aluno que não soube responder.
Passearia... Sim. Gosto quando ela faz carinho e não gosto quando ela briga comigo. (C3TA)
Passearia... Sim. Gosto quando ela passa tarefa e não gosto quando ela briga comigo. (C11TA)
Passearia... Não, porque eu tenho vídeo game em casa aí eu fico apressado para ir embora. Gosto quando ela passa tarefa e não gosto quando ela grita alto. (C8TA)
Passearia... Não, porque minha mãe disse que não é para confiar nas pessoas. Gosto quando ela não passa tarefa, não gosto quando ela não deixa recrear. (C10TA)

Dentre as falas expostas, a de "C11" é a que mais denota a opinião da Turma A sobre a docente, reforçando a aceitação e empatia pelo que ela é e faz na sala de aula, como propostas de aprendizagem.
Da mesma forma, as indagações foram feitas aos alunos da Turma B e das 12 crianças, 6 responderam, convictas, positivamente quanto à passear com a professora, 4 crianças foram contrárias a idéia e 2 crianças timidamente disseram que sim depois de um certo tempo pensando e ainda sem ter certeza, uma vez que, ao repetirmos a pergunta expressavam não saber se queriam.
Ainda na Turma B, em se tratando do que gostam na docente, de 12 alunos, 5 fizeram referência a quando ela deixa-os livre para brincar, 3 alunos não souberam responder, 2 alunos citaram o fato dela passar tarefa, 1 aluno comentou sobre a professora ter gestos afetivos e 1 aluno valorizou o visual da docente. A respeito do que não gostam na professora, 8 crianças ressaltaram o fato dela brigar, gritar, colocar de castigo e mandar alunos para diretoria. Enquanto 3 crianças disseram não gostar quando ela passa tarefa e 1 criança não gosta quando ela leva para aula de computação.
Passearia... Sim. Gosto quando ela brinca com a gente. Não gosto quando ela briga. (C1TB)
Passearia... Sim. Quando ela faz carinho em mim é a coisa que eu gosto mais muito. Não gosto quando ela me bota de castigo, manda pra diretoria, aí quando eu chego em casa minha mãe mete o pau em mim.(Sic) (C4TB)
Passearia... Não, eu gosto dela, mas não queria ir. Gosto que ela faz tarefa pra mim. Não gosto que ela brigue com os coleguinhas todos. (C3TB)
Passearia... Não, porque ela não gosta de mim. A criança chorou bastante e não conseguiu responder sobre o que gostava na professora. Depois prosseguiu... Quando ela briga, eu não gosto. (C12TB)

Mediante as falas de "C1", "C4", "C3" e, sobretudo com a reação de "C12", ficou clara que a postura da professora ao repreender os alunos, seja por qualquer fator, é o agravante que interfere no relacionamento afetivo com a docente da Turma B e demonstra diminuição da motivação pelo desejo de aprender quando comparadas às crianças da Turma A.
Frente a este contexto, é possível dizer que a Professora B vai de encontro ao pressuposto desta pesquisa que concorda com Cunha (2008, p. 80) quando afirma que:
A professora ou professor é o guardião do seu ambiente. A começar pelos seus movimentos em sala, que devem ser adequados e gentis. A postura, o andar, o falar são observados pelos alunos que o vê como modelo. [...] Então, um bom ambiente para prática do ensino começa por ele, que canalizará a atenção do aprendente e despertará o seu interesse em aprender.

5.4 A afetividade e motivação como elementos indissociáveis da aprendizagem
A aprendizagem sugere normalmente uma interação do aluno com o meio, de forma que ele alcance e processe os estímulos que lhes são dados pelo professor. Para tanto, a busca pelo ato de aprender deve nascer de um interesse, de uma necessidade ou um desejo de alcançar uma meta. Deste modo, a motivação pode ser compreendida como uma intensificação e constância do comportamento.
Diante das observações e conversas informais desenvolvidas nas Turmas A e B, ficou clara a diferença do nível motivacional das crianças pelo desejo de aprender. Fato que pode ser explicado pela hipótese defendida neste estudo, de que a motivação está estritamente relacionada à emoção. Pois como ressalta Neves; Boruchovitch (2008, p. 125): "No contexto escolar, a motivação pode influenciar o modo como o indivíduo utiliza suas capacidades, além de afetar seu pensamento, comportamento social, emocional, aprendizagem e desempenho escolar".
Então, foi percebido que na Turma A, a postura democrática da professora por incentivar o diálogo, a proximidade afetiva em buscar detectar as emoções através da escuta (ainda que com falhas), o uso positivo das expressões não-verbais como um olhar que passa segurança, um sorriso, um gesto carinhoso, foram refletidos em emoções satisfatórias pela aprendizagem, demonstradas pelas crianças.
Em contrapartida, na Turma B, a postura permissiva da professora, na qual os alunos são observados, mas, não há imposição de limites, tendo ainda como agravante o não cumprimento da palavra, gera insegurança na criança. Ao exprimir autoridade com agressividade por meio do uso negativo de expressões verbais e não verbais, como alto tom de voz e o olhar fixo de descrédito para com as atitudes inesperadas dos alunos, sem posterior intervenção para auxiliá-los a tomar consciência de seus próprios bloqueios, também contribuíram para o conflituoso relacionamento professor-aluno presenciado no decorrer deste estudo. Assim como, estas atitudes posturais da docente configuraram maior falta de atenção, de participação e de iniciativa das crianças pelas atividades de aprendizagem.
De acordo com as perspectivas de Wallon, marco teórico deste estudo, as emoções têm como particularidade importante a contagiosidade entre os indivíduos. O entusiasmo de um docente em sala de aula mediante posturas adequadas, já citadas anteriormente no que concerne à Professora A, por exemplo, quando propõe uma atividade pode contagiar as crianças, que tenderão a ficar igualmente empolgadas pela aprendizagem. Por outro lado, muitas vezes a excitação constante, a alteração da voz excessiva pode criar um clima de alvoroço exemplificado nesta pesquisa pelo comportamento da Professora B, descontrole que necessita ser ajustado para que as crianças possam ser de fato motivadas pelas práticas de aprendizagem.

6. CONSIDERAÇÔES FINAIS
O presente estudo mostrou que a afetividade, em algumas situações, ainda não é compreendida como um elemento essencial à prática pedagógica. Nesse caso, faz-se necessário uma conscientização do profissional docente quanto ao seu papel fundamental no estabelecimento de relações afetivas com seus alunos. É preciso, sobretudo, que ele se identifique como um mediador e organizador do espaço, procurando promover, assim, a intervenção necessária à construção do conhecimento. Uma vez existente essa compreensão, foi possível perceber a diferença na qualidade da relação estabelecida entre o educador e o educando, bem como nas respostas apresentadas pelas crianças à motivação pelo ato de aprender.
Foi exposto, também, que no cotidiano escolar muitas são as expressões que deflagram ou não a afetividade. Momentos de carinho, compreensão, solidariedade atuam em contraste com situações de embates e desentendimentos entre professores e alunos. Cenas, essas, bastante corriqueiras em lugares que tratam com pessoas advindas de meios sociais diversos, com características e vontades distintas. Sendo assim, o campo da Educação Infantil não é diferente, pois a afetividade é uma dimensão que se encontra presente nos processos interativos vivenciados nas dinâmicas que ocorrem na sala de aula.
O diálogo estabelecido entre professor e aluno é fator importante no processo de aprendizagem, visto que forma laços afetivos que despertam o interesse e a motivação, levando os alunos a executarem suas tarefas com prazer. Pois, o ato de educar só terá sucesso se houver uma relação afetiva entre professor e aluno, caso contrário, a aprendizagem não será significativa e não preparará o indivíduo para uma vida futura, deixando lacunas no processo ensino-aprendizagem.
É inegável, portanto, a relação estabelecida entre a afetividade e a motivação no êxito da prática pedagógica na Educação Infantil, e conseqüentemente no despertar do desejo de aprender por parte da criança, uma vez que, elas se deixam envolver por determinadas atividades quando essas lhe causam satisfação, em contrapartida, quando lhe causam mal-estar as crianças as rejeitam.
Assim sendo, esta pesquisa incita a necessidade de se investir numa maior atuação junto aos professores da Educação Infantil, tendo em vista trabalhar a conscientização da importância do afeto para o desenvolvimento da criança, para que as posturas dos docentes sejam conscientes e a afetividade faça parte das relações estabelecidas na escola.

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