Amanda Valente de Oliveira**

SUMÁRIO:1. Introdução; 2. Das Provas; 3. As provas ilícitas a luz da reforma processual penal de 2008; 3.1. Relativização da vedação às provas ilícitas; 4. As interceptações Telefônicas e gravações clandestinas, 5. Considerações Finais; Referências.

RESUMO

Desenvolve-se, primeiramente, uma breve explanação acerca da provas, para depois se adentrar na questão das provas ilícitas. Posteriormente, discorre-se sobre o principio da proporcionalidade no que refere-se às provas ilícitas, em especial dois tipos delas: as interceptações telefônicas e as gravações clandestinas. .

PALAVRAS-CHAVES

Provas Ilícitas; Principio da Proporcionalidade; Interceptação telefônica e gravações clandestinas.

1. Introdução

O presente artigo abordará um dos temas mais complexos e discutidos no âmbito do Direito Processual Penal brasileiro que são as provas ilícitas. Ao abordarmos esse tema, será necessário fazermos um paralelo das provas ilícitas com o principio da proporcionalidade, pois não será suficiente expor apenas conceitos de provas ilícitas e suas limitações, sendo importante relativizar sua admissibilidade no processo, haja vista que deve-se atrelar para a segurança jurídica.
Trataremos também, especificadamente sobre as interceptações telefônicas e gravações clandestinas, que inicialmente são considerados meios de provas obtidos ilicitamente, porém que ao analisar-se com base no principio da proporcionalidade, poderão se tornar licitas em determinados casos.
2. Das Provas

A prova é o aparelho usado pelos sujeitos processuais para corroborar os fatos do feito, isto é, aquelas alegações que são deduzidas pelas partes como embasamento para o exercício da tutela jurisdicional (BONFIM, 2009).
Em outros termos, a prova possui o objetivo de ao reconstruir os fatos investigados no processo, trazer o maior grau de verossimilhança possível com os acontecimentos concretos. Fala-se em verossimilhança, pois é evidente que a obtenção da verdadeira realidade histórica é muito improvável, assim, para facilitar esta reconstrução dos fatos são disponibilizados pelo ordenamento vários meios de prova.
O artigo 332 do Código de Processo Civil dispõe: "todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste código, são hábeis para provar a verdade dos fatos, em que se funda a ação ou defesa".
Outrossim, em especial, no que tange ao processo penal brasileiro, não pode-se tratar a liberdade probatória ilustrada no artigo 332 como sendo absoluta, pois o nosso ordenamento não pode se conter aos abusos que possam vim a ser praticados, já que existem certos interesses mais relevantes (como os direitos que são assegurados constitucionalmente) do que a simples prova de um fato. Existe, pois, algumas limitações expressamente enumeradas.
O próprio Código de Processo Penal em seu atual artigo 155, parágrafo único, faz uma dessas limitações: "somente quanto ao estado das pessoas serão observadas as restrições estabelecidas na lei civil", em seu artigo 157 elucida sobre outra limitação, que é a vedação às provas ilícitas no ordenamento pátrio, vedação esta que é também garantida em nossa Constituição Federal em seu artigo 5º, LVI.
A atividade probatória é, abstratamente, dividida nas seguintes fases: a) proposição: é o momento em que a produção da prova é proposta, a partir da configuração dos fatos que constituam a lide penal; b) admissão: trata-se do momento em que a produção da prova é admitida pelo julgador; c) produção: constitui o momento em que determinado elemento da prova passa a integrar os autos do processo; d) apreciação: momento posterior à produção da prova, quando as partes se manifestarão, e o magistrado valorará e proferirá a decisão final acerca dos fatos probandos. (BONFIM, 2009)
Vale frisar que o juiz, na fase de apreciação, devido ao principio do livre convencimento motivado ou da persuasão racional, é livre na formação de seu convencimento, podendo optar pela prova que lhe pareça mais convincente. Todavia, são indispensáveis as fundamentações ou explicitações do juiz singular em sua decisão no que tange à utilização das provas, para que proporcione às partes insatisfeitas a capacidade de afrontar esta decisão.
No que pese às alterações causadas pela Lei 11.690/08, o magistrado não poderá motivar sua decisão exclusivamente nos elementos colhidos na investigação. Neste diapasão, o caput do artigo 155 do Código de Processo Penal elucida:
O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos normativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas.

Assim, com base no principio do contraditório e ampla defesa, sabendo-se que na fase investigatória o acusado ainda não manifestou sua defesa, não será coerente que juiz fundamente sua convicção, somente, com as alegações do autor do feito, haja vista que a intenção é garantir a segurança jurídica em nosso ordenamento, e também, o Estado Democrático de Direito.
Inclusive, a ampla defesa tem condão de em determinadas situações, possibilitar que as provas consideradas ilícitas se tornem admissíveis, caso estas sejam favoráveis na defesa do acusado. Neste sentido, o renomado doutrinador Eugênio Pacelli de Oliveira expõe:
Quando a obtenção da prova é feita pelo próprio interessado (o acusado), ou mesmo por outra pessoa que tenha conhecimento da situação de necessidade, o caso será de exclusão da ilicitude, presente, pois, uma das causas de justificação: o estado de necessidade. Mas mesmo quando a prova for obtida por terceiros sem o conhecimento da necessidade, ou mesmo sem a existência da necessidade (porque ainda não iniciada a persecução penal, por exemplo), ela poderá ser validamente aproveitada no processo, em favor do acusado, ainda que ilícita sua obtenção. E assim porque o seu não-aproveitamento, fundado na ilicitude, ou seja, com a finalidade de proteção do direito, constituiria um insuportável paradoxo: a condenação de quem sabe e se julga inocente, pela qualidade probatória da prova obtida ilicitamente, seria, sob quaisquer aspectos, uma violação abominável ao Direito, ainda que justificada pela finalidade originária de sua proteção (do Direito). (OLIVEIRA, 2009, p. 291).


No que tange o assunto supracitado, será melhor comentado em momento oportuno, pois, faz-se necessário antes transcorrer mais profundamente sobre as provas ilícitas, depois caminhar para a possibilidade de sua admissibilidade.

3. As provas ilícitas a luz da reforma processual penal de 2008

As provas ilícitas são aquelas que violam direitos e garantias individuais, além de afetar o próprio processo. No que diz respeito aos direitos individuais, se visa proteger os direitos à intimidade, à imagem e privacidade, além dos direitos à inviolabilidade do domicilio, todos assegurados constitucionalmente, ainda neste sentido, Eugenio Pacelli discorre:
Mais que uma afirmação de propósitos éticos no trato das questões do Direito, as aludidas normas, constitucionais e legal, cumpre uma função ainda mais relevante, particularmente no que diz respeito ao processo penal, a saber: a vedação das provas ilícitas atua no controle da regularidade da atividade estatal persecutória, inibindo e desestimulando a adoção de praticas probatórias ilegais por parte de quem é o grande responsável pela sua produção. Neste sentido, cumpre função eminentemente pedagógica, ao mesmo tempo que tutela determinados valores reconhecidos pela ordem jurídica. (OLIVEIRA, 2009, p. 303)


A doutrina do processo penal tem gerado discussões no que pese a uma diferenciação entre prova ilícita e ilegítima, alguns doutrinadores, inclusive, defendem suas teses de admissibilidade de prova ilícitas com base na relação que estas têm com a ilegítima, em outros termos, alguns acreditam que a prova só se torna inutilizada quando esta for também ilegítima. (BARBOSA, 2009)
As provas ilícitas são aquelas cuja obtenção viola os princípios constitucionais ou preceitos legais da natureza material, como exemplo: as provas obtidas por meio de tortura. Já as provas ilegítimas são aquelas que ferem as normas processuais, como exemplo: se o juiz for incompetente para a medida ou ocorrer a violação de requisitos legais necessários à interceptação telefônica. (BONFIM, 2009, p. 311).
Porém, com toda discussão já gerada (que foge ao limite deste trabalho) pensa-se que tal distinção só é pertinente para facilitar o entendimento dos momentos de obtenção, introdução, produção e valoração da prova, no que concerne às conseqüências jurídicas de nada tem utilidade. (OLIVEIRA, 2009, p. 324). Com intuito de facilitar mais ainda a compreensão do que foi comentado, se utiliza um exemplo com a chamada prova emprestada (prova obtida através de outra produzida em um processo diferente):
Em ação penal instaurada contra determinados réus, é possível, por exemplo, que, no caso de morte de uma testemunha, a acusação obtenha uma certidão de inteiro teor do depoimento por ela prestado em outra ação penal, envolvendo os mesmos fatos e outros acusados. Essa prova, assim, obtida, seria denominada emprestada, porque produzida em outro processo. Como se percebe, a sua obtenção seria inteiramente licita, não se podendo falar, ainda, em inadmissibilidade da prova. Todavia, a sua introdução no novo processo e, sobretudo, a sua valoração seria inadmissível, por manifesta violação do principio do contraditório [...] por isso, porque atingido o direito ao contraditório, tal prova não poderia ser utilizada contra os réus. (OLIVEIRA, 2009, p. 324)
Ou seja, no exemplo em tela há a prova licita, porém, devido à falta de contraditório, a prova se torna ilegítima, podendo, assim, ser decretada sua nulidade. Conclui-se que a prova ilícita e ilegítima, juntas ou separadas no mesmo feito, são em regra inadmissíveis no processo.
Ao se analisar o Código de Processo Penal, este não deixa claro taxativamente todos os meios de provas admissíveis, só dispondo os mais utilizados, outrossim, deve-se verificar em cada caso real se a prova utilizada pela parte fere ou não o ordenamento jurídico.
Vale ressaltar que quando não houver expressamente a vedação a um meio de prova, será mister averiguar acerca do resultado da utilização desta prova, a fim de se constatar se houve a violação de algum direito. Neste diapasão o ilustre, sempre em comento, Pacelli expõe:
A vedação a prova não ocorre unicamente em relação ao meio escolhido, mas também em relação aos resultados que podem ser obtidos com a utilização de determinado meio de prova. Uma intercepção telefônica, enquanto meio prova, poderá ser licita se autorizada judicialmente, mas ilícita quando não autorizada. No primeiro caso, a afetação (o resultado) do direito à privacidade e/ou intimidade é permitida, enquanto, no segundo, não, disso resultando uma violação indevida daqueles valores. (OLIVEIRA, 2009, p. 304).

Há, ainda, que se mencionar a prova ilícita por derivação, que refere-se a prova proveniente de uma prova ilícita. Esse tipo de prova ilícita é movida pela Teoria dos Frutos da Árvore Envenenada, que Rosmar Alencar e Nestor Távora explicam :
Por esta Teoria, de origem na Suprema Corte norte-americana, a prova ilícita produzida (arvore), tem o condão de contaminar todas as provas dela decorrentes (frutos). Assim, diante de uma confissão obtida mediante tortura, prova embrionariamente ilícita, cujas informações deram margem a uma busca e apreensão formalmente integra, é imperioso reconhecer que esta busca e apreensão está contaminada, pois decorreu de uma prova ilícita. Existindo prova ilícita, as demais provas dela derivadas, mesmo que formalmente perfeitas, estarão maculadas no seu nascedouro. Este é o entendimento inclusive, do Supremo Tribunal Federal. (ALENCAR; TÁVORA, 2009, p. 315).

O advento da Lei 11.690/08 consolidou no artigo 157 do Código de Processo Penal a teoria em comento. Entretanto esta teoria sofre algumas limitações, como: a limitação da fonte independente, a limitação da descoberta inevitável, a limitação da contaminação expurgada ou conexão atenuada.
A prova independente se refere às provas obtidas sem a contribuição da ilícita, não havendo o nexo de causalidade, acabando por se torna admissível, o parágrafo 1º do artigo 157 do Código de Processo Penal esclarece sobre o assunto. No que concerne à descoberta inevitável é quando a prova ilícita dá ensejo para que seja descoberta outra prova, mas prova esta que acabaria por ser colhida por outro meio que não fosse o ilícito. E finalmente, a limitação da contaminação expurgada é quando a prova ilícita e a derivada possuam um vinculo tênue que acabe por não ser contaminada. (ALENCAR, TÁVORA, 2009, p. 316)

Assim essas teorias decorrentes afastam a possibilidade de transformar injustamente uma prova que deveria ser licita em ilícita
Sem mais delongas, tratar-se-á sobre a possibilidade de aproveitamento da prova considerada ilícita inicialmente.

3.1 Relativização da vedação às provas ilícitas

As provas ilícitas em determinadas situações podem se tornar utilizáveis no processo, assumindo a licitude. Isto se deve ao fato de que nossa vida em sociedade é envolvida por vários princípios garantidores de direitos, princípios estes que muitas vezes acabam por entrar em colisão, então se torna necessário sopesar qual direito deve ser garantido em um caso concreto, pois é sabido que não existe hierarquia entre os princípios. Outrossim, é neste quadro que o principio da proporcionalidade se torna de grande relevância.
O principio da proporcionalidade foi amplamente utilizado na Alemanha do pós-guerra, sob o argumento de que nenhuma garantia constitucional é absoluta, podendo ceder em situações excepcionais, quando se conclui por priorizar um principio de maior relevância social em detrimento de outro, de menor valor (PRADO, 2009, p. 31).

Dentre as provas ilícitas que se tornam admissíveis no processo devido ao principio em explanação, pode se utilizar as ilustrações do doutrinador Paulo Rangel (que na verdade muito se assemelha aos comentários do doutrinador Pacelli, já elencados no primeiro tópico deste trabalho):
É admissível prova colida com (aparente) infringência às normas legais, desde que em favor do réu para provar sua inocência, pois absurda seria a condenação de um acusado que, tendo provas de sua inocência, não poderia usá-las só porque (aparentemente) colhidas pelo arrepio da lei. Afirmamos ser aparente a infrigência da lei por entendermos que o estado de necessidade exclui a ilicitude, pois a necessidade de salvar o interesse maior (liberdade de locomoção), sacrificando o menor (sigilo das comunicações telefônicas) em uma situação não provocada de conflito extremo, justifica a conduta do réu. Estará ele (réu) agindo de acordo com o direito e não de forma contrária. (RANGEL, 2009, p. 439)


Destarte, percebe-se que quando favorável ao réu (pro reo) a prova ilícita poderá ser admitida, haja vista que é um assunto pacificado em nosso ordenamento, porém existe uma discussão bastante divergente no que tange à utilização do principio da proporcionalidade em favor da sociedade (pro sociatate), ou seja, quando é priorizada a defesa de um todo no lugar da do acusado. Em linha favorável a este ultimo caso, elucida Fernando Capez:
Entendemos que o principio da proporcionalidade deve ser também admitido pro sociatate, pois o confronto que se estabelece não é entre o direito ao sigilo, de um lado, e o direito da acusação à prova, do outro, Trata-se de algo mais profundo. A acusação, principalmente a promovida pelo Ministério Público, visa a resguardar valores fundamentais para a coletividade, tutelados pela norma penal. Quando o conflito se estabelecer entre a garantia, o sigilo e a necessidade de se tutelar a vida, o patrimônio e a segurança, bens também protegidos por nossa Constituição, o juiz, utilizando de seu alto poder de discricionariedade deve sopesar e avaliar os valores contrastantes envolvidos. Suponhamos uma carta apreendida ilicitamente, a qual seria dirigida ao chefe de uma poderosa rede de narcotráfico internacional, com extensas ramificações com o crime organizado. Seria mais importante proteger o direito do preso ao sigilo de sua correspondência epistolar, do qual se serve para planejar crimes, do que desbaratar uma poderosa rede de distribuição de drogas, a qual ceifa milhões de vidas de crianças e jovens? Certamente não. Neste sentido, interessante acórdão do STF: "A administração penitenciaria, com fundamento em razões de segurança publica, pode, excepcionalmente, proceder à interceptação da correspondência remetida pelos sentenciados, eis que a clausula da inviolabilidade do sigilo epistolar não pode constituir instrumento de salvaguarda de praticas ilícitas" (STF, HC 70.814-5, rel Min. Celso de Mello, DJU, 4 jun. 1994, p.16.649). A prova, se imprescindível, deve ser aceita e admitida, a despeito de ilícita, por adoção ao principio da proporcionalidade, a qual deve ser empregada pro reo ou pro sociatate. Ressalvamos apenas a pratica de tortura, a qual, por afrontar normas de direito natural, anteriores e superiores às próprias Constituições, jamais podem ser admitidas, seja para que fim for. (CAPEZ, 2008, p. 269)

Já os autores Rosmar Alencar e Nestor Távora acreditam somente na possibilidade da utilização do principio favorável à sociedade em situações excepcionais:

[...] Admitindo, em ultima ratio, a utilização da prova ilícita além da tutela do réu, o magistério de Denilson Feitoza Pacheco, entendendo que "em situações extremas e excepcionais se pode admitir a utilização de prova ilícita pro sociatate, pois, do contrario, o Estado estaria sendo incentivado a violar direitos fundamentais, o que iria frontalmente contra a própria noção de provas ilícitas, que foram originariamente idealizadas e instituídas exatamente para dissuadir o Estado de violar direitos fundamentais. O principio da legalidade, por sua vez, também não se prestaria a esse intento, pois sua função precípua de defesa é a de garantir direitos fundamentais em face do Estado e não o contrário. (ALENCAR; TÁVORA, 2009, p. 322).

Feita esta breve anotação sobre o principio da proporcionalidade aplicado às provas ilícitas, entrar-se-á no estudo de dois tipos de provas em espécie, qual sejam: as interceptações telefônicas e as gravações clandestinas.

4. As interceptações Telefônicas e Gravações Clandestinas

A interceptação consiste no ato de intervir nas comunicações telefônicas, impedindo sua transmissão ou possibilitando a terceiros o acesso ao conteúdo. Lembra-se que para a interceptação se concretizar não precisa existir a gravação, o mero fato de escutar já configura. (PRADO, 2009, p. 41).
Vale frisar a diferença entre gravação clandestina e interceptação telefônica, na primeira uma das partes possui o conhecimento da gravação, já na interceptação nenhuma das partes envolvidas no ato tem consciência.
Tanto a interceptação como a gravação clandestina são provas obtidas ilicitamente, porém, existem casos em que se tornam aproveitáveis. Para que ocorra a admissibilidade dessas provas é necessário que estejam presentes situações de relevância jurídica no caso concreto, como a utilização desses meios para a defesa. Outrossim, um julgado do STF se posicionou neste sentido:
GRAVAÇÃO DE CONVERSA FEITA POR UM DOS INTERLOCUTORES: LICITUDE. PREQUESTIONAMENTO.
Súmula 282- STF. I. - A gravação de conversa entre dois interlocutores, feita por um deles, sem conhecimento do outro com a finalidade de documentá-la, futuramente, em caso de negativa, nada tem de ilícita, principalmente quando constitui exercício de defesa.

No que tange à interceptação telefônica, a nossa atual redação da Constituição Federal em seu artigo 5º, inciso XII elucida:
É inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no ultimo caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelece para fins de investigação criminal ou instrução processual penal (grifo nosso).


Além disto, com advento da Lei nº 9296/96 o legislador fixou os casos em que não cabem a interceptação telefônica:

Art. 2º da Lei n.º 9296/96 ? Não será admitida a interceptação de comunicações telefônicas quando ocorrer qualquer das seguintes hipóteses: I ? não houver indícios razoáveis da autoria ou participação em infração penal; II ? a prova puder ser feita por outros meios disponíveis; III ? o fato investigado constituir infração penal punida, no mínimo, com pena de detenção.
Parágrafo único. Em qualquer hipótese deve ser descrita com clareza a situação objeto da investigação, inclusive com indicação e qualificação dos investigados, salvo impossibilidade manifesta, devidamente justificada.

Então, entende-se que a interceptação telefônica poderá ser utilizada quando autorizada judicialmente e quando não cometer as vedações do artigo supracitado.
O prazo máximo da interceptação será de 15 dias, podendo ser prorrogável por mais 15 dias, porém tem-se entendido que poderão haver sucessivas prorrogações, com o argumento de que por muitas vezes é indispensável este meio de prova a fim de corromper um crime. Mas necessário será sopesar esse limite de tempo, para que não haja extrema violação de direitos do individuo atingido pela interceptação. Neste sentido o STJ se manifestou:
INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA. AUTORIZAÇÕES SUCESSIVAS.
Trata-se de habeas corpus em que se pugna pela nulidade ab initio do processo penal, visto que sua instauração deu-se com base em provas ilícitas, ou seja, decorrentes de interceptação telefônica cuja autorização foi sucessivamente renovada e os investigados, ora pacientes, foram assim monitorados por um prazo superior a dois anos. A Turma entendeu que, no caso, houve sim violação do principio da razoabilidade, uma vez que a Lei nº 9.296/1996, no seu artigo 5º, prevê o prazo de 15 dias para a interceptação telefônica, renovável por mais 15, caso seja comprovada a indispensabilidade desse meio de prova. Assim, mesmo que fosse o caso de não haver explicita ou implícita violação desse dispositivo legal, não é razoável que a referida interceptação seja prorrogada por tanto tempo, isto é, por mais de dois anos. Ressaltou-se que, no caso da referida lei embora não esteja clara a hipótese de ilimitadas prorrogações, cabe ao juiz interpretar tal possibilidade. Contudo, dada a natureza da norma que alude à restrição de liberdade, o que está ali previsto é uma exceção à regra. Se o texto legal parece estar indeterminado ou dúbio, cabe a esta Corte dar à norma interceptação estrita, face a sua natureza limitadora do direito à intimidade, de modo a atender ao verdadeiro espírito da lei. Com isso, concedeu-se a ordem de habeas corpus a fim de reputar ilícita a prova resultante de tantos dias de interceptações telefônicas, e consequentemente, declarar nulos os atos processuais pertinentes e retornar os autos ao juiz originário para determinações de direitos .

Outra interessante questão diz respeito às gravações de diálogos realizados em lugar público, pois muito se tem entendido no sentido de admitir essas provas como licitas (PRADO, 2009, p. 62).
Ainda neste sentido, o STF explanou: "Utilização como prova, de gravação de dialogo transcorrido em local publico, sem estar em causa a proibição constante do inciso XII do art. 5º da Constituição, ocorrendo ademais- fora dessa gravação- elementos probatórios suficientes para fundamentar a condenação".
Em suma, baseando-se no principio da proporcionalidade, entende-se que a interceptação telefônica e gravação clandestina obtidas ilicitamente poderão se tornar licitas, se atenderem todas as razões supracitadas no trabalho. Ainda neste raciocínio:
Caberá à doutrina dar-lhe a melhor exegese, e à jurisprudência a melhor aplicação, com os olhos sempre voltados ao crucial conflito entre as exigências da segurança e os direitos da defesa, buscando o ponto de equilíbrio que harmonize a necessária luta contra a criminalidade com os valores de um processo penal respeitoso da dignidade humana. (MENDONÇA, 2008).

Assim, o principio da proporcionalidade deve ser utilizado como um critério hermenêutico indispensável na realização do Direito.

5. Considerações Finais

Ante o exposto, conclui-se que as provas são peças fundamentais para o andamento e para um justo julgamento do processo e mais fundamental ainda é a maneira com a qual elas são produzidas, pois provas produzidas de maneiras ilícitas ferem direitos e garantias individuais asseguradas pela nossa constituição, porém será relevante analisar-se o caso concreto, para determinar em certas situações qual direito possui maior relevância e qual principio deve ser tomado como prioritário, para que não cometa-se atrocidades a mando da má interpretação da lei.
Assim, as interceptações telefônicas e as gravações clandestinas não são meios de provas tidos absolutamente como ilícitos, podendo sofrer uma flexibilização com a realidade.

REFERÊNCIAS



ALENCAR, Rosmar Rodrigues, TÁVORA, Nestor. Curso de direito processual penal. 3ª ed. Bahia: Editora JusPodivim ,2009.

BARBOSA, José Olindo Gil. As provas ilícitas no processo brasileiro. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=8417.> Acesso: 29/04/2009.

BONFIM, Edilson Mougenot. Curso de Processo Penal. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 15 ed., São Paulo: Saraiva, 2008.

MENDONÇA, André Luiz Nossa E. Das provas obtidas por meios ilícitos: interceptação telefônica. Disponível em: <http://www.jurisway.org.br/v2/dhall.asp?id_dh=771>. Acesso: 3/05/2009

OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal. 11ª edição; Rio de Janeiro: Lúmen Júris. 2009.

PRADO, Leandro Cadenas. Provas ilícitas- teoria e a interpretação dos tribunais superiores. 2ªedição. Niterói: Editora Impetus, 2009.

RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 16ª ed. Rio de Janeiro: Editora LúmenJuris, 2009.

STJ HC 76.686/PR relator Ministro Nilson Naves votação unânime julgado em 09/09/2008 publicação DJ 10/11/2008

STF,Al 503.617 AgR/PR, relator Ministro Carlos Velloso, publicação DJ 04/03/2005. Disponível em: <http://br.vlex.com/vid/41539240>. Acesso:3/05/2009

STF, HC 74.356/SP, relator Ministro Octavio Gallotti, publicação DJ 25/04/1997. Disponivel em: < http://www.jfrj.gov.br/noticias/anexos/2003.5101505703-2.pdf>. Acesso: 24/05/2009