As políticas públicas de esporte, os Megaeventos esportivos e a Educação Física escolar: relações de tensão entre os objetivos propostos.

 

 

 

Monografia a ser apresentada como Trabalho

de Conclusão do curso de Pós Graduação em

Educação Física Escolar.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Rio de Janeiro

2014

 

BRUNO INOCENCIO VICENTE

 

 

 

 

 

As políticas públicas de esporte, os Megaeventos esportivos e a Educação Física escolar: relações de tensão entre os objetivos propostos.

 

 

 

Trabalho de conclusão de curso apresentado à Universidade Estácio de Sá como exigência parcial ao Título de Pós graduado em Educação Física Escolar.

 

 

Aprovado em __/__/___

BANCA EXAMINADORA

 

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Resumo

 

Os grandes eventos estão na iminência em nosso pais e com ele o poder público vem implementar diversos programas esportivos, visando a formação de atletas através da formação de base, ou seja: a escola. Por tanto o estudo veio analisar através das principais obras que inauguraram as abordagens da Educação Física escolar o anacronismo entre os objetivos propostos pelas mesmas e os que são divulgados pelo poder público. Através de discursos um tanto duvidosos quando analisados a luz de sua prática e por ventura da época em que os mesmo foram lançados é possível entender os reais interesses que estão por trás desses projetos esportivos. Compreendendo os objetivos, conteúdos e metodologias que divulgam as diferentes abordagens e o consenso pela superação do modelo que imperou por décadas nas quadras de nosso pais, em que o esporte era o conteúdo hegemônico da disciplina e a metodologia adotada nas aulas era a tradicional. Para tanto a luz desses abordagens é possível analisar de forma crítica os programas esportivos do governo federal e os megaeventos, questionando seus pontos contraditórios e somente assim sendo possível instrumentalizar nossos alunos a exigirem do poder público os reais legados dos Megaeventos e que os projetos esportivos ofereçam a prática esportiva nas suas diferentes dimensões, cabendo ao praticante escolher qual quer praticar. Caso isto não ocorra, podemos ter um retrocesso histórico, voltando a Educação Física escolar a servir aos interesses escusos, que em outros momentos da história, não foi a favor da maioria, mas sim de uma minoria escolhida através das suas habilidades técnicas para determinados esportes. 

 

Palavras chaves: Abordagens transformadoras, Megaeventos, Políticas Públicas

 

 

 

 

 

 

 

Abstrat

 

Great events are on the verge in our country and with it the government has implemented various sports programs for the training of athletes through basic training , ie the school . Therefore the study came through analyzing major works which inaugurated the approaches of Physical Education anachronism among the proposed goals for them and those that are disclosed by the government . Through speeches somewhat dubious when analyzed in light of their practice and perchance the time when it was launched is possible to understand the real interests . Understanding the objectives , contents and methods that present the different approaches and consensus by overcoming the model that prevailed for decades in the courts of our country , where the sport was content hegemonic discipline and methodology was adopted in the traditional classes . For both the light of these approaches is possible to analyze critically the athletic programs of the federal government and mega events , criticizing their points contradictory and therefore can only equip our students require the government the real legacy of the games and sports projects that offer the sport in its different dimensions , leaving the practitioner to choose which to practice. If it does not , we have a historic setback , going back to school physical education to serve the interests of those interests , which at other times was not in favor of the majority, but a minority chosen through their technical skills for specific sports.

Keywords: transformational approaches, Mega Events, Public Policy

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Dedicatória

A minha esposa, pela força que me dá para realizar todos meus objetivos...

Aos meus pais, por ter feito o possível e o impossível para poderem me educar da melhor forma possível...

A Deus, por me dar clareza e sabedoria para realizar este trabalho.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Agradecimentos

 

A Carla Viana de Azevedo Campos, pelos conselhos e contribuição para elaboração deste trabalho e também aos professores do curso de Pós graduação em Educação Física escolar da UNESA.

E acima de todos, a Deus.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Epígrafe

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

                                                                                                                          

 

 

“O povo que esquece sua história está condenado a repeti-la”

                                                                                         George Santayana

Sumário

1.Introdução..................................................................................................11

2.Revisão de Literatura.................................................................................14

2.1Panorama da Educação Física antes da década de 80..........................14

2.2Panorama da Educação Física pós década de 80..................................16

2.3.Abordagens transformadoras da Educação Física escolar....................17

2.3.1 Psicomotricidade.................................................................................17

2.3.2 Desenvolvimentista.............................................................................18

2.3.3 Construtivista-interacionista................................................................19

2.3.4 Crítico-superadora...............................................................................20

2.3.5 Crítico-emancipatória...........................................................................21

2.3.6 Parâmetros Curriculares Nacionais.....................................................23

3.As Políticas públicas de esporte e a Educação Física escolar..................24

4.Metodologia................................................................................................26

5.Resultados..................................................................................................28

6.Conclusão...................................................................................................32

7.Referências.................................................................................................35

1.INTRODUÇÃO

O papel da Educação Física na escola é de suma importância na formação integral do educando. A Lei de Diretrizes e Bases da educação nacional em seu artigo 26 inciso 3º cita o seguinte:

“§ 3º. A educação física, integrada à proposta pedagógica da escola, é componente curricular da Educação Básica, ajustando-se às faixas etárias e às condições da população escolar, sendo facultativa nos cursos noturnos.” (LDB 9394/96)

 Porém esta mesma lei deixou lacunas sobre a obrigatoriedade da disciplina na Educação Básica, sendo então, em 2003, alterada a redação, incluído posteriormente ao termo componente curricular a palavra obrigatória, ficando da seguinte forma: “A educação física, integrada à proposta pedagógica da escola, é componente curricular obrigatório da educação básica.” (LEI Nº10.793/2003).

Os avanços conquistados com a Lei 9394/96 em seu § 3º e com sua alteração através da Lei 10.793/2003 não foi por acaso. Muito se deve a resistência dos professores de Educação Física que desde o final dos anos 70 e início dos anos 80 criticavam os modelos e os métodos de ensino adotados nas aulas de Educação Física Escolar e por interesses políticos que serão evidenciados no estudo.

A concepção tecnicista predominava até a década 80, os conteúdos das aulas de Educação Física eram os esportes e os estudantes da época eram selecionados por sua habilidade em determinados desporto. Nesta época a Prefeitura de São Paulo através da sua Secretaria de Educação criou a resolução de 18 de Fevereiro de 1971 que foi introduzida na rede de ensino de 1º e 2º grau. Com esta lei, foi criada a possibilidade das “Turmas de Treinamento”, dessa forma a secretaria de Educação de São Paulo fez surgir duas formas de Educação Física escolar, uma destinada às elites, ou seja, aos alunos que possuíam algum conhecimento prévio de determinado desporto e que deveriam integrar as Turmas de Treinamento e outra com os alunos não iniciados desportivamente e que ficavam destinados as turmas normais de ginástica.

   A transformação na Educação Física Escolar se deu em um momento oportuno, em meados dos anos 80 o país passava por um processo de redemocratização. Artistas, intelectuais e sociedade civil buscavam o fim da Ditadura Militar e a possibilidade de eleições diretas para Presidente da república. Impulsionada pelas mudanças sociais, políticas e educacionais, a Educação Física brasileira, iniciou suas críticas aos moldes tecnicistas que permeavam o ambiente escolar brasileiro e a inclusão de todos os estudantes nas aulas de Educação Física Escolar e não só mais aqueles que possuíam uma iniciação prévia ao desporto, buscava-se uma Educação Física Escolar para todos. A Educação Física que pretendia atender a toda população escolar, fez com que surgissem novas propostas pedagógicas de cunho critico, que em oposição ao modelo tecnicista, buscavam um referencial teórico de cunho sociológico, antropológico e cultural podendo assim contribuir de forma eficaz na formação do cidadão pleno. A Educação Física não queria mais servir de inocente útil, mas sim como disciplina importante na formação de cidadãos críticos, emancipados e autônomos.

Assim, em oposição à vertente mais tecnicista, esportista e biologicista, surgem novos movimentos na Educação Física escolar a partir, especialmente, do final da década de 70, inspirados no novo momento histórico social por que passaram o País, a Educação e a Educação Física. (DARIDO, 2005, p.5.)

Com o fim da Ditadura Militar e a maior abertura política em nosso país, professores puderam ter acesso livros, artigos e cursos de Pós graduação Latu Senso e Stricto Senso fora do Brasil. Muitos puderam ter contato com concepções de cunho transformador e trouxeram de volta toda essa bagagem renovada e transformada sobre a Educação e a Educação Física escolar. Com essa nova roupagem que foi trazida através de intercâmbios acadêmicos, somada ao desejo de mudança que passava a sociedade e a Educação Física, surgem novas propostas que buscavam superar todo modelo ultrapassado e excludente que viveu a Educação Física escolar por séculos.

As novas abordagens da Educação Física escolar vieram romper com o Status quo que vivia a Educação Física na época. Por ser o Esporte capaz de mobilizar grandes massas, a Educação Física foi utilizada como arcabouço da ideologia dominante, servindo de inocente útil ao processo de analgesia da população. No ambiente escolar, imaginava-se que um estudante extenuado por aulas voltadas para o treinamento desportivo, faria com que esse cansaço não permitisse que os mesmos se envolvessem em movimentos populares.

A ideia-força de ênfase na Educação Física era a seguinte: o estudante, cansado e enquadrado nas regras de um esporte, não teria disposição para entrar na política. Esta ideia, aliás, adaptada de outra que os militares desenvolveram para os recrutas e os alunos das escolas militares. (GHIRALDELLI, 2004, p.42)

Por ser o Esporte um fenômeno de massa capaz de servir como importante ferramenta manipulativa para determinados momentos da história este, sempre que necessário é manipulado a favor de quem o interessa. Foi assim durante a Olimpíada de Berlin-1936, onde Adolf Hitler queria demostrar a superioridade da raça Ariana através de conquistas expressivas no esporte e fazer dos jogos propaganda de seu governo Nazista. Foi assim também no Brasil, quando os militares tomaram o poder e fizeram do esporte sustentáculo ideológico de seu governo. Muito se investiu no esporte e na Educação Física nesta época. Avanços biomecânicos e fisiológicos foram imensos e a performance levada ao extremo, a instituição escolar também sofreu com esse avanço, a escola passou a ser um celeiro para descoberta de talentos e os professores de Educação Física técnicos especialistas em determinadas modalidades.

Baseado na história que viveu o esporte no mundo e no Brasil, a forma como o mesmo chegou as Escolas brasileira através do micróbio maligno da Educação Física Competitivista e os ranços que deixaram esta época obscura para a Educação Física escolar. É preocupante a forma como o governo vem incentivando a pratica esportiva nas escolas, vários programas ganharam força após a escolha do Brasil como sede da Copa do Mundo de Futebol 2014 e os Jogos Olímpicos de verão 2016. Muitos desses, de incentivo a descoberta de talentos na escola vão de encontro as propostas que as abordagens transformadoras da Educação Física escolar trouxeram e trazem até hoje, a formação global do educando, possibilitando aos mesmos o acesso ao acervo de representações de movimentos que o homem tem produzido e acumulado ao longo dos anos e que é por direito o acesso de todos a essa “Cultura Corporal de Movimento” (PCN’s,1998).

Portanto é de suma importância nos dias atuais o entendimento dos fatores que levaram ao surgimento das principais abordagens transformadoras da Educação Física escolar brasileira, suas relações com as políticas públicas de esporte e com os megaeventos , podendo assim ser traçado um paralelo com as causas que levaram a adoção do modelo tecnicista, com o atual momento esportivo que vive nosso país, e compreender as motivações que levaram ao surgimento das principais abordagens transformadoras da Educação Física escolar brasileira, dessa forma podemos nos posicionar de forma crítica em relação a formação de atletas, sobre os reais interesses das políticas públicas voltadas para o esporte e os legados que e megaeventos podem vir a deixar para o país.

2.REVISÃO DE LITERATURA

 

Muitas abordagens nos dias atuais nos auxiliam no cotidiano escolar. Estas inauguraram uma nova fase da Educação Física no âmbito educacional, hoje temos uma teoria que embasa e qualifica nossa atuação prática, além disso, a Educação Física vai ao encontro dos objetivos principais da educação, que é a formação do cidadão que atue de forma crítica e consciente na sociedade que este está inserido.

Partindo destes afirmações o estudo revisitará as principais abordagens transformadoras da Educação Física escolar. A escolha destas, se deu através da relevância que as mesmas tiveram e tem até os dias atuais e pela contribuição efetiva e eficaz na mudança do panorama que perdurava nas décadas de 70 e 80.

2.1 PANORAMA DA EDUCAÇÃO FÍSICA ANTES DA DÉCADA DE 80.

 

No contexto anterior as décadas de 70 e 80, mas especificadamente por volta de 1851, ocorreu a introdução da Educação Física na escola, com a reforma de Couto Ferraz, embora a preocupação com a inclusão de exercícios físicos, na Europa, vinha deste o século XVIII, com Guths Muths, J.J. Rousseau, Pestalozzi e outros.

Em reforma realizada, por Rui Barbosa conhecido como o “Palatino da Educação Física” em 1882, houve a recomendação para inclusão da Ginástica obrigatória, para ambos os sexos e nas Escolas Normais. Contudo, a implantação de fato, dessas leis só se concretizou no Rio de Janeiro, até então a capital da Republica e nas Escolas Militares. Segundo Betti,1991: É apenas a partir de 1920 que vários estados da federação começaram a realizar suas reformas educacionais e incluem a Educação Física, com o nome mais frequente de ginástica.

De 1920 até as décadas de 70 e 80 a Educação Física passou por várias transformações. Foi responsável pela assepsia social, quando tinha por fundamentos os pensamentos liberais do início do século XX, sendo a promotora da saúde individual e coletiva sendo considerada redentora da sociedade, podendo a mesma resolver o problema de saúde pública que pairava nos finais do Império e na Primeira República.

Passamos também por responsáveis pela formação do “cidadão-soldado”, capaz de obedecer cegamente e de servir de exemplo para o restante da juventude pela sua bravura e coragem. Seguidora de ideias Fascistas, destacava o papel da Educação Física e do Desporto na formação do homem obediente e adestrado.         

                        De acordo com Filho (1958, apud GHIRALDELLI, 2004, p.26):

O estádio como quartel, desperta o sentimento da obediência às regras das operações; adestra a capacidade aplicada ao raciocínio e à decisão: remarca o cunho da solidariedade e aprofunda os laços de respeito ao valor, à autoridade e ao dever.

 Por volta de 1945 até 1964, a Educação Física voltou-se aos objetivos educacionais. Inspirada assim como a Educação Física Higienista no pensamento Liberal. Contudo não se tratava do pensamento Liberal do início do século, mas sim uma concepção de buscava integrar a Educação Física como uma disciplina educativa por excelência no âmbito da rede púbica de ensino. Conforme cita Ghiraldelli (2004, p.19) “A Educação Física Pedagogicista é, pois, a concepção que vai reclamar da sociedade a necessidade de encarar a Educação Física não somente como uma prática capaz de promover a saúde.”

Devido a isso, a Educação Física nesta época vai advogar por um reconhecimento pedagógico, como sendo uma prática educativa. Por tanto responsável pela educação do movimento, sendo este o único responsável pela formação integral dos sujeitos.

A Educação Física Pedagogicista está preocupada com a juventude que frequenta as escolas. A ginástica, a dança, o desporto etc., são meios de educação do alunato. São instrumentos capazes de levar a juventude a aceitar as regras de convívio democrático e de preparar as novas gerações para o altruísmo, o culto a riqueza nacionais etc. (Ghiraldelli, 2004, p.19.)

Já no pós 64 e influenciada pelo panorama que dominava a política da época, nasce a Educação Física denominada Competitivista. Com grande incentivo do governo militar, está tinha por objetivos uma hierarquização e elitização social. Segundo Ghiraldelli a competição e a superação individual seriam os valores fundamentais de uma sociedade moderna, sendo a Educação Física então reduzida aos desportos, mais especificadamente, o de alto nível.      

Nasce com essa forma de Educação Física a exclusão dos menos hábeis e a valorização dos capazes. Estes podendo vislumbrar sua ascensão social através de conquistas e títulos internacionais, levando o nome do pais ao topo. E também o “desporto espetáculo”, servindo de base alienante e mascarando os principais desejos da classe dominante.

Tanto o “desporto de alto nível”, que é o “desporto espetáculo”, é oferecido em doses exageradas no meio popular, como, explicitamente, é introduzido no seio popular através de ação governamental. O objetivo de dirigir e canalizar energias” nem sempre é dissimulado. (Ghiraldelli, 2004, p.20.)         

                       

Pode-se assim através do resgaste das principais tendências que existem no Brasil antes da década de 70, notar que todas buscavam através da Educação Física, ora como agente de assepsia social, ou como formação de um cidadão-soldado, ou valorizando a educação do movimento e através do desporto de alto nível, aquilo que podemos chamar de arcabouço da ideologia dominante.

2.2 PANORAMA DA EDUCAÇÃO FÍSICA A PARTIR DAS DÉCADA DE 80 ATÉ OS DIAS ATUAIS.

Com o desejo de romper o quadro que perdurou a Educação Física durante anos, vislumbram no cenário durante as décadas de 70 e 80 abordagens de cunho humanistas, renovadores e transformadores. A partir destas mudanças de paradigmas, a Educação Física brasileira inicia mudanças conceituais, procedimentais e atitudinais no seu trato com o movimento.

As novas abordagens buscam uma nova forma de se pensar o homem, o corpo, e o movimento. Estes não sendo mais vistos como partes estanques, mas sim como um todo que deve ser reconhecido e trabalhado de forma única, valorizando o gesto e todo repertório motor que dispões o homem, movimento este, resultado de um acervo acumulado por anos e que é caracterizado pela cultura que está inserido.

Por tanto, as abordagens transformadoras citadas vêm confirmar o homem como um todo e o movimento como parte integrante de um emaranhado cultural que é passado de gerações a gerações e que deve ser valorizado pela Educação Física.

2.3. ABORDAGENS TRANSFORMADORAS DA EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR

2.3.1 PSICOMOTRICIDADE

Uma das primeiras tentativas de mudança no panorama que perdurava, foi com a Psicomotricidade. Atualmente o conceito de Psicomotricidade vai além de apenas o estudo anatômico e fisiológico do ser humano, busca-se o significado do movimento como comportamento, numa relação contínua e consciente entre a ação do individuo e a situação. A esse respeito Ajuriaguerra (1983, p.207 apud MELLO, 2005, p.30):

O ato motor não pode ser concebido como funcionamento de sistemas neurológicos justapostos. (...) Só podemos compreender a ação quando consideramos o ponto inicial, o desenvolvimento e a finalidade que esta ação pretende alcançar.

A partir destes estudos, passou a não mais se observar o movimento como um emaranhado de ossos e músculos, como se este fosse uma máquina, sem sentimentos e que apenas executava as ações sem nenhum sentido.  

A Psicomotricidade passa a ser um dos movimentos mais articulados da Educação Física, buscava-se através da abordagem o envolvimento da Educação Física com a desenvolvimento da criança, com o ato de aprender, com os processos cognitivos, afetivos e psicomotores. Buscava-se- através da comunhão destes fatores a formação integral do aluno. Não havia somente o desenvolvimento de aspectos técnicos esportivos, mas sim a preocupação em valorizar a cognição e os aspectos afetivos do aluno.

Darido (2005, p.7) aponta que com a psicomotricidade vemos inaugurar uma nova roupagem na Educação Física, os professores passam a se preocupar não mais somente com os limites técnicos, de rendimento e biológicos de seus alunos, mas com os conhecimentos de origem psicológica.

Um dos autores que mais influenciaram a abordagem em nosso país foi o Francês Jean Le Bouch, através de diversos professores que tiveram contato com suas obras fora do país, através de cursos a Psicomotricidade pode vislumbrar no ambiente acadêmico da época.  Segundo Le Bouch (1986, apud DARIDO, 2005, p. 8): “assegurar o desenvolvimento funcional, tendo em conta possibilidades da criança ajudar as afetividade a expandir-se e a equilibrar-se, através do intercâmbio com o ambiente humano”.

Portanto a abordagem Psicomotora através de interdependência do desenvolvimento moto, afetivo e cognitivo dos indivíduos, vem com tentativa de justificar a Educação Física como componente curricular essencial a formação da base escolar dos alunos, dando ao professor a necessidade de sentir na sua ação pedagógica a responsabilidade escolar e com seus objetivos, desatando os nós da disciplina com os ranços tecnicistas que a antecederam.

2.3.2.DESENVOLVIMENTISTA

 

 O modelo desenvolvimentista foi dirigido inicialmente para crianças de 4 a 14 anos, buscando, nos processos de aprendizagem e desenvolvimento, uma fundamentação para Educação Física escolar. Segundo seus principais autores (TANI et al., 1998), é uma tentativa de caracterizar a progressão normal do crescimento físico, do desenvolvimento fisiológico, motor, cognitivo e afetivo-social na aprendizagem motora, e em função dessas características, sugerir aspectos relevantes para a estruturação das aula, os autores da abordagem indicam que as habilidades devam ser trabalhadas da ordem das menos para as mais complexas, ou seja: das habilidades básicas, tais como corre, saltar, pular etc para as habilidades fundamentais, que seria a combinação de duas ou mais habilidades básicas.

 Os autores dessa abordagem defendem a ideia de que o movimento é o principal meio e fim da Educação Física, garantindo a especificidade do seu objeto. Sua função não é desenvolver capacidades que auxiliem a alfabetização e o pensamento lógico-matemático, embora isso possa ocorrer como um subproduto da prática motora. Além disso, a proposta também não é buscar na Educação Física solução para todos os problemas sócias do país, com discursos que não dão conta da realidade. A abordagem acredita que um bom planejamento em Educação Física e que deseja atender as reais necessidades das crianças deva ser realizado levando em conta as fases de desenvolvimento e crescimento das crianças e que os domínios cognitivos, motores e afetivos devam fazer parte da preocupação dos professores, pois este, se forem trabalhados de forma separadas se perderá a visão global do ser humano.

Conclui-se então que para a abordagem, o movimento é o principal objetivo e objeto de estudo, mas não o movimento simples, isolado, técnico e sem sentido, mas aquele que foi realizado por um corpo que senti, pensa e age em determinadas situações impostas pelas adaptações impostas pelo ambiente.

Conforme enfatiza Gallahue (1982, apud, TANI et al., 1998, p.137):

As crianças necessitam de abundância de oportunidades, movimentação e instrução numa variedade de atividades físicas, vigorosas e diárias, com o objetivo de desenvolver suas capacidades singulares de movimento a um nível ótimo.

2.3.3 ABORDAGEM CONSTRUTIVISTA-INTERACIONISTA

 

A proposta construtivista-interacionista apresenta um discurso cada vez mais presente nos diferentes segmentos do contexto escolar, opondo-se à proposta mecanicista da Educação Física, que é caracterizada pela busca do desempenho máximo, de padrões de comportamento, sem considerar as diferenças individuais e as experiências vividas pelos alunos, com o objetivo de selecionar os mais habilidosos para competições esportivas.

O construtivismo na área de Educação Física tem o mérito de considerar o conhecimento que o aluno previamente já possui, resgatando sua cultura de jogos e brincadeiras. A abordagem busca envolver essa cultura no processo de ensino - aprendizagem, aproveitando as brincadeiras de rua, os jogos com regras, as rodas cantadas e outras atividades que compõem o universo cultural dos alunos. O jogo tem papel privilegiado nessa proposta, considerado seu principal conteúdo, porque, enquanto joga ou brinca, a criança aprende em um ambiente lúdico e prazeroso.

A abordagem em questão, como princípio a construção do conhecimento a partir da interação do sujeito com o mundo, respeita o universo cultural do aluno, explorando as diversas possibilidades educativas de atividades lúdicas espontâneas, propondo tarefas cada vez mais complexas e desafiadoras com vistas à construção do conhecimento. Essa abordagem é defendida por João Batista Freire e além de valorizar as experiências, a cultura dos alunos, a proposta construtivista tem o mérito de propor alternativas aos métodos diretivos, alicerçados na prática da Educação Física.

O autor cita que no início do ano letivo os pais devam matricular além da mente, o corpo. Só assim seria possível uma educação de corpo inteiro, título de sua primeira publicação de grande difusão no meio acadêmico. Pois com uma educação de corpo inteiro, que valorize a cultura do aluno e reconhecendo que os mesmos são especialistas em jogos e brincadeiras e evitando-se os padrões estereotipados de movimentos, característicos dos modelos tecnicistas e valorizando-se o esquemas motores que segundo Freire (2009, p.19) são:

Organizações de movimentos construídos pelos sujeitos, em cada situação, construções essas que dependem, tanto dos recursos biológicos e psicológicos de cada pessoa, quanto das condições do meio ambiente em que ela vive.

Por tanto a proposta que advoga a abordagem é por uma Educação Física que através da valorização dos aspectos psicológicos da criança e o resgaste dos jogo e brincadeiras que as crianças trazem em si, mas que são colocados em segundo plano ou esquecidos pela escola, visando está, somente a formação intelectual do aluno e não na sua totalidade.

2.3.4 ABORDAGEM CRÍTICO-SUPERADORA.

Essa proposta tem representantes nas principais universidades do país e apresenta um grande número de publicações na área, especialmente em periódicos especializados. A proposta critico-superadora (SOARES et al., 1992) utiliza o discurso da justiça social como ponto de apoio e é baseada no marxismo e neo-marxismo, tendo recebido na Educação Física grande influência dos educadores José Carlos Libâneo e Demerval Saviani. Eles levantam questões de poder, interesse, esforço e contestação. Acredita que qualquer consideração sobre a pedagogia mais apropriada deve versar não somente sobre questões de como ensinar, mas também sobre como elaborarmos conhecimentos, valorizando a questão da contextualização dos fatos e do resgate histórico. Essa percepção é fundamental na medida em que possibilitaria a compreensão, por parte do educando, de que a produção da humanidade expressa uma determinada fase e que houve mudanças ao longo do tempo.

A abordagem em questão aprofunda a discursão sobre o desenvolvimento da aptidão física, como forma de padronização de movimentos e manutenção do Status quo estabelecido, com a reflexão sobre a cultura corporal que segundo os autores seria:

Uma reflexão pedagógica sobre o acervo de formas de representação do mundo que o homem tem produzido no decorrer da história, exteriorizados pela expressão corporal: jogos, danças, lutas, exercícios ginásticos, esportes [...] que podem ser identificados como forma de representação simbólica de realidades vividas pelo homem, historicamente criadas e culturalmente desenvolvidas. (SOARES et al., 1992, p. 38)

 Quanto à seleção dos conteúdos para as aulas de Educação Física, os adeptos da abordagem propõem que se considere a relevância social dos conteúdos, sua contemporaneidade e sua adequação às características sócias e cognitivas dos alunos. Para organização do currículo, ressaltam que é preciso fazer com que o aluno confronte os conhecimentos do senso comum com o conhecimento cientifico, para ampliar o seu acervo de conhecimentos. Entendendo os autores que se existe uma cultura corporal, resultado de conhecimentos socialmente produzidos e historicamente acumulados pela humanidade, estes devem ser transmitidos para os alunos na escola, fazendo parte do cabedal cultural de conteúdos que possuí a Educação Física escolar.

2.3.5 ABORDAGEM CRITICO-EMANCIPATÓRIA

 A abordagem critico-emancipatória (KUNZ, 1994) é um dos desdobramentos da tendência crítica e valoriza a compreensão crítica do mundo, da sociedade e de suas relações, sem a pretensão de transformar esses elementos por meio escolar. Assume a utopia que existe no processo de ensino e aprendizagem, limitado pelas condicionantes capitalistas e classistas, e se propõe a aumentar os graus de liberdade do raciocínio crítico e autônomo dos educandos. Do ponto de vista das orientações didáticas, o professor confronta, num primeiro momento, o aluno com a realidade do ensino.

 Kunz defende o ensino critico, pois é a partir dele que os educandos passam a compreender a estrutura autoritária dos processos institucionalizados da sociedade, os mesmos que formam falsas convicções, interesses e desejos. Assim, a tarefa da Educação Física crítica é promover condições para que essas estruturas autoritárias sejam suspensas e o ensino encaminhado para uma emancipação, possibilitada pelo uso da linguagem, que tem papel importante no agir comunicativo.

A abordagem é representada por Elenor Kunz e tem a intenção de levar os alunos a uma reflexão crítica sobre os esportes, encaminhando-os a emancipação. A partir do esquema conceitual de Habermans, em que são apresentadas as categorias trabalho, interação e linguagem, delimita a sua trajetória. Essa abordagem está centrada no ensino dos esportes, tendo como princípio didático pedagógico buscar uma ampla reflexão sobre a possibilidade de ensinar os esportes pela sua transformação didático-pedagógica e de tornar o ensino escolar uma educação de crianças e jovens para a competência crítica e emancipada. A emancipação é entendida como um processo contínuo de libertação do aluno das condições limitantes de suas capacidades racionais críticas e até mesmo o seu agir no contexto sociocultural e esportivo. O conceito do que seja “crítico” pode ser entendido como a capacidade de questionar e analisar as condições e a complexidade de diferentes realidades de forma fundamentada permitindo uma constante auto-avaliação do envolvimento objetivo e subjetivo no plano individual e situacional. As crianças e jovens a que Kunz (1994) se refere estão na faixa-etária da segunda etapa do ensino fundamental até o ensino médio, onde encontramos a necessidade de se lançar um olhar mais cuidadoso sobre a forma de lidar com o esporte, que teve início na década de 1970 e que, em alguns casos, ainda permanece atrelado aos princípios da época.

2.3.6 ABORDAGEM DOS PARÂMETROS CURRÍCULARES NACIONAIS

 

 Representado pelos professores Marcelo Jabu e Caio Costa, procura introduzir o aluno na esfera da cultura corporal de movimento, através do conhecimento sobre o corpo, os esportes, as lutas, os jogos e as brincadeiras, as atividades rítmicas e expressivas. Foram elaborados com a intenção de ampliar e aprofundar o debate sobre a educação, respeitando as diversidades regionais, culturais e políticas existentes no nosso país. Conforme indica Brito (1999, apud, DARIDO, 2005, p. 17), o Conselho Nacional de Educação enfoca os PCNs como: uma proposta curricular dentre outras, uma proposta significativa, porém não obrigatória e como alternativa às propostas do Estados e Munícipios.  Esse documento tem como pretensão criar condições para que as crianças e os jovens tenham acesso ao conjunto de conhecimentos socialmente elaborados e reconhecidos como necessários ao exercício da cidadania.

Três princípios norteiam a Educação Física no documento:

*Princípio da inclusão: Sistematização dos objetivos, conteúdos, metodologias e avaliação. Dessa forma busca-se incluir o aluno no mundo da Cultura Corporal de Movimento, através de objetivos concretos e conteúdos significativos os alunos podem participar de forma efetiva e eficaz nas aulas, evitando com isso um quadro histórico de exclusão da disciplina.

*Princípio da diversidade: Através da escolha de objetivos e conteúdos os mais diversificados possíveis, buscando sempre introduzir o aluno nas aulas através de objetivo e conteúdo do mundo vivido dos alunos.

 

*Categoria dos conteúdos: Indicam que todo conteúdo a ser apresentado aos alunos devam conter as seguintes categorias: Conceitual (fatos, conceitos e princípios), Procedimental (relacionados ao fazer) e Atitudinais (normas, valores e atitudes). Através destas categorias pode-se englobar as três dimensões do ser humano que são o cognitivo, o motor e o afetivo formando a globalidade do aluno.

Através das diversas abordagens citadas nas páginas anteriores, podemos perceber que os objetivos, conteúdos e metodologia da Educação Física escolar sofreu uma grande transformação desde a década de 80 até os dias atuais. A disciplina passou a ser reconhecida como componente curricular e que merecesse uma fundamentação teórica, mas não apenas teorias relacionadas a fatores biológicos, fisiológicos e anatômicos, mas com bases antropológicas, sociológicas, filosóficas e culturais. Com isso, a Educação Física escolar transformou sua atuação no âmbito educacional, tendo como objetivos geral a formação do cidadão pleno e como específico a valorização e transmissão do acervo de gestos produzidos e reproduzidos culturalmente ao longo de séculos.

Muitas dessas abordagens citadas acima, vem se desdobrando nos dias atuais, muito se deve a necessidade de adaptações e a nossa realidade educacional, e a prática concreta de muitos professores que para reverter o quadro de desvalorização educacional em nosso país reinventam e inovam, mesmo em condições desfavoráveis. É sabido também eu muitos ainda carregam o ranço das propostas ultrapassadas, que não servem mais para nossos alunos e que geram a exclusão e a volta a um passado que deve ser esquecido.

3. AS POLITICAS PÚBLICAS DE ESPORTE E A EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR.

 

É notório que nosso país está na rota de megaeventos esportivos tais como: Jogos Pan-americanos de 2007, Copa das Confederações 2013, Copa do Mundo de Futebol 2014 e Jogos Olímpicos e Paraolímpicos 2016. Incentivados por estes eventos o governo federal vem fortalecendo as políticas públicas de esporte que influenciam diretamente a Educação Física escolar, já que estas as mesmas quando não atuam diretamente na instituição educacional criam leis, perspectivas e objetivos que atuam diretamente sobre a disciplina na escola.      

Isto não é de hoje, em 2000 aconteceu em Sydney, na Austrália XXVII Jogos Olímpicos. A participação do Brasil na mesma foi pífio, grande parte da culpa foi colocada na Educação Física escolar (Bracht, Almeida, 2003). O pensamento era que a Educação Física escolar deveria servir de base para descoberta de novos talentos que futuramente representariam o país e elevariam o nome da nação.

Não por acaso em 2001 o governo federal cria o Programa Esporte na Escola cujo objetivo era “[...] devolver a Educação Física às escolas brasileiras e beneficiar 36 milhões de crianças em todo o País” (Esporte..., 2002, p. 1). Mediante a revalorização das práticas esportivas no interior da escola, constituindo-se numa contribuição singular para o futuro do esporte no Brasil. No entender dos defensores do programa, o desempenho do Brasil na Austrália “[...] foi a gota d’água para se repensar o esporte nacional de uma outra perspectiva, voltada para o futuro e não mais para o imediatismo. Concluiu-se que é preciso começar pela base, ou seja, pela escola” (Bracht, Almeida, 2003, p. 93).

O Programa Esporte na Escola tinha como objetivo: democratizar o acesso à prática esportiva como instrumento educacional, visando o desenvolvimento integral das crianças e dos adolescentes. Segundo Bracht e Almeida (2003): “[...]sua proposta era entendida como uma das principais iniciativas da história do esporte no País e uma de suas funções era a descoberta do talento esportivo.” A proposta do programa é anacrônica em relação aos objetivos da Educação Física escolar segundo as principais abordagens da área, que buscam através dos diversos conteúdos da disciplina introduzir o aluno na cultura corporal de movimento.

Já em 2003 em substituição ao Programa Esporte na escola, surge o Segundo Tempo. Tendo como objetivos os seguintes:

[...] acesso à prática e à cultura do esporte de forma a promover o desenvolvimento integral de crianças, adolescentes e jovens, como fator de formação da cidadania e melhoria da qualidade de vida, prioritariamente daqueles que se encontram em áreas de vulnerabilidade social. Filgueira et al (2009, apud BRACHT E ALMEIDA, 2003 p.133).

Ao difundir o esporte na escola através da proposta de que o mesmo pode contribuir na qualidade de vida e formação da cidadania. Com esses objetivos, o Segundo tempo vem confirmar o que pretendia seu antecessor, buscar através do esporte na escola e do binômios esporte-saúde e esporte-cidadania induzir o velho jargão difundido pelo governo de que o “esporte educa” ou “esporte é saúde”. A afirmação de que “o esporte educa” tem, normalmente, seu fundamento na ideia de que, por meio do esporte, as crianças e os jovens incorporam valores importantes para a vida social, para o pleno desenvolvimento da cidadania: espírito de grupo, espírito competitivo, respeito às regras (leis), entusiasmo pelo esforço, assimilação adequada das derrotas, atitude humilde na vitória etc. – essas são razões mais do que suficientes para fomentar a ampliação do seu acesso via escola.

Porém o Segundo Tempo vem com o discurso de que através do esporte os jovens poderiam evitar envolver-se em práticas delinquentes e degradantes, evitando-se o uso de drogas licitas e ilícitas.

Nessa compreensão, reproduzida pelo Segundo Tempo, o esporte aparece como um direito social a partir de uma perspectiva liberal-funcionalista, na medida em que o acesso a ele deve ser ampliado, pois sua prática funciona como elemento de compensação dos efeitos colaterais da globalização econômica. Conforme pode ser lido nas diretrizes do programa, seu objetivo é “democratizar o acesso ao esporte educacional de qualidade, como forma de inclusão social, ocupando o tempo ocioso de crianças, adolescentes e jovens em situação de vulnerabilidade social” (BRACHT E ALMEIDA, 2003 p.133).

Visto por esse prima, surge o primeiro anacronismo em relação aos objetivo da Educação Física escolar. Dessa forma o esporte não deve ser desenvolvido nas aulas por ser um patrimônio da humanidade, mas sim por seus benefícios instrumentais, de que o esporte promova aos que eles se envolvam, a reabilitação de pessoas em condições de risco e vulnerabilidade social.

Essa função do esporte difundida pelo Segundo Tempo deve ser analisada de forma crítica, visto que há vários exemplos claros de que o esporte não significa o afastamento de drogas licitas e ilícitas. O doping é um exemplo claro disso, no esporte de rendimento é fácil encontra casos em que atletas utilizaram substancias ilegais para conquistarem resultados. Recentemente atletas da seleção de atletismo da Jamaica foram flagrados nos testes e tiveram suas medalhas e seus títulos não mais reconhecidos.

            Dessa forma é necessário repensar os objetivos que são propostos ao se colocar o esporte na escola. Busca-se a competição ou a cooperação? O esporte como compensação ou como cultura corporal de movimento? O individualismo ou coletivismo? Em se tratando de objetivos educacionais o estudo aponta a cooperação, a cultura corporal de movimento e o coletivismo ou seja: o esporte da escola, reinventado segundo os códigos e objetivos gerais e específicos da educação.

4. METODOLOGIA

 

 

O presente estudo é uma pesquisa qualitativa que buscou através de fontes bibliográficas que tratam do tema deste estudo, analisar como as principais abordagens transformadoras da Educação Física escolar surgiram em nosso país e quais motivações, interesses e desejos levaram ao seu aparecimento e por base nas mesmas, colocar em questão os objetivos propostos pelos programas de esporte do governo e os Megaeventos esportivos que virão a acontecer em nosso país.  

Analisando as obras de autores como: Soares et al (1992), Kunz (1994). PCNs (1998), Tani et al (1998), Ghiraldelli (2004), Darido (2005), Mello (2005) e Freire (2009), foi possível traçar um panorama da Educação Física pré e pós década de 80. Todas as obras citadas têm em comum a busca pela superação do quadro de exclusão, tecnicista e alienante que viveu a Educação Física durante séculos, fato que fez com que os autores buscassem propostas que transformassem este cenário que perdurou nas quadras escolares brasileiras.

Além da revisão de obras de grande difusão e que inauguraram as diferentes abordagens transformadoras da Educação Física escolar brasileira, também foram analisados documentos que fomentam a formação de atletas no âmbito educacional através de programas governamentais, buscando com isso, justificar a preocupação do estudo com o retorno ao cenário pré década de 80 da Educação Física escolar.

5. RESULTADOS

 

             

Em tempos de Megaeventos esportivos acontecendo em nosso país, é de se esperar uma maior valorização da Educação Física nas suas dimensões: rendimento, participação e educacional. Mais projetos esportivos surgem neste momento, todos com objetivos por muitas vezes camuflados em discursos de que o esporte pode livrar os adolescentes das drogas, ou mesmo podem promover a ascensão social, mas quando analisados a luz da sua prática, através do histórico de programas lançados pelo governo federal e seu interesse pela Educação Física escolar ao longo das décadas, confirmam a busca pela implementação do esporte na escola e formação de futuros atletas escolares.

 O estudo se ateve a dimensão educacional, visto que os Megaeventos afetam o imaginário de nossos alunos e que grande parte dos projetos atuam diretamente no âmbito escolar ou em alunos que se encontram neste momento.

A retórica reedita um discurso a muito presente na Educação Física brasileira, qual seja, a retomada da ideia de pirâmide esportiva, subordinando, mais uma vez, o desporto escolar àquilo que é de interesse do esporte de alto rendimento, tornando perceptível o corte, já denunciado, da perda do projeto político pedagógico da Educação Física para o esporte de rendimento. Em outras palavras, a subordinação da Educação Física à política esportiva (BRACHT; ALMEIDA, 2003, p. 94).

A Educação Física escolar devido ao simbolismo e importância que é data ao esporte em nosso país, passa a ser reconhecida na escola como a disciplina responsável por passar aos alunos os conhecimentos técnicos e táticos das diversas modalidades, e não reconhecida como uma disciplina integrante do projeto político pedagógico da escola e por isso tão responsável quando as outras pela formação integral do alunos.

Portanto o estudo identificou que a valorização da Educação Física escolar é única e exclusivamente com pretensões a descoberta de futuros talentos, tanto que o discurso defendido pelo Ministério do Esporte em relação a valorização do esporte na escola, é que o mesmo poderá trazer benefícios tanto para o país quanto para os jovens. Segundo a Secretaria Nacional de Esporte Educacional do Ministério do Esporte, parte-se do pressuposto de que o caminho para a democratização do esporte passa pela articulação entre sistema educacional e sistema esportivo. Este discurso nos remete a reflexão de que o único conteúdo a ser desenvolvido na escola será o esporte e que este deverá ser desenvolvido não submetido aos códigos e objetivos educacionais, mas aos do esporte na escola, que não valoriza e reconhece as diversas formas de participação e as adaptações possíveis de sua prática no ambiente escolar, ou seja: é o sistema educacional e a Educação Física se submetendo aos interesses do esporte.

O estudo também constatou que é necessário acima de tudo contextualizar as políticas públicas esportivas e o tema que ela trata, o esporte, no ambiente educacional, segundo cita Bracht e Almeida, 2003, p. 135.

Isso implica a noção de que é a partir da função social atribuída ao sistema educacional que essa disciplina vai “absorver/incorporar” o esporte como mais uma manifestação da cultura corporal de movimento a ser tematizada na escola. Ao “absorver/incorporar” o esporte, a Educação Física Escolar precisaria “pedagogizar” essa prática social, ou seja, submetê-la aos códigos da instituição escolar.

 

Por tanto é necessário distinguir o esporte na escola, aquele que é inserido sem o necessário trato pedagógico, do esporte da escola. Este sim, transformado e reinventado segundo as necessidades e desejos educacionais, respeitando todo gesto motor como verdadeiro, eficiente, eficaz e não selecionando os melhores, mas sim buscando a todo tempo a inclusão. Para tanto o esporte e os outros conteúdos da disciplina tais como: Lutas, atividades rítmicas e expressivas, jogos, ginástica, conhecimentos sobre o corpo entre outros que podem e devem ser oportunizados na escola e devem ser desenvolvidos para além de suas técnicas e táticas, ou seja: apenas da forma tradicional e tecnicista.

Nesse sentido, o conhecimento é tratado de forma a ser retraçado desde sua origem ou gênese, a fim de possibilitar ao aluno a visão de historicidade, permitindo-lhe compreender-se enquanto sujeito histórico, capaz de interferir nos rumos de sua vida privada e da realidade social sistematizada (SOARES et al., 1992 p. 40.).

Somente o esporte sendo tratado como os demais conteúdos e não como o único a ser trabalhado nas aulas de Educação Física, pode-se impedir que voltemos a época em que o esporte e a Educação Física se preocupava apenas com a aptidão física do aluno, com sua técnica e tática única e simplesmente, apoiando-se nos aspectos biológicos, no adestramento motor e na meritocracia durante as aulas. Dessa forma o esporte passa a ser uma forte ferramenta a favor da classe dominante, contribuindo historicamente para a manutenção da estrutura social estabelecida.

O conhecimento que o aluno deve aprender é o exercício de atividades corporais que lhe permitam atingir o máximo rendimento de sua capacidade física e os conteúdos são selecionados não de acordo com os interesses e desejos dos alunos, mas sim com das estruturas que dominam e influenciam a estrutura educacional.

Nesta perspectiva, o esporte é selecionado porque possibilita o exercício do alto rendimento e, por isso, as modalidades esportivas selecionadas são geralmente as mais conhecidas e que desfrutam de prestigio social, como, por exemplo, voleibol basquetebol etc.

Em suma, é necessário aproveitar ao máximo o que o esporte pode nos apresentar de positivo. Sendo possível o desenvolvimento da cooperação, liderança, autonomia e responsabilidade e que será transmitido por ser um patrimônio cultural da humanidade. Não deixando que somente ele seja o único conteúdo a ser desenvolvido na escola, mas sim uma opção, dentre os diversos conteúdos que fazem parte da gama de diversidade que privilegia a disciplina.

Na escola, é preciso resgatar os valores que privilegiam o coletivo sobre o individual, defendem o compromisso da solidariedade e respeito humano, a compreensão de que jogo se faz “a dois” e de que é diferente jogar “com” o companheiro e jogar “contra” o adversário. [...] O programa deve abraçar desde os jogos que possuem regras implícitas até aqueles institucionalizados por regras específicas, sendo necessário que seu ensino não se esgote nos gestos técnicos. (SOARES et al., 1992, p 71.)

Já a relação das políticas públicas, megaeventos esportivos e a Educação Física, os objetivos tendem a serem anacrônicos. As políticas públicas buscam fomentar a cultura esportiva na escola, limitando as aulas aos dogmas e seus objetivos que são extremamente técnicos e sua metodologia de ensino tradicional.

Os Megaeventos com seu apelo popular inquestionável e sua grande adesão tendem a influenciar a Educação Física escolar, já que as mesma é responsável por dar o tratamento pedagógico necessário as atividades que são promovidas pelos eventos. Dessa forma, passa que automaticamente a responsabilidade pela qualidade na preparação para bons resultados nos eventos a Educação Física escolar, o que faz com que pais, alunos e dirigentes coloquem na Educação Física a responsabilidade por possíveis fracassos. Portanto, para esses interesses a Educação Física teria por obrigação a formação de atletas de alto rendimento e as atividades esportivas deveriam ser a única forma de trabalho a ser desenvolvido na escola.

Já a Educação Física a luz das principais abordagens transformadoras que a partir da década de 80 vieram a superar o paradigma tecnicista, fomentam a cultura corporal de movimento. Buscam através das diversas possibilidades motoras, dos diversos conteúdos da disciplina, e de metodologias transformadoras que buscam dar sentido e significado a cada atividade desenvolvida, inserir o aluno no mundo dos movimentos, valorizando os aspectos psicológicos, sociológicos, filosóficos, antropológicos e culturais, permitindo assim o desenvolvimento da totalidade do ser humano.

Para tanto o resultado do estudo foi de que as políticas públicas e os megaeventos esportivos buscam uma valorização da técnica e a formação de atletas. Através de discursos que visam os binômios, esporte-saúde e esporte-cidadania que defendem, não é possível atender as necessidades educacionais da Educação Física escolar, apenas serve para reforçar a exclusão dos menos habilidosos a prática das aulas, já que a prioridade passam a ser aspectos técnicos, biológicos e meritocráticos.

Uma Educação Física que pretenda atendar aos interesses da população escolar deve valorizar acima de tudo a intersubjetividade, a individualidade e a historicidade. Respeitar e valorizar cada gestor como forma de linguagem e que foi ao longo dos anos reinventada e adaptada, construindo uma infinidade de possibilidades de movimentos e não os padrões técnicos divulgados pelos métodos tradicionais que imperavam na Educação Física.

Nossos alunos podem e devem desfrutar de todo o acervo motor que foi construído ao longo dos tempos. Muitos desses gestos são exteriorizados através das modalidades esportivas, tanto de alto rendimento, quanto educativa ou como forma de lazer, cabendo ao praticante definir em qual das dimensões quer usufruir do esporte.

As políticas públicas e os megaeventos estão iminentes, e permeiam a cada dia o imaginário dos nossos alunos, cabe à Educação Física o papel de dar subsídios aos mesmos para compreenderem o processo que leva a tais políticas e seus reais interesses, cabendo o aluno decidir se quer ou não segui-los, caso queria, cabe ao professor de Educação Física encaminhá-lo para locais especializados que são próprios para isso. Sobre os megaeventos, também é necessário que a Educação Física instrumentalize-os para reconhecer os reais benefícios que possam a vir acontecer após a realização dos mesmos. Cobrar do poder público um verdadeiro legado, tanto para o esporte, quanto no crescimento e valorização social e que os locais utilizados para a disputa de competições sejam acessíveis a toda população e aos que desejam utiliza-los para o treinamento em alto rendimento.

6. CONCLUSÃO

 

Após a revisitada nas abordagens pré e pós década de 80 foi possível entender como a Educação Física serviu de ferramenta manipulativa e coesão durante décadas, servindo aos interesses dos que imperavam nas diferentes épocas. Fomos responsáveis pela “assepsia social”, pela formação do “cidadão-soldado”, como “uma prática educativa”, pela “analgesia popular” através da política do pão e circo e finalmente pela “educação física popular”. 

Por volta dos anos 70 e principalmente na década de 80, iniciam-se os primeiros movimentos mais articulados que visavam a superação do modelo tecnicista que reinava nas quadras escolares. Quadro este que se deu devido ao fato do Brasil estar numa ditatura militar e os objetivos da Educação Física para época era a dar o máximo possível de atividades aos jovens evitando assim que os mesmos participassem dos movimentos populares que eram contra o modelo ditatorial. Muita valor foi dada a Educação Física, aspectos fisiológicos, biomecânicos e anatômicos tiveram grande avanços na época, tais interesses se justificavam pelo fato da necessidade do Brasil ser bem representado em competições e assim elevar a nação ao local mais alto do pódio. Passamos a ter o esporte como conteúdo hegemônico das aulas, privando os que não possuam habilidades para determinados esportes, a formação normal e aos demais as turmas de Treinamento.

As abordagens transformadoras que vieram para superar este modelo esportivo, vieram com o discurso da formação integral do aluno. As aulas não mais seriam apenas para alguns, mas para todos e os objetivos não mais seriam a formação de atletas, mas inserir os alunos na cultura corporal de movimento, valorizando com isso todo acervo de movimentos que foi construído pelo homem ao longo das décadas e que é de direito dos alunos conhecerem e usufruírem. Estes objetivos são consenso entre as abordagens, porém cada uma buscou seu referencial teórico em fontes diferenciadas, tais como: A Psicomotricidade em Walon, Le bouch, Ajuriaguerra etc, a Desenvolvimentista nos processos de crescimento e desenvolvimento de Gallahue, a Construtivista-interacionista nos postulados de Piaget, a Crítico-Superadora nos discurso da Justiça Social de Marx, a Crítico-Emancipatória no esquema conceitual de Habermans e os PCN’s através de sua abordagem eclética, reunindo as diversas referências num documento oficial para todo o território nacional. 

Dentro dos objetivos propostos pelas Políticas públicas de esporte e a Educação Física escolar, identifica-se um anacronismo, visto que a função da disciplina na escola não é a formação de atletas e nem tão pouco lugar para divulgação dessas ideias, fato que é priorizado pelo poder público através de seus programas esportivos. Já em relação aos megaeventos que estão ocorrendo em nosso país, é preciso ter cuidado, analisar cada contexto que é divulgado pela mídia e pelo poder público, visto que por ser um evento esportivo, conteúdo inerente a disciplina Educação Física, podendo ocorrer uma errada interpretação da função da disciplina no âmbito escolar por parte de pais, alunos e poder público.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

8. REFERÊNCIAS

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_________. Esporte, escola e a tensão que os megaeventos esportivos trazem para a Educação Física Escolar. Em aberto, Brasília, v. 26, n. 89, p. 131-143, jan./jun. 2013.

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