AS MEDIDAS SOCIOEDUCATICAS DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE E A REINCIDÊNCIA DA DELINQUÊNCIA JUVENIL

 

 

 

João Victor Silva Carneiro

 

 

 

 

INTRODUÇÃO

 

 

O intuito deste artigo é estudar de forma especifica as medidas socioeducativas previstas nos artigos 112 e seguintes do Estatuto da Criança e do Adolescente, em face do crescente aumento de atos infracionais praticados por jovens na atualidade. Analisaremos também, os altos níveis de reincidência da delinqüência juvenil após a imposição de tais medidas socioeducativas, bem como sua eficácia, e as falhas nas execuções das medidas pelo Poder Judiciário.

Com o elevado índice de violência praticado entre os jovens menores de 18(dezoito) anos, e por conta de sua inimputabilidade penal, coube ao Estatuto da Criança e do Adolescente criar medidas de responsabilização à estes, medidas de coerção que se diferencie da esfera penal, cujo seu principal objetivo não seria uma sanção, mas sim a imposição de medidas preventivas e repressivas adotadas como meios de ressocialização, e reeducação.

Tais medidas foram criadas e caracterizadas como medidas socioeducativas, sendo estas, Advertência, Reparação do Dano, Prestação de Serviços à comunidade, Liberdade Assistida, Inserção em Regime de Semi-liberdade e a Internação em estabelecimento educacional. Medidas estas aplicadas pela legislação especial em vigor aos jovens infratores, tendo tais medidas prazos indeterminados, fixado pelo juiz, prevendo a lei apenas o prazo máximo.

Nota-se que mesmo com a intervenção das medidas socioeducativas aos menores infratores, é cada vez mais crescente o numero de reincidência da delinqüência juvenil aos jovens que foram condenados com tais medidas.

Perante a tamanha problemática, o projeto de pesquisa vem, com intuito basilar de mostrar até onde vão as deficiências do nosso poder judiciário, analisando a eficácia, e os meios executórios das medidas socioeducativas, adotadas como meios de ressocialização, e os aspectos que motivam a reincidência dos atos infracionais após a aplicação de tais medidas.

 

MEDIDAS SOCIEDUCATIVAS EM ESPÉCIE

 

                 Antes da instituição da Constituição Federal de 1988, os Direitos da Criança e do Adolescente eram pautados pela doutrina da situação irregular do menor, onde o ordenamento jurídico brasileiro conferia ao Estado a exclusividade e a responsabilidade para atuar nos casos que envolviam jovens e adolescentes em situações de abandono, ou de delinqüência. Com o advento da CF/88, foi adotada a doutrina da proteção integral do menor, com isso, foram conferidos direitos fundamentais à criança e ao adolescente, reconhecendo a sua condição de sujeito de direitos e dotados de prioridade absoluta. Além disso, foi compartilhada a responsabilidade pela tutela dos direitos dos menores entre o Estado, a família e a sociedade. Esses direitos foram regulamentados pelo ECA, Lei 8.060/1990, cuja prioridade é resguardar os direitos e interesses de crianças e adolescentes.

Na atualidade a Lei n. 8.069, de 13 de julho de 1990 - Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) é quem regulamenta os delitos que envolvem adolescentes menores de 18(dezoito) anos, tendo como principal proposta, dar um tratamento diferenciado as crianças e aos os jovens devido a sua condição peculiar de pessoa em desenvolvimento e a necessidade de reeducação e ressocialização.

Com o advento do Estatuto da Criança e do Adolescente, criou-se no Brasil um sistema de controle judicial da delinquência juvenil, baseado na responsabilização socioeducativa dos jovens entre 12 (doze) e 18 (dezoito) anos de idade, que venham a desenvolver um comportamento definido como crime ou contravenção penal, denominado, neste caso, ato infracional.

O legislador preocupou-se em dar ao menor infrator tratamento diferenciado em virtude de suas condições e peculiaridades. Inclusive nos termos utilizados ao referir da sua conduta, onde foi utilizado o termo ato infracional para as condutas delitivas praticadas pelo menor infrator, distinguindo da denominação de crime, utilizada para se referir aos demais sujeitos que não o menor e tratados pelo código penal. Nos termos do art. 103 do ECA, ato infracional será toda conduta descrita como crime ou contravenção penal. Nas palavras de Saraiva, é a própria definição da espécie inclui a garantia da observância do princípio da tipicidade, que exige subsunção da conduta àquela descrita pela norma penal. Assim só há ato infracional se houver figura típica penal que o preveja.[1]

 Uma vez apurada a prática do ato infracional cometido pela criança ou adolescente mediante um devido processo legalde competência absoluta da Justiça da Infância e da Juventude, ou do juiz que exerça as suas funções, após representação oferecida pelo membro do Ministério Público, Arts. 171 a 190 do ECA, caberá à autoridade competente, estabelecer medidas de proteção, aplicadas às crianças, previstas no Art. 100 do ECA e as medidas socioeducativas destinadas aos adolescentes, previstas no Art. 112 do mesmo diploma legal.

 Vale ressaltar, que o ECA não descreve a figura típica do ato infracional, e nem determina a aplicação de determinada medida socioeducativa para cada ato anfracional praticado.  Cabendo ao Juiz, como autoridade competente estabelecer, de acordo com o caso concreto, uma sanção, sob a forma de medida socioeducativa mais adequada à conduta delitiva do jovem infrator, cuja aplicação deverá levar em conta a sua peculiar situação da pessoa em formação e desenvolvimento físico, social e psicológico.

 As medidas socioeducativas elencadas no Estatuto da Criança e do Adolescente impõem sanções ao jovem infrator, sanções estas, condicionadas ao seu caráter de pessoa em desenvolvimento, cujo objetivo não é a punição, mas a efetivação de meios de caráter pedagógico, que visam sua recuperação e ressocialização.

São medidas socioeducativas as previstas no ECA (art. 112):

 

Art. 112 − Verificada a prática de ato infracional, a autoridade                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                competente poderá aplicar ao adolescente as seguintes medidas:

                 

I- advertência;

II- obrigação de reparar o dano;

III- prestação de serviços à comunidade;

IV- liberdade assistida;

V- inserção em regime de semi-liberdade;

VI- internação em estabelecimento educacional.

 

                                

 

No ECA, observamos que há dois tipos de medidas sócio-educativas, as medidas em meio aberto, através das quais os jovens não são penalizados com a privação de sua liberdade, sendo estas - Advertência, Reparação de Dano, Prestação de Serviços (a comunidade) e a Liberdade Assistida. A advertência é uma medida amena, aplicada a atos infracionais de pequeno porte, havendo uma repreensão feita pelo juiz ao jovem infrator em audiência. A reparação do dano promove que o adolescente infrator faça a compensação da avaria causada à vítima, não pode ser imposta aos pais ou responsável, tal medida deve ser cumprida pelo próprio adolescente, se este tiver economia própria. Caso contrário, o ECA determina que a medida seja substituída por outra adequada. Isso porque a imposição de medida socioeducativa tem caráter pessoal, e não se confunde com a responsabilidade civil, nada obsta assim, que a vítima demande os pais do infrator no juízo cível, pleiteando a reparação pelos danos decorrentes do ato infracional, haja vista a disposição do art. 932, I, e 933 do CC/2002, que prevê a responsabilidade objetiva dos pais pelos danos causados pelos filhos menores; já a Prestação de serviços é a medida mais aplicada aos adolescentes, que fornecem assistência a instituições de serviços comunitários; já na Liberdade Assistida, o infrator será levado a uma pessoa especializada que, além de acompanhar o caso, vai auxiliar e guiar esse jovem e o mesmo precisará comparecer perante seu orientador para assinar sua freqüência e seguir determinadas condições.

No segundo tipo das medidas socioeducativas, temos as privativas de liberdade, que são a semi-liberdade e a Internação. Nas privativas de liberdade se mostram as infrações mais graves, cometidas mediante violência e ameaça. A medida de semi-liberdade consiste em aplicação de liberdade condicionada, na qual o jovem estuda e trabalha durante o dia e se recolhe a uma instituição especializada durante a noite. A internação é a mais grave das medidas previstas pelo ECA, destinada aos casos mais extremos, somente podendo ser aplicada nos casos específicos previstos no art. 122, e somente se não houver outra medida mais branda adequada ao caso, não comportando prazo determinado, podendo ser revalidada, mediante fundamentação a cada seis meses, não podendo exceder a três anos.

 

Tais medidas, de modo geral, conferem ampla resposta ao ato praticado, merecedor de reprovação social. É incontestável, que as medidas socioeducativas constituem-se numa resposta social destinada ao adolescente infrator, entretanto, na sua aplicação deve prevalecer o caráter sócio-pedagógico, que não visa meramente a retribuição ou  punição pelo ato cometido, mas sim, a recuperação, de modo a evitar sua reincidência.

Entretanto, tem sido evidente e relevante o alto índice de reincidência da delinqüência juvenil após os jovens infratores serem submetidos às medidas socieducativas. Desta feita, recai uma discussão acerca da efetividade de tais medidas, e a cerca de falhas inerentes à sua execução perante o Poder Judiciário.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

É notório que o Poder Judiciário é o competente para proferir sentenças socioeducativas, após análises da capacidade do adolescente de cumprir a medida, das circunstâncias do fato e da gravidade da infração. Contudo na execução, que é parte decisiva na aplicação da medida, existem algumas possíveis falhas, que estão ocorrendo no sistema de modo a comprometer a efetividade das medidas e por quais razões, em parte dos casos, não surtem os efeitos esperados, resultando na reincidência de atos infracionais por jovens que já cumpriram medidas socioeducativas.

A medida de advertência, que consiste numa admoestação verbal, onde pode ser praticada por qualquer pessoa que tenha relação de poder em relação ao menor infrator, tem altos níveis de reincidência, pois, sua execução quando aplicada não surte efeito em virtude de não ser suficiente para o menor que delinquiu.

A medida de reparação de dano tem sua execução comprometida, uma vez que na maioria dos casos os menores não dispõem de uma situação financeira suficiente para reparar o dano causado, ou quando possuem condição para repará-lo não sentem a responsabilidade a que se propõe a medida.

Quanto à medida de Prestação de Serviço à Comunidade, foram identificadas algumas dificuldades na sua execução, tais como o fato desta ter um número muito grande de adolescentes atendidos, apresentando grande defasagem entre o número de adolescentes vinculados na medida e o número de vagas oferecidas.

Sobre a medida de Liberdade Assistida, as dificuldades encontradas estão no fato do órgão responsável não ter um quadro de pessoal suficiente para efetuar sua execução, estando abaixo do desejado.

Na medida de Semi-liberdade foram identificadas como principais dificuldades para sua execução a falta de unidades, ausência de atividades físicas, culturais e de lazer, instalações físicas precárias, alto índice de evasões, não observância do critério de separação de acordo com o grau de infração e com a reincidência na semi-liberdade, tratamento igualitário entre aquele que tem primeira passagem com o que já é reincidente.

Em relação à medida de Internação as dificuldades na sua execução referem-se à inexistência, de unidades especializadas para executar a medida. A falta de políticas públicas entre os órgãos do governo para uma integração setorial objetivando melhorias na execução da medida. A não separação por infrações cometidas por adolescentes de alta periculosidade daqueles primários, demonstrando um descaso no que se refere ao foco da medida que é o da reabilitação e ressocialização do infrator.

Vale ressaltar, que no ano de 2012, foi criada a Lei do SINASE - Lei nº 12.594/12, que institui o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo e regulamenta a execução das medidas socioeducativas destinadas ao adolescente que pratique ato infracional. Nesta Lei, assim como no ECA, são estabelecidos deveres e obrigações para as entidades de atendimento e direitos e garantias dos adolescentes atendidos.

     

 

 

 

 

 

 

 

 

REFERÊNCIAS

 

 

BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente. Brasília: MEC, 2005.

 

 

CURY, Munir. Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado. 8ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2006.

 

ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da Criança e do Adolescente: Doutrina e jurisprudência. 12ª ed. atualizada de acordo com o Novo Código Civil. São Paulo: Ed. Atlas. 2010.

 

SARAIVA, João Batista da Costa. Adolescente e Ato Infracional: Garantias processuais e medidas socioeducativas. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1999.

 

 

 

 

 

 


 

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