AS LIMITAÇOES À MITIGAÇAO DA PERSONALIDADE JURÍDICA NO PROCESSO JUDICIAL TRIBUTÁRIO PARA FINS DE SATISFAÇAO DO CRÉDITO DEVIDO À FAZENDA PÚBLICA Daniella Patrícia de Oliveira Porto RESUMO O Processo Judicial Tributário comporta em si duas situações concomitantes e, por vezes, conflitantes: a necessidade da fazenda pública ver seu crédito satisfeito e a imprescindibilidade de tal satisfação não ultrapassar os limites impostos pelo conjunto principiológico norteador da processo tributário. É sabido que as empresas de capital detêm personalidade própria e respondem por seus débitos tributários de maneira dissociada de seus sócios administradores. Todavia, em determinados casos especificados em lei, pode o judiciário declarar a responsabilidade dos sócios pelos descumprimentos obrigacionais da empresa. Entretanto, tal mitigação da personalidade jurídica própria do ente empresarial deve se ater estritamente às hipóteses legais, sob pena de se estar o judiciário desestimulando a atividade empresarial e, por conseguinte indo de encontro ao interesse de estímulo à atividade empresarial externada inclusive na carta constitucional. Portanto, pretende-se com esse artigo, sem contudo esgotar o assunto deverasmente amplo, demonstrar quais são as hipóteses em que existe a possibilidade de a fazenda alcançar o patrimônio pessoal do sócio empresário. INTRODUÇÃO A análise ora realizada por meio deste artigo científico justifica-se de forma precípua pela importância ganhada pela atividade empresarial, mormente nas últimas décadas, pelo estímulo conferido à mesma pela CRFB/88. Para fins de planejamento empresarial, um dos pontos que não pode ser renegado a um segundo plano refere-se a maneira como o judiciário entenderá e aplicará o direito no que cocerne à responsabilidade tributária. É sabido que o constituinte originário preocupou-se em criar mecanismos que instigasse empreendedores a constituírem empresas, sendo tal intento corroborado por dispositivos infra-constitucionais. Neste contexto firma-se a figura da personificação das sociedades empresárias, no qual o patrimônio a as condutas praticadas no âmbito societário serão analisadas de forma distinta a dos sócios que a compõem, configurando-se, portanto , em cristalino estímulo à formação societária. Todavia, para fins de satisfação do crédito tributário a personalidade jurídica da sociedade empresária poderá, em tese, ser desconstituída se averiguadas, e tão somente se, determinadas hipóteses legais, verbis: “Art. 135 - São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos: I - as pessoas referidas no artigo anterior; II - os mandatários, prepostos e empregados; III - os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado.” Nos dizeres de José Otávio de Vianna Vaz, a doutrina da desconsideração da personalidade jurídica ganhou forças em face da preocupação com “a utilização da pessoa jurídica para fins diversos daqueles idealizados pelo legislador. Tal fato fez com que se buscassem meios para reprimir o aproveitamento indevido – ou abusivo- da sociedade para encobrir as atividades das pessoas naturais.” (VAZ, 2003. P.82). Destarte, buscando-se o equilíbrio entre o intento de se estimular a criação de sociedades empresariais e a premente necessidade de se afastar condutas fraudulentas e abusivas pelos membros da sociedade em nome da pessoa jurídica foram estipulas as hipóteses acima elencadas a fim de que se permita a desconsideração da personalidade jurídica quando da ocorrência das citadas condutas. Todavia, não pode o processo tributário judicial, sob o subterfúgio da desconsideração da personalidade da empresa, alcançar o patrimônio do sócio a qualquer custo e fora das hipóteses legalmente previstas, sob pena de configurar patente arrepio às leis e aos princípios garantidores do devido processo legal. Portanto, faz-se imprescindível analisar todas as possibilidades de desconsideração e, principalmente, seus limites., estando aí o fim precípuo do presente artigo. 1. A PERSONALIDADE JURÍDICA NO DIREITO TRIBUTÁRIO E A ANÁLISE DA RESPONSABILIDADE 1.1 O tratamento legal dispensado às empresas Como já fora exposto supra, o ser humano, para fins de organização social e econômica decidiu se reunir em grupos e conferir a estes personalidade distinta a das seus integrantes, assim preceitua Francisco Amaral: Conclui-se, portanto, que o direito permite a formação de centros unitários de direitos e deveres que, à semelhança das pessoas naturais, são dotados de personalidade jurídica para servir aos interesses dos seres humanos. Com uma diferença porém. Nas pessoas físicas, a sua personalidade jurídica é autônoma e original, no sentido de que é inerente ao ser humano como atributo de sua dignidade pessoal, enquanto nas pessoas jurídicas, ou coletivas, ela é meramente instrumental e derivada ou adquirida, meio de realização de infinita variedade dos interesses sociais. À partir da definição da necessidade de formação das pessoas jurídicas, surgem então correntes acerca da natureza destas, dentre as quais despontam-se duas grandes, a da ficção e da realidade, dentre as quais Francisco Amaral filia-se à teoria da realidade técnica: Para tal concepção a pessoa jurídica resulta de um processo técnico, a personificação, pelo qual a ordem jurídica atribui personalidade a grupos em que a lei reconhece vontade e objetivos próprios. As pessoas jurídicas são uma realidade, não ficção, embora produto da ordem jurídica. Sendo a personalidade, no caso, um produto da técnica jurídica, sua essência não consiste no ser em si, mas em uma forma jurídica, pelo que se considera tal concepção como formalista. A forma jurídica não é, todavia, um processo técnico, mas a “tradução jurídica de um fenômeno empírico”, sendo a função do direito apenas a de reconhecer algo já existente no meio social. Percebe-se, à partir da análise do art. 45 do código civil, que o legislador brasileiro filiou-se à teoria da realidade técnica: Art. 45. Começa a existência legal das pessoas jurídicas de direito privado com a inscrição do ato constitutivo no respectivo registro, precedida, quando necessário, de autorização ou aprovação do Poder Executivo, averbando-se no registro todas as alterações por que passar o ato constitutivo. Parágrafo único. Decai em três anos o direito de anular a constituição das pessoas jurídicas de direito privado, por defeito do ato respectivo, contado o prazo da publicação de sua inscrição no registro. 1.2 A personificação das sociedades Por óbvio, à partir da aquisição de personalidade pelas pessoas jurídicas, estas adquirem não só direitos, mas também obrigações, tal qual preconiza o código civil em seu artigo: "Toda pessoa é capaz de direitos e deveres na ordem civil". Assim, sendo a sociedade empresarial juridicamente uma pessoa terá, por força de lei, direitos e deveres a cumprir, dentre os quais obrigações de cunho tributário. Nas modalidades empresariais em que a responsabilidade é limitada, o patrimônio e as obrigações do sócio, inclusive administrador, não se confundem com as da pessoa jurídica, vez que dotada de personalidade própria, assim sendo, em um primeiro momento, as responsabilidades decorrentes das atividades da pessoa jurídica deverão ser por estas adimplidas . 1.3 A tese da desconsideração da personalidade jurídica É sabido que a obrigação tributária, da qual nasce o crédito tributário, decorre do não pagamento de tributos. A responsabilidade oriunda do crédito tributário poderá, nas hipóteses legais ser transportada aos administradores da sociedade empresária à partir da desconsideração da personalidade jurídica. Consoante Sacha Calmon Navarro Coêlho “o dever de pagar de tributos, igualmente, surge porque a lei elege determinados eventos como geradores de obrigações tributárias se e quando ocorrerem no mundo (...), tudo conforme o princípio de imputação, que vem a se atribuir dadas conseqüências a certos fatos e atos a priori previstos.” (COELHO, 2010). Ainda conforme o eminente doutrinador Sacha Calmon Navarro “o sujeito passivo é denominado pelo CTN de contribuinte quando realiza, ele próprio, o fato gerador da obrigação, e de responsável quando, não realizando o fato gerador da obrigação, a lei imputa o dever de satisfazer o crédito tributário em prol do sujeito ativo.” (COELHO, 2010). Assim, após a devida conexão dos conceitos chega-se à conclusão de que a obrigação tributária deverá ser sempre em virtude da lei. Ocorrendo uma situação, nela prevista, como necessária e suficiente para concretização do seu fato gerador surgem para o Estado o direito de exigir de um sujeito passivo o tributo nos termos do artigo 113 do Código Tributário Nacional, sob pena de sanção. Nos dizeres de Ricardo Lobo Torres "tributo é o dever fundamental, consistente em prestação pecuniária, que é exigido de quem tenha realizado o fato descrito em lei". Como já fora exposto supra, os deveres da pessoa jurídica, após o acatamento da teoria da personificação, decorrem, em um primeiro momento, do artigo 1º do código civil. Já adentrando no assunto atinente a este trabalho, nas modalidades empresariais em que a responsabilidade é limitada, o patrimônio e as obrigações do sócio, inclusive administrador, não se confundem com as da pessoa jurídica, vez que dotada de personalidade própria. Nos termos do art 135, III do CTN a solidariedade do sócio pela dívida da sociedade só se manifestará quando restar demonstrado que alguma das seguintes condutas do caput do artigo foram praticadas: Art. 135 - São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos: I - as pessoas referidas no artigo anterior; II - os mandatários, prepostos e empregados; III - os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado. (grifo meu) Destarte com a adoção da teoria da desconsideração da personalidade jurídica, também chamada de disregard doctrine qualquer tipo de sociedade empresária, inclusive a limitada, pode ser atingida pela mitigação da personificação, ainda que integralizado o capital social, o patrimônio dos sócios pode ser responsabilizado por obrigações da sociedade, no caso de desconsideração da personalidade jurídica. A adoção da disregard doctrine deve, contudo, em virtude da potencialidade lesiva ao patrimônio, está adstrita aos contornos e cabimentos legais. À propósito, a este respeito, professoral o posicionamento do Tribunal de Justiça do Distrito Federal acerca da temática: “É impossível a penhora dos bens do sócio que jamais exerceu a gerência, a diretoria ou mesmo representasse a empresa executada”. Assim, ainda que desconsiderada a personalidade jurídica, só serão alcançados os bens daqueles envolvidos com o ato que motivou a desconsideração (TJDF, 3ª Turma Cível, APELAÇÃO CÍVEL nº 3675195, Relator: NANCY ANDRIGHI, j. em 27/11/1995, DJU de 19/12/1995.) Assim, pode-se previamente concluir e pugnar pelo entendimento de que o Direito Tributário brasileiro tão somente imputará aos diretores, gerentes ou representantes da pessoa jurídica a responsabilidade pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias, quando estes forem resultantes da prática de ato ou fato eivado de excesso de poderes ou com infração de lei, contrato social ou estatutos, nos termos do art. 135, III, do CTN, sendo, portanto, uma hipótese de mitigação da proteção conferida pelo instituto da personificação. 1 A RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA Consta no Dicionário Jurídico publicado pela academia Brasileira de Letras a conceituação de responsabilidade tributária, qual seja: “a que recai sobre o sujeito passivo de fato gerador ou que é atribuída por lei a terceira pessoa, nesse caso excluindo a responsabilidade do contribuinte ou atribuindo-a em caráter supletivo do cumprimento total ou parcial da referida obrigação” Auxiliando na elucidação do conceito, Hugo de brito Machado divide responsabilidade tributária em um sentido amplo e outro estrito: “em sentido amplo, é a submissão de determinada pessoa, contribuinte ou não, ao direito do fisco de exigir a prestação da obrigação tributária. (...) em sentido estrito, é a submissão, em virtude de disposição legal expressa, de determinada pessoa que não é contribuinte, mas está vinculada ao fato gerador da obrigação tributária, ao direito do fisco de exigir a prestação respectiva” . Para se alcançar o ponto a ser questionado no presente artigo, chegar-se a demonstração das hipóteses legais dos casos de desconsideração da pessoa jurídica e, por conseguinte responsabilização sócios administradores, faz-se imprescindível a análise e a distinção de dois artigos do CTN, o art. 134 e o art. 135: Art. 134 - Nos casos de impossibilidade de exigência do cumprimento da obrigação principal pelo contribuinte, respondem solidariamente com este nos atos em que intervierem ou pelas omissões de que forem responsáveis: I - os pais, pelos tributos devidos por seus filhos menores; II - os tutores e curadores, pelos tributos devidos por seus tutelados ou curatelados; III - os administradores de bens de terceiros, pelos tributos devidos por estes; IV - o inventariante, pelos tributos devidos pelo espólio; V - o síndico e o comissário, pelos tributos devidos pela massa falida ou pelo concordatário; VI - os tabeliães, escrivães e demais serventuários de ofício, pelos tributos devidos sobre os atos praticados por eles, ou perante eles, em razão do seu ofício; VII - os sócios, no caso de liquidação de sociedade de pessoas. (grifo nosso) Parágrafo único. O disposto neste artigo só se aplica, em matéria de penalidades, às de caráter moratório. Art. 135 - São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos: I - as pessoas referidas no artigo anterior; II - os mandatários, prepostos e empregados; III - os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado. (grifo nosso) Da simples leitura dos artigos citados supra já se conclui que a responsabilidade de terceiros trazida pelo art. 134 é em virtude de uma atuação regular, e que a responsabilidade de terceiros trazida pelo art. 135 é originada por atuação IRREGULAR, sendo esta última a que nos interessa. Ainda, para fins de esclarecimento, observa-se que, ainda que o art. 134 traga a expressão “solidária”, o que ocorre de fato é uma responsabilidade SUBSIDIÁRIA, vez que comporta benefício de ordem. Deve-se ressaltar ainda que o disposto no art. 134 no que tange aos sócios ( inciso VII) refere-se tão somente aos tributos devidos pelas sociedades de pessoas, nas quais de fato subsiste uma responsabilidade subsidiária e ilimitada dos sócios pelas dívidas sociais, não alcançando, portanto nosso objeto de estudo que se refere às sociedades nos quais a responsabilidade se limita ao capital subscrito. Hodiernamente as sociedades de pessoas estão em desuso diante do crescimento das Sociedades Anônimas e das Sociedades Limitadas, nas quais, após a integralização do capital subscrito ocorre o desaparecimento da responsabilidade dos sócios. Contudo, não obstante a observação quanto o afastamento da responsabilização do sócio, esta poderá ocorrer nos casos do art. 135, III do CTN, sendo este enfim o objeto a ser avaliado neste estudo. 2- DA HERMENEUTICA DO ART. 135 DO CTN Art. 135 - São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos: I - as pessoas referidas no artigo anterior; II - os mandatários, prepostos e empregados; III - os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado. (grifo nosso) 2.1 Da análise do termo pessoalmente: A primeira questão que salta aos olhos é a disposição do legislador no que se refere ao caráter pessoal da responsabilidade, afastando, pois os critérios de solidariedade ou subsidiariedade que via de regra norteiam tais relações. Assim preleciona o eminente jurista Sacha Calmon Navarra Coelho: Em suma, o art. 135 retira a “solidariedade” e a “subsidiariedade” do art. 134. Aqui a responsabilidade se transfere inteiramente para os terceiros, liberando os seus dependentes e representados. A responsabilidade passa a ser pessoal, plena e exclusiva desses terceiros. Isto ocorrerá quando eles procederem com manifesta malícia (mala fides) contra aqueles que representam, toda vez que for constatada a prática de ato ou fato eivado de excesso de poderes ou com infração de lei, contrato social ou estatuto. . Ocorre uma responsabilização pessoal dos representantes, mas que tão somente se justifica quando da ocorrência de atos que excedem aos poderes aos mesmos conferidos ou infração da lei, contrato social ou estatutos. No entendimento do professor Kiyoshi Harada, não obstante entendimentos divergentes, trata-se de uma responsabilidade por substituição. Nessas hipóteses, ocorre a responsabilidade por substituição e não apenas responsabilidade solidária estritamente no caso de impossibilidade de cumprimento da obrigação principal pelo contribuinte, como nos casos elencados no artigo antecedente. Essa responsabilidade por substituição, outrossim, inclui quaisquer penalidades, bem como as obrigações acessórias. Corroborando a tese de que o termo “pessoalmente” traz a inferência de que o terceiro deve responder integralmente pelos débitos tributário se abarcada a pessoa jurídica pela situações descritas no art. 135, sendo esta também vítima, tal qual o fisco, da conduta ilegítima e irregular do administrador, o Professor Eduardo Sabbag tem assim se posicionado: Em geral, o contribuinte aqui é vítima de atos abusivos, ilegais ou não autorizados, cometidos por aqueles que o representam, razão pela qual se procura responsabilizar pessoalmente tais representantes, ficando o contribuinte, em princípio, afastado da relação obrigacional. De fato, no artigo 135 do CTN, a responsabilidade se pessoaliza, ou seja, torna-se plena, rechaçando o benefício de ordem e fazendo com que o ônus não recaia sobre o contribuinte, mas pessoalmente, sobre o responsável citado quando houver (I) excessos de poderes ou (II) infração da lei, contrato social ou estatutos . (grifo nosso) Há de se ressaltar, contudo, que tal teoria, a de responsabilidade pessoal e afastamento por completo da responsabilidade da pessoa jurídica esbarra na culpa in eligendo ou in vigilando, vez que caberia a diligência por parte da pessoa jurídica aos atos do administrador, bem como na possibilidade de dificultar a satisfação do crédito tributário, caso este esteja majoritariamente sob o domínio da empresa. Assim, os estudiosos tributários que tratam as hipóteses do art. 135 como de substituição tributária e não de transferência tributária tem seus opositores, dentre os quais o sapiente professor Hugo de Brito Machado: No 5º Simpósio Nacional de Direito Tributário, realizado em São Paulo, em outubro de 1980, prevaleceu, contra nosso voto, a tese de que o artigo 135 cuida de hipótese de substituição, e que por isso a responsabilidade de qualquer das pessoas no mesmo referidas implica a exoneração da pessoa jurídica. Parece-nos inteiramente inaceitável tal entendimento. A lei diz que são pessoalmente responsáveis mas não diz que sejam os únicos. A exclusão da responsabilidade, a nosso ver, teria de ser expressa. e acrescenta: Com efeito, a responsabilidade do contribuinte decorre de sua condição de sujeito passivo direto da relação obrigacional tributária. Independente de disposição legal que expressamente a estabeleça. Assim, em se tratando de responsabilidade inerente à própria condição de contribuinte, não é razoável admitir-se que desapareça sem que a lei diga expressamente. Isto, alias, é o que se depreende do disposto no art. 128 do Código Tributário Nacional, segundo o qual, ‘”a lei pode atribuir de modo expresso a responsabilidade pelo crédito tributário de terceira pessoa vinculada ao fato gerador da respectiva obrigação, excluindo a responsabilidade do contribuinte ou atribuindo-a a este em caráter supletivo do cumprimento total ou parcial da referida obrigação.” Pela mesma razão que se exige dispositivo legal expresso para a atribuição da responsabilidade a terceiro, também se há de exigir dispositivo legal expresso para excluir a responsabilidade do contribuinte. (grifo nosso) No mesmo entendimento de Hugo de Brito Machado está Emanuel Carlos Dantas de Assis, que defende a idéia de que a responsabilidade contida no artigo 135 do CTN tratar-se-ia de responsabilidade por transferência, já que o legislador não a designou de plano, ocorrendo tão somente após o cometimento dos atos ilegais ou infracionais. 2.2 Da análise dos termos “Excesso de Poderes” e Infração de lei, contrato social ou estatutos Os “excessos de poderes” referidos no art. 135 , ocorrem quando o terceiro toma decisões e age por conta própria extrapolando os limites do que lhe fora delegado por via legal, contratual ou estatutária em caráter nitidamente comissivo. Depreende-se do comando normativo a premente necessidade de que a violação seja de caráter subjetivo e não meramente objetivo. Imprescindível se faz a comprovação do dolo por parte do administrador. A jurisprudência tem entendido que somente o descumprimento da obrigação tributária, dissociado de dolo ou fraude, não possui o condão de remetê-lo às iras do art. 135. Para tanto, sacramentou a súmula 430 do STJ: “O inadimplemento da obrigação tributária pela sociedade não gera, por si só, a responsabilidade solidária do sócio-gerente.” 2.3 Da necessária distinção entre sócios e diretores, gerentes ou representantes. Patente se afirmar que para se incidir na responsabilidade prevista no art. 135 do CTN deve se estar revestido pela condição de diretor, gerente ou representante e não tão somente de sócio, vez que imprescindível se faz exercer-se a gerência, sendo sabido que muitas vezes o reles sócio não foi investido de tal prerrogativa, sendo esse entendimento o mais externado pela melhor doutrina, inclusive pelo Professor Hugo de Brito Machado: “Destaque-se desde logo que a simples condição de sócio não implica responsabilidade tributária. O que gera a responsabilidade, nos termos do art. 135, III, do CTN, é a condição de administrador de bens alheios. Por isso a lei fala em diretores, gerentes ou representantes. Não em sócios. Assim, se o sócio não é diretor, nem gerente, isto é, se não pratica atos de administração da sociedade, responsabilidade não tem pelos débitos tributários” (grifos do autor) CONCLUSÃO À partir de todo o exposto, pode-se inferir que de fato a teoria da disregard doctrine pode sim ser aplicada pelo judiciário no que tange à responsabilização tributária. Todavia, tal aplicação, por se constituir como desfavorável ao participante das sociedades, deve se ater aos estritos limites legais. REFERÊNCIAS AMARAL, Francisco. Direito Civil: introdução. 5. ed., Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p. 285. Artigo A teoria da Desconsideração da personalidade jurídica no Direito Tributário: Estudo sobre sua Aplicabilidade. In> http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=8908 Autora=Nádia Arnaud Pereira Ferreira, acessado em 20 de junho de 2014 ASSIS, Emanuel Carlos Dantas de. Arts. 134 e 135 do CTN: Responsabilidade Culposa e Dolosa dos Sócios e Administradores de Empresas por Dívidas Tributárias da Pessoa Jurídica. In FERRAGUT, Maria Rita; NEDER, Marcos Vinicíos. Responsabilidade Tributária. São Paulo: Dialética, 2007. BRASIL. Constituição, 1988. BRASIL. Código Tributário Nacional, 1966 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário Brasileiro. 10. ed. Rio de Janeiro: forense, 2009. HARADA, Kiyoshi. Direito Financeiro e Tributário. 19. ed. São Paulo: atlas, 2010. MACHADO, Hugo de Brito. Comentários ao Código Tributário Nacional. v. II. São Paulo: Atlas, 2004 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário, 29 ed.São Paulo: Malheiros,2008 SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2009 SIDOU, J. M. 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