2. FORMAS DE INCIDÊNCIA
Há várias formas de agressão física e psíquica, contudo, se estas ocorrerem de forma repetitiva e frequente, com o intuito de atingir a vítima, pode levar ao assédio moral. Se faz mister, pois, atentar-se ao fato de que nem sempre a ocorrência de um conflito no ambiente de trabalho é sinônimo de assédio moral, visto que é comum ocorrer neste meio conflitos, que são gerados pelo estresse ou pela pressão do trabalho.
Entende-se como estresse as sobrecargas e as péssimas condições de trabalho a qual o trabalhador é exposto, onde seu organismo reage de diversas formas à ação do agente estressante. Porém, não se pode considerar o estresse como assédio moral, apesar de muitos trabalhadores vítimas do assédio moral terem sofrido anteriormente com o estresse. A principal diferença consiste em que no assédio moral, as agressões e humilhações são dolosas e frequentes e não um mero evento isolado.
O assédio moral divide-se em diversas formas de incidência, tanto é que Marie-France Hirigoyen em uma de suas obras, intitulada de mal estar no trabalho (2002, p. 108-109), lista uma série de atitudes hostis, as quais estão agrupadas em quatro categorias, vejamos:
a) Deterioração proposital das condições de trabalho.
 Retirar da vítima a autonomia.
 Não lhe transmitir mais as informações úteis para a realização de tarefas.
 Contestar sistematicamente todas as suas decisões.
 Criticar seu trabalho de forma injusta ou exagerada.
 Privá-la do acesso aos instrumentos de trabalho
 Retirar o trabalho que normalmente lhe compete.
 Dar-lhe permanentemente novas tarefas.
 Atribuir-lhe proposital e sistematicamente tarefas inferiores às suas competências.
 Pressioná-la para que não faça valer seus direitos (férias, horários, prêmios).
 Agir de modo a impedir que obtenha promoção.
 Atribuir à vítima, contra a vontade dela, trabalhos perigosos.
 Atribuir à vítima tarefas incompatíveis com sua saúde.
 Causar danos em seu local de trabalho.
 Dar-lhe deliberadamente instruções impossíveis de executar.
 Não levar em conta recomendações de ordem médica indicadas pelo médico do trabalho.
 Induzir a vítima ao erro.
b) Isolamento e recusa de comunicação.
 A vítima é interrompida constantemente.
 Superiores hierárquicos ou colegas não dialogam com a vítima.
 A comunicação com ela é unicamente por escrito.
 Recusam todo o contato com ela, mesmo o visual.
 É posta separada dos outros.
 Ignoram sua presença, dirigindo-se apenas aos outros.
 Proíbem os colegas de lhe falar.
 Já não a deixam falar com ninguém.
 A direção recusa qualquer pedido de entrevista.
c) Atentado contra a dignidade.
 Utilizam insinuações desdenhosas para qualificá-la.
 Fazem gestos de desprezo diante dela (suspiros, olhares desdenhosos, levantar de ombros...).
 É desacreditada diante dos colegas, superiores ou subordinados.
 Espalham rumores a seu respeito.
 Atribuem-lhe problemas psicológicos (dizem que é doente mental).
 Zombam de suas deficiências físicas ou de seu aspecto físico; é imitada ou caricaturada;
 Criticam sua vida privada.
 Zombam de suas origens ou nacionalidade.
 Implicam com suas crenças religiosas ou convicções políticas.
 Atribuem-lhe tarefas humilhantes.
 É injuriada com termos obscenos ou degradantes.
d) Violência verbal, física ou sexual.
 Ameaças de violência física.
 Agridem-na fisicamente, mesmo que de leve, é empurrada, fecham-lhe a porta na cara.
 Falam com ela aos gritos.
 Invadem sua vida privada com ligações telefônicas ou cartas.
 Seguem na rua, é espionada diante do domicílio.
 Fazem estragos em seu automóvel.
 É assediada ou agredida sexualmente (gestos ou propostas).
 Não levam em conta seus problemas de saúde.
2.1. Isolamento Da Vítima.
Verifica-se no início do processo do assédio moral, a vítima é completamente isolada, pois os demais não lhe dirigem a palavra e quando ela tenta falar é duramente reprimida. Tais atitudes são tomadas como uma maneira de censurá-la, para que a vítima não se comunique com os demais funcionários, e desta forma não tenha aliados para se proteger.
Segundo Marie-France Hirigoyen (2002, p. 53) “O agressor isola a pessoa marcada para que ela não possa se queixar a outras e eventualmente obter solidariedade. Aliás, passado um certo tempo de assédio, ela não ousa mais procurar outras pessoas, pois teme ser rejeitada”.
Também nesse mesmo sentido completa Márcia Novaes Guedes (2005, p. 51) aponta que:

A possibilidade de comunicação da vítima é limitada; é sempre interrompida quando fala. É repreendida e tratada aos berros. Seu trabalho é criticado com expressões grosseiras. Recebe ameaças verbais, por telefone ou escritas, e tem sua correspondência violada. Os colegas a evitam com gestos e olhares de desprezo, assim afastando as tentativas desesperadas de socorro, interrompendo-se a comunicação.
Decorrido certo tempo de assédio, a vítima não ousa mais buscar ajuda, ou sequer falar com outras pessoas no ambiente de trabalho, pois teme ser rejeitada. A comunicação da vítima é restrita, pois é sempre interrompida quando tenta demonstra a sua opinião. É sempre censurada, seu trabalho é advertido, e muitas vezes isso ocorre na frente de seus colegas.
Os colegas de trabalho, vezes por omissão outros por medo de serem a próxima vítima, ou simplesmente por fazerem parte do grupo dos assediadores, evitam a vítima com gestos e olhares de desprezo, desta forma afastam qualquer tentativa de pedido de socorro.
Segundo Hirigoyen (2012, p. 177), quando adquirem consciência da manipulação, as vítimas se sentem lesadas, como alguém que acaba de ser objeto de uma fraude dolosa. Encontra-se nelas um sentimento idêntico, de terem sido enganadas, exploradas, de não terem sido respeitadas.
Assim, a vítima sente-se sozinha transtornada e sem forças para reagir, e questionando se a culpa é sua em consequência de não saber o que fez para ser tratado desta forma, tendo em vista o agressor não dar explicação alguma por estar agindo com tamanha perversidade.
2.2. Críticas que Levam a Destruição da Autoestima.
Com as críticas o agressor visa atingir a vítima como ser humano, levando-a a desacreditar em seu potencial. Nessa forma de incidência o foco são os sentimentos da pessoa, pois o agressor busca na vítima algo que possa ser usado contra ela mesma, fazendo brincadeiras de mal gosto em relação ao seu modo de se vestir, sua opção sexual, enfim, sua autoestima.
Essas agressões vêm muitas vezes travestidas de conselhos, que encobrem sua real finalidade, que nada mais é que desestabilizar a vítima, atingindo a sua dignidade.
Segundo Marie-France Hirigoyen (2002, p. 56), nos elucida:

O objetivo do assédio é desestabilizar o outro, a fim de não ter mais diante de si um interlocutor capaz de responder. Para isso, instaura-se uma desigualdade ou reforçar-se a que já existe pelo elo de subordinação. Desarma-se o adversário antes do combate. Conscientemente ou não, os agressores evitam criticas puramente profissionais e visam o íntimo, bem onde machuca.
Os agressores evitam críticas que visam atingir o lado profissional da vítima, preferem atingir o psicológico. Assim, entende-se que quando a vítima ainda possui autoestima, esta se defende dos ataques, perdendo-a, passa a ser alvo fácil, sujeito ao assédio moral.
O agressor antes de agir, observa a vítima, analisa cuidadosamente, estuda e procura algo que possa utilizar para desestabilizá-la, buscando atingir precisamente o seu ponto fraco.
2.3. Falta ou Excesso de Trabalho.
Esta é a forma em que o agressor afeta o trabalhador com o seu próprio trabalho, sejam pelo excesso ou pela falta.
No caso do excesso de trabalho, o agressor passa diversas tarefas para o empregado, já sabendo que não será possível de ser realizado, isso é feito simplesmente com a intenção de humilhá-lo, e posteriormente chamá-lo de incompetente por não ter conseguido terminar o seu trabalho no tempo estipulado.
Por outro lado, o agressor deixa o empregado sem ter o que fazer, excluindo de suas tarefas de costume, isso é feito para que a vítima se sinta inútil, ou ache que está sendo retirada do seu trabalho para não atrapalhar o rendimento dos demais.
2.4. Perdendo os Sentidos.
Nessa forma, a vítima é constantemente acusada de erros, e de tanto ser acusada, passa a acreditar que é a principal causadora do problema, pois como foi dito anteriormente, o agressor não dá explicações de estar agindo com tamanha perversidade.
Segundo Marie-France Herigoyen, (2002, p. 59-60):

Na tentativa de compreender, a pessoa visada se perde em um questionamento infrutífero. Mesmo que venha a perguntar a opinião dos colegas sobre a situação, nada vai conseguir, pois, em geral, os colegas deixam de ser solidários. Mesmo que ela venha a corrigir aquilo que desagrada ao agressor, o processo continua até sua eliminação. O agressor, seja um indivíduo ou o sistema, trata de negar a agressão: “Não aconteceu nada. Esta pessoa está vendo fantasmas e criando caso”, ou então se recusa a carregar a responsabilidade: “Ela está sendo afastada, mas é porque é difícil (ou esquisita, ou histérica)!” Mesmo que acabe sendo desmascarado o agressor encontra uma desculpa qualquer. A lógica do bom senso é abandonada, e torna-se impossível compreender as razões dessas condutas, o que leva a vítima a duvidar de sua própria saúde mental. Dizem-lhe que é louca e, como ela não encontra explicações por ter sido afastada, termina por acreditar. É, no sentido estrito da palavra, uma maneira de levá-la à loucura.
Assim, a vítima se vê culpada mesmo sem ter feito nada, pois até os colegas não lhes dão a menor atenção ou explicação do que está acontecendo. A vítima perde a motivação, não se sente mais a vontade no ambiente de trabalho e com isso acaba abandonando seu emprego.
2.5. Agressões Diretas.
Geralmente as agressões se dão de forma indireta, tais como sussurros, fofocas, olhar de desprezo, pois assim fica mais fácil de ser negada pelo agressor, tendo em vista as agressões diretas permitem que sejam desmascaradas com mais facilidade, porém, tal forma não está descartada, já que por diversas vezes a vítima é agredida em público pelo agressor.
Apesar da essência do assédio moral ser caracterizada pelas agressões indiretas, diversas vezes as agressões diretas fazem parte do fenômeno. Assim, o agressor varia em suas atitudes gerando uma perturbação psicológica na vítima.
Entende-se que as agressões diretas apesar de não ocorrer com frequência, é uma forma bastante utilizada, sendo comum de ser verificada nos setores de produção, onde o contato entre os trabalhadores é mais intenso.
2.6. Diferenças entre Assédio Sexual e Assédio Moral.
É elementar a distinção dessas duas formas de assédio, pois apesar das duas formas de incidência apresentarem uma correlação, são termos distintos, no entanto frequentemente confundidos e utilizados como sinônimos, o que definitivamente é um erro. O assédio sexual nada mais é que a submissão contra a vontade da vítima a uma chantagem sexual, sob pena de se não ceder aos desejos do agressor ser prejudicado em seu trabalho.
Vê-se, pois, que a diferença entre o assédio sexual e o assédio moral é sem dúvidas o interesse do agressor em relação à vítima, no primeiro caso o que ocorre é um atentado contra a liberdade sexual, levando a vítima, por meio da força ou da coação, ceder aos desejos sexuais do agressor, já na segunda hipótese, fere-se a dignidade do ser humano, visando a eliminação da vítima do ambiente de trabalho.
Márcia Novaes Guedes (2005, p. 42) elucida:
A distinção entre assédio moral e assédio sexual é fundamental. As pessoas, normalmente, tendem a confundir os termos “assédio moral” e “assédio sexual”. Uma e outra violência não são modismos, são fenômenos que, em certos casos guardam alguma relação, mas que se distinguem radicalmente porque, enquanto o primeiro visa a dominar a vítima sexualmente, normalmente pela chantagem, o segundo visa precisamente à eliminação da vítima do mundo do trabalho pelo psicoterror.
Mais uma distinção é como já explicado na seção 1.2, a caracterização do assédio moral dar-se pela ação ou omissão de atos abusivos ou hostis praticados de forma sistemática e repetitiva de certa duração e frequência de forma consciente por parte do agressor com o intuito de afastar a vítima de seu trabalho. No assédio sexual não há a necessidade da habitualidade, é preciso apenas que se ocorra uma só vez, desde que seja caracterizado o assédio sexual.
No assédio moral, frequentemente o agressor age sorrateiro, por meio de gestos e sussurros, de maneira que é difícil de constatar a agressão. No caso do assédio sexual o agressor é mais ofensivo e direto, muitas vezes chega a tocar a vítima, sendo dessa forma mais fácil de perceber pelos colegas ou superiores hierárquicos.
O agressor não escolhe um gênero específico a vítima tanto pode ser do sexo masculino, quanto do sexo feminino, porém as mulheres, até por uma questão cultural, ainda são as maiores vítimas desse tipo de violência, principalmente quando são subordinadas ao empregador homem.

Márcia Novaes Guedes (2005, p. 42-43) aponta que:
O assediador é um perverso que se utiliza de truques rasteiros, de gestos obscenos e palavras de baixo calão, insinuações e piadas de mau gosto, pornografia no lugar de erotismo. No trabalho, as propostas constrangedoras frequentemente vêm seguidas de ameaças veladas, ou mesmo diretas, de represália em caso de recusa.
Pode ocorrer de o assédio sexual desencadear o assédio moral, isso ocorre quando o assediador não obtém sucesso com o assédio sexual, e o ofensor passa a assediar moralmente a vítima como uma forma de vingança. Nesse sentido Jorge Luiz de Oliveira da Silva (2005, p. 28) ressalta:
[...] a vítima rejeita com veemência o assédio sexual e passa a figurar como foco de perseguições contínuas, agora já com o objetivo de levá-la ao desequilíbrio e prejudicá-la profissionalmente, perpetuando-se uma espécie de vingança do outrora assediador sexual malsucedido. Tal desdobramento é bastante comum, pois revoltado com a recusa de sua proposta sexual, o assediador aproveita novamente o ambiente laboral para desenvolver sua vingança, através da tortura psicológica à vítima. [...]
Diferente do assédio moral, o assédio sexual em maio de 2001, por meio da Lei nº. 10.224, ingressou no nosso ordenamento jurídico no art. 216-A do Código Penal, e passou a ser crime punido com pena de detenção de 1 a 2 anos. Apesar de o assédio moral ainda não ter tipificação penal, este não deixa de ser punido.