As cartas da discórdia

"Belo horizonte, 3 ? 6 ? 921.

Amo. Raul Soares
Saudações afetuosas
Estou informado do ridículo e acintoso banquete dado pelo Hermes, esse sargentão sem compostura, aos seus apaniguados e de tudo que nessa orgia se passou. Espero que use com toda energia de acordo com as minhas ultimas instruções, pois, esse canalha precisa de uma reprimenda para entrar na disciplina. Veja o Epitácio mostra agora a sua apregoada energia, punindo severamente esses ousados, os que saírem da disciplina e prendendo para bem longe esses generais anarquizadores. Se o Epitácio com medo não atender, use de diplomacia, que depois do meu reconhecimento ajustaremos as contas.
A situação não admite contemporizações, os que forem venais. Que é quase a totalidade, compre-os com todos os bordados e galões.

Abraços do Arthur Bernardes"


"Minas, 6 ? 6 ? 921.

Meu caro Raul Soares
Saudações afetuosas
Ciente dos dizeres da última carta, fico inteirado dos compromissos tomados para o resultado seguro da Convenção. Todavia desacordo com outra prorrogação porque ela devia ter sido realizada antes da chegada do Nilo, pois, como V. disse, esse moleque é capaz de tudo. Remova toda dificuldade, como bem entender, não olhando despesas, o que já fiz ver ao João Luiz.
Das classes armadas nada devemos temer devido aos compromissos assumidos pelo Epitácio agindo com toda energia.
Da política mineira só tenho adiantar que os elementos do Salles estão sendo trabalhados tenazmente para abandoná-lo e que a sua candidatura à presidência do Estado está garantida porque obrigaremos os políticos recalcitrantes, sob pena de perderem as suas posições e V. quando me suceder continuará a levar na devida verba o que falta das grandes despesas que estamos fazendo, para que depois não venha a se dar escândalo.

Abraços do Arthur Bernardes."


O ponto de partida.
O ano era 1921, e o Brasil estava as vésperas de mais uma eleição, os candidatos eram Arthur Bernardes, da ocasião, e Nilo Peçanha, da oposição, este apoiado pelo exercito, que estava mais uma vez, desagradado do governo.
O desentendimento entre o exercito e as oligarquias dominantes, se deu devido a nomeação do civil Pandiá Calógeras para o ministério da guerra, pelo então presidente Epitácio Pessoa, o que provocou grande descontentamento aos militares.
A situação ficou ainda pior quando no dia 9 de outubro de 1921 o jornal "O correio da manhã" divulga a primeira das duas cartas supostamente escritas pelo então candidato a presidência Arthur Bernardes, a segunda carta foi publicada logo no dia seguinte, o que causou ainda mais indignação. Bernardes fez questão de negar a autoria das cartas.
De fato em 27 de dezembro do mesmo ano, peritos atestaram que as cartas eram falsas.
Apesar de toda a polêmica que as falsas cartas causaram, Arthur Bernardes foi eleito em março de 1922, com 1,5 milhões de votos, contra apenas 700 de Nilo Peçanha. Em maio de 1929, dois falsários confessaram ter forjado as cartas.
O fato, é que essas cartas, foram apenas os estopins da grande revolta que se seguiria nos próximos dias no país, pois depois dos fatos ocorridos Hermes da Fonseca foi preso, e o clube militar fechado, setenta e duas horas depois estava declarado a tenentista, que originou o fatídico episódio dos dezoito do forte.

Um pouco sobre os envolvidos.
O correio da manhã.
O correio da manhã, nasceu no Rio de janeiro, em 1901 pelas mãos de Edmundo e Paulo Bittencourt, ficou famoso por estar sempre a par, dos governos, e fazer oposição a quase todos os presidentes do Brasil, por este motivo foi perseguido e fechado diversas vezes, a sua ultima edição foi publicada em 1972. Contou sempre com a participação de grandes nomes da nossa literatura, como por exemplo, Lima Barreto, e Carlos Drummond de Andrade.
Arthur Bernardes (1875 ? 1955).
Nasceu em Viçosa, Minas Gerais, e se formou em direito na universidade de São Paulo, começou sua vida publica como presidente da Câmara Municipal ocupou diversos cargos públicos até chegar a presidência da republica em 1922.

Hermes da Fonseca (1853 ? 1923).
Nascido no Rio Grande do Sul, sobrinho do primeiro presidente da republica, Marechal Deodoro da Fonseca, estudou na escola militar, foi um dos fundadores do clube republicano do circuito militar, ocupou vários cargos públicos e militares ao longo da vida, foi eleito presidente em 1910, morreu em Petrópolis, Rio de janeiro, em 1923.

Fontes:
Enciclopédia Barsa 1973 - livro três pág. 114.
Livro: História do Brasil (Folha de São Paulo)
http://www.almanaquedacomunicacao.com.br/artigos/1749.html
http://www.passei.com.br/tc2000/historia2/2hb25.pdf
http://educacao.uol.com.br/biograf. jhtm
http://books.google.com.br