Artigo: Alagoas: terra de sequestros, estupros e assassinatos de menores

Roberto Ramalho é advogado, jornalista, relações públicas e blogueiro

Finalmente, embora de maneira triste e dramática, após denúncia anônima feita por telefone, a polícia encontrou, na manhã de sábado (19), em uma área de mata da usina Guaxuma, os corpos das adolescentes Eduarda dos Santos e Cinthia da Silva Santos, ambas de 15 anos, que estavam desaparecidas desde o início da semana e tinham sido sequestradas.

A informação foi confirmada pelo delegado de Coruripe, José Carlos Sales, que investiga o caso. Os corpos encontrados em numa mata serão levados ao IML para confirmar a causa da morte das menina Maria Eduarda dos Santos, 14, e Cíntia Santos da Silva, 15. As amigas haviam desaparecido no último dia 10 ao sair de suas residências para ir à farmácia.

Os corpos estão em avançado estado de decomposição e, ao que tudo indica, serão necessários exames de DNA para identificação. Na quinta-feira (17), dois suspeitos foram presos. O dono do Punto, Raphael Lima, e um colega conhecido apenas como Darlan. Segundo testemunhas, as meninas teriam entrado no veículo de Rapahel no dia do ‘sumiço’.

A prisão de Raphael Lima e Darlan da Silva foi decretada pelo Poder Judiciário na noite da última quinta-feira (17). Algumas testemunhas que prestaram depoimento à Polícia, afirmam que os dois têm ligação com o sumiço das jovens. As amigas desapareceram no dia 10 de maio, ao saírem de suas residências para irem à farmácia. Elas foram vistas pela última vez nas imediações do Posto Liberal, indo em direção ao Centro.

O jovem de nome Lima acusado de ter sequestrado as meninas afirmou que lembrou que mesmo diante das acusações, se apresentou espontaneamente à Polícia. Disse ele: “Quero também dizer que de livre e espontânea vontade compareci à Delegacia de Coruripe, no dia 16 de maio de 2012 e prestei declarações que foram anexadas ao inquérito policial e juntamente, disponibilizei meu carro, de marca Punto, cor bege da cidade de Coruripe, também de livre e espontânea vontade para que seja feita a perícia no mesmo e que sejam esclarecidas qualquer dúvidas”, concluiu.

O acusado ainda pediu para que a sociedade não se deixe levar por tramas maquiavélicas. Afirmou ele: “Quero aqui neste momento declarar o meu total respeito às famílias em questão e dizer que a sociedade de Coruripe, da qual faço parte, não faça qualquer tipo de julgamento antecipado, pois temos muitos casos de inocentes que passaram muitos anos na prisão por causa de erros ou até mesmo tramas maquiavélicas”, disse.

No ano passado, coincidentemente também duas jovens menores desapareceram e foram encontradas mortas.

Enquanto isso, a garota Roberta Lopes, que está ou estava grávida de dois meses, continua desaparecida, e a polícia civil continua investigando seu paradeiro.

E de acordo com “O GLOBO”, em edição dessa quarta-feira, dia 23.05.12, o Ministério da Saúde revela que mais de cinco mil menores de dez anos foram violentados em 2011. Todos os dias do ano passado, aproximadamente 14 crianças, com idade abaixo de 10 anos foram vítimas de algum tipo de abuso sexual no país. O número alarmante faz parte de um levantamento inédito realizado pelo Ministério da Saúde, com base nas notificações computadas pelo sistema de Vigilância de Violências e Acidentes (Viva), que agrupa dados repassados mensalmente por unidades de saúde pública e privada. Em 2011, foram contabilizados 14.625 registros de violência contra crianças de zero a nove anos. Desse total, 5.118 ou 35% dos casos estão relacionados à violência sexual.

E alarmados e chocados com o depoimento da apresentadora Xuxa Meneghel ao programa “Fantástico” da rede Globo de Televisão, deputados que integram a CPI sobre Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes da Câmara apresentaram dois requerimentos para que ela fale ao colegiado sobre os abusos que sofreu. Xuxa revelou que foi vítima no último domingo, no "Fantástico" de violência sexual. A votação dos requerimentos será no dia 29, já que os deputados querem antes consultar a apresentadora.

Cada vez mais, crianças inocentes que apenas necessitam de carinho e atenção dos seus familiares e amigos, são traídas pela confiança depositada neles, acabando muitas das vezes por serem barbaramente exploradas e abusadas.

Normalmente crianças isoladas e com carência de afeto são o alvo perfeito para serem atacadas pelos molestadores de crianças.

Como ser humano, advogado, jornalista, e chefe de família, cito o seguinte:

  • • “Mais de 60% dos atos de pedofilia são praticados dentro de casa, por pais, tios, primos e amigos da família”.
  • • “Cerca de 70% dos casos de pedofilia pertencem a comportamentos repetidos, desencadeados principalmente por familiares ou amigos das crianças”.
  • • “Cerca de dois terços dos pedófilos são atraídos por crianças do sexo oposto”.
  • • “A maioria dos pedófilos conhece a criança que abusa, e estão sempre por perto”.
  • • “É raro acontecer dos pedófilos pararem depois da sua primeira vítima”.
  • • “Muitos dos pedófilos encontram-se na maioria das vezes sob o efeito da droga ou do álcool no momento em que praticam o abuso”.
  • • “Menos de 5% dos pedófilos são diagnosticados como sendo mentalmente perturbados ou psicóticos”.

Cada vez mais, crianças inocentes que apenas necessitam de carinho e atenção dos seus familiares e amigos, são traídas pela confiança depositada neles, acabando muitas das vezes por serem barbaramente exploradas e abusadas.

Muitas das vezes, as crianças são literalmente envolvidas em casos de atividade para a produção de pornografia e em redes de prostituição infantil. “De acordo com os dados divulgados pelos investigadores das polícias europeias, em 2001, só na Europa havia um milhão e duzentas mil crianças identificadas em fotografias na Internet, pertencentes a redes pedófilas.” (Fonseca, Soares e Vaz, 2003).

Compreende-se que a violência é complexa polissêmica, controversa, um fenômeno que expressa uma realidade plural. Sua definição é um desafio permanente, que não se submete a uma descrição fácil. Os atos que o termo abarca correspondem a uma enorme diversidade de definições e abordagens no campo das ciências que deles se ocupam (MINAYO et al. Apud GONÇALVES, 2003).

A violência contra a criança e o adolescente constitui-se em todo ato ou omissão de pais, parentes, outras pessoas e instituições capazes de causar danos físicos, sexual e/ou psicológico à vítima. De um lado, implica uma transgressão no poder/dever de proteção do adulto e da sociedade em geral e, de outro, na coisificação da infância, isto é, numa negação do direito que crianças e adolescentes têm de serem tratados como sujeitos e pessoas em condições especiais decrescimento e desenvolvimento (ASSIS; AZEVEDO; GUERRA apud MINAYO, 2002, p. 95).

Os crimes que vêem sendo praticados contra essas jovens menores estão devidamente tipificados no Código Penal Brasileiro e que foram alterados pela lei nº 12.015, de 2009. Vejamos abaixo:

DOS CRIMES CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL. (Redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009)

CAPÍTULO I - DOS CRIMES CONTRA A LIBERDADE SEXUAL. (Redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009)

Estupro

Art. 213.  Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso: (Redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009)

Violação sexual mediante fraude (Redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009)

Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com alguém, mediante fraude ou outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação de vontade da vítima: (Redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009)

Assédio sexual (Incluído pela Lei nº 10.224, de 15 de 2001)

“Constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função”. (Incluído pela Lei nº 10.224, de 15 de 2001)

CAPÍTULO II - DOS CRIMES SEXUAIS CONTRA VULNERÁVEL. (Redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009)

Estupro de vulnerável (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)

Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos: (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)

Incorre na mesma pena quem pratica as ações descritas no caput com alguém que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência. (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)

Corrupção de menores

Induzir alguém menor de 14 (catorze) anos a satisfazer a lascívia de outrem: (Redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009)

Satisfação de lascívia mediante presença de criança ou adolescente (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)

Praticar, na presença de alguém menor de 14 (catorze) anos, ou induzi-lo a presenciar, conjunção carnal ou outro ato libidinoso, a fim de satisfazer lascívia própria ou de outrem: (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)

Favorecimento da prostituição ou outra forma de exploração sexual de vulnerável (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)

Art. 218-B.  Submeter, induzir ou atrair à prostituição ou outra forma de exploração sexual alguém menor de 18 (dezoito) anos ou que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, facilitá-la, impedir ou dificultar que a abandone: (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)

Observe-se, ainda, que a Lei Maria da Penha (LEI Nº 11.340, de 7 de agosto de 2006) só é aplicável em casos de violência doméstica e familiar contra a mulher. E que para os efeitos desta lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial:

I - no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas;

II - no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa;

III - em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação.

Parágrafo único.  As relações pessoais enunciadas neste artigo independem de orientação sexual.

E o mais grave de tudo, é que resultou em morte, portanto, crimes contra a vida, sendo a pena aplicada, caso os acusados sejam julgados e declarados culpados, a aplicação de pena de 30 anos de reclusão.

No Relatório Mundial sobre Violência e Saúde, organizado pela OMS (Organização Mundial de Saúde), a violência sexual é definida como “qualquer ato sexual ou tentativa de ato sexual não desejada, ou atos para traficar a sexualidade de uma pessoa, utilizando coerção, ameaças ou força física, praticados por qualquer pessoa, independentemente de suas relações com a vítima, em qualquer cenário, incluindo, mas não limitado o do lar ou do trabalho”. As vítimas são em sua maioria meninas, mulheres jovens e mulheres adultas, apesar de meninos, também serem vítimas. As meninas de 0 a 15 anos são as mais afetadas e correspondem a 60% dos casos que são registrados na polícia. (OMS, 2002).

Podemos também afirmar que embora o assunto tratado seja de cunho sociológico, antropológico, psicológico e familiar, no meu entendimento essa violência toda desencadeada contra jovens mulheres de menor idade, é culpa da omissão do Estado, representado aqui pela Segurança Pública e pela falta de punição do Poder Judiciário, criando o que se denomina de impunidade.

Essa tipologia criminosa não pode mais continuar, e a OAB de Alagoas tem também a obrigação de dizer para o Estado de Alagoas, melhor prestar um serviço de segurança a população, inclusive, aos jovens, que saem à noite nos fins de semana para se divertirem, mas temem que algo de ruim possam lhes acontecer de mal e terminarem também sendo assassinados ou desaparecerem.

Se essa violência continuar, de iniciativa própria, como advogado, vou requerer intervenção federal no Estado de Alagoas, mesmo sabendo que terei meu pedido será negado por membros de um Poder Judiciário que se comportam covardemente ou de modo frouxo.

Se for para exercerem a magistratura dessa forma, é melhor não existir Poder Judiciário em Alagoas.

Finalizando, não estou com essas palavras querendo ofender ninguém. Pelo contrário, temos um exemplo típico de juízes corajosos – não confundir com valentes – que tem agido com o rigor da lei e conseguindo prender muita gente que praticam crimes, de toda natureza. É o caso dos juízes da 17ª Vara Criminal. O problema, infelizmente, é que dois ministros do STF, Gilmar Mendes e Marco Aurélio Mello, tem concedido Habeas Corpus a muita gente que envereda ou enveredou pelo caminho do crime, e depois de estar preso, pouco tempo depois está solto para responder pelos seus atos em liberdade. É o caso do médico Roger Abdelmassih que usou o Habeas Corpus de Gilmar Mendes para fugir do país. O médico Roger Abdelmassih havia sido condenado pela juíza Kenarik Boujikian Felippe, da 16.ª Vara Criminal de São Paulo, a 278 anos de prisão em sentença proferida à época, em 2010. O médico foi acusado de estupro e tentativa de estupro contra pelo menos 39 pacientes e foi absolvido em apenas sete casos. Da mesma maneira aconteceu com o ex-banqueiro Salvatore Caciolla, que também se aproveitou de um Habeas Corpus do Ministro Marco Aurélio Mello para fugir para a Itália. Sobre o assunto, inclusive, segundo divulgou a imprensa, Marco Aurélio Mello disse que Caciolla tinha mesmo todo o direito de fugir para a Itália. Caciolla, no entanto, foi preso novamente, no principado de Mônaco, por pressão do delegado Romeu Tuma Jr., que à época ocupava um posto de destaque no Ministério da Justiça. Hoje o banqueiro está solto, em razão de ter cumprido ½ da pena.

Referências Bibliográficas

AZEVEDO, Maria Amélia; GUERRA, Viviane Nogueira de Azevedo (Org.). Infância e violência doméstica: fronteiras do conhecimento. 4. Ed. São Paulo: Cortez, 2005.

MINAYO. Maria Cecília de Souza. O significado social e para a saúde da violência contra crianças e adolescentes. In: ___ WESTPHAL, Márcia Faria (Org.). Violência e criança. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2002. p. 95 a 124.

ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE - Relatório Mundial sobre Violência e Saúde – um problema mundial de saúde pública, Genebra – 2002.

Fontes: Código Penal e Lei Maria da Penha.