Aquele Homem

Chovia muito quando aquele homem saiu de casa rumo ao trabalho no outro lado da cidade; apesar do mal tempo fazia muito calor e ainda faltava muito para o amanhecer.

Depois de caminhar por cerca de meia hora desviando-se de poças d`água e da lama que se acumulavam nas ruas sem calçamento, ele chegou ao ponto de ônibus onde uma grande fila já se formara.

Quando o veículo chegou ao local aquele pessoal todo se jogou para dentro dele no afã de conseguir um lugar sentado; e aquele homem foi levado não se sabe como para dentro e percebeu que mais uma vez teria que passar as duas horas de viagem de pé no corredor.

Quando estava a meio caminho de seu destino o homem sentiu um grande impulso em seu corpo que o jogou no colo de uma senhora que estava sentada logo à frente dele. Sem saber direito o que se passava, ele sentiu que a mulher o agredia com palavras e com a bolsa que carregava. Voltando a si percebeu que o veículo fora fechado por outro, quase ocasionando um sério acidente. O homem olhou em volta e viu que alguns dos passageiros passaram a fazer piada de sua queda e sem reagir baixou a cabeça, e seguiu em silêncio.

Depois desse acontecimento, o trânsito parece ter parado, ninguém andava; um caos total.Nosso homem chegou ao trabalho com uma hora de atraso e teve de ouvir um sermão de seu chefe imediato, além de ser informado que a demora seria descontada em seu salário. Colocou suas coisas no armário, trocou a roupa e começou seu serviço como faxineiro em uma grande empresa. Chateado ainda com as duras palavras do chefe, foi direto ao primeiro andar iniciar a limpeza.Devido às chuvas da manhã o saguão do prédio estava molhado e bastante sujo, mas isto não era problema, porque ele estava acostumado a trabalhar pesado. o que realmente o incomodava era a postura das pessoas que chegavam ao edifício; como por exemplo, duas jovens que conversavam algo inteligível aos seus ouvidos, e que passaram sem o notar, deixando pelo caminho um rastro de lama dos sapatos e água que caia de seus guarda-chuvas; sendo que na entrada havia um tapete para se limpar os pés. O homem suspirou sem esperança que alguém notasse sua indignação.

Na hora do almoço nosso "herói" lembrou-se que devido à pressa não havia colocado sua marmita na geladeira da cantina, como de costume... Tarde demais; a comida estava com um odor desagradável. Porém, o que fazer? O que o alimentaria para continuar a labuta? Comeu sem pensar!

Ao longo de toda a tarde sentiu os efeitos da má alimentação em seu corpo. Começou a sentir calafrios, sentiu vertigens e foi obrigado a correr ao banheiro. Fraco e cansado terminou mais um dia se serviço e se preparou para voltar ao lar.

Para a condução... mais fila. No trajeto... mais confusão. Na estrada para casa... mais lama.

Foi recebido pela esposa que veio logo lhe dizendo que as compras do mês estavam por acabar e ela não sabia o que fazer. No banho, sozinho, suspirou ao pensar no que faria para manter a família.

Saiu do banheiro renovado... deparou-se com os filhos a brincar com um pedaços de madeira, simulando que seriam seus carros de corrida... um nó ficou preso na graganta.

Depois de comer algo, muito pouco, pois ainda sentia o estômago "embrulhado", foi se despedir das crianças antes de ir para a cama. Já na cama elas ainda faziam algazarra e pareciam estar se divertindo bastante. Sem perceber a presença do pai que se aproximava da porta, os meninos conversavam animadamente quando um deles disse:

"Quando eu crescer, quero ser igaul ao papai!"

Um soluço ficou preso na garganta daquele homem, que fecou os olhos e sentiu que uma lágrima lhe corria pela face.


Obs: Esta é uma obra de ficção, qualquer semelhança com a realidade terá sido mera coincidência?