No meu percurso de assessor pedagógico da Gerência de Ensino Fundamental na cidade de Serra no Espírito Santo , imerso nos  cotidianos das escolas, ouvi muito dizer que os estudantes também ensinam algo aos professores, quando trazem suas lógicas, conhecimentos, experiências de vida para o cotidiano escolar. Indaguei sempre acerca do que eles ensinam? Como os conhecimentos trazidos pelos alunos entram no planejamento das aulas? 

Em 2017, visitando as festas culturais de algumas escolas de Ensino Fundamental de Serra, agucei os meus sentidos no intuito de identificar a aprendizagem inventiva. Amparado em Certeau (1995), acredito que os estudantes também inscrevem trajetórias, não determinadas, mas inesperadas, que alteram, corroem e mudam pouco a pouco os equilíbrios dos cotidianos escolares. Nessa esteira, “cacei” nas mostras culturais, a criação, a inventividade, a autoria dos alunos. Encontrei. O meu achado estava ali,  nas danças apresentadas.  

Estive em sete  escolasl. Assim,  compartilho neste texto algumas inquietações que estão pedindo passagem, acreditando, como Bakhtin, que os sentidos de um texto não se encerram nele mesmo, nem nas capacidades cognitivas do leitor, numa terceira via, o texto é o lugar da interação verbal. Nesse intento, espero criar uma cadeia enunciativa em torno da aprendizagem inventiva nos contextos escolares. 

O que vi  de aprendizagem inventiva? 

Ao trabalhar com música, os professores permanecem nos clichês. O que se vê como proposta, na maioria das vezes, são produções culturais embaladas  por Planeta Água , Aquarela e Palavrinhas Mágicas.  Desse modo, o que fica evidenciado é o gosto do adulto. 

Nesse sentido, fica posto em  Alves et al (2011) , quando afirmam que “[...] a concepção de currículo como guia curricular é redutora, na medida em que (sic) privilegia a dimensão produto do currículo, deixando de fora todo o processo de produção sociocultural que se estabelece no cotidiano da escola”.

No entanto, em algumas unidades de ensino, vi os estudantes realizando coreografias com as músicas de Sia (Austrália), Demi Lovato (Estados Unidos), Anitta (Brasil) e MC Gui (Brasil). Desconfiei que aquele tipo de show de talentos, poderia não ter nascido do coração dos professores para os alunos, mas só desconfiei ... Seria preconceito de minha parte, afirmar que professoras não ouvem Funk e nem bailam ao som do pop internacional. 

 Dialogando com o corpo pedagógico, verifiquei que as ideias das danças e músicas nasceram a partir das demandas das crianças e adolescentes. A aprendizagem inventiva aparece nesses processos de seleção das músicas, ensaios e apresentação final. Certamente que as canções passaram pelo crivo dos professores, que após analise, organizaram tempos-espaços para que tudo acontecesse, pois sem a mediação qualificada dos docentes, a festa não “rola”. 

Considero que as práticas de ensinagem não devem direcionar na totalidade o que se deve aprender. Nas festas culturais, percebi que alguns professores já caminham, mesmo que de forma incipiente , em direção de uma aprendizagem inventiva, onde o estudante também exerce sua autoria. Considero que a partir das pressões dos discentes, ao trazerem para o cotidiano escolar suas referenciais musicas, temos, em parte, o que nos acena Freire em Pedagogia da Autonomia: “Não há docência sem discência”.