Mariana Fernandes dos Santos[2]

Em qualquer espaço educativo a aprendizagem é fundamentada, mesmo que inconscientemente, por diferentes epistemologias. Essas epistemologias estudadas pela psicologia, antes ocupavam o espaço de discussão da filosofia e só mais tarde foram aplicadas à educação

As teorias psicológicas que fundamentam o processo de aprendizagem no meio educacional seja ele presencial ou digital sofreram fortes influências das teorias filosóficas desenvolvidas nos séculos XVI e XVII. Nesse sentido, as epistemologias racionalistas, empiristas e interacionistas influenciaram diretamente os estudos das teorias psicológicas da aprendizagem.

A influência dessas bases filosóficas sempre dependeu do desenvolvimento de estudo e do momento de produção do conhecimento. Isso se deve pelo fato de haver diversas formas de conceber o fenômeno educativo. Pois este não se concebe numa realidade acabada, ao contrário,depende de múltiplos aspectos.Sobre isso nos reportamos a idéiasa seguir que se referem ao processo educativo:

É um fenômeno humano, histórico e multidimensional. Nele estão presentes tanto a dimensão humana quanto a técnica, a cognitiva, a emocional, a sócio-política e cultural. Não se tratade mera justaposição das referidasdimensões,mas sim, da aceitação de suas múltiplas implicações e relações.(MIZUKAMI,1986,p.1)

De acordo aos estudos existentes sobre ensino/aprendizagem constatamos que sempre há um aspecto privilegiado em detrimento de outro, segundo a uma determinada teoria. As teorias do conhecimento que embasam as correntes psicológicas de aprendizagem, apesar de suas diversidades, possuem como pontos chaves em suas discussões a função de sujeito e de objeto e ainda a relação entre os ambos.

Os empiristas, por exemplo, focam no objeto, entendem que o aprendente sofre influência determinante do meio, por isso o conhecimento é a cópia do mundo exterior. Assim, o indivíduo é uma 'tábula rasa' sem maturação cognitiva.

... essa pedagogia, legitimada pela epistemologia empiristas,configura o próprio quadro da reprodução da ideologia;reprodução do autoritarismo, da coação, da heteronomia,da subserviência, do silêncio, da morte da crítica, da criatividade, da curiosidade.(BECKER,2001,p.18)

Já os inatistas, que concentram os olhares para o sujeito, postulam ao contrário dos empiristas, que o conhecimento está pré- determinado pelo sujeito e que o ambiente externo não influência e sim os estímulos sensoriais do aprendente. É o que Piaget (1967), chamou de "exercício de uma razão já pré-fabricada". Enquanto na primeira epistemologia há uma ênfase no que é pré-determinado, exógeno, no segundo há uma centralização do que é endógeno.

E falando na ótica do interacionismo, vemos uma relação entre sujeito-objeto, em que o conhecimento é entendido como uma complexa construção que implica a interação entre educando e educador. Configura-se uma relação dinâmica entre o biológico, o físico e o social. Essas diferentes teorias fundamentam diferentes concepções de ensino e de aprendizagem numa prática pedagógica. E são influenciadas pelo contexto histórico, social e cultural vigente na sociedade.

Dessa maneira, a aprendizagem no mundo digital surge como uma modalidade de educação adequada às novas demandas sócio-educacionais que caracterizam o mundo globalizado e a sociedade contemporânea alicerçada em informações dinâmicas. E essa aprendizagem, que tem sua gênese há alguns anos, mas que constrói sua consolidação na contemporaneidade é influenciada pelas teorias tradicionais. Fato que muitas vezes implica em concepções equivocadas do uso e da compreensão da educação on line.

Em sua essência a Educação on line configura-se no contexto da epistemologia interacionista, mas como dito, é entendida muitas vezes como reflexo das teorias reducionistas tradicionais. Isso deve-se ao fato dela significar para alguns como a volta da educação tecnicista dos anos de outrora.Apesar de que em alguns casos, devido a certas práticas,isso configura-se verdade.Essa confusão é parcialmente explicada pela falta de equidade no acesso à informações e aos recursos necessários para o estudo e compreensão das transformações sociais.Por isso, a sociedade senti essas transformações, porém tem dificuldade de adequar-se por está acostumada com outros referenciais.Fato que dificulta a reconstrução de novos paradigmas.

É o que discuti (ZAINA, 2002), quando afirma:

...todavia, romper os paradigmas da educação tradicional e implementar caminhos seguros para a nova realidade educacional tem sido tema de estudo para muitos pesquisadores na área educacional e tecnológica.

Nesse sentido, as teorias psicológicas da aprendizagem desenvolvidas no contexto histórico e social do século passado não são suficientes para fundamentar essa modalidade de educação que subjaz uma aprendizagem dinâmica, colaborativa e cooperativa, em que a mediação ocorre numa relação dialógica entre o binômio homem e tecnologia.

Surge então nesse cenário a necessidade de uma epistemologia que explique as peculiaridades da aprendizagem nos espaços virtuais. Para isso, os autores Pierre Lévy e Félix Guatarri nos apresentam a teoria da ecologia cognitiva no intuito de levar a adequada compreensão das potencialidades e possibilidades de aprendizagem interagida pelas tecnologias intelectuais. Visto que ecologia refere-se às relações, interações e diálogos entre organismos e cognitiva a relação com um novo conhecimento, a teoria aqui em discussão propõe o estudo de uma nova dinâmica na relação entre homem, tecnologia e ambiente de aprendizagem, no intuito de estabelecer e compreender outras formas de aprendizagem e construção do conhecimento.

O termo Ecologia Cognitiva surge a partir das discussões sobre a Ecologia da Mente de Guattari et al."A ecologia cognitiva consiste num espaço interativo de cognição individual em que são construídas e reconstruídas as competências cognitivas"(GUATARRI, 1999).Um espaço onde configuram-se as diferentes formas de conhecer,pensar e aprender.Nessa perspectiva,surge a teoria psicológica ecologia cognitiva para fundamentar o processo de aprendizagem mediada pelas Tics, que por ser tão mais dinâmico e complexo em alguns aspectos,é mister uma teoria específica para a sua compreensão.

Palloff e Pratt (2002 apud KOSLOSKY, 2004, p. 72) afirmam que:

[...] o uso da tecnologia abre novos horizontes para que os alunos construam novos conhecimentos, aprendam sobre si próprios, sobre seus estilos de aprendizagem e sobre como trabalhar em conjunto em equipes distribuídas geograficamente. Todas essas habilidades são transferíveis ao mundo do trabalho e adquiridas da participação em comunidades de aprendizagem virtuais.

Nessa vertente, a aprendizagem on-line deve enfatizar a interação, cooperação (colaboração) e a construção do conhecimento, ou seja, o discente passa a ser indivíduo gestor e autônomo na edificação do seu saber e do grupo ao qual pertence.

É fato que a educação a distância vem passando por um processo evolutivo constante ao longo da sua história. Nos dias atuais, a necessidade de qualificação de recursos humanos e o desenvolvimento das tecnologias virtuais, particularmente, a internet, vêm contribuindo para alavancar este processo de ensino-aprendizagem. Contudo, a caminhada rumo a excelência é árdua e repleta de paradigmas que colocam em suspeição a eficácia da educação à distância. Porém, iniciativas implementadas em vários países ratificam o sucesso da educação a distância on-line como uma maneira de democratizar o saber.

Pelo exposto, é urgente que neste 'novo' modelo de ensino, professores e discentes devam possuir papéis bem definidos e não simplesmente transpor as aulas expositivas e a situação passiva, respectivamente, do ensino tradicional para o ambiente virtual. É imperioso o uso das ferramentas síncronas e assíncronas para desenvolver a colaboração, a interação, os embates de idéias no processo de aprendizagem e, sobretudo o acesso e a democratização do conhecimento.

REFERÊNCIAS

BRASIL - MCT. Sociedade da Informação no Brasil. Livro Verde, Brasília, MCT, Setembro de 2000.

CASTELLS, M.A. A Sociedade em rede. Paz e Terra, 1999.

BECKER, F. 2001. Educação e Construção do Conhecimento. ARTMED, Porto Alegre.

GUATARRI, Félix. As três ecologias. 1999.

LA TAILLE,Yves de :Piaget, Vigotsky, Wallon:Teorias psicogenéticas em discussão.11B.São Paulo:Sammmmus,1992.

LÉVY, Pierre. As Tecnologias da Inteligência. O futuro do pensamento na era da informática. Tradução de Carlos Irineu da Costa. Rio de Janeiro: Ed. 34, 1993.

MIZUKAMI, Maria da Graça. Ensino: As abordagens do processo. São Paulo: EPU, 1986.

PALLOFF, Rena M.; PRATT, Keith. Construindo comunidades de aprendizagem no ciberespaço: estratégias eficientes para a sala de aula on-line. Tradução Vinícius Figueira. Porto Alegre: Artmed, 2002. PRIMO, Alex. Avaliação em processo de educação problematizadora online. In: SILVA,

ZAINA, Luciana Aparecida Martinez. Acompanhamento do aprendizado do aluno em cursos a distância através da Web: metodologias e ferramentas.2002.169 f. Dissertação(Mestrado em Engenharia) ? Escola Politécnica da Universidade de São Paulo,SãoPaulo,2002.Disponívelem:<http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/3/3141/tde-13012003095336/>. Acesso em: 30 jul. 2006.

http://www.escola2000.org.br/pesquise/texto/textos_art.aspx?id=54

[1] Texto elaborado como requisito avaliativo para a disciplina Psicologia Ecológica no curso de Especialização em Educação a Distância da UNEB-VALENÇA.

[2]Graduada em Letras-Vernáculas pela UNEB.Pós-Graduada em Ensino de Língua Portuguesa e Literatura. Pós ? Graduanda em Educação a Distância pela UNEB. Atua como docente em cursos presenciais e a distância de nível superior.Tutora presencial do curso de Letras-Vernáculas-UESC.Professora da Educação Profissional do Estado da Bahia e da Educação Básica no município de Ipiaú/Bahia.