Aprendizagem e autonomia do educando

Sebastião Maciel Costa (*)

O ser humano, ao longo de sua história tem registrado infinitas conquistas que coloca o homem no topo da busca, da pesquisa, da curiosidade, da hipótese, da utopia e das verdades. Uma das mais fortes fontes de poder de que o homem dispôs e dispõe em todas as faces da história é a sua autonomia. O domínio sobre o que idealiza, sobre o que propõe e o que realiza. Na perspectiva de “status” a autonomia confere ao sujeito-agente a classificação onde o mesmo se coloca diante de si, dos seus propósitos e o do outro. Com o passar do tempo, o ato autônomo, consciente, maduro ecoa para as futuras gerações, como um indicativo de grandeza, destaque, liberdade e confiança. Autonomia:1 Qualidade ou estado de autônomo.2 Sociol e Polít. Autodeterminação político-administrativa de que podem gozar, relativamente, grupos (partidos, sindicatos, corporações, cooperativas etc.), em relação ao país ou comunidade política dos quais fazem parte. 3.Liberdade moral ou intelectual.4 Biol Independência funcional de partes do organismo ou do organismo inteiro. (Moderno Dicionário - Michaelis ).
A autorregulação no processo de ensino aprendizagem apresenta algumas linhas que embricam em questões que nos conduzem ao processo de avaliação que resulta de um gradativo caminhar entre os primeiros sinais de aprendizagem e a confirmação da apreensão de conteúdos que trabalhados nos indicam que houve liberdade, direito, reconhecimento, espaço, oportunidade e autonomia dos envolvidos. Esse envolvimento professor-aluno implica o sentimento de autonomia de forma bilateral: o professor dispondo de autonomia para conduzir, em nome de sua escola o processo de ensino, respeitando limites e vontades e o aluno com o reconhecimento de que o seu saber não precisa ser buscado por meio de sacrifícios e renúncias no seu modo de ver, pensar e agir.
Nesse raciocínio, o aluno, consciente do seu papel de produtor do conhecimento estabelece metas que confirmam a necessidade de um balizamento entre o que ele faz para aprender, o que ele aprende, como aprende e o que fará com o que aprendeu. No processo de ensino/aprendizagem, apostar na autorregulação seria a forma racional se não mesmo a única forma racional que os professores deviam investir em suas atividades. Esta é a postura ou deveria ser a postura do professor que efetivamente pretenda ajudar seus alunos a aprender. (Hadji (2011)
Historicamente, a escola trabalhou com o professor dono do conhecimento. Esse preconceito levou o sistema educacional brasileiro a resultados insatisfatórios e, em muitos casos, catastróficos. Quando o professor, de fato, detinha um conhecimento acadêmico flexível e capaz de adequar-se à realidade de aluno, havia as conquistas, registravam-se dados positivos ainda que tímidos, visto que o mundo vivido pelo professor está diametralmente oposto à realidade vivida pelo aluno. Esse desencontro de valores e dados, aumentava a distância entre os efetivos motivos apresentados pela escola e a leitura que o aluno, com a sua realidade, como os seus sonhos, projetos e limitações esperava aprender, para melhoria da sua qualidade de vida. O entendimento não satisfazia nem ao professor, nem ao aluno. Reforçava-se o mito de que se o aluno não prendeu, a culpa é do professor. Nesse mesmo eixo, o que prevalece é o estigma de que se o professor ensinou, o aluno aprendeu. E não deixa de ser, na medida em que o professor não se permite reconhecer os saberes do aluno e nem se reconhece como mero mediador de um processo dinâmico onde há permanente jogo de perde-e-ganha para todos, é lastimável para qualquer proposta. O professor com essa visão, certamente respaldava-se do no sistema vigente como forma de se manter acima de qualquer suspeita, como senhores do conhecimento. Era um ambiente favorável para que estabelecesse que estimular a autonomia e o crescimento do aluno, durante o processo de ensino-aprendizagem era declarar que o professor passaria a ser uma figura dispensável no processo.
A águia para alçar voo precisa ser estimulada a arriscar-se a aprender a voar com as suas próprias condições. O aluno precisa caminhar com as suas pernas, com os seus conhecimentos prévios que vão, aos poucos de cristalizando, acumulando-se, transformando e fazendo avançar um processo onde não vencido, todos serão vencedores: aluno, professor, escola, sistema, comunidade, por assim dizer.
Pode-se perfeitamente discutir que a educação, que veio antes da escola será sempre vista por ângulos adversos a partir do interesse de quem olha. A Educação precisa impor-se como a melhor solução para todos os problemas do homem; a Escola precisa defender seus ideais de formação acadêmica sob qualquer ângulo, muitas vezes, a qualquer custo; o professor precisa impor-se como senhor do seu tempo e do seu espaço. Afinal, ele se preparou a vida inteira para encontrar uma forma de produzir o seu próprio sustento; o aluno vem a reboque, como massa de manobra, como caça apreendida para entre quatro paredes obedecer, sem direito, muitas vezes, a sequer, pensar em pensar quanto mais se manifestar. Certamente é na escola que muitos alunos vêm buscar conhecimentos e encontram limites; vêm buscar soluções e encontram problemas; vêm para ampliar horizontes e sentem-se manietados, massificados, omissos, reduzidos a um número, a um registro, a uma matrícula.
O professor que o aluno espera, pelo menos nos dias de hoje é que seja capaz de antever o que o aluno quer aprender, que entenda o seu jeito de ser, que respeite o seu ritmo de aprendizagem, que não pare de ensinar quando chegam as férias, que esteja disponível no seu tempo de querer aprender, que se interesse pelos mesmos assuntos, que defenda os mesmos ideais. Mas tudo isso que ele espera de um professor ideal, está nele mesmo, se ele sabe o que gostaria de ter é porque se reconhece capaz de idealizar. E se é capaz de idealizar, é porque sente e se é capaz de sentir, é porque ele busca o que está nele mesmo. Ninguém procura com afinco e vontade o que, inconscientemente não esteja em si mesmo. O aluno é o que ele traz em si: saberes que a autonomia lhe confere como propriedade sua para ser lapidado.
Para que o aluno desenvolva o seu senso de autonomia ele precisa seguir alguns passos que demandam disciplina e vontade, como sendo: 1) por que eu preciso aprender, 2) o que me impulsiona a estudar, 3) que benefício o aprendizado me trará. O aluno autônomo procura outras fontes de aprendizado e busca formas de desenvolver suas habilidades. Em princípio, o aluno autônomo é um investigador curioso sempre disposto a experimentar. Não dá para desenvolver a autonomia sem se arriscar. É natural ter receio de se expor e de errar. Mas, mesmo que o resultado seja indesejado, o aluno terá tido uma oportunidade de aprender. E, provavelmente, não cometerá aquele erro de novo, já que não existe autonomia sem iniciativa. Desconhecer algo não é motivo para constrangimento, mas uma oportunidade de aprendizado. Essa é uma boa ocasião para estimular o aluno a buscar respostas por si próprio. Dessa forma, deixará de unicamente depender das informações que lhe são trazidas. Honestidade e transparência são essenciais nesse momento. Na próxima aula, você voltará com a resposta e o aluno aprenderá muito mais do que apenas conteúdo acadêmico. Aprenderá autonomia e honestidade, aprenderá a compartilhar e a confiar.
Nos procedimentos que se caracterizam como meio de ensino o processo requer grande envolvimento do professor a fim de que se conquistem resultados satisfatório para a escola, para o professor e subjetivamente para o aluno. Ocorre porém, que à medida que novos instrumentos, novos programas, novas ferramentas são postas a serviço do ato de ensinar, surge o início de um embate que, deveria ser na verdade, um encontro de possibilidades e perspectivas de conquistas para todos.
Ao professor, considerado conhecedor do seu tempo e supostamente preparado para a função de liderar iniciativas e embalar sonhos, subentende-se que o mesmo esteja apto a instigar, propor, mediar e acompanhar todas as etapas d e um processo que envolve, a cada dia, uma maior gama de interesses e visões posto que cada um tem os seus próprios meios de apropriar-se do que aprende.
O aluno vem de uma outra vertente: jovem, em formação, produto de famílias com outra estrutura e valores, vivenciando toda a sorte de banalização das instituições estruturantes da sociedade, presenciando a violência como defesa, a fome como destino, prostituição como alternativa de sobrevivência, as drogas como válvula de escape, a corrupção como moda, os relacionamentos como um jogo de interesse e, finalmente, a escola como sacrifício que não leva à realização de sonhos, concretização de ideais, garantia de melhoria da qualidade de vida. Nesse raciocínio, ir à escola é coisa de quem não tem o que fazer, permanecer na escola é perder tempo, acreditar nas propostas é ilação, aprender é sacrifício: “rala”, “se mata”, renuncia” “perde noites”. “deixa de viver” “ é babaquice” (...)
Aprender não é sacrifício, estudar não é desafio, ensinar não é sacerdócio, investir na educação não é ideologia, Ensinar é aprender; aprender é descobrir-se e assumir-se; é agir, é decidir... Ser autônomo não é fazer o que se pretende, como se pretende, o que der na telha, não é quebrar regras e ignorar parâmetros é construir-se construindo, Na medida em que fundamenta-se a autonomia constrói-se a responsabilidade. É uma questão de reconhecimento da capacidade de cada um no processo de que crescimento sócio intelectual. Quando a relação escola-professor-aluno está calcada em critérios justos e equilibrados os direitos são assegurados. O direito do que busca aprender equivale aos deveres de quem ensina. Quando não se respeitam os direitos do outro, nega-se a dignidade e violentam-se os processos. O que seria a educação, a escola, o trabalho, o ensinar, o aprender, senão um processo de elevação como resultado da disciplina, da educação e de empenho?.
O papel do professor é de grande relevância no processo de aprendizagem e, de modo especial, quando envolve a questão da autonomia. Mas é preciso que esse papel seja desempenhado no enfrentamento de dificuldades que elevem o papel do que aprende, para que não se perpetuem os mitos de que o professor decide os rumos do trabalho, o ritmo em que o aluno deve agir. Entre as quatro paredes não é o professor é quem está no controle, ele deve estar atento aos procedimentos e à regulação do que vai sendo produzido. Segundo Paiva (2005, p.5),

Por ignorar o papel da autonomia do aprendiz, os vários métodos de ensino geraram propostas e explicações lineares sobre o processo de aprendizagem, sem levar em conta que o ser humano é sempre o mediador de sua aprendizagem, mesmo quando seu grau de autonomia é mínimo. Esses métodos ignoraram, ainda, que, devido às diferenças individuais dos aprendizes, efeitos diferentes poderão surgir em reação a um mesmo conjunto de variáveis.

Assim, a escola deve estar preparada para se preparar sempre; o professor deve estar atento às mudanças impostas pela sociedade como resultado de estudos, pesquisas e tecnologias; o aluno, enquanto foco de todos os processos, deve tornar-se autônomo, crítico e senhor dos seus projetos e procedimentos.

(*) Mestrando em Ciências da Educação