Gracielen Costa do Nascimento²

Julia Motta Costa³

Thaís Viegas4

 

SUMÁRIO: Introdução; 1 Desenvolvimento urbano e direito à habitação; 2 Áreas de ocupação ambientalmente protegidas; 3 Novo Código Florestal e a colisão de direitos fundamentais envolvidos; 4 Compatibilização de interesse ambiental e urbano; Conclusão; Referências.

RESUMO

O presente trabalho visa analisar a aplicação dos limites instituídos pelo Código Florestal nas áreas urbanas, considerando a incompatibilidade da restrição legal do dispositivo frente ao desenvolvimento urbano acelerado. Deste modo, o estudo será delineado frente à adoção dos princípios e garantias fundamentais, aliados ao interesse ambiental, para que seja possível alcançar tal compatibilização. Sendo assim, primeiramente será analisado o direito à habitação e sua prerrogativa, para que seja possível estabelecer a ligação com o desenvolvimento urbano; de forma subsequente, serão abordadas as áreas que tem sua proteção legalmente estabelecida, estabelecendo as categorias e seus respectivos limites; no tópico seguinte, o estudo será direcionado para o novo código florestal, instituído pela lei nº 12.651/2012, partindo do embate ocasionado pela colisão de direitos envolvidos; e por fim, versar sobre uma forma de compatibilizar essa problemática envolvida no embate entre o desenvolvimento acelerado, gerador de uma necessidade intrínseca de urbanização, que direta ou indiretamente, atingem às áreas de proteção ambiental, sob a ótica do disposto no novo código florestal.

Palavras-chave: Desenvolvimento urbano. Interesse ambiental. Poder Público.

INTRODUÇÃO

                O desenvolvimento acelerado das cidades, resultado da atividade humana com o desequilibro de distribuição econômica, provocou um crescimento desordenado do espaço público, em detrimento da ausência de políticas eficazes de distribuição urbana atrelada à proteção ambiental. Desta forma, portanto, se tornou

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¹Paper apresentado à disciplina de Direito Ambiental, da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco – UNDB

² Aluna do 4º período do Curso de Direito da UNDB

³ Aluna do 4º período do Curso de Direito da UNDB

4 Professor orientador.

necessário a atuação do Estado, por meio de ações que possibilitem acoplar esse desenvolvimento à proteção sadia do meio ambiente, de forma que ambos possam ser satisfeitos, se não na totalidade, em sua grande maioria.

Para tanto, é preciso estabelecer limites quanto à atuação em provimento da necessidade social e do interesse ambiental, limitações tais de natureza legal, e que embora apresentem uma correlação, não detêm o mesmo enfoque: uma vez que as leis urbanísticas visam à segurança humana na ocupação de espaços urbanos, portanto, tem seus critérios e valores pautados no paisagismo e na condição social coletiva; e as leis ambientais versam sobre o próprio interesse ambiental, na proteção dos recursos naturais e de todo o meio ambiente da intervenção do homem.

Deste modo, considerando que não há a prevalência de um instituto jurídico sobre o outro, há uma busca da harmonização desses aspectos, através dos princípios e garantias constitucionais, tendo sua aplicação pautada no parâmetro urbanístico.

Sendo assim, ambos os direitos tem sua interpretação baseada na possibilidade de compatibilização, portanto, a forma que poderá tornar possível o uso do meio urbano, frente ao seu desenvolvimento acelerado, é aquela mediante a qual as limitações ambientais estabelecidas pelo novo Código Florestal (LEI Nº 12.651/2012) não prejudiquem um direito fundamental em face de outro.

1 DESENVOLVIMENTO URBANO E DIREITO À HABITAÇÃO

A declaração universal dos direitos humanos (DUDH), instituída pela Assembleia Geral das Nações Unidas, teve como fim a estipulação de normas que fossem comuns à todos, com o intuito de proteger os direitos humanos e a liberdade de grupos ou indivíduos. Dentre aqueles que estão reconhecidamente definidos em tal declaração, encontra-se o direito à habitação, conforme descrito:

Toda pessoa tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e a sua família saúde e bem estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis, e direito à segurança em caso de desemprego, doença, invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda dos meios de subsistência fora de seu controle (art. 25,§2º) – grifo nosso.

Destarte, embora o direito humano à habitação esteja legalmente reconhecido, há uma dificuldade no que concerne o cumprimento do dever legal de garanti-lo, aliado ainda ao fato de que os países participantes não reconheceram, de forma legal, tal direito – postergado, dessa forma, em razão da concepção de que este não seria um direito cujo cumprimento tivesse a necessidade de ser imediato (PIOLI; ROSSIN, 2006, p.44).

Esse fato culminou na prejudicialidade do ambiente urbano, uma vez que o crescimento populacional acelerado gerou uma tendência à urbanização, que por sua vez, causou impactos na distribuição do processo urbanístico, acarretando problemas tais como a degradação ambiental, transformação da paisagem urbana e modificação da utilização do solo (SILVA, 2008, p.27).

José Afonso da Silva (2008, p. 27- 31) ainda reitera a posição anterior, recepcionando a ideia de que as soluções para tais problemas podem ser obtidas através do Poder Público, por meio da transformação do ambiente urbano, promovendo a sua funcionalidade, através da racional sistematização do território. Entretanto, é justamente nesse aspecto que ocorre o embate entre o desenvolvimento urbano e as áreas de proteção ambiental – dentre as quais, destaca-se, no caso, a habitação -, uma vez que não se consegue manter os níveis de crescimento populacional sem promover um esgotamento ambiental.

Sobre o posicionamento, Rogério Portanova (2004, p.632) enuncia que “a capacidade científica e tecnológica de processar as matérias é infinitamente superior à capacidade que a natureza tem de se regenerar ou de ofertar a matéria prima para seu processamento”. Observa-se, portanto, a dificuldade na tentativa de compatibilizar o crescimento urbano frente às limitações ambientais vigentes, uma vez que por ora, pode ser observada a afetação de áreas primordialmente destinadas à proteção do Poder Público – já que estas, por sua vez, precisam atender as necessidades urbanísticas apresentadas.

Desta forma, é viável a observação da posição do Poder Público frente ao direito à habitação, uma vez que corresponde a uma obrigação social, e, portanto, devendo este contribuir para que sejam oferecidas condições econômicas e sociais para os indivíduos, ultrapassando, dessa forma, a expectativa de um direito economicamente desfavorecido – como é o direito à habitação.

Entretanto, no que tange às necessidades ambientais, de promover um meio ambiente saudável para as futuras gerações, além ainda dos limites primordialmente estabelecidos das áreas destinadas à proteção do Poder Público – preservação que se torna essencial até mesmo para a viabilidade das cidades – estas devem ser asseguradas, em consonância com a própria Constituição, em seu art. 225:

Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações.

Sendo assim, constitucionalmente garantida a proteção ao meio ambiente, este não pode ser considerado hierarquicamente superior à legislação que prevê o direito à habitação, da mesma forma que não se pode privilegiar o direito à habitação frente às necessidades ambientais. É permitida, entretanto, para a pacificação da problemática, a promoção da compatibilização de ambos, de modo a alcançar a ponderação entre os interesses envolvidos, sem que haja necessariamente interferência prejudicial de um em face de outro.

Sobre esse aspecto, discorre a lei 9.638/81 sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, disposto no inciso I, do art. 4º, de que esta visará “a compatibilização do desenvolvimento econômico-social com a preservação da qualidade do meio ambiente e do equilíbrio ecológico”.

Privilegia-se, portanto, o mecanismo de atribuição da ponderação dos interesses envolvidos, tanto em relação à proteção ambiental quanto às necessidades urbanas de habitação. Mecanismo este que envolve a tentativa de compatibilizar o crescimento urbano, tornando viável também a garantia constitucional e efetiva da proteção ao meio ambiente equilibrado, visando minimizar eventuais impactos ambientais, e até mesmo a distribuição social desgastada, decorrente do processo acelerado de urbanização.

2 ÁREAS DE OCUPAÇÃO AMBIENTALMENTE PROTEGIDAS

            A criação de espaços territoriais especialmente protegidos foi regulada através do inciso VI do art. 9° da lei de nº 7.804 de 18 de julho de 1989. Nesse inciso, foi especificado que o Poder Público federal, estadual ou municipal deve proteger de forma especial as áreas de proteção ambiental, de relevante interesse ecológico e reservas.

            O maior objetivo da criação dessa lei foi o de que existem áreas territoriais no espaço geográfico brasileiro, que necessitam de maior fiscalização e proteção do Poder Público Federal, pois os recursos dos quais essas áreas são formadas são de extrema importância, e o uso exacerbado pode gerar desequilíbrio ambiental. E como se sabe que, mesmo em tempos atuais, nos quais o acesso à informação faz parte do rol de direitos fundamentais da Constituição Brasileira, ainda existem cidadãos que desconhecem a importância do meio ambiente, e maior ainda a importância que existe de sua conservação, para que as próximas gerações possam também desfrutar, de maneira igual ou melhor do que os indivíduos da geração atual.

            Os espaços territoriais especialmente protegidos consistem em áreas geográficas, que podem ser de caráter público ou privado, possuidoras de certos atributos ambientais os quais requeiram a sua sujeição a um regime jurídico de interesse público que implique em sua imodificabilidade e a utilização sustentada, com o objetivo de ser uma área preservada e com a integridade protegida. (SILVA, 2010, p. 233). Ainda explica a autora Márcia Dieguez Leuzinger, que os espaços territoriais especialmente protegidos referem-se "à totalidade das áreas, públicas ou privadas, sujeitas a regimes especiais de proteção, ou seja, sobre as quais incidam limitações objetivando a proteção, integral ou parcial, de seus atributos naturais" (LEUZINGER, 2005, p. 93).

            A partir disso, chega-se a uma definição do que são as áreas de proteção ambiental. As áreas de Proteção Ambiental (APA’s), que são reguladas pelo art. 9º da lei de nº 6.902/81, são um tipo de instrumento da Política Nacional do Meio Ambiente, conceituadas pelo SNUC (Sistema Nacional de Unidades de conservação) em áreas com relevante extensão, e certo grau de ocupação humana, que também são dotadas de atributos abióticos, bióticos, culturais ou estéticos que tem importância especial para propiciar a qualidade de vida e o bem-estar das populações humanas, cujo objetivo geral é proteger a diversidade biológica, ao mesmo tempo em que disciplina o processo de ocupação e assegura a sustentabilidade do uso dos recursos naturais. (SILVA, 2010, p. 245).

            As APA’s são classificadas como uma categoria de Unidades de Uso Sustentável, segundo o autor José Afonso da Silva, que as caracteriza como “espaços que permitem o uso direto de seus recursos naturais, cujo objetivo básico é compatibilizar a conservação desta com o uso sustentável de parcela dos seus recursos naturais” (SILVA, 2010, p. 244). Esse uso sustentável de parcela dos recursos refere-se ao sentido de que a outra parcela que não é utilizada tem que ser completamente imune ao uso, ou seja, é intocável. Enquanto uma parcela está apta para o uso, a outra está inapta. O uso sustentável significa a não utilização de uma parte do bem referido, com o objetivo de que se poupe certos recursos para que as gerações futuras possam desfrutar do mesmo. (SILVA, 2010, p. 244).

            Voltando ao artigo que regulamenta as APA’s, ele exige que em cada uma delas sejam estabelecidas normas pelo Poder Executivo, que obedeçam aos princípios constitucionais que regem o exercício do direito de propriedade, com o intuito de limitar ou proibir a construção de indústrias potencialmente poluidoras, cujo funcionamento é capaz de afetar mananciais de água; a realização de obras de terraplenagem e a abertura de canais, uma vez que essas atividades importem em sensível alteração das condições ecológicas locais; o exercício de atividades capazes de provocar uma acelerada erosão das terras ou com um acentuado grau de assoreamento das coleções hídricas; o exercício de atividades que possam vir a ameaçar a extinção de espécies raras da biota regional na área protegida.

            A fiscalização e supervisão das áreas de proteção ambiental são feitas pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis, ou por órgão equivalente a esse no âmbito estadual, isoladamente, em conjunto ou mediante algum convênio com outras entidades. A falta de cumprimento das normas disciplinadoras previstas no art. 9º da lei 6.902/81 sujeitará os infratores ao embargo das iniciativas irregulares, à medida cautelar de apreensão do material e das máquinas usadas nessas atividades, à obrigação de reposição de reconstituição, tanto quanto possível, da situação anterior e a imposição de multas aplicáveis diariamente se for o caso de infração continuada. Essas penalidades são aplicadas por meio de iniciativa do órgão fiscalizador.

            As APA’s podem ser constituídas em terras de domínio público ou privado, nas quais podem ser admitidas pesquisas científicas e visitação pública. Nas áreas públicas dentro das condições estabelecidas pelo órgão gestor e nas áreas privadas dentro das condições estipuladas pelo proprietário, sendo observadas as exigências e também as restrições legais. (SILVA, 2010, p. 245).

            A questão que acarreta em uma problemática é exatamente o conflito existente entre o direito de moradia e a defesa do meio ambiente, quando existem pessoas que vivem em áreas de proteção ambiental, e que principalmente tiram o seu sustento, a sua subsistência dos recursos existentes nela. Como um exemplo têm-se os mananciais, que são áreas de proteção ambiental, mais especificamente os situados em São Bernardo do Campo. Explica o caso Itikawa e Alvim (2008):

A reversão do quadro de degradação ambiental nas áreas de recuperação e proteção de mananciais decorrentes de ações antrópicas não pode ser tratada de forma isolada, uma vez que, a gestão dos recursos hídricos está intimamente ligada aos aspectos das dinâmicas espaciais e atividades socioeconômicas. As políticas em curso devem ser capazes de intervir e reorientar os processos de ocupação das áreas de proteção recuperação de mananciais, garantindo a prioridade de atendimento às populações residentes na sub-bacia do reservatório Billings, sem desconsiderar fatores sociais, culturais e econômicos, além de diminuir as cargas poluidoras da represa, reprimir a expansão urbana desordenada e minimizar o quadro de degradação ambiental. ( ITIKAWA; ALVIM, 2008, texto digital).

3 NOVO CÓDIGO FLORESTAL E A COLISÃO DE DIREITOS FUNDAMENTAIS ENVOLVIDOS

A nova edição do Código Florestal pelo Presidente da República – oriunda do Projeto de Lei nº 1.876/99 - realizada pela lei 12.651/12 trouxe algumas inovações, que versaram sobre o uso das florestas e a preservação da mata nativa. Contudo, no mesmo dia em que foi sancionada, a lei foi alterada pela Medida Provisória nº 571/12, que resgata o texto oriundo do Senado e que foi, em partes, rejeitado pela Câmara dos Deputados na votação final. A nova edição englobou desde alterações singelas a inclusões de novos dispositivos à lei, totalizando 12 vetos e 32 modificações, segundo relatório apresentado para apreciação atualizada do Código Florestal (RAMOS; AHMAD, 2012, p.5).

Dentre as alterações, destaca-se o acréscimo de um dispositivo (art. 1º, alínea A), em substituição ao artigo 1º que foi vetado, retomando os princípios que versam sobre a biodiversidade, a função estratégica da produção rural, a sustentabilidade, integração da norma ambiental com as demais políticas ambientais, a responsabilidade dos entes da federação quando à proteção ambiental e a relevância tecnológica e econômica (JURAS; GANEM, 2012, p. 3).

Todavia, ainda que tais sejam os princípios considerados norteados pelo Novo Código Florestal, segundo alguns doutrinadores, de forma controvertida, este representaria um retrocesso das políticas públicas que orientam o desenvolvimento social e econômico do país em bases sustentáveis. Isto, pois, o Novo Código Florestal se apresenta em uma face muito mais permissiva do que a anterior, relativizando os limites ambientais previamente estabelecidos – flexibilizando assim a proteção ambiental.

A flexibilização paira no sentido dos novos limites estatuídos pelo Código, na qual demonstram não raramente a insuficiência da área para a devida proteção ambiental, sobressaindo ainda o aspecto social em detrimento do ambiental – como pode ser obsevado principalmente em relação às APPs, sendo observada em relação ao critério fixado – que cria dificuldade quanto ao controle e fiscalização - além de também passar a admitir uma nova forma de recomposição da propriedade sob ponto de vista ambiental negativo (JURAS; GANEM, 2012, p. 4).

Desta forma, tem-se que além do retrocesso ambiental vivenciado pelo atual Código, a recepção de um Estado Socioambiental - pautado no desenvolvimento de políticas socioambientais, que prezam o desenvolvimento sustentável - fica à mercê de um interesse que, além de beneficiador do aspecto social, também é meramente econômico (PIZZUTTI, 2011, p. 8).

Verifica-se, contudo, que a discussão quanto à aplicação dos novos limites estatuídos e os direitos decorrentes deste, pode ser concebida sob dois aspectos: primeiramente, no ambiental, no que concerne à aplicação da garantia constitucional do meio ambiente, disposta no art. 225 da CF; e de forma subsequente, sob a análise no âmbito social, que representa direitos coletivos, elencados no art. 6º da CF, que na sua ausência ou insuficiência, promove um impedimento ao exercício de outros direitos fundamentais.

Portanto, verifica-se notadamente o embate que gira em torno da limitação ambiental quanto ao Novo Código Florestal no que diz respeito à garantia da proteção ambiental, que também recai sob o aspecto social, no que tange a obrigação do Estado de prover a prestação positiva sobre tais direitos sociais, elencados constitucionalmente, e também no que se refere à coletividade, direta ou indiretamente interessada.

Nesse sentido, depreende-se segundo José Afonso da Silva (2010, p. 25):

[...] Quando o art. 225 da CF impõe ao Poder Público e a coletividade o dever de defender e preservar o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado “para as presentes e futuras gerações” [...] E essa é uma cláusula que imanta todos os parágrafos e incisos daquele artigo. Requer como requisito indispensável, um crescimento econômico que envolva equitativa redistribuição dos resultados do processo produtivo e a erradicação da pobreza, de forma a reduzir as disparidades nos padrões de vida e melhor atendimento da maioria da população.          

Portanto, toda a análise pautada no Novo Código Florestal, editado pela lei 12.651/12 e alterada pela MP 571/12, recai basicamente quanto às colisões de interesses divergentes, tanto àqueles que prezam o meio ambiente em si, como aos que provém a garantia dos direitos sociais, representada pela necessidade de atender a demanda crescente por urbanização - que inevitavelmente atinge os bens ambientais protegidos. Desta forma, a solução viável recai sob a tentativa de minimizar os efeitos da afetação indevida de um direito sobre o outro, compatibilizando os interesses envolvidos, na tentativa de eximir tal prevalência em face do outro.

4 COMPATIBILIZAÇÃO DE INTERESSE AMBIENTAL E URBANO

            O maior interesse ambiental é o de conservação e preservação, para que gerações futuras estejam possibilitadas de desfrutar dos recursos naturais existentes, de maneira igual ou melhor do que a geração atual. Enquanto o interesse urbano é sempre o de desenvolvimento, as cidades estão em constante evolução, cada vez maiores e mais tecnológicas, sempre com o objetivo de propiciar uma qualidade de vida maior para a sua população. A partir disso, os interesses ambientais e urbanos devem estar sempre de acordo, para que um complete e ajude o outro, e não atrapalhe e impeça que cada um concretize seus interesses e pratique seus maiores objetivos.

            Para regulamentar o direito urbanístico foi criado o Estatuto da Cidade, que é um tipo de lei Federal. Através disso, tem-se o interesse de desenvolvimento urbano no Brasil, e essa lei surge com o objetivo de cumprir o papel de regulamentar o capítulo da Constituição de 1988 de Política Urbana, para consolidar um controle jurídico no que diz respeito ao desenvolvimento urbano. Para isso, tem-se que romper barreiras existentes, reorientar a ação dos gestores públicos, do mercado imobiliário e também da sociedade para que sejam enfrentados os graves problemas urbanos, principalmente os conflitos socioambientais presentes na ocupação do território municipal. (FERREIRA; ATAÍDE; BORGES, 2004, texto digital).

            Enquanto por um lado as cidades brasileiras estão em constante desenvolvimento, do outro lado o meio ambiente vem sofrendo graves degradações, o que acarreta problemas não só atuais, mas também futuros, o que pode gerar escassez de recursos naturais. Por isso que deve existir essa compatibilização entre os interesses urbanos e ambientais, pois um necessita do outro para concretizar-se. Um exemplo é o uso de água, que é essencial para as cidades, outro é a energia, que, mesmo que existam várias maneiras de ser utilizada, sempre é retirada da natureza. E se houver a escassez desses e outros recursos naturais importantes para que haja o desenvolvimento das cidades, não haverá a possibilidade de atingir os interesses de nenhuma dessas partes.

            A partir dessa compatibilização de interesses é que estão sendo criados novos modelos de gestão das cidades que têm como base a sustentabilidade, para que haja a preservação do meio ambiente. Esses novos modelos foram construídos a partir do pensamento de que deve haver a conciliação entre o desenvolvimento econômico e a conservação ambiental como meio para assegurar o atendimento das necessidades das gerações futuras (Relatório Brundtland, 1987). O melhor a ser feito é o uso moderado dos recursos que não são renováveis, pelas atividades de produção que acontecem nas cidades. (FERREIRA; ATAÍDE; BORGES, 2004, texto digital).

CONCLUSÃO

Considerando o que foi levantado nos tópicos anteriores, chega-se a conclusão de que a base para uma compatibilização entre os interesses ambientais e urbanos deve-se chegar a um consenso de uso sustentável dos recursos naturais. O uso sustentável é a solução pare que as cidades, principalmente os grandes centros urbanos, estejam aptas a desenvolver-se, inclusive no que tange à tecnologia, paisagismo, funcionalidade etc, de forma que conserve o meio ambiente, que é o maior contribuinte para o seu desenvolvimento.

Tendo em vista que no ordenamento jurídico brasileiro já é reconhecida essa importância de união de interesses ambientais e urbanos, fica mais propício a uma solução de todos os problemas gerados pelo embate entre o direito à moradia e a conservação de certas áreas com proteção ambiental especial. O novo código florestal vem por meio de normas regulamentar as ações dos humanos sobre a natureza, de forma que puna aqueles que não obedecerem ao que é previsto legalmente. E os estatutos das cidades já vêm trazendo maneiras sustentáveis de utilização de recursos naturais.

Portanto, o Novo Código Florestal tem como um de seus maiores objetivos aplicar limites a atuação humana em áreas de proteção especial, para que não acarrete em uso exacerbado dos recursos naturais ali presentes, que são de extrema importância para o equilíbrio ambiental, e que o contrário acarretaria em graves problemas para gerações atuais e futuras.

REFERÊNCIAS

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FERREIRA, Angela Lucia de Araujo; ATAÍDE, Ruth Maria da Costa; BORGES, Jennifer dos Santos. Conflitos socioespaciais em áreas protegidas de natal (RN): limites e desafios para uma nova prática urbanística. Brasilia, 2004. Disponível em:<http://www.anppas.org.br/encontro_anual/encontro2/GT/GT14/angela_ferreira.pdf>. Acesso em: 10/11/2012.

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JURAS, Ilidia Garrido; GANEM,Roseli Senna. LEI FLORESTAL: TABELA COMPARATIVA DA LEI 12.651/2012, DA MEDIDA PROVISÓRIA 571/2012 E DO TEXTO DO SENADO FEDERAL. Disponível em: http://bd.camara.gov.br/bd/bitstream/handle/bdcamara/9991/lei_florestal_juras_ganem.pdf?sequence=1. Acesso em 10/11/2012.

LEUZINGER, Márcia Dieguez. Meio Ambiente: propriedade e repartição constitucional de competências. São Paulo: Adcoas/Esplanada, 2005.

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