Concluso o processo, e sendo o caso, o juiz aplica a pena. É o momento do magistrado impor a severidade que a lei determina ou relaxá-la quando necessário. Por isso, cada caso deve ser considerado um caso, cada condenado um condenado, cada sentença uma sentença, que será sempre motivada individualmente cada aplicação de pena.

Não existe na natureza nada que possa ser considerado exatamente idêntico. Cada ser é único. Não existe uma árvore que seja rigorosamente igual à outra, ou mesmo uma folha, uma pedra, um animal. Todos, na sua individualidade, são diferentes. O homem, principalmente. Por isso, não se pode dispensar o mesmo tratamento igualitário para pessoas que não são iguais. O princípio constitucional de que todos são iguais perante a lei deve ser interpretado segundo o seu verdadeiro sentido. Considerar o rico e o pobre, o instruído e o analfabeto igualmente é um absurdo, porque a diferença entre ambos é enorme.

Com a finalidade de orientar o julgador neste momento tão importante que é o da aplicação da pena, a lei penal traçou uma série de etapas que, obrigatoriamente, deverão ser por ele observadas, sob pena de se macular o ato decisório, podendo conduzir até mesmo à sua nulidade.

Essas etapas citadas são chamadas de sistema trifásico de aplicação da pena. O primeiro passo é a definição da pena-base; após a fixação da pena provisória, e por fim, a pena definitiva.

Não há no Código Penal um conceito de pena-base (mesmo porque não é função da lei substantiva conceituar), ao contrário do que previa o art. 63 do Código Penal de 1969, revogado depois de longa vacatio legis.

O artigo 59 do atual Código Penal reza que o juiz, atendendo aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime: as penas aplicáveis dentre as cominadas; a quantidade de pena aplicável, dentro dos limites previstos; o regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade e a substituição desta por outra pena, se cabível.

A pena-base será muito importante, pois influi no resultado da pena definitiva. Cada tipo penal tem a sua respectiva pena cominada em abstrato, por exemplo, o furto simples, cuja pena pode ser de um a quatro anos. Já o furto qualificado por concurso de pessoas - novo tipo penal - tem a pena de dois a oito anos.

Muito se discute se a pena-base pode ir aquém do mínimo ou além do máximo previsto na lei. O Supremo Tribunal Federal na súmula 231 afirma que a incidência de atenuante não pode levar a pena abaixo do mínimo legal, fazendo com que a maioria siga essa regra.

Para Rogério Greco, o argumento de que o juiz estaria legislando se reduzisse a pena aquém do mínimo ou a aumentasse além do máximo não nos convence. Isso porque o art. 59 do Código Penal, que cuida da fixação da pena-base, é claro em dizer que o juiz deverá estabelecer a quantidade de pena aplicável nos limites previstos. O juiz jamais poderá fugir aos limites determinados pela lei na fixação da pena-base. Contudo, tal proibição não se estende às demais etapas previstas pelo art. 68 do Código Penal.

Somos pela corrente que possibilita a redução da pena aquém do mínimo legal, mas que impossibilita o aumento além do máximo permitido, ou seja, trinta anos. Isso porque a lei penal deve ser interpretada da forma mais favorável ao agente quando da sua aplicação, aplicando-se o princípio do favor rei.

Nessa esteira, o juiz deve aplicar a pena-base conforme as citadas circunstâncias judiciais do artigo 59 do Código Penal.

A palavra "circunstância" é derivada de circum (círculo) e de stare (estar) e designa aquilo que pode estar em círculo, em torno, ao redor do fato natural e típico em si, dos meios e modos de execução, dos motivos, dos atributos de personalidade do agente e da eventual participação da vítima no crime.

São as circunstâncias que envolvem o crime, nos aspectos objetivo e subjetivo, extraídas da livre apreciação do juiz, desde que respeitados os parâmetros no art. 59 do Código Penal, constituindo efeito residual das circunstâncias judiciais.

A culpabilidade é a primeira das circunstâncias elencadas no diploma penal. O sistema vigente hoje no Brasil é o chamado vicariante, ou seja, se o agente é imputável e considerado culpado, aplica-se a pena, e se o agente é semi-imputável, aplica-se a medida de segurança.

A teoria normativa pura contempla três aspectos para auferir a culpabilidade: a imputabilidade, a potencial consciência da ilicitude e a exigibilidade de uma conduta conforme o dever. É a mais usada modernamente.

Sem adentrar na questão, que é objeto de estudo específico do tema, vale citar a passagem de Claus Roxin, que encerra sua tese concluindo, no ponto que nos interessa, que a pena deve ser aplicada somente àquelas pessoas sensíveis aos apelos motivadores da norma, não como retribuição, mas por ser necessária aos fins da prevenção geral e especial. Se não houver essa necessidade, a pena não deve ser aplicada. "A realização, com culpa, de um fato ilícito típico não conduz automaticamente à punição: esta só surge quando é, além disso, exigida do ponto de vista preventivo."

Os antecedentes também são levados em conta na fixação da pena-base. Trata-se de todos os atos juridicamente relevantes para o direito penal praticados pelo agente antes da consumação do fato típico.

A principal questão a ser considerada é o chamado "direito penal do autor" e "direito penal do fato". O primeiro afirma a punição considerando não só o fato típico punível, mas também os antecedentes, de forma que o agente mereceria ou não uma pena, realizando um julgamento sobre a pessoa, não sobre o fato. Já o segundo, que é o que deve ocorrer, utiliza os antecedentes como simples elemento para fixação de pena-base, julgando somente o fato típico em análise.

Já a conduta social, pelo próprio nome se revela. É o que o Réu faz perante a sociedade. Tem íntima relação com a circunstância da personalidade, considerando-a um conjunto de atos e omissões na vida.

A motivação também é levada em conta nesta etapa. A palavra motivo deriva do latim motivu¸ no sentido de motor, impulsionar. Os motivos constituem a fonte propulsora da vontade criminosa. Não há crime gratuito ou sem motivo. Para a dosagem da pena é fundamental considerar a natureza e qualidade dos motivos que levaram o indivíduo à prática do crime.

Circunstâncias do crime são os elementos acidentais não participantes da estrutura do tipo, embora envolvendo o delito. O legislador talvez pudesse ter adotado a expressão "particularidades do fato" para evitar eventuais confusões que o uso reiterado do termo "circunstância" possa trazer aos menos atentos, especialmente diante de conhecida regra de hermenêutica que afirma não se poder conferir significados diferentes à mesma palavra.

Conseqüências do crime não são aquelas inevitáveis, por exemplo, a morte no homicídio ou a diminuição de patrimônio no furto, e sim, aquelas indiretas, como o desamparo da prole ou inconvenientes gerados pelo crime.

O comportamento da vítima é a última circunstância judicial para fixação da pena-base. Sem também aprofundar na questão, vale salientar a teoria da imputação objetiva, no tópico da autocolocação em risco, ou seja, a vítima age de modo a expor si mesma em risco. Há na doutrina algumas classificações das vítimas, entre elas vale destacar: vítimas inocentes, menos culpadas que o delinqüente, tão culpadas, mais culpadas, e únicas culpadas.

Sem embargo, não se confunde de forma alguma, aquelas circunstâncias que constituírem, qualificam ou privilegiarem o crime ou, de alguma forma agravarem ou atenuarem a pena, pois não podem ser avaliadas neste momento, para evitar dupla valoração. É a inadmissibilidade do "bis in idem".

Fixada a pena-base, entre a mínima e a máxima pena prevista em abstrato para o tipo penal, passa-se à etapa da aplicação das agravantes e atenuantes, fixando a pena provisória.

O artigo 61 do Código Penal taxa as agravantes, senão vejamos:

"São circunstâncias que sempre agravam a pena, quando não constituem ou qualificam outro crime:

I – a reincidência;

II – ter o agente cometido o crime:

a) por motivo fútil ou torpe;

b) para facilitar ou assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime;

c) à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação, ou outro recurso que dificultou ou tornou impossível a defesa do ofendido;

d) com emprego de veneno, fogo, explosivo, tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou de que podia resultar perigo comum;

e) contra ascendente, descendente, irmão ou cônjuge;

f) com abuso de autoridade ou prevalecendo-se de relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade, ou com violência contra a mulher na forma da lei específica;

g) com abuso de poder ou violação de dever inerente a cargo, ofício, ministério ou profissão;

h) contra criança, maior de 60 (sessenta) anos, enfermo, ou mulher grávida;

i) quando o ofendido estava sob a imediata proteção da autoridade;

j) em ocasião de incêndio, naufrágio, inundação ou qualquer calamidade pública, ou de desgraça particular do ofendido;

k) em estado de embriaguez preordenada."

As circunstâncias legais são genéricas, porque se aplicam a todos os crimes, e obrigatórias, porque uma vez que constatadas, o juiz deve considerá-las na mensuração da pena.

Há também a agravante no caso de concurso de pessoas, para quem promove ou organiza a cooperação no crime ou dirige a atividade dos demais agentes; coage ou induz outrem à execução material do crime; instiga ou determina a cometer o crime alguém sujeito à sua autoridade ou não-punível em virtude de condição de qualidade pessoal; executa o crime, ou nele participa, mediante paga ou promessa de recompensa – artigo 62 do Código Penal.

Não há na lei o quantum será aplicado pelas agravantes. É um poder discricionário do juiz. Somente aparecem na parte geral do Código Penal.

Por outro lado, também incide sobre a pena-base fixada as chamadas atenuantes. São circunstâncias que sempre atenuam a pena: ter o agente menos de vinte e um anos, na data do fato, ou maior de setenta anos, na data da condenação; o desconhecimento da lei; ter o agente: cometido o crime por motivo de relevante valor social ou moral; procurado, por sua espontânea vontade e com eficiência, logo após o crime, evitar-lhe ou minorar-lhe as conseqüências, ou ter, antes do julgamento, reparado o dano; confessado espontaneamente, perante a autoridade, a autoria do crime; cometido o crime sob a influência de multidão ou tumulto, se não o provocou.

A pena ainda poderá ser ainda atenuada em razão de circunstância relevante, anterior ou posterior ao crime, embora não prevista expressamente em lei.

Incididas as agravantes e atenuantes sobe a pena-base já fixada, e dentro dos limites, chega-se a fixação da pena definitiva, que a nosso ver pode ir aquém da pena mínima, conforme já demonstrado.

As causas especiais de aumento ou de diminuição de pena podem ser encontradas tanto na parte geral quanto na parte especial do Código Penal. O artigo 68 estabelece que no concurso de causas de aumento ou de diminuição o juiz pode limitar-se a um só aumento ou a uma só diminuição, prevalecendo aquela que mais aumente ou diminua.

São exemplos de causas de diminuição: tentativa, arrependimento posterior, embriaguez incompleta decorrente de caso fortuito ou força maior. Exemplo clássico de aumento: violência.

Nessa fase, as causas de aumentou ou diminuição sempre aparecerão na lei na forma de fração, isto é, ocorrendo uma ou outra hipótese aplica-se um adicional ou redutor de um terço, por exemplo.

Encerrado o sistema trifásico da aplicação da pena, é a hora de analisar o regime de cumprimento inicial da pena cominada concretamente. Segundo Boschi, a quantificação da pena definitiva esgota as fases do método trifásico, mas não exaure, sob o aspecto global, o judicial processo de individualização da pena, pois ao juiz da sentença incumbirá ainda estabelecer o regime de execução da reclusão, da detenção ou da prisão simples (o fechado, o semi-aberto ou o aberto), decidir sobre a eventual substituição por restritiva de direitos ou multa, sobre a concessão ou não do sursis e sobre a eventual prisão cautelar.

Bibliografia:

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BOSCHI, José Antônio Paganella. "Das Penas e seus Critérios de Aplicação." Porto Alegre: Editora Livraria do Advogado, 2006.

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