O governo confirmou ontem (dia 22 de junho), ao anunciar o novo Plano de Safra para o ciclo 2009/10, que dará prioridade de estímulos à classe média rural e às cooperativas agropecuárias. O lançamento oficial, feito pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em Londrina (PR), destinou R$ 92,5 bilhões ao financiamento do segmento empresarial, dos quais R$ 12,3 bilhões reservados à agroindústrias e usinas de álcool já haviam sido anunciados em abril. Mesmo sem reduzir os atuais juros de 6,75% ao ano, o governo garantiu R$ 54,2 bilhões em recursos a taxas subsidiadas pelo Tesouro.

As medidas do governo reservaram, um orçamento de R$ 5 bilhões aos médios produtores com renda bruta anual até R$ 500 mil. E acabaram com o limite de propriedade de até 1,5 mil hectares para esses produtores. Na prática, a mudança reduz os juros ao setor rural, já que a taxa do Proger está em 6,25% ao ano.

Ao mesmo tempo, o governo federal criou uma nova regra para obrigar os bancos operadores do crédito rural a emprestar ao segmento dentro da parcela de 30% de aplicação obrigatória sobre os depósitos à vista - as chamadas exigibilidades bancárias. A partir da nova safra, que começa oficialmente no próximo dia 1º de julho, os bancos terão que emprestar ao menos 6% das exigibilidades aos médios produtores. Na safra 2010/11, o índice passará a 8%, chegando a 10% no ciclo 2011/12.

O governo deixou evidente sua opção pela pequena e média agriculturas. Os produtores familiares, por exemplo, já têm garantidos ao menos 10% das exigibilidades pelo governo. Assim, em 2011, pequenos e médios terão 20% dessas exigibilidades. Para completar a prioridade, o governo criou uma linha de R$ 2 bilhões para capitalização das cooperativas agropecuárias a juros de 6,75%, seis anos de prazo e dois de carência. Cada associado poderá financiar R$ 25 mil para reforçar sua cota-parte na cooperativa. Os grupos também poderão emprestar até R$ 50 milhões nessa linha.

O governo elevou os limites de crédito para custeio - de R$ 170 mil a R$ 600 mil, segundo a cultura - e elevou o orçamento de investimento a R$ 14 bilhões, além de reajustar os preços mínimos de todos os principais produtos. O orçamento para a comercialização da nova safra será de R$ 5,2 bilhões, informou o Ministério da Agricultura. O governo também elevou, de R$ 273 milhões para R$ 452 milhões, os recursos para subsidiar metade do prêmio do seguro rural em 2010.

Caráter político
O evento do lançamento do novo plano teve um tom bastante político. O governo escolheu a dedo a cidade do evento. Segundo maior colégio eleitoral do Paraná, Londrina é a base política do ministro Paulo Bernardo (Planejamento), pré-candidato a governador, e de sua esposa, Gleisi Hoffmann, pré-candidata ao Senado. A região norte do Paraná também é uma das principais bases eleitorais do ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, que obteve parte de seus 101,7 mil votos de deputado federal por lá.

Questionado sobre o tom político do evento, o presidente Lula, que estava acompanhado pela ministra Dilma Rousseff (Casa Civil), admitiu a interferência. "(...) a gente não consegue segurar ministro. Tem um comichão assim, uma coisa, uma coceira, que quando vai chegando perto do ano eleitoral todo mundo quer ser candidato a alguma coisa. (...) eu acho que se o Paulo Bernardo quiser ser candidato, ele tem direito de querer ser candidato", afirmou a uma rádio local. "Eu não posso impedir que ninguém seja candidato. Obviamente que, sendo candidato, eu espero que, aqui no Paraná, a gente consiga construir uma aliança política e que todo mundo esteja junto. E que demarquemos quem é o nosso adversário e trabalhemos para derrotar nossos adversários tradicionais lá de Brasília e do Estado do Paraná", explicitou Lula.

A visão da CNA
Apesar de considerar conservador o Plano Agrícola e Pecuário 2009/2010, lançado hoje (22) pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em Londrina (PR), a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) informou que o plano “traz medidas positivas, como o crédito mais barato para o médio produtor, o mais prejudicado pela escassez de dinheiro.
 
Enquanto a confederação pediu para que o governo disponibilizasse R$ 120 bilhões para financiar a produção empresarial, o plano oferece R$ 92,5 bilhões. A agricultura familiar ficará com R$ 15 bilhões. “O volume de recursos divulgado ficou abaixo do esperado, porém seu eventual impacto negativo foi amenizado pela redução dos custos de produção e a conseqüente redução da demanda de recursos”, explicou a CNA em uma nota técnica na qual compara o que foi pedido pelo setor e o que o governo disponibilizará.
 
A entidade considera, neste momento, a garantia de acesso ao crédito mais importante do que o volume, na medida em que vários produtores não conseguem financiamento por causa da inadimplência do setor. Para solucionar a situação, a CNA vem propondo a criação de um fundo garantidor, que funcionaria como avalista para os empréstimos tomados pelos agropecuaristas.
 
O ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, pediu hoje (dia 22 de junho), em discurso em Londrina, para que o Congresso aprove em regime de urgência a criação do fundo. Segundo estudos do governo e de entidades do setor, o valor do novo mecanismo, que pode dar início a uma nova fase da produção agropecuária brasileira, ficaria em torno de R$ 7 bilhões.
 
Para a senadora Kátia Abreu (DEM-TO), presidente da CNA, os pontos de destaque no Plano Agrícola e Pecuário 2009/2010 são a elevação dos recursos para os investimentos de R$ 10 bilhões para R$ 14 bilhões, a criação do Programa de Capitalização das Cooperativas Agropecuárias (Procap-Agro) e a extensão do Programa de Geração de Emprego e Renda (Proger Rural) ao médio produtor, com o aumento do limite de renda bruta anual, de R$ 250 mil para R$ 500 mil.

O discurso de Lula
No lançamento do Plano Agrícola e Pecuário 2009/10, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez ontem em Londrina (PR) um apelo para que os agricultores continuem plantando, de olho na recuperação econômica mundial. Ele comparou os grandes países a um urso em hibernação na crise, que vai estar faminto após esse período. ""Plantem, plantem, plantem", afirmou Lula.

Lula também apelou aos agricultores para que acompanhem a liberação de recursos, pois, segundo ele, não adianta aprovar verbas se elas não chegam aos produtores. Neste plano de safra, a novidade foi a liberação de R$ 2 bilhões para o Programa de Capitalização de Cooperativas Agropecuárias, em uma rubrica de R$ 14 bilhões para investimentos.

Lula criticou ainda "aqueles que fazem a separação" entre agricultura familiar e agronegócio. Segundo o presidente, o país "depende dos dois".

O presidente afirmou que a função do governo federal é preparar o país para produzir e andar. "Não adianta produzir e ficar na mão de três ou quatro tradings, que na hora do "pega para capar" correm e nos deixam na mão."

Para ressaltar a importância que é dada ao agronegócio durante os dois mandatos de Lula, a ministra Dilma Rousseff (Casa Civil) disse que no plano de safra 2002/3 o governo federal liberou R$ 24,7 bilhões.

Dilma afirmou que as obras de infraestrutura e logística do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) têm como objetivo eliminar gargalos na agropecuária brasileira, especialmente para o escoamento da produção.
 
O medo das lideranças do setor
Lideranças do setor rural apoiaram o Plano Agrícola e Pecuário 2009/10, mas temem que boa parcela do volume recorde de recursos para financiamento da nova safra fique longe do campo, a exemplo do que ocorre no atual ano agrícola, quando 20% a 25% do dinheiro disponível deixou de ser usado.

Márcio Lopes de Freitas, presidente da Organização das Cooperativas Brasileiras, afirmou que o plano tem avanços "não apenas no volume de recursos, mas em mecanismos para alocá-los".

O presidente da Sociedade Rural Brasileira, Cesário Ramalho, saudou o aval do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à ideia de um fundo garantidor do agronegócio -a exemplo do que existe para pequenas empresas e no âmbito do programa Minha Casa, Minha Vida, notícia que a Folha antecipou anteontem.

É preciso definir de onde vêm os recursos e o total disponível, afirmou Ramalho. A CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil) espera valor na faixa de R$ 7 bilhões a R$ 10 bilhões.

"Se já foram criados fundos para outros segmentos da economia, por que não para o agronegócio, que representa um terço do PIB?", disse, por meio de nota, a presidente da CNA, senadora Kátia Abreu (DEM-TO).

O deputado Moacir Micheletto (PMDB-PR), coordenador político da Frente Parlamentar da Agropecuária, lembrou que o setor tem alto estoque de dívidas, estimado em R$ 120 bilhões.

Para que esse número não dispare, afirmou que o setor pode se beneficiar do aprimoramento do seguro rural e da redução da dependência de fertilizantes importados.
Sobre o seguro rural, Micheletto espera que no próximo mês o relatório do Fundo de Catástrofe seja votado no Congresso e, em agosto, siga para sanção da Presidência da República.

O congressista disse torcer para que a política para incentivar a produção nacional de fertilizantes saia do papel.

Segundo Fábio Meirelles, presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de São Paulo, essa é uma medida fundamental para diminuir pressões sobre o custo de produção.
 
Bibliografia
Jornal Folha de S. Paulo de 23 de junho de 2009
Jornal de Brasília de 23 de junho de 2009
Jornal Valor Econômico de 23 de junho de 2009
Jornal O Estado de S. Paulo de 23 de junho de 2009