GABRIELA MEDEIROS MOROTI
CHAYENE CRISTINA DE MORAES

INTERPRETAÇÃO FREUDIANA DO FILME DE OLHOS BEM FECHADOS

FRANCA
2011
GABRIELA MEDEIROS MOROTI
CHAYENE CRISTINA DE MORAES



INTERPRETAÇÃO FREUDIANA DO FILME
DE OLHOS BEM FECHADOS




Trabalho apresentado como exigência parcial para a avaliação do aproveitamento da disciplina Psicologia da Personalidade I, do 2º ano, turma "N", do Curso de Psicologia da Universidade de Franca.
Professora: Rita Aparecida de Oliveira Martins



FRANCA
2011
 
I. INTRODUÇÃO

É através deste trabalho que pretendemos estabelecer relações entre teorias freudianas e o cinema, ou seja, a vida real modificada pelas telas de cinema vista por nós seres humanos. Nós, estudantes de psicologia nos interessamos muito pelas manifestações do psiquismo e quando isso se é passado através de representações artísticas, se torna uma maneira mais prazerosa para ser vista e notada.
Não são raros os filmes em que a psicanálise é o tema, onde se abundam digamos "dramas psicológicos", onde para pessoas de senso comum não há tanta existência, ou apenas não percebem a existência e o quão grande é o conteúdo do filme.
É preciso que saibamos do entrelaçamento entre temas freudianos e o cinema, ou melhor, nossa vida cotidiana.
Para Zusman (1994, p.10), o cinema é um riquíssimo manancial didático, em que suas potencialidades infelizmente ainda não foram exploradas em toda sua extensão e valor, e ressaltando também que quando vamos ao cinema de certa forma já estamos usando de um mecanismo de defesa: a regressão.
Zusman ainda ressalta a paixão de Freud para com a literatura, e que nunca deixou de recorrer a obras de romances e do teatro para embasar suas descobertas em psicologia (1994, p. 10).
"O seu famoso Complexo de Édipo, todos o sabem, se explicitou com o auxílio do Édipo Rei, a famosa peça escrita por Sófocles, onde uma narrativa mítica ganha expressão teatral, dando lugar a que ali se desdobre uma das tragédias centrais da existência humana". (Zusman, 1994)

E foi nos escolhido a categoria filme por vários aspectos, um deles, é que através de filmes veiculamos mitos tanto coletivo como individuais, assim, podemos constar que a imagem nos traz grande grau de realidade e representações da vida mental e onírica.
Freud é o ponto de partida para que iniciemos nossas análises psicanalíticas. Afinal, quem passa a ver a experiência da interpretação freudiana com plenitude, passa a ver com o próprio, os filmes e a vida de uma maneira diferente. (Zusman, 1994, p.11).

1.1. OBJETIVO GERAL

Conseguir estabelecer ligações entre a teoria freudiana e a nossa vida psíquica, estudada através de filmes, onde os próprios se baseiam na vida.

1.2. OBJETIVO ESPECÍFICO

Colocar sob ponto principal a importância de nossos fenômenos oníricos e como eles são influentes em nossa vida psíquica.


1.3. JUSTIFICATIVA
Esta análise foi feita para podermos ter melhor compreensão de nossas estruturas psíquicas. É através desta análise freudiana que pudemos compreender a relação entre nossa vida humana e as teorias freudianas, tal como observamos também em filmes e artes em geral.
É um trabalho onde podemos flutuar dentro de nós mesmos, onde nem nós mesmos conhecemos por parecer: nosso inconsciente.

 
II ? RELAÇÃO TEORIA E FILME

Antes de iniciarmos a nossa relação teoria e filme, é bom relembrarmos sobre as hipóteses fundamentais da Teoria de Freud. Para ele, nada ocorre ao acaso e muito menos os processos mentais. (FADIMAN, F; FRAGER, R)
Duas dessas hipóteses fundamentais, que foram copiosamente confirmadas, são o princípio do determinismo psíquico, ou da causalidade, e a proposição de que a consciência é antes um atributo excepcional do que um atributo comum dos processos psíquicos.
(BRENNER, 1987)

O filme começa com o casal (que será nosso foco principal), se preparando para ir à uma festa, e na mesma, tanto um como outro bebem e dançam... Eles não conhecem praticamente ninguém, mas encaram isso como um acontecimento social do qual fazem parte. Já se delineiam fantasias nesse momento: em determinado instante, por estar sem o marido, Alice Harford, dança com outro homem; e ele, o médico William Harford, por encontrar-se também desacompanhado, é convidado por duas mulheres a ir para um lugar mais interessante. Durante este tempo em que os casais estavam separados, pudemos perceber a 1° teoria de Freud, onde há uma formação de compromisso entre o consciente e o inconsciente, pois o homem com qual Alice dançara disse uma frase em que cabe dizer aqui: "Não acha que a necessidade do casamento é tornar fingimento para ambas as partes?"
Pois é através deste diálogo que vemos a luta constante entre superego e id, sempre com o ego controlando-os.
E para isto vale-nos revisar estas estruturas da personalidade: Id, ego e superego.
É através do Id que se formam as outras estruturas, e podemos associá-lo a um rei cego cujo poder e autoridade são totais e cerceadores, mas que depende de outros para distribuir e usar de modo adequado seu poder. Ele é um reservatório de energia.
O ego seria nosso eu real, que protege o id, mas extrai dele a energia, a fim de realizar isto. Assim o ego é criado pelo id para reduzir a tensão e aumentar o prazer, mas para fazer isto, o ego, tem que controlar os impulsos do id de modo que o indivíduo possa buscar satisfações menos imediatas e mais realistas. (FADIMAN, J; FRAGER, F).
Nosso superego é responsável pela moralidade convencional, este social dentro de nós, da famosa "consciência pesada", a internalização de referências como certo e errado, ou melhor, dizendo, o nosso eu ideal.
Voltando a nosso cenário psicanalítico do filme, os dois não conseguem satisfazer suas vontades, pois ambos voltam ao princípio da realidade e são sacudidos pelo superego, falando assim da segunda tópica da teoria topográfica do aparelho psíquico.
De volta a casa, o casal decide fumar maconha, considerando um fato marco, é que a mulher é uma fumante, mostrando assim fixada na fase oral das fases psicossexuais de Freud.
A partir daí, encontramos vários pontos onde podemos encontrar a teoria de Freud sobre mecanismos de defesa.
As defesas aqui descritas são formas que a psique tem de se proteger da tensão interna e externa. As defesas evitam a realidade (repressão), excluem a realidade (negação, redefinem a realidade (racionalização) ou invertem-na (formação reativa). Elas colocam sentimentos internos no mundo externo (projeção), dividem a realidade (isolamento) ou dela escapam (regressão).
(FADIMAN, J; FRAGER, R)

O casal começa a dialogar sobre a noite que passaram juntos e este foi um ponto forte, pois, houve negação da parte do médico William, quando sua mulher o perguntou se ele paquerou alguma das mulheres que ele havia conversado. Ele respondeu que não, sendo certamente nítido um homem paquerar duas mulheres jovens e bonitas como foi mostrado no filme. Não é de tanta certeza este mecanismo de defesa, pois, esta arte descobriremos ao pouco, que é a arte de saber se é uma negação ou se é apenas uma mera mentira.
Nesta conversa quente, a mulher o perguntou por que ele não iria pra cama com outra mulher. Ele usou do mecanismo de defesa chamado racionalização, que é um processo de achar motivos aceitáveis para pensamentos e ações inaceitáveis.
William tinha projetado (projeção) em sua mulher uma imagem de mulher perfeita: boa esposa, boa mãe, ou seja, qualidades, sentimentos e intenções que se originavam dele mesmo.
E Alice na mesma noite, na mesma conversa, o confessou ter sentido atração por outro homem, e que ao mesmo tempo em que pensava em fugir com ele e largar ele e a filha, pensava também se o deixaria sozinho. Neste momento podemos ver o Princípio do Prazer, dado pelo inconsciente onde o não, não existe e o Princípio da Realidade, dado pelo pré-consciente e o consciente onde a moralidade está presente.
Logo após o fato, pudemos perceber no decorrer do filme, que as causas que vão acontecendo nunca são por acaso. Depois de Alice confessar seus desejos, William se sente atormentado e suas ações e pensamentos focam para o que ela disse inconscientemente.
Depois de ter confessado isso, William recebeu uma ligação na qual um paciente seu morrera. Foi imediatamente a casa dele, no sentido que seu superego exigiu para cumprir com seus códigos de ético de médico, pois ao receber o telefone, o próprio disse: "Acho que preciso ir até lá, é meu paciente". E não de acordo com sua vontade (id).
Na noite em que o casal estava fumando maconha houve o mecanismo de defesa regressão, pelo fato de que, foi uma forma de aliviar a ansiedade escapando de um pensamento realístico.
Houve também o mecanismo de defesa racionalização em uma das conversas do casal, pois, a mulher perguntou por que ele não transaria com outras mulheres, sendo que ele próprio um pouco antes havia falado que é normal sentir atração por mulheres bonitas. Ele contra-argumentou dizendo que era porque a amava e que ele era uma exceção.
William conhece uma prostituta, e a mesma o leva para sua casa. Chegando lá, eles combinam os valores e ele optou por transar. No momento em que iam começar a relação amorosa, seu celular toca, e é a sua mulher Alice, a partir daí, seu superego entra em alerta e William não consegue fazer mais nada, seu princípio da realidade havia sido despertado. Essa ligação o deixou com a famosa "consciência pesada", mostrando assim o funcionamento do nosso superego.
William tem um amigo que se chama Nick, e é pianista. Os dois se reencontram em um bar e Nick o fala sobre um evento pessoal que irá ocorrer na mesma madrugada onde há várias mulheres estrondosas. Quando Nick fala isso, William se sente acuado, pois, ao mesmo tempo em que seus impulsos sexuais vêem a tona, ele se lembra de sua esposa (superego X id).
William vai até uma loja de fantasia e o dono da mesma flagra sua filha com dois homens lá dentro. Para tentar escapar da punição os dois homens usam do mecanismo de defesa chamado racionalização, pois, eles falam que não fizeram nada demais, apenas foram convidados pela moça tentando assim deixar seu argumento mais aceitável.
No momento em que ele chega ao evento particular, seu id estava pulsando, e lembrando-nos sempre que em sua ação há uma conexão casual, e no mesmo momento uma das mulheres de lá, o alertou para que ele fosse embora, pois, estava correndo riscos ali.
No momento em que estava lá dentro, ele via muitas cenas de sexo explícito e necessitara de satisfazer seus desejos. Mas nada foi realizado.
De volta pra casa, sua mulher estava sorrindo enquanto dormia então William a acordou, ela o disse que estava tendo pesadelos e o contou. Analisemos seu sonho: Estava ela e William em uma cidade deserta, nus. Ela se sentia muito mal e falara que era culpa do marido e então o marido (William) foi tentar buscar roupas. No momento em que o marido saiu de perto dela, ela se sentiu ótima, e sua energia psíquica foi deslocada para outro lugar, um lindo jardim. E no momento em que ela se encontrara neste jardim, o oficial da marinha com quem ela na vida em vigília falou ao marido que havia sentido desejo, apareceu e eles transaram, não apenas com ele, mas segundo Alice, transou com muitos homens. E a vontade dela no sonho era apenas de caçoar o marido, de rir muito da cara dele.
Neste sonho, Alice foi regida pelo princípio do Prazer, onde não existe censura e negação e sim imediatismo.
Mais importante que o valor biológico dos sonhos são os efeitos psicológicos da elaboração onírica, para isso, vale-nos ressaltar que:
"Uma estrutura de pensamento, na maioria das vezes muito complicada, que foi construída durante o dia e não realizada (estabelecida) ? um remanescente do dia ? apega-se firmemente mesmo durante a noite à energia que tinha assumido... e então ameaça perturbar o sono. Esse resíduo diurno é transformado num sonho pela elaboração onírica e, dessa forma, torna-se inofensivo ao sono".
(FADIMAN, J; FRAGER, R. 1986. P.17).
No evento que estamos analisando encontramos também a regressão, pois, as pessoas de lá engajam-se em práticas sexuais inusitadas, reduzindo a tensão mas deixa sem solução a fonte da ansiedade original.
Depois de sua mulher Alice o confessar interesse por outros homens, William nos mostra ansiedade de alarme, onde vemos que existe tensão ou desprazer na situação. A causa seria sua perda de auto-estima, ou seja, a desaprovação do superego por atos que resultam em culpa ou ódio em relação a si próprio. Ele teria duas formas de diminuir sua ansiedade: enfrentando-a ou recalcando-a.
Analisamos e concluímos que seu modo de aliviar a ansiedade foi recalcá-la negando a própria situação.
Lembrando também que o recalcamento é o mecanismo de defesa "pai de todos".
Em um dia comum, o marido de Alice deseja satisfazer seus impulsos do id, e ir à busca de sua auto-estima que foi perdida após a confissão, comenta com a esposa que necessita de sair. Então a esposa indaga do por que ele precisaria sair novamente, e ele para não colocar o motivo em cima da mesa, racionaliza, dizendo que precisa ir novamente ao escritório, pois tem muitas coisas a fazer.
Há uma causa para cada pensamento, para cada memória revivida, no caso de William, ele não parava de pensar em sua mulher transando com outro. Este pensamento tem raiz de acordo com a 1° hipótese fundamental de psicanálise da Teoria de Freud.
E diante destes pensamentos, suas ações, que também são causais, foram de procurar mulheres para obter relações sexuais.
Sentindo sua perca de auto-estima em relação à sua ansiedade de alarme, William procura recalcar isto e ir atrás da mesma prostituta para lhe dar um presente e ir atrás da realização de desejos. Ao chegar lá, a mesma não está, mas está uma amiga dela, e ela convida William para entrar.
Logo que ele entra, ambos estão com os impulsos sexuais vindo à tona para serem realizados, porém, o superego da amiga da prostituta age assim ela conta o que houve com Domino, sabendo que assim quebraria o clima.
A mulher que o alertou e o salvou daquele evento particular inusitado, era sua paciente. Isto ele descobre no final do filme, pois, no evento todos estavam de máscara. Ela morre por overdose, então, William vai visitá-la no necrotério e ele mesmo se assusta quando vai de encontro a ela para lhe dar um beijo, e no meio do percurso, se interrompe pelas proibições que o superego o faz.
Ao chegar a casa, ele vê a mulher dormindo e máscara que usou no evento em seu travesseiro. Senta em sua cama e chora desesperadamente.
Fala à mulher que irá contar tudo a ela, desabafar, assim, fazendo uma regressão, aliviando a ansiedade que o corroia por dentro.
É interessante dizer que, no fim deste incrível filme, o casal dialoga sobre o que houve em uma loja, pois, levaram a filha para comprar presentes natalinos.
E então ele pergunta o que ela acha que deveriam fazer. E ela então o responde que eles deveriam ficar gratos, tantos por nossas aventuras reais, quanto as sonhadas.
É de suma importância colocar neste trabalho duas frases ditas no final do filme que nos descrevem os pensamentos do casal. Alice comenta com o marido que: "A realidade de uma noite pode ser toda a verdade". E William comenta com sua esposa: "E nenhum sonho é apenas um sonho".
O filme finaliza com a realização do id de Alice: "Há uma coisa que precisamos fazer o mais possível: Sexo".

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Podemos concluir que em relações cotidianas, se pararmos para fazer análise, estará presente alguma teoria de Freud, não só dele, e sim, de várias teorias que estudamos no presente curso. E o quanto isso é importante, pois nos ligamos tanto ao consciente que esquecemos que muitas de nossas ações e pensamentos são inconscientes e que vale a pena pararmos para analisar filmes, canções e a nós mesmos, por que não?
No casal que focamos, encontramos a estrutura de suas personalidades, e vimos o quanto suas ações são fortemente regidas pelo Id, Ego e Superego.
No respectivo filme, deu-se para entender muito bem a Teoria de Freud, quando o próprio diz que há uma causalidade em tudo, afinal, os comportamentos de William não eram apenas comportamentos coincidentes, e sim, frutos de alguma experiência passada.
E focamos também no quanto a teoria estrutural de Freud implica na vida de uma pessoa, principalmente hoje em dia com normas convencionais, proibições e moralidade o Superego se torna rígido, mas o Id sempre será a reserva de energia que temos e que se não satisfazermos, acaba por loucautear o nosso ego.
E assim sendo, o respectivo filme nos mostrou não totalmente de forma clara os acontecimentos, afinal, é preciso fazer uma análise específica para obter conhecimentos psicanalíticos, vários conceitos existentes nas teorias de Freud, fazendo-nos assim enxergar de uma maneira mais ampla o quanto nossa vida é regida pelo "inconsciente".
 
Referências Bibliográficas
De olhos bem fechados (Eyes Wide Shut). Direção: Stanley Kubrick. Produção: Stanley Kubrick para Warner Bros e Hobby Films. Um DVD (159 minutos). Produzido por Warner Bros.

SHVOO. Resumos e revisões curtas. Disponível em: <http://pt.shvoong.com/humanities/film-and-theater-studies/2083837-filme-olhos-bem-fechados-analise/> Acesso em: 13/05/2011.

ZUSMAN, Waldemar. Os filmes que eu vi com Freud. Rio de janeiro: Imago Ed, 1994.

BRENNER, Charles. Noções básicas de psicanálise: introdução à psicologia psicanalítica. 3. ed. rev. e aum. Rio de Janeiro: Imago; São Paulo: Ed. Da universidade de São Paulo, 1975.

FADIMAN, F; FRAGER, R. Teorias da Personalidade. São Paulo: Harbra, 1986.