ANÁLISE DO TESTAMENTO GENÉTICO NOS CASOS DE REPRODUÇÃO ASSISTIDA HETERÓLOGA E SEUS REFLEXOS JURÍDICOS NO DIREITO DAS SUCESSÕES[1]

 

Ingrid Brandão e Raissa Braga[2]

Anna Valéria Cabral Marques[3]

Sumário. Introdução; 1. Elementos gerais e históricos da reprodução assistida no ordenamento jurídico brasileiro; 1.1. O testamento genético; 2. Análise dos efeitos jurídicos provenientes do testamento genético dentro das esferas do Biodireito e do Direitos das Sucessões; 3. As consequências da reprodução assistida heteróloga por material genético cedido por testamento no Direito Sucessório; Conclusão. Referências.

RESUMO

 

Conforme autorização expressa da lei, no art. 1.597, inciso V do Código Civil de 2002 que ‘’Presumem-se concebidos na constância do casamento os filhos havidos por inseminação artificial heteróloga’’, se houver prévia e expressa autorização do marido. Além disso, também pode ocorrer reprodução assistida heteróloga post mortem desde que o titular do material genético deixe prévia disposição acerca da sua destinação. Dessa forma, é necessário analisar a legalidade do dispositivo conhecido como “testamento genético” ou biológico, uma vez que o Código Civil, na parte de Sucessões, não regulamentou os direitos de sucessão dos seres gerados nas inseminações após a morte. Sendo assim, a finalidade do trabalho é identificar os reflexos jurídicos no tocante à sucessão de seres gerados provenientes de material genético cedido por testamento genético de uma pessoa que não seja o marido.

Palavras-chave: Testamento genético; Reprodução assistida heteróloga; Direitos das Sucessões; Reprodução assistida post mortem.

 

INTRODUÇÃO

 

A reprodução assistida, no que tange ao seu surgimento, gerou uma série de polêmicas, uma vez que o direito considera como herdeiros aqueles seres gerados somente de relação sexual entre os conjugues. Porém, muitos casais tinham problemas para conceber um filho como a infertilidade, por exemplo, e para atender aos anseios da sociedade, foram inseridos três incisos para regulamentar a reprodução assistida por meio de inseminação artificial no artigo 1.597 do Código Civil de 2002, podendo estar ser fecundação artificial homóloga ou heteróloga.

Quanto a utilização de óvulo ou sémen post mortem, é dito que se presumem filhos os provenientes de reprodução assistida heteróloga, no inciso V do art. 1.597 que dispõe sobre o Direito de Família, com a ressalva de que haja expressa autorização do marido ou companheiro à época a colheita do gameta, para que assim, seja presumida a paternidade do cônjuge falecido. Essa disposição de vontade pode ser feita por meio do testamento genético, dispondo sua vontade sobre a destinação do material genético colhido em bancos de sêmen ou óvulos, em virtude de ocorrer morte ou incapacidade do titular do material.

Porém, discute-se a legalidade do testamento biológico, uma vez que os direitos de sucessão ficam comprometidos com a realização de tal prática por falta de regulamentação expressa em lei, já que o legislador só se preocupou com a questão da paternidade proveniente de reprodução assistida inserida no art. 1.597 do Código Civil na parte de Direito de Família.

É importante ressaltar que a doutrina discute sobre os efeitos psicológicos que acarretam tanto na genitora e no ser gerado após a reprodução assistida post mortem. Além disso, o médico se vê diante de uma questão bioética entre cumprir o testamento biológico e não o fazer por fala de legislação expressa que o regulamente, além das resoluções do Conselho Federal de Medicina.

Dessa forma, o trabalho torna-se uma importante ferramenta para analisar os efeitos jurídicos e as consequências da reprodução assistida heteróloga por material genético cedido por testamento tanto na esfera do Direito das Sucessões como para o Biodireito.

1 ELEMENTOS GERAIS E HISTÓRICOS DA REPRODUÇÃO ASSISTIDA HETERÓLOGA NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

 

A reprodução assistida surgiu como forma de suprir a necessidade de casais que não podiam ter filhos, devido principalmente a fatores como a infertilidade. Essas técnicas de reprodução assistida acontecem conforme um conjunto de procedimentos em reprodução humana que manipulam pré-embriões ou interferem no manuseamento de gametas, e ocorrem principalmente por meio da inseminação artificial in vitro. Segundo Venosa (2013) a inseminação pode ser entendida como forma de fecundação artificial, onde se dá a união do sêmen ao óvulo por meios não naturais, cujo estudo pertence a biomédica, mas que também se difunde no Direitos de Sucessões.

A reprodução assistida pode ser tanto homóloga, esta quando se utiliza gametas do próprio casal, e a reprodução assistida heteróloga, esta por sua vez objeto da pesquisa, que sendo segundo Venosa, 2013, p. 243 é ‘’aquela cujo sêmen é de um doador que não o marido e aplica-se principalmente nos casos de esterilidade do marido. Com frequência, recorre-se aos chamados bancos de esperma’’.

Essas técnicas de reprodução assistida são resultado de avanço científico e tecnológico para suprir as necessidades da humanidade.

A partir do século XX, a ciência alcançou, através do experimento e do avanço tecnológico, inúmeras descobertas direcionadas a melhorar a existência humana. O estudo pormenorizado do genoma humano, a clonagem, a criação de organismos geneticamente modificados são apenas alguns dos desenvolvimentos científicos que causaram grande repercussão na sociedade nas últimas décadas. (CARDIN; CAMILO, 2009).

Ainda segundo as autoras, esses procedimentos de reprodução humana ganharam repercussão mundial com o nascimento do primeiro bebê (Louise Brown) concebido in vitro, em 1978 na Inglaterra. Já, a primeira inseminação artificial heteróloga (de um terceiro doador) ocorreu nos Estados Unidos em 1834 (PUSSI, 2007). O autor ainda comenta que o primeiro ser humano proveniente de uma reprodução in vitro no Brasil ocorreu em 7 de Outubro de 1984.

Outro aspecto relevante da reprodução assistida, é que a heteróloga no caso em questão, também pode ocorrer post mortem, ou seja, aquela que utiliza o sêmen ou embrião conservado, por meio de técnicas especiais, após a morte do doador (MONTALBANO, 2012, p. 22). No entanto, ainda é uma questão polêmica a respeito dos direitos sucessórios de uma criança concebida por essa técnica de reprodução assistida. Por isso, devido ao grande número de problemas que pode trazer, a inseminação artificial e a implantação de embriões excedentários post mortem é proibida em muitos países, como na Alemanha, na Suécia, na França e na Espanha.

Então, atualmente a reprodução assistida está regulada pelo artigo 1.597 do Código Civil de 2002 que dispõe que ‘’Presumem-se concebidos na constância do casamento os filhos: [...]; V - havidos por inseminação artificial heteróloga, desde que tenha prévia autorização do marido. No entanto, conforme afirma Venosa, 2013, p. 240 ‘’advirta-se, de plano, que o Código de 2002 não autoriza nem regulamenta a reprodução assistida, mas apenas constata lacunosamente a existência da problemática e procura dar solução ao aspecto da paternidade’’.

Dessa forma, entende-se que para haver reprodução assistida heteróloga deve haver expressa autorização do cônjuge, incluindo-se os casos de reprodução assistida post mortem. Além disso, conforme a Resolução n° 1.358/192 do Conselho Federal de Medicina que prevê normas éticas para a utilização das técnicas de reprodução assistida e regula esse procedimento, também dispõe que tanto na reprodução assistida heteróloga como na homologa, a esposa vai necessitar do consentimento do esposo ou companheiro.

Sabe-se que se o cônjuge, em vida, consentir de forma livre e consciente a reprodução assistida heteróloga de sua esposa, não poderá contestar mais a paternidade, e o contrário acontece se este não consentir e ocorrer o procedimento de reprodução. A filiação socioafetiva, é, portanto, prevista legalmente na reprodução assistida de forma heteróloga, pois considera-se como pai mesmo aqueles que não forneceram seu material genético para a concepção do seu filho (REIS, 2010).

Em consequência, o vínculo de filiação, uma vez formado, não mais será objeto de contestação ou de impugnação e imporá, aos que externarem de forma livre e esclarecida o seu consentimento, os direitos e obrigações relativos à filiação, com todos os efeitos daí decorrentes. (REIS, p. 8, 2010).

           

No entanto, esse tipo de procedimento reprodutivo gera muitas polêmicas, tanto no aspecto jurídico como social, em virtude do filho concebido carregará o material genético e aparência do pai biológico, mas será criado pelo seu pai afetivo, e a partir desse aspecto, passa-se a questionar os direitos sucessórios desse filho.

A doutrina entende que no caso da reprodução assistida heteróloga, havendo o consentimento informado do pai (cônjuge ou companheiro) que tenha autorizado a fertilização de sua mulher, depois de realizado o procedimento, não poderá contestar sua paternidade. A partir do momento que assumiu a paternidade de filho com que sabidamente não tinha consangüinidade, não lhe é permitido a qualquer momento negar sua responsabilidade, salvo se provar vício de vontade por meio de coação, erro ou lesão (REIS, p. 8-9, 2010).

Sendo assim, o nascido por meio das técnicas de reprodução assistida heteróloga possui a garantia da igualdade entre os filhos, sendo igualmente considerado descendente de seus genitores.

Já nos casos de reprodução assistida heteróloga post mortem, esta divide bastante a doutrina no que diz respeito aos direitos sucessórios do filho concebido por meio desta, em razão da falta de regulamentação sobre o assunto, bem como que deve ocorrer mediante expressa autorização do marido. Dessa forma, será analisado mais adiante sobre os aspectos provenientes do testamento genético nesse tipo de reprodução assistida.

  • O TESTAMENTO GENÉTICO

Dá-se o nome de testamento genético à aquele tipo de testamento que expressa a vontade de futuros pai ou mãe, doadores de gametas, que deixam instruções acerca da sua vontade e da destinação final do material genético congelado, para que esse possa ser utilizado na reprodução assistida para o nascimento de futuros filhos post mortem de um dos genitores, determinando inclusive quem pode utilizar esse material.

A vontade expressa em testamento quanto ao destino de sêmens e óvulos congelados, a constituir o material genético objeto de doação no efeito de uma futura inseminação artificial pela donatária, tem sido definida como um novo instrumento jurídico para o surgimento dos “filhos de herança”, programados “post mortem” para pessoas determinadas (ALVES, 2014).

Dessa forma, o autor ainda afirma que o testamento genético passa a ser um bem de inventário e tem como destinação servir à procriação do falecido, mediante sua vontade expressa. Sendo assim, para ocorrer qualquer tipo de reprodução assistida post mortem, deve haver expressa vontade de um dos cônjuges para que os direitos sucessórios de um filho concebido por esse procedimento, tenha seus direitos garantidos.

Além disso, a partir do momento que o titular do material genético queira depositá-lo em bancos de sêmen ou óvulos, este deve deixar expresso todas as instruções a cerca do destino que à eles deve ser dado, inclusive pela falta de legislação que regulamente tal assunto, uma vez que o Código Civil de 2002 só se manifesta sobre a paternidade na reprodução assistida, enquanto o Conselho Federal de Medicina dispõe que para ser utilizado o material de bancos de sêmen e/ou óvulos, o titular do material deve deixar expressa sua vontade.

A Resolução nº 1.995/2012 do Conselho Federal de Medicina veio permitir em seu dispositivo a possibilidade do registro do “testamento vital”, dito “testamento biológico”, junto à ficha médica ou prontuário do paciente, vinculando o médico à vontade do paciente (ALVES, 2014).

Ainda assim, há diferença entre esses dois tipos de testamento, uma vez que no testamento biológico, ou genético, este ocorre geralmente pela disposição da vontade expressa do titular do material genético em criopreservação quanto sua destinação, enquanto que o testamento vital, segundo Alves (2014) são instrumentos de “diretivas antecipadas de vontade”, cujas declarações de vontade e instruções devem ser aplicadas sobre uma condição terminal do testador ou em casos de impossibilidade dele dispor sobre sua vontade, seja em razão da morte ou à recusa ou suspensão de tratamentos paliativos como a ortotanásia, por exemplo.

No atinente aos “testamentos genéticos”, inexiste previsão na legislação brasileira, dispondo, entretanto, a Resolução 1.957, de 06.01.2011, do Conselho Federal de Medicina, que “não constitui ilícito ético a reprodução assistida “post mortem”, desde que haja autorização prévia específica do(a) falecido(a) para o uso do material biológico criopreservado, de acordo com a legislação vigente” (Anexo único, VIII). Este normativo ético é premissa de base suficiente a sugerir a prática mais elaborada de testamentos da espécie (ALVES, 2014).

Ainda assim, como foi visto, o Código Civil na parte que dispõe sobre o Direito de Família, prevê a reprodução assistida, seja heteróloga ou homológa ou ainda post mortem, desde que com expressa autorização do cônjuge ou companheiro, onde aqui o testamento genético teria sua função, porém no que tange ao aspecto sucessório, ainda há uma lacuna legislativa sobre o assunto. Dessa forma, deve-se analisar os reflexos jurídicos provenientes do testamento genético no direito de sucessão.

  1. ANÁLISE DOS EFEITOS JURÍDICOS PROVENIENTES DO TESTAMENTO GENÉTICO DENTRO DAS ESFERAS DO BIODIREITO E DO DIREITOS DAS SUCESSÕES

 

 

Inicialmente, faz-se mister analisar o conceito de filiação, com o intuito de identificar a relação existente em caso de reprodução assistida heteróloga post mortem. A palavra filiação, etimologicamente, “é um termo derivado do latim filiatio, sendo um conceito que distinguia a relação de parentesco estabelecida entre pessoas que concederam a vida a um ente humano e este, ou seja, os pais e seu filho”. Partindo da intenção deste instituto, a primeira percepção da filiação tinha, como fato originário, a procriação, tendo por base a relação sexual entre pessoas de dois sexos diferentes. Do viés sociológico, “tem-se como filiação o resultado das relações interpessoais na concretização do desejo pela perpetuação da espécie.” (REIS apud LÔBO, 2010, p.10).

Destrate, o estado de filiação é, portanto, a qualificação jurídica dessa relação de parentesco, atribuída a alguém, a qual compreende um complexo de direitos e deveres.

Nos dias de hoje, filiação e parentalidade não são conceitos mais tão facilmente estruturados. O Direito de Família sofreu várias mudanças no decorrer dos anos, bem como em razão do reconhecimento da socioafetividade, porém, o que, realmente, trouxe grandes inovações foi os avanços da biotecnologia, a qual implantou impõem novas formas de concepção de filhos e, consequentemente, novas situações jurídicas.

Referente aos direitos sucessórios da criança concebida por meio de reprodução assistida através de autorização testamentária, aduz Francisco José Cahali citado por Douglas Phillips Freitas (2012):

Independente de ter havido ou não testamento, sendo detectada no inventário a possibilidade de ser utilizado material genético do autor da herança (já que sua vontade ficara registrada no banco de sêmen por força da resolução já informada), no intuito de evitar futuro litígio ou prejuízo ao direito constitucional de herança, há de ser reservados os bens desta prole eventual sob pena de ao ser realizado o procedimento, vier o herdeiro nascido depois, pleitear, por petição de herança, seu quinhão hereditário, como se fosse um filho reconhecido por posterior ação de investigação de paternidade (CAHALI apud FREITAS, 2012).

 

Partindo dessa análise, não há restrições quanto ao uso do material genético após a morte, possibilidade advinda com o avanço exponencial da biotecnologia. Nesse sentido, está Alves:

No atinente aos “testamentos genéticos”, inexiste previsão na legislação brasileira, dispondo, entretanto, a Resolução 1.957, de 06.01.2011, do Conselho Federal de Medicina, que “não constitui ilícito ético a reprodução assistida “post mortem”, desde que haja autorização prévia específica do(a) falecido(a) para o uso do material biológico criopreservado, de acordo com a legislação vigente” (Anexo único, VIII). Este normativo ético é premissa de base suficiente a sugerir a prática mais elaborada de testamentos da espécie.(2014, p.1)

Sendo assim, a reprodução assistida heteróloga post mortem não possui impedimentos quanto a sua realização, porém, existirá efeitos sucessórios somente em relação ao pai afetivo, em virtude da previsão do inciso V do art. 1597, o qual se espelha na presunção de paternidade no casamento, claro, se existir a anuência do marido.

  1. AS CONSEQUÊNCIAS DA REPRODUÇÃO ASSISTIDA HETERÓLOGA POR MATERIAL GENÉTICO CEDIDO POR TESTAMENTO NO DIREITO SUCESSÓRIO

A inseminação post mortem, como já explanado ao longo do trabalho, possui previsão no art. 1.597, sendo objeto de estudo desse trabalho o inciso V, o qual o ordenamento jurídico prevê a possibilidade da reprodução assistida heteróloga.

Art. 1.597. Presumem-se concebidos na constância do casamento os filhos:

I - nascidos cento e oitenta dias, pelo menos, depois de estabelecida a convivência conjugal;

II - nascidos nos trezentos dias subsequentes à dissolução da sociedade conjugal, por morte, separação judicial, nulidade e anulação do casamento;

III - havidos por fecundação artificial homóloga, mesmo que falecido o marido;

IV - havidos, a qualquer tempo, quando se tratar de embriões excedentários, decorrentes de concepção artificial homóloga;

V - havidos por inseminação artificial heteróloga, desde que tenha prévia autorização do marido. (grifo nosso)

 

Deve-se atentar ao estado de filiação dessa criança proveniente da reprodução assistida heteróloga, visto que, o pai biológico difere do pai socioafetivo. Ter essa distinção de forma clara é de imensa relevância ao se analisar os direitos sucessórios desta criança, visto que, feito esse método de reprodução, atendido ao requisito de anuência do marido, quem passará a configurar como pai será o marido daquela que se submeteu a esse procedimento de reprodução, ou ao contrário, poderia ser um óvulo doado e os espermatozoides do marido, fazendo-se a analogia, reputar-se-á como pais o casal, não possuindo o doador vinculo algum. (ALDROVANDI; FRANÇA, 2002).

Sendo assim, adentrando-se numa questão mais específica, a reprodução assistida heteróloga post mortem no direito de sucessão, constata-se que não há que se falar em direito sucessório desse filho em relação ao doador, visto que, quem configura como pai é o marido que concordou com o procedimento da reprodução assistida heteróloga. Nesse sentido está Felipe Antônio Colaço Bernardo e Mariana Galvão Rodrigues da Cunha (2012) ao afirmarem que a paternidade socioafetiva prevalece sobre a biológica. Dessa forma, se houve a autorização do marido não há como negar a paternidade. No mesmo sentido está Resende:

A paternidade sócio-afetiva que existirá também deve ser levada a sério, pois o parentesco civil também tem o mesmo amparo legal do parentesco consangüíneo. O consentimento do marido à sua esposa em autorizar que ela insemine material genético de um terceiro anônimo deve ser dotado de certezas, pois futuramente, ele não pode ser desfeito. (2012, p.1)

Faz-se mister observar que, essa autorização é indispensável, conforme a Resolução 1.358/92 do Conselho Federal de Medicina:

O consentimento informado será obrigatório e extensivo aos pacientes inférteis e doadores. Os aspectos médicos envolvendo todas as circunstâncias da aplicação de uma técnica de RA serão detalhadamente expostos, assim como os resultados já obtidos naquela unidade de tratamento com a técnica proposta. As informações devem também atingir dados de caráter biológico, jurídico, ético e econômico. O documento de consentimento informado será em formulário especial, e estará completo com a concordância, por escrito, da paciente ou do casal infértil (CFM, 1992).

Destarte, por essa presunção de paternidade do filho em virtude do casamento, inclusive em relação a reprodução assistida heteróloga, quando respeitado o requisito da concordância do parceiro, há uma equiparação ao filho havido pelo processo natural, sendo assim, ele será herdeiro necessário do casal e não do doador, concorrendo a sucessão legítima daqueles, essa possibilidade se dá em virtude do principio da igualdade jurídica entre os filhos. (COCO, 2010).

Por fim, “os efeitos da real paternidade, a sócio-afetiva, será dada ao pai que vai criá-la” (RESENDE, 2012, p.1) e não ao doador (pai biológico), o que enseja afirmar que em relação a este ultimo a criança não terá nenhum efeito sucessório, apenas em relação ao primeiro.

 
CONCLUSÃO

 

Diante do presente trabalho de pesquisa acerca da reprodução assistida heteróloga post mortem, constatou-se que este não é um tema abordado tanto quanto a reprodução assistida homóloga post mortem. Isso fez com que o trabalho buscasse um estudo mais aprofundado sobre o testamento genético, biotecnologia, a sucessão no direito brasileiro, bem como o direito de família, os quais estão estritamente interligados.

Foi necessário, também, um estudo acerca da família e sua evolução na sociedade, bem como os conceitos de filiação e de que forma o mesmo se dava no decorrer da história, as modificações advindas pelo Código e Resoluções.

Destarte, constatou-se que o direito sucessório é assegurado ao filho proveniente de reprodução assistida heteróloga, direito este que advém do pai afetivo, o qual é casado com a mulher que se submeteu a esse procedimento e concordou para com tal. O filho advindo desse método não terá nenhum direito sucessório quanto ao doador, seu pai biológico.

REFERÊNCIAS

 

ALDROVANDI, Andréa; FRANÇA, Danielle Galvão de. A reprodução assistida e as relações de parentesco. Disponível em: < http://jus.com.br/artigos/3127/a-reproducao-assistida-e-as-relacoes-de-parentesco/1>. Acesso em: 08 nov. 2014.

 

ALVES, Jones Figueirêdo. Bem de inventário: Testamento genético celebra a dignidade da vida. Disponível em>http://www.conjur.com.br/2014-mar-15/jones-figueiredo-testamento-genetico-celebra-dignidade-vida< Acesso em: 12/11/14.

 

BRASIL. Presidência da República. Código Civil. Lei N° 10.406, de 10 de Janeiro de 2002. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm>. Acesso em: 12/11/14.

CARDIN, Valéria Silva Galdino; CAMILO, Andryelle Vanessa. Dos aspectos controvertidos da reprodução assistida post mortem. Disponível em>http://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:oMMRmfTeZsoJ:www.periodicos.uem.br/ojs/index.php/RevCiencJurid/article/download/10963/6014+&cd=2&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br< Acesso em: 12/11/14.

COCO, Bruna Amarijo. Reprodução assistida post mortem e seus aspectos sucessórios. Disponível em: < http://jus.com.br/artigos/21747/reproducao-assistida-post-mortem-e-seus-aspectos-sucessorios/2>. Acesso em: 11 nov. 2014.

Conselho Federal de Medicina. RESOLUÇÃO CFM nº 1.358/1992. Disponível em> http://www.portalmedico.org.br/resolucoes/CFM/1992/1358_1992.htm< Acesso em: 12/11/14.

Conselho Federal de Medicina. RESOLUÇÃO CFM nº 1.957/2010. Disponível em> http://www.portalmedico.org.br/resolucoes/CFM/2010/1957_2010.htm< Acesso em: 12/11/14.

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RESENDE, Cecília Cardoso Silva Magalhães. As questões jurídicas da inseminação artificial heteróloga. Jus Navigandi, Teresina, ano 17, n. 3234, 9 maio As questões jurídicas da inseminação artificial heteróloga. Jus Navigandi, Teresina, ano 17, n. 3234, 9 maio 2012. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/21725>. Acesso em: 13 nov. 2014.

FREITAS, Douglas Phillips. Reprodução assistida após a morte e o direito de herança. Disponível em: < http://www.egov.ufsc.br/portal/conteudo/reprodu%C3%A7%C3%A3o-assistida-ap%C3%B3s-morte-e-o-direito-de-heran%C3%A7a>. Acesso em: 11 nov. 2014.

LÔBO, Paulo Luiz Netto. Direito ao estado de filiação e direito à origem genética: uma distinção necessária. Jus Navigandi. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4752>. Acesso em: 10 de nov. de 2014.

MONTALBANO, Ana Caroline Oliveira. Inseminação post mortem e seus reflexos no direito de família e sucessões. Disponível em>http://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:hEqXp7XqEEMJ:www.revista.esmesc.org.br/re/article/download/48/49+&cd=2&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br< Acesso em: 12/11/14.

PUSSI, William Artur. Personalidade Jurídica do Nascituro. 1. Ed. Curitiba: Juruá, 2007.

REIS, Carolina Elhoáh Stumpf. Direitos sucessórios na reprodução medicamente assistida. Disponível em> http://www.egov.ufsc.br/portal/sites/default/files/direitos_sucessorios_na_reproducao_medicamente_assistida.pdf< Acesso em: 12/11/14.

VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: direito de família. 13. Ed. – São Paulo: Atlas, 2013.

[1] Paper final apresentando à disciplina de Direito de Família e Sucessão;

[2] Alunas do 6° período noturno do curso de Direito da UNDB;

[3] Professora e Especialista na disciplina de Direito  de Família e Sucessão.