Emanuela Mendes Kruschewsky**

RESUMO

Este artigo visa analisar o conto da escritora baiana Sônia Coutinho,com o intuito de mostrar que a função social da mulher não é apenas ser dona de casa ou um esposa exemplar,mas demostrar que a função da mulher em sua sociedade vai além que ser um mera "rainha do lar".

PALAVRAS-CHAVES

Mulher;função social;Sônia Coutinho

"[...] os sistemas gênero-sexo historicamente realizados revelariam, na relação masculino e feminino, a opressão deste ultimo pelo primeiro [...]" (Campos,1992)

CONSIDERAÇÕES INICIAIS

O papel social do sexo está dentro de um recorte cultural, conceitualmente dividido em masculino e feminino, esse sistema de gênero é um modo como a realidade social é organizada. Mas essa divisão relaciona o masculino e feminino, a opressão e exploração das mulheres pelos homens. Essa distinção atribui papéis aos sexos, o sexo incorpora o plano da natureza e a naturalização foi relacionada a submissão do feminino ao masculino, uma vez que as mulheres eram dominadas, oprimidas e excluídas de certas posições pela sociedade machista, fato que, incontestavelmente restringe as possibilidades de ascensão social da figura feminina.

O conto "Darling, ou amor em Copacabana" de Sônia Coutinho representa um rompimento com os "padrões sociais" estabelecidos pela sociedade às mulheres, uma vez que as atribuições referentes ao feminino eram elencadas (ainda que de forma implícita) a partir de ideais machistas que caracteriza a mulher apenas como dona-de-casa, mãe e esposa. No conto temos uma personagem não nominada que conta a história de um novo e passageiro amor com um rapaz: " [...] este rapaz de uns vinte e poucos anos (ô tórax musculoso moreno) (que dentes brancos curtinhos) [...]". Essa mulher que vive sozinha em Copacabana, experiente, aparentando ter seus trinta e poucos anos; viúva e divorciada; Sônia Coutinho descreve um Rio de Janeiro dos anos 70 onde ocorre a revolução sexual e a libertação das mulheres (sexo livre, pílula, emancipação financeira). O início do conto mostra essa mulher madura na praia em um dia ensolarado de domingo: "[...] pois é domingo e de maio assim nos encontramos na praia onde cheguei às 11 e meia, como todas as manhãs [...]" (UCF, 1994, p. 59),que se preocupa com o corpo e beleza.

Quebrando a visão e destinação imposta pela sociedade machista a personagem de Sônia Coutinho vive de modo contrário a essas imposições; ela se mostra e cuida da beleza do corpo, ela se mostra superior (fisicamente) a mulheres de menos idade, mas é uma mulher que tem suas frustrações, limitações e tristezas. A "sociedade dos homens" apresenta uma mulher diferente, que com seus trinta e poucos anos tinha que estar numa casa com filhos e marido, vivendo à sombra deste, desistindo dos seus sonhos. Campos (1992) afirma que: "[...] os sistemas gênero-sexo historicamente realizados revelariam, na relação masculino e feminino, a opressão deste ultimo pelo primeiro [...]" Havia um certo estranhamento, uma certa "punição" para as mulheres que ousassem romper com os princípios cristalizados em relação a sua condição subalterna a que era sempre submetida.

Vista como objeto de desejo, a mulher experiente ou não, buscando cultuar o corpo para que o desejo e os olhares masculinos se voltem para elas.

"[...] Então tirei a saída-short amarelo gema e exibi, com orgulho o biquíni novo da mesma cor e minha cintura perfeita, fazendo inveja a qualquer menininha das imediações, com essas duas estiradas de barriga para baixo, bronzeadas-quase-negras brilhando sob o sol, ao lado do sujeito louro desbotado seguramente estrangeiro lendo seu pocket – book [...]" (UCF, 1994, 59).

O culto a corpos belos e esbeltos, tanto para homens quanto para mulheres é aceito na sociedade atual, "impõe" que mulheres sejam altas e magras, e os homens devem ser fortes e musculosos.

Com o passar das décadas as mulheres foram deixando de lado a obrigatoriedade de ser "mãe – dona-de-casa – esposa" e foram buscar liberdade nas imposições feitas pela sociedade em que vivem. Até o início do século XX, competia, inquestionavelmente, à mulher ofícios relacionados, direta ou indiretamente, à maternidade, ou seja, e alimentar e educar as crianças, o que insinua que além de um estafante dia de trabalho de cuidar da casa. Ao homem, cabia fornecer a alimentação da família trabalhando.

Mulheres independentes recebiam vários nomes, mulheres com filhos e sem marido eram consideradas prostitutas, sendo obrigadas a largarem seus filhos com parentes ou entregá-los para a adoção.

A autora de "Uma certa felicidade" apresenta uma mulher independente que vai de encontro aos padrões de uma sociedade que estava em mudança:

"[...] viúva de um campeão internacional de automobilismo , protegíede um diplomata grego aposentado atriz de teatro e cantora de ópera, amante de um japonês, de um turco e um homossexual riquíssimo, que me apresentou um rubi indiano, antes de fugir para Hong – Kong com um trapezista louro viajei por Europa e África [...]".

No início do século, mulheres que vivessem tantas experiências com homens eram "excluídas" da sociedade. No início da década de 70 a liberação sexual estava no auge; cidade do Rio de Janeiro, berço de músicos e músicas, bairro de Copacabana, boemia carioca, lá morava a personagem em um pequeno apartamento, levando seu "novo amor" para conhecê-lo:

"[...] inevitável eu convidá-lo a tomar um uísque comigo nesta minha kitchenette do posto três na qual agora nos encontramos, você com um roupão de seda vermelho que lhe dei para substituir o calção molhado, eu com a túnica indiana encima da pele [...]" (UCF, 1994, 60).

Neste momento percebe-se que há,na verdade, um jogo de sedução onde a mulher proporciona ao seu "amor" um momento em que seria muito provável que acontecesse o ato sexual.Deve-se a esse acontecimento o fato de ela já ter trinta e poucos anos, algo que poderia ser inconcebível para alguém de menos idade, pois a cobrança do grupo família – sociedade seria maior.

Além da realização de ambos, em se tratando do aspecto sexual, percebe-se que no conto há uma necessidade onde a mulher supre, também, a carência afetiva do rapaz com quem se envolveu. Suprindo ela também, em partes, a frustração de não ser mãe, mesmo porque os outros relacionamentos dela sempre aconteceram com homens experientes. Podemos perceber essa situação no fragmento que segue:

"[...] você se senta do meu lado e conta o quanto precisa de alguém simplesmente para passar a mão em sua cabeça, naqueles dias em que a gente telefona e não há ninguém do outro lado do fio, só chove sem parar! Você até chora e se sente muito criança [...]" (Idem,p. 60)

Mas nem só de boa vida e alegrias que a personagem do conto vive, nela existe uma certa frustração, a vontade de ter um filho, sonho de muitas mulheres:

[...] meus olhos ficam cheios de lágrimas, sofro demais darling, morro de medo de escuridão e de elevador, carrego o não ter tido filhos como uma ferida secreta [...]" (Ibidem,p.61)

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Uma mulher que viveu alegrias e amores, leva consigo o fato de não ter gerado um herdeiro, de não ter realizado uma das principais funções físicas femininas, ou seja mesmo havendo o que se pode chamar de emancipação da figura feminina, ela ainda continua presa às realizações pessoais como sendo um reflexo do discurso das imposições de uma sociedade patriarcal. Nesse sentido, observa-se que a total "libertação" da mulher depende em maioria do desprender, por parte dela, dos critérios estabelecidos para que ela seja uma mulher "realizada" no seu convívio social.

De pessoas confinadas apenas ao lar as pessoas que tem acesso ao mercado de trabalho, de quem tinha apenas deveres e deveria obedecer a ordens do marido, as melhorias que resultaram em direitos, como por exemplo, o voto, direito a divórcio, as mudanças no cenário feminino foram resumidas e rápidas. Porém há muito ainda que avançar, com o surgimento de novas possibilidades e potencialidades, a mulher tem enxergado um mundo diferente daquele do início do século e conquistado a duras penas espaços, conquistas nas áreas políticas e econômicas, em especial, no mercado de trabalho tem sido assimilado de diferentes formas quanto à classe social, cor, credo e raça, tudo isso relacionado à nova forma que vêem as mulheres.

REFERÊNCIAS

  • CAMPOS,Maria Consuelo Cunha.Gênero.In:JOBIM,José Luís (org.)Palavras da crítica.Rio de Janeiro:Imago Ed.,1992.Coleção Pierre Menard.p.,111-124.
  • COUTINHO, Sônia. Uma certa felicidade.2 ed.Rio de Janeiro:Rocco,1994.p.,59-64.