Análise de alguns dos espaços de participação na gestão  ambiental do Estado da Bahia: Conferência de Meio Ambiente, Conselhos de Meio Ambiente, de Recursos Hídricos e de Educação Ambiental.

Mateus de Oliveira Conceição Almeida

Resumo: O presente artigo se propõe a analisar a participação na gestão ambiental no Estado da Bahia, a partir dos espaços institucionais previstos na Política de Meio Ambiente e de Recursos Hídricos (Leis nº 10.431/06 e nº 11.612/2009). Ainda, o artigo reúne balanço da produção normativa dos Conselhos de Meio Ambiente, de Recursos Hídricos e de Educação Ambiental. 

Palavras chaves: participação, Conferência, Conselhos, meio ambiente.

Sumário: Introdução. 1. Conferência de Meio Ambiente. 2. Conselho de Meio Ambiente. 3. Conselho de Recursos Hídricos. 4. Comissão Interinstitucional de Educação Ambiental. Considerações Finais. Referências.

Introdução

De uma forma geral, a demanda por mais aproximação com os espaços de deliberação tem sido constantemente apontados pela sociedade civil. As representações não estão se fazendo suficientes e tem se mostrado um grande desafio o processo de transição do Brasil para um novo e superior padrão civilizatório.

É evidente a carência de espaços sólidos de ação efetiva em poder da coletividade. Na tentativa de avançar vemos medidas que no máximo podem ser consideradas como tímidas, e ainda assim capaz de reunir 8 (oito) mil propostas com apenas 15 (quinze) dias de iniciado, como ocorreu no caso do Programa Federal "Dialoga Brasil" lançado neste mês de agosto[1].

A previsão de participação popular nos rumos da Nação encontra amparo na Constituição Federal de 1988 quando estabelece que todo o poder emana do povo[2].

Ao meio ambiente, em especial, dispõe que é dever do poder público e da coletividade defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações[3].

Ainda, em âmbito internacional, mencionamos 02 (duas) convenções que fortalecem a necessidade de uma gestão ambiental participativa: a) Declaração do Rio de 1992[4]; e, b) Convenção de Aarthus[5].

Essa participação, necessária para uma gestão ambiental responsável, se materializa em espaços institucionais e não institucionais[6]. Acerca do primeiro destacaremos no Estado da Bahia a Conferência de Meio Ambiente e os Conselhos de Meio Ambiente, de Recursos Hídricos e o de Educação Ambiental.

1. Da Conferência de Meio Ambiente:

Em nível federal, a 1ª Conferência de Meio Ambiente foi realizada em 2003, com participação de 65 mil pessoas[7], sendo um dos objetivos "mobilizar, educar e ampliar a participação popular na formulação de propostas para um Brasil sustentável".

Já na 2ª Conferência que teve participação de 86 mil pessoas em todo o País, realizada em 2005, a idéia de uma gestão ambiental mais participativa constava ainda mais clara "firmar a Conferência como uma instância de tomada de decisões orientadoras das Políticas Públicas Ambientais"[8].

Ainda ocorreu a 3ª Conferência, realizada em 2008 (Mudanças Climáticas), e a 4ª Conferência em 2013, esta última segundo o MMA com participação de cerca de 200 mil pessoas[9].

No âmbito do Estado da Bahia, a 1ª Conferência de Meio Ambiente ocorreu em 2005 e foi convocada em 06 de junho[10]. Dificulta a pesquisa o fato da ementa do mencionado Decreto não ter sido retificada e segue equivocadamente como se esse encontro fosse o 2º mesmo ainda não tendo sido realizada a 1ª.

A 2ª Conferência do Estado, propriamente dita, ocorreu em 2007, tendo sido convocada em 10 de dezembro[11], constando os objetivos definidos em seu art. 3º.

Por fim, a mais recente Conferência Estadual de Meio Ambiente realizada na Bahia, foi convocada por meio do Decreto nº 13.619, de 20 de janeiro de 2012. Destaca-se, segundo a Secretaria do Meio Ambiente, que "Foram realizadas 136 conferências municipais, 19 territoriais, envolvendo os 27 Territórios de Identidade baianos e uma etapa estadual, que contou com a participação de cerca de 15 mil pessoas, no Centro de Convenções da Bahia."[12]

No Estado a regulamentação da Conferência de Meio Ambiente está prevista na Lei nº 10.431/2006, sendo que sua convocação[13] deverá ser realizada com periodicidade a cada 02 (dois) anos.

Considerando a realização da ultima conferência em 2012, bem como os claros indícios da sociedade baiana por necessidade de participação, deveríamos ter efetivado esse instrumento da política em 2014. Infelizmente até o momento, mais de 2/3 do ano de 2015 já se passou e não houve nenhuma sinalização no sentido de realização da IV Conferência de Meio Ambiente, nem mesmo das etapas preparatórias nos municípios e territórios.

O cerrado e as comunidades estão em situação de vulnerabilidade perante as intensas supressões de vegetação; a gestão de meio ambiente e de recursos hídricos requer construção intimamente aproximada com a coletividade, a implantação de instrumentos estratégicos não admite açodamento como vem se mostrando a instalação da cobrança de recursos hídricos; precisamos discutir como está funcionado o modelo de licenciamento ambiental trazido com a Lei nº 12.377/2011, bem como a isenção de licenciamento para empreendimentos agrosilvopastoris[14]; a sociedade baiana precisa conhecer efetivamente em que se consiste a publicização das suas unidades de conservação.

O Programa Federal de Aceleração do Crescimento de infraestrutura e logística prevê o investimento no Estado da Bahia nos anos de 2015/2018 em valor acima de 49 bilhões, superior a todo o orçamento do Estado para o ano de 2015[15]. Desse valor, 30 bilhões é para área de energia que envolve, dentre outros, 135 empreendimentos de energia eólica no Estado.

A gestão de meio ambiente na Bahia precisa junto com a sociedade civil atuar qualificando essas intervenções nos territórios com vista a resguardar o meio ambiente ecologicamente equilibrado.

Esse ano o Estado da Bahia convocou, por exemplo, a X Conferência Estadual de Assistência Social[16], a IX Conferência Estadual de Saúde[17] e a IV Conferência Estadual de Políticas para as Mulheres[18].

A sociedade baiana tem uma grande responsabilidade nesse processo. Precisamos de uma mobilização coletiva para viabilizar a realização da IV Conferência de Meio Ambiente do Estado da Bahia.

2. Do Conselho de Meio Ambiente - CEPRAM

Após a 1ª Conferência Mundial sobre Meio Ambiente das Nações Unidas, o Estado da Bahia criou o primeiro Conselho Estadual de Proteção Ambiental (Cepram)[19], órgão colegiado com estrutura e atribuições inéditas no País, a época integrante da estrutura da Secretaria do Planejamento, Ciência e Tecnologia (Seplantec).

O surgimento do Cepram, sob forte influência dos entendimentos construídos na Conferência de Estocolmo no ano anterior, também foi impulsionado pela implantação de um grande empreendimento no Estado[20]. O Pólo Petroquímico, no município de Camaçari, teve as primeiras unidades industriais instaladas a partir de 1974.

Em 2011, com a edição da Lei nº 12.212 de 04 de abril, a competência licenciatória concentrou-se integralmente no órgão executor da Política de Meio Ambiente (Inema), o que gerou grande tensionamento[21] com a sociedade civil representada no Conselho.

A justificativa institucional consistia na necessidade de fortalecer o caráter normatizador do Conselho. Dessa maneira, passemos a verificar as produções normativas desse órgão após a reforma administrativa acima mencionada, ressaltando que as informações foram extraídas do site da Secretaria do Meio Ambiente[22].

Em 2012 o Cepram editou 46 Resoluções: sendo 30 análises de sanções administrativas (multas/advertências/embargos); 09 reconhecimentos de Municípios para o licenciamento; 01 com mera correção de inconsistência técnica jurídica (Resolução nº 4.249); 01 com alteração de um anexo (Resolução nº 4.259); 03 com definições de composição de câmera técnica; e, por fim, apenas 01 (uma) deliberando/regulamentando efetivamente a Política Ambiental do Estado (Resolução nº 4.260[23] - Que define os empreendimentos licenciáveis por meio da Licença Ambiental por Adesão e Compromisso).

No ano de 2013, o Cepram editou 33 Resoluções, das quais 31 referem-se a análise de multas administrativas; 01 a rezoneamento da Apa do Abaeté (Resolução nº 4.280); e apenas 01 de regulamentação efetiva da Política, Resolução nº 4.327[24] (define impacto local para licenciamento dos Municípios);

Em 2014, o Cepram editou 48 Resoluções, das quais 44 foram análises de multas; 02 referem-se a ajustes em Planos de Manejo; 01 definiu composição de Câmara Técnica; 01 refere-se especificamente ao Abaeté.

Em 2015, já com o funcionamento da Câmara Técnica (Resolução nº 4.329 em 2014), de janeiro a 06 de agosto do corrente ano o Cepram editou 43 Resoluções das quais todas referem-se a análise de multas administrativas.

Assim, tendo como análise os anos de 2012 a 2015 conclui-se que das 170 Resoluções editadas pelo CEPRAM, 148 referem-se a multa e apenas 02 deliberaram efetivamente acerca da Política Ambiental do Estado, o que representa um pouco mais de 1% das Resoluções editadas, demonstrando a fragilidade normativa do Conselho e a prevalência na pauta de análises de multas administrativas.

3. Do Conselho de Recursos Hídricos - CONERH

O Conselho Estadual de Recursos Hídricos é o órgão colegiado superior do Sistema Estadual de Gerenciamento de Recursos Hídricos - SEGREH, e possui atribuição normativa, deliberativa, recursal e de representação, conforme art. 46 da Lei nº 11.612/09.

A finalidade do Conselho é formular a Política Estadual de Recursos Hídricos e dentre suas competências destaca-se: a) estabelecer normas para implementação da Política Estadual de Recursos Hídricos e para a aplicação de seus instrumentos; b) estabelecer os procedimentos de elaboração, implementação e revisão do Plano Estadual de Recursos Hídricos[25]; c) fomentar a articulação do planejamento de recursos hídricos com os planejamentos nacionais, regionais, estaduais e dos setores usuários[26].

Continuando a análise das produções normativas dos Conselhos Estaduais que atuam na área de meio ambiente e de recursos hídricos do Estado, destacamos, nesse tópico, as resoluções emanadas do Conselho Estadual de Recursos Hídricos – CONERH:

Em 2012, o Conerh editou 09 resoluções. Dessas, 03 referiam-se a Câmaras Técnicas e Grupos de Trabalho; outras 03 reconheciam o funcionamento dos Comitês de Bacia; 01 alterou o quantitativo das Regiões de Planejamento e Gestão das Águas (Resolução nº 88/2012); e 02 tratavam acerca da eleição dos membros dos comitês.

Em 2013 foram 04 Resoluções, em comum que todas referiam-se a mandato dos membros.

No ano de 2014 a produção do Conselho foram 03 Resoluções. Destaca-se a de nº 96/2014 que “estabelece diretrizes e critérios gerais para a outorga do direito de uso dos recursos hídricos do Estado da Bahia”. Entre as demais, 01 consiste na definição de grupo de trabalho e a outra aprova as metas estabelecidas no Programa Federal Progestão.

Em 2015, considerando de janeiro até o dia 01º de setembro se somam 03 Resoluções. Sobre as eleições do Conselho são duas e a última uma nova aprovação das metas do Programa Federal Progestão.

Com essas informações conclui-se que entre os anos de 2012 a 2015 o CONERH editou 19 Resoluções, sendo que apenas uma tratou efetivamente acerca da regulamentação da Política que foi a Resolução nº 96/2014.

 

4. Da Comissão Interinstitucional de Educação Ambiental – CIEA.

A Comissão Interinstitucional de Educação Ambiental tem como missão propor as diretrizes da Política e do Plano Estadual de Educação Ambiental, coordenando e interligando as atividades relacionadas ao tema[27].

As competências desse Conselho constam descritas no parágrafo único do art. 16 da Lei nº 10.431/06, dentre as quais destacamos: a) promover a Educação Ambiental a partir das recomendações da legislação pertinente e de deliberações oriundas de conferências oficiais de meio ambiente e de Educação Ambiental; b) propor programas de Educação Ambiental considerando a diversidade local e regional; c) apoiar técnica, científica e institucionalmente as ações de Educação Ambiental.

Considerando essa relevante atribuição da CIEA prevista na Política Estadual de Meio Ambiente, passemos a analisar, assim como nos demais Conselhos, a produção normativa dentre os anos de 2011 / 2015:

 

Em 2011, a CIEA publicou 01 Resolução (nº 02/2011) que foi responsável pela “Aprovação de alteração do Regimento Interno”.

No ano seguinte, em 2012, foram editadas 02 novas Resoluções, sendo que ambas também tratavam sobre o regimento do conselho.

Em 2013 a CIEA estabeleceu a recondução dos seus membros por meio da única Resolução do ano.

No ano de 2014 as Resoluções emanadas da CIEA foram 02: 01 definindo composição de Câmara Técnica, e a outra mais uma alteração no Regimento.

Quanto ao ano de 2015, registra-se que até o dia 01º de setembro não houve nenhuma Resolução da CIEA.

 

Assim, considerando os anos de 2011 a 2015 a CIEA editou 06 Resoluções, e conforme exposto acima não houve nenhuma regulamentação efetiva da Política de Educação Ambiental do Estado, limitando suas ações a definição de procedimentos meramente formais administrativos.

 

Considerações Finais

Analisando alguns dos espaços institucionais de participação instituídos na Política de Meio Ambiente e de Recursos Hídricos do Estado da Bahia verifica-se fragilidade no exercício das suas competências típicas, nos casos dos Conselhos, e uma não observância na realização no caso da Conferência de Meio Ambiente.

Para consubstanciar estas afirmativas, as ações e os balanços de produção normativa apresentadas mostram que os Conselhos vêm tendo uma redução da sua importância na construção da Política Ambiental, sendo priorizadas ações meramente administrativas e que fragilizam esses que deveriam ser espaços estratégicos de deliberação/regulamentação.

Uma questão importante é que as Políticas de Meio Ambiente, de Recursos Hídricos e de Educação Ambiental possuem uma perspectiva clara da necessidade de participação da coletividade. Dessa maneira esperamos que se constitua nesses espaços institucionais um conjunto articulado entre o Poder Público e a Sociedade Civil que não permita o abandono dessas instâncias, bem como que seja viabilizada o quanto antes uma ampla mobilização pela realização da IV Conferência de Meio Ambiente no Estado da Bahia.


[2] Art. 1º da C.F/88.

[3] Art. 225 da C.F/88.

[4] "art. 10 - O melhor modo de tratar as questões ambientais é com a participação de todos os cidadãos interessados, em vários níveis. (...) assim como a oportunidade de participar do processo de adoção de decisões."

[5] Art. 1º - Para contribuir para a proteção do direito de qualquer pessoa das presentes e futuras gerações e viver num ambiente adequado para o seu bem-estar, deverá ser garantido o seu direito de acesso à informação, à participação pública em processos decisórios e à justiça em matéria de meio ambiente.

[10] Decreto nº 9.442/2005.

[11] Decreto nº 10.653/2007.

[13] Art. 68 - A convocação das conferências será realizada através de ato do Chefe do Executivo Estadual, com periodicidade a cada dois anos.

[14] Decreto Estadual nº 15.682, de 19 de novembro de 2014.

[16] Decreto nº 16.033/2015.

[17] Decreto nº 16.037, de 17 de abril de 2015.

[18] Decreto nº 16.084, de 15 de maio de 2015.

[19] Por meio da Lei nº 3.163 editada no ano de 1973.

[20] "Entendendo o Licenciamento Ambiental Passo a Passo" Maria Lucia Cardoso (2009).

[25] Inciso II do art. 46 da Lei nº 11.612/09.

[26] Inciso IV do art. 46 da Lei nº 11.612/09.

[27] Conforme art. 16 da Lei nº 10.431/06.

Autor:

Mateus de Oliveira Conceição Almeida é professor na Faculdade São Salvador, Especialista em Legislação Ambiental pela Universidade Federal do Estado da Bahia e servidor da Secretaria de Meio Ambiente do Estado.