Análise de alguns dos espaços de participação na gestão ambiental do Estado da Bahia
Publicado em 03 de setembro de 2015 por mateus de oliveira conceição almeida
Análise de alguns dos espaços de participação na gestão ambiental do Estado da Bahia: Conferência de Meio Ambiente, Conselhos de Meio Ambiente, de Recursos Hídricos e de Educação Ambiental.
Mateus de Oliveira Conceição Almeida
Resumo: O presente artigo se propõe a analisar a participação na gestão ambiental no Estado da Bahia, a partir dos espaços institucionais previstos na Política de Meio Ambiente e de Recursos Hídricos (Leis nº 10.431/06 e nº 11.612/2009). Ainda, o artigo reúne balanço da produção normativa dos Conselhos de Meio Ambiente, de Recursos Hídricos e de Educação Ambiental.
Palavras chaves: participação, Conferência, Conselhos, meio ambiente.
Sumário: Introdução. 1. Conferência de Meio Ambiente. 2. Conselho de Meio Ambiente. 3. Conselho de Recursos Hídricos. 4. Comissão Interinstitucional de Educação Ambiental. Considerações Finais. Referências.
Introdução
De uma forma geral, a demanda por mais aproximação com os espaços de deliberação tem sido constantemente apontados pela sociedade civil. As representações não estão se fazendo suficientes e tem se mostrado um grande desafio o processo de transição do Brasil para um novo e superior padrão civilizatório.
É evidente a carência de espaços sólidos de ação efetiva em poder da coletividade. Na tentativa de avançar vemos medidas que no máximo podem ser consideradas como tímidas, e ainda assim capaz de reunir 8 (oito) mil propostas com apenas 15 (quinze) dias de iniciado, como ocorreu no caso do Programa Federal "Dialoga Brasil" lançado neste mês de agosto[1].
A previsão de participação popular nos rumos da Nação encontra amparo na Constituição Federal de 1988 quando estabelece que todo o poder emana do povo[2].
Ao meio ambiente, em especial, dispõe que é dever do poder público e da coletividade defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações[3].
Ainda, em âmbito internacional, mencionamos 02 (duas) convenções que fortalecem a necessidade de uma gestão ambiental participativa: a) Declaração do Rio de 1992[4]; e, b) Convenção de Aarthus[5].
Essa participação, necessária para uma gestão ambiental responsável, se materializa em espaços institucionais e não institucionais[6]. Acerca do primeiro destacaremos no Estado da Bahia a Conferência de Meio Ambiente e os Conselhos de Meio Ambiente, de Recursos Hídricos e o de Educação Ambiental.
1. Da Conferência de Meio Ambiente:
Em nível federal, a 1ª Conferência de Meio Ambiente foi realizada em 2003, com participação de 65 mil pessoas[7], sendo um dos objetivos "mobilizar, educar e ampliar a participação popular na formulação de propostas para um Brasil sustentável".
Já na 2ª Conferência que teve participação de 86 mil pessoas em todo o País, realizada em 2005, a idéia de uma gestão ambiental mais participativa constava ainda mais clara "firmar a Conferência como uma instância de tomada de decisões orientadoras das Políticas Públicas Ambientais"[8].
Ainda ocorreu a 3ª Conferência, realizada em 2008 (Mudanças Climáticas), e a 4ª Conferência em 2013, esta última segundo o MMA com participação de cerca de 200 mil pessoas[9].
No âmbito do Estado da Bahia, a 1ª Conferência de Meio Ambiente ocorreu em 2005 e foi convocada em 06 de junho[10]. Dificulta a pesquisa o fato da ementa do mencionado Decreto não ter sido retificada e segue equivocadamente como se esse encontro fosse o 2º mesmo ainda não tendo sido realizada a 1ª.
A 2ª Conferência do Estado, propriamente dita, ocorreu em 2007, tendo sido convocada em 10 de dezembro[11], constando os objetivos definidos em seu art. 3º.
Por fim, a mais recente Conferência Estadual de Meio Ambiente realizada na Bahia, foi convocada por meio do Decreto nº 13.619, de 20 de janeiro de 2012. Destaca-se, segundo a Secretaria do Meio Ambiente, que "Foram realizadas 136 conferências municipais, 19 territoriais, envolvendo os 27 Territórios de Identidade baianos e uma etapa estadual, que contou com a participação de cerca de 15 mil pessoas, no Centro de Convenções da Bahia."[12]
No Estado a regulamentação da Conferência de Meio Ambiente está prevista na Lei nº 10.431/2006, sendo que sua convocação[13] deverá ser realizada com periodicidade a cada 02 (dois) anos.
Considerando a realização da ultima conferência em 2012, bem como os claros indícios da sociedade baiana por necessidade de participação, deveríamos ter efetivado esse instrumento da política em 2014. Infelizmente até o momento, mais de 2/3 do ano de 2015 já se passou e não houve nenhuma sinalização no sentido de realização da IV Conferência de Meio Ambiente, nem mesmo das etapas preparatórias nos municípios e territórios.
O cerrado e as comunidades estão em situação de vulnerabilidade perante as intensas supressões de vegetação; a gestão de meio ambiente e de recursos hídricos requer construção intimamente aproximada com a coletividade, a implantação de instrumentos estratégicos não admite açodamento como vem se mostrando a instalação da cobrança de recursos hídricos; precisamos discutir como está funcionado o modelo de licenciamento ambiental trazido com a Lei nº 12.377/2011, bem como a isenção de licenciamento para empreendimentos agrosilvopastoris[14]; a sociedade baiana precisa conhecer efetivamente em que se consiste a publicização das suas unidades de conservação.
O Programa Federal de Aceleração do Crescimento de infraestrutura e logística prevê o investimento no Estado da Bahia nos anos de 2015/2018 em valor acima de 49 bilhões, superior a todo o orçamento do Estado para o ano de 2015[15]. Desse valor, 30 bilhões é para área de energia que envolve, dentre outros, 135 empreendimentos de energia eólica no Estado.
A gestão de meio ambiente na Bahia precisa junto com a sociedade civil atuar qualificando essas intervenções nos territórios com vista a resguardar o meio ambiente ecologicamente equilibrado.
Esse ano o Estado da Bahia convocou, por exemplo, a X Conferência Estadual de Assistência Social[16], a IX Conferência Estadual de Saúde[17] e a IV Conferência Estadual de Políticas para as Mulheres[18].
A sociedade baiana tem uma grande responsabilidade nesse processo. Precisamos de uma mobilização coletiva para viabilizar a realização da IV Conferência de Meio Ambiente do Estado da Bahia.
2. Do Conselho de Meio Ambiente - CEPRAM
Após a 1ª Conferência Mundial sobre Meio Ambiente das Nações Unidas, o Estado da Bahia criou o primeiro Conselho Estadual de Proteção Ambiental (Cepram)[19], órgão colegiado com estrutura e atribuições inéditas no País, a época integrante da estrutura da Secretaria do Planejamento, Ciência e Tecnologia (Seplantec).
O surgimento do Cepram, sob forte influência dos entendimentos construídos na Conferência de Estocolmo no ano anterior, também foi impulsionado pela implantação de um grande empreendimento no Estado[20]. O Pólo Petroquímico, no município de Camaçari, teve as primeiras unidades industriais instaladas a partir de 1974.
Em 2011, com a edição da Lei nº 12.212 de 04 de abril, a competência licenciatória concentrou-se integralmente no órgão executor da Política de Meio Ambiente (Inema), o que gerou grande tensionamento[21] com a sociedade civil representada no Conselho.
A justificativa institucional consistia na necessidade de fortalecer o caráter normatizador do Conselho. Dessa maneira, passemos a verificar as produções normativas desse órgão após a reforma administrativa acima mencionada, ressaltando que as informações foram extraídas do site da Secretaria do Meio Ambiente[22].
Em 2012 o Cepram editou 46 Resoluções: sendo 30 análises de sanções administrativas (multas/advertências/embargos); 09 reconhecimentos de Municípios para o licenciamento; 01 com mera correção de inconsistência técnica jurídica (Resolução nº 4.249); 01 com alteração de um anexo (Resolução nº 4.259); 03 com definições de composição de câmera técnica; e, por fim, apenas 01 (uma) deliberando/regulamentando efetivamente a Política Ambiental do Estado (Resolução nº 4.260[23] - Que define os empreendimentos licenciáveis por meio da Licença Ambiental por Adesão e Compromisso).
No ano de 2013, o Cepram editou 33 Resoluções, das quais 31 referem-se a análise de multas administrativas; 01 a rezoneamento da Apa do Abaeté (Resolução nº 4.280); e apenas 01 de regulamentação efetiva da Política, Resolução nº 4.327[24] (define impacto local para licenciamento dos Municípios);
Em 2014, o Cepram editou 48 Resoluções, das quais 44 foram análises de multas; 02 referem-se a ajustes em Planos de Manejo; 01 definiu composição de Câmara Técnica; 01 refere-se especificamente ao Abaeté.
Em 2015, já com o funcionamento da Câmara Técnica (Resolução nº 4.329 em 2014), de janeiro a 06 de agosto do corrente ano o Cepram editou 43 Resoluções das quais todas referem-se a análise de multas administrativas.
Assim, tendo como análise os anos de 2012 a 2015 conclui-se que das 170 Resoluções editadas pelo CEPRAM, 148 referem-se a multa e apenas 02 deliberaram efetivamente acerca da Política Ambiental do Estado, o que representa um pouco mais de 1% das Resoluções editadas, demonstrando a fragilidade normativa do Conselho e a prevalência na pauta de análises de multas administrativas.
3. Do Conselho de Recursos Hídricos - CONERH
O Conselho Estadual de Recursos Hídricos é o órgão colegiado superior do Sistema Estadual de Gerenciamento de Recursos Hídricos - SEGREH, e possui atribuição normativa, deliberativa, recursal e de representação, conforme art. 46 da Lei nº 11.612/09.
A finalidade do Conselho é formular a Política Estadual de Recursos Hídricos e dentre suas competências destaca-se: a) estabelecer normas para implementação da Política Estadual de Recursos Hídricos e para a aplicação de seus instrumentos; b) estabelecer os procedimentos de elaboração, implementação e revisão do Plano Estadual de Recursos Hídricos[25]; c) fomentar a articulação do planejamento de recursos hídricos com os planejamentos nacionais, regionais, estaduais e dos setores usuários[26].
Continuando a análise das produções normativas dos Conselhos Estaduais que atuam na área de meio ambiente e de recursos hídricos do Estado, destacamos, nesse tópico, as resoluções emanadas do Conselho Estadual de Recursos Hídricos – CONERH:
Em 2012, o Conerh editou 09 resoluções. Dessas, 03 referiam-se a Câmaras Técnicas e Grupos de Trabalho; outras 03 reconheciam o funcionamento dos Comitês de Bacia; 01 alterou o quantitativo das Regiões de Planejamento e Gestão das Águas (Resolução nº 88/2012); e 02 tratavam acerca da eleição dos membros dos comitês.
Em 2013 foram 04 Resoluções, em comum que todas referiam-se a mandato dos membros.
No ano de 2014 a produção do Conselho foram 03 Resoluções. Destaca-se a de nº 96/2014 que “estabelece diretrizes e critérios gerais para a outorga do direito de uso dos recursos hídricos do Estado da Bahia”. Entre as demais, 01 consiste na definição de grupo de trabalho e a outra aprova as metas estabelecidas no Programa Federal Progestão.
Em 2015, considerando de janeiro até o dia 01º de setembro se somam 03 Resoluções. Sobre as eleições do Conselho são duas e a última uma nova aprovação das metas do Programa Federal Progestão.
Com essas informações conclui-se que entre os anos de 2012 a 2015 o CONERH editou 19 Resoluções, sendo que apenas uma tratou efetivamente acerca da regulamentação da Política que foi a Resolução nº 96/2014.
4. Da Comissão Interinstitucional de Educação Ambiental – CIEA.
A Comissão Interinstitucional de Educação Ambiental tem como missão propor as diretrizes da Política e do Plano Estadual de Educação Ambiental, coordenando e interligando as atividades relacionadas ao tema[27].
As competências desse Conselho constam descritas no parágrafo único do art. 16 da Lei nº 10.431/06, dentre as quais destacamos: a) promover a Educação Ambiental a partir das recomendações da legislação pertinente e de deliberações oriundas de conferências oficiais de meio ambiente e de Educação Ambiental; b) propor programas de Educação Ambiental considerando a diversidade local e regional; c) apoiar técnica, científica e institucionalmente as ações de Educação Ambiental.
Considerando essa relevante atribuição da CIEA prevista na Política Estadual de Meio Ambiente, passemos a analisar, assim como nos demais Conselhos, a produção normativa dentre os anos de 2011 / 2015:
Em 2011, a CIEA publicou 01 Resolução (nº 02/2011) que foi responsável pela “Aprovação de alteração do Regimento Interno”.
No ano seguinte, em 2012, foram editadas 02 novas Resoluções, sendo que ambas também tratavam sobre o regimento do conselho.
Em 2013 a CIEA estabeleceu a recondução dos seus membros por meio da única Resolução do ano.
No ano de 2014 as Resoluções emanadas da CIEA foram 02: 01 definindo composição de Câmara Técnica, e a outra mais uma alteração no Regimento.
Quanto ao ano de 2015, registra-se que até o dia 01º de setembro não houve nenhuma Resolução da CIEA.
Assim, considerando os anos de 2011 a 2015 a CIEA editou 06 Resoluções, e conforme exposto acima não houve nenhuma regulamentação efetiva da Política de Educação Ambiental do Estado, limitando suas ações a definição de procedimentos meramente formais administrativos.
Considerações Finais
Analisando alguns dos espaços institucionais de participação instituídos na Política de Meio Ambiente e de Recursos Hídricos do Estado da Bahia verifica-se fragilidade no exercício das suas competências típicas, nos casos dos Conselhos, e uma não observância na realização no caso da Conferência de Meio Ambiente.
Para consubstanciar estas afirmativas, as ações e os balanços de produção normativa apresentadas mostram que os Conselhos vêm tendo uma redução da sua importância na construção da Política Ambiental, sendo priorizadas ações meramente administrativas e que fragilizam esses que deveriam ser espaços estratégicos de deliberação/regulamentação.
Uma questão importante é que as Políticas de Meio Ambiente, de Recursos Hídricos e de Educação Ambiental possuem uma perspectiva clara da necessidade de participação da coletividade. Dessa maneira esperamos que se constitua nesses espaços institucionais um conjunto articulado entre o Poder Público e a Sociedade Civil que não permita o abandono dessas instâncias, bem como que seja viabilizada o quanto antes uma ampla mobilização pela realização da IV Conferência de Meio Ambiente no Estado da Bahia.
[1] http://blog.planalto.gov.br/governo-recebeu-mais-de-8-mil-propostas-pelo-dialoga-brasil-nos-primeiros-15-dias/
[2] Art. 1º da C.F/88.
[3] Art. 225 da C.F/88.
[4] "art. 10 - O melhor modo de tratar as questões ambientais é com a participação de todos os cidadãos interessados, em vários níveis. (...) assim como a oportunidade de participar do processo de adoção de decisões."
[5] Art. 1º - Para contribuir para a proteção do direito de qualquer pessoa das presentes e futuras gerações e viver num ambiente adequado para o seu bem-estar, deverá ser garantido o seu direito de acesso à informação, à participação pública em processos decisórios e à justiça em matéria de meio ambiente.
[6] Cristiana Losekann
[7]http://www.mma.gov.br/responsabilidade-socioambiental/conferencia-nacional-do-meio-ambiente/i-conferencia
[8] http://www.mma.gov.br/responsabilidade-socioambiental/conferencia-nacional-do-meio-ambiente/ii-conferencia
[9] http://www.mma.gov.br/responsabilidade-socioambiental/conferencia-nacional-do-meio-ambiente/iv-conferencia
[10] Decreto nº 9.442/2005.
[11] Decreto nº 10.653/2007.
[13] Art. 68 - A convocação das conferências será realizada através de ato do Chefe do Executivo Estadual, com periodicidade a cada dois anos.
[14] Decreto Estadual nº 15.682, de 19 de novembro de 2014.
[16] Decreto nº 16.033/2015.
[17] Decreto nº 16.037, de 17 de abril de 2015.
[18] Decreto nº 16.084, de 15 de maio de 2015.
[19] Por meio da Lei nº 3.163 editada no ano de 1973.
[20] "Entendendo o Licenciamento Ambiental Passo a Passo" Maria Lucia Cardoso (2009).
[21] http://atarde.uol.com.br/politica/noticias/1110976-carta-aberta-denuncia-esvaziamento-do-cepram
[22] http://www.sema.ba.gov.br/conteudo.aspx?s=CONSERHYPERLINK "http://www.sema.ba.gov.br/conteudo.aspx?s=CONSER&p=SERVICOS"&HYPERLINK "http://www.sema.ba.gov.br/conteudo.aspx?s=CONSER&p=SERVICOS"p=SERVICOS
[24] http://www.meioambiente.ba.gov.br/upload/150514-Resolucao4327_%20Impacto%20Local%20dos%20Municipios.pdf
[25] Inciso II do art. 46 da Lei nº 11.612/09.
[26] Inciso IV do art. 46 da Lei nº 11.612/09.
[27] Conforme art. 16 da Lei nº 10.431/06.
Autor:
Mateus de Oliveira Conceição Almeida é professor na Faculdade São Salvador, Especialista em Legislação Ambiental pela Universidade Federal do Estado da Bahia e servidor da Secretaria de Meio Ambiente do Estado.