ANÁLISE DAS MUDANÇAS TRAZIDAS PELA LEI DE TRÁFICO DE PESSOAS AO CPP, FRENTE A NORMAS JÁ INSTITUÍDAS.[1]

Lucas Ranieri Ferreira da Rocha

Me. Cleopas Isaías Santos[2]

 

SUMÁRIO: RESUMO; 1 INTRODUÇÃO; 2 ANÁLISE DAS MEDIDAS INTRODUZIDAS NO CPP PELA LEI DE TRÁFICO DE PESSOAS; 3  ; 4  ; 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS; 6 REFERÊNCIAS.

 

 

 

RESUMO

 

Diante do objetivo de tornar a legislação acerca do tráfico de pessoas mais rígida, foi criada a lei 13.344 de 2016, que trata de outras questões além desta. Esta lei acarretou mudanças no Código de Processo Penal, sendo as mais debatidas pela doutrina as que constam nos artigos 13-A e 13-B do mesmo. As referidas alterações trouxeram significativas mudanças ao processo de investigação preliminar. Cabe discussão acerca das mudanças trazidas pela lei 13.344 a este processo de investigação, uma vez que a crítica tem sido constante desde sua criação, pois se argumenta que o conteúdo está confuso, que houve falta de técnica legislativa, que vai de encontro a preceitos constitucionais, que contraria jurisprudência do STF etc. As incertezas trazidas pelas mudanças ao CPP são alvo de críticas, uma vez que o processo de investigação preliminar pode ser prejudicado pela falta de técnica legislativa ao criar o conteúdo dos artigos, de forma que as provas obtidas podem ser consideradas ilícitas por não cumprimento de algum prazo ou requisito.

 

 

1 INTRODUÇÃO

 

Com a publicação da lei 13.344 de 2016, que tem conteúdo voltado à prevenção e repressão do tráfico interno e internacional de pessoas, houve certas modificações em alguns códigos, como o de processo penal, por exemplo.  O presente trabalho tem como objetivo analisar as mudanças trazidas pela referida lei a este código, assim como a consequente influência sobre o procedimento preliminar de investigação policial.

Com a obtenção de informações, cadastros, dados e sinais por parte daquele que conduz as investigações, buscou-se dar maior eficiência a este procedimento, especialmente nos casos que envolvem tráfico de pessoas, já que a lei 13.344 busca, como foi mencionado, prevenir e reprimir esta conduta criminosa.

A análise deste tema torna-se interessante por conta da lei 13.344 trazer novidades bastante recentes acerca do procedimento preliminar de inquérito policial, cabendo aos cientistas do direito discutir tais alterações, sendo analisados neste trabalho os escritos de certos autores principalmente acerca das mudanças trazidas pela lei ao CPP. Após o debate acerca do assunto se pode ter maior clareza quanto ao mesmo, se tem condições de alcançar os objetivos aos quais foi alçado, se os meios utilizados são eficientes etc.

 

2 ANÁLISE DAS MEDIDAS INTRODUZIDAS NO CPP PELA LEI DE TRÁFICO DE PESSOAS.

Com a publicação da lei 13.344 de 2016, que trouxe avanços principalmente quanto ao crime de tráfico de pessoas, houveram mudanças no Estatuto do Estrangeiro, no Código Penal e no Código de Processo Penal. Isso foi feito para tornar a legislação sobre o tema mais específico e a sanção mais rígida. As alterações mais debatidas são as do CPP, sobre as quais comenta Henrique Hoffmann Monteiro de Castro:

 

Segundo o artigo 13-A do CPP, nos crimes de sequestro e cárcere privado (art. 148 do CP), redução à condição análoga à de escravo (art. 149 do CP) e tráfico de pessoas (art. 149-A do CP), sequestro relâmpago (art. 158, §3º do CP) e extorsão mediante sequestro (art. 159 do CP) e envio ilegal de criança ou adolescente para o exterior (art. 239 do ECA), o membro do Ministério Público ou o delegado de polícia pode requisitar, de quaisquer órgãos do poder público ou de empresas da iniciativa privada, dados e informações cadastrais da vítima ou de suspeitos. (CASTRO, 2016)

 

 

 

Além do artigo 13-A do Código de Processo Penal, o referido autor também critica o legislador ao comentar sobre o artigo 13-B, ressaltando que houve falta de técnica legislativa na criação desta norma, uma vez que a mesma prevê que membro do Ministério Público e delegados só podem requisitar meios técnicos adequados para a localização da vítima ou dos suspeitos, junto às empresas prestadoras de serviços de telecomunicação, por meio de autorização judicial. Hoffman (2016) afirma que nos casos em que haja necessidade de autorização judicial não se está tratando de requisição, mas sim de requerimento ou representação, dependendo do caso.

 

O mesmo é dito pelos autores Bruno Taufner Zanotti e Cleopas Isaías Santos (2016), que comentam as alterações feitas ao afirmarem que:

 

A terceira e mais importante medida trazida pela lei sob análise é a prevista no novo art. 13-B do CPP. De acordo com este dispositivo, quando necessário à prevenção e à repressão dos crimes relacionados ao tráfico de pessoas, o Delegado de Polícia poderá requisitar, mediante autorização judicial, às empresas prestadoras de serviço de telecomunicações e/ou telemática que disponibilizem imediatamente os meios técnicos adequados – como sinais, informações e outros – que permitam a localização da vítima ou dos suspeitos do delito em curso. (SANTOS e ZANOTTI, 2016).

 

Os parágrafos do artigo 13-B trazem algumas peculiaridades, como o caso em que o Ministério Público ou o delegado de polícia podem fazer a requisição sem autorização judicial, que ocorre nos casos em que há falta de manifestação do judiciário no prazo de 12 horas.

 

De acordo com o parágrafo 4º do artigo 13-B do CPP, não havendo manifestação judicial no prazo de 12 horas, a autoridade competente requisitará às empresas prestadoras de serviço de telecomunicações e/ou telemática que disponibilizem imediatamente os meios técnicos adequados – como sinais, informações e outros – que permitam a localização da vítima ou dos suspeitos do delito em curso, com imediata comunicação ao juiz. Cuida-se de cláusula de reserva de jurisdição temporária, verdadeira inovação no mundo jurídico, em que o decurso de lapso temporal (bastante apertado – 12 horas) faz desaparecer a necessidade de autorização judicial. Trata-se de previsão dúplice, exigindo-se no início ordem judicial e passando a dispensá-la pelo decurso de tempo. (CASTRO, 2016)

 

 

Cabe ressaltar que nos casos em que haja inércia do judiciário no prazo de 12 horas estabelecido em lei, o membro do Ministério Público ou delegado de polícia devem comprovar à empresa prestadora de serviços de telecomunicação que tal fato ocorreu, para que a mesma tenha a segurança de que a divulgação dos dados está embasada em ato legal. Ainda em relação a este prazo, não cabe à empresa questionar as requisições das referidas autoridades públicas, uma vez que se estes estiverem agindo à margem da lei serão posteriormente responsabilizados, e não os funcionários da fornecedora dos dados, que por sinal são acobertados pela presunção de legitimidade dos atos de qualquer funcionário público. (CABETTE, ?)

Há ainda, nos parágrafos terceiro e segundo do referido artigo, a previsão de prazo de 72 horas para a instauração do inquérito policial, e também o prazo máximo de 60 dias para que os dados fiquem disponíveis às autoridades, sendo prazos superiores concedidos apenas por meio de ordem judicial.

 

O parágrafo 3º do artigo 13-B do CPP também traz novidade ao estabelecer prazo para a instauração de inquérito policial: o procedimento policial deve ser iniciado no prazo máximo de 72 horas, contado do registro da respectiva ocorrência policial. Consagra ainda o dispositivo em seu parágrafo 2º que a identificação da ERB não deve permitir acesso ao conteúdo da comunicação. Deve ser fornecida pela prestadora de telefonia móvel celular por período não superior a 30 dias, renovável por uma única vez por igual período. Para períodos superiores há 60 dias, exige-se ordem judicial. Assim, para prazos de até 60 dias (30 dias renováveis por igual período), pode-se aplicar a sistemática de que se o juiz não decidir em 12 horas, a autoridade pode requisitar diretamente a informação. (CASTRO, 2016)

 

 

O tema do parágrafo segundo do artigo 13-B, que trata do prazo de 72 horas para instauração do inquérito policial, também é abordado pelos autores Bruno Taufner Zanotti e Cleopas Isaías Santos, que chamam a atenção para o fato de que a previsão desta norma possibilita que medidas cautelares sejam requisitadas sem que haja inquérito policial. Percebe-se que, de acordo com este artigo, O inquérito policial pode ser instaurado até três dias depois de registrada a ocorrência policial. Nos casos em que registrada a ocorrência o policial faça requisição (ou requerimento) judicial para obtenção de meios para rastrear a vítima ou os suspeitos, casos em que o judiciário tem que dar uma resposta em até 12 horas, sob pena do delegado ou membro do Ministério Público agir sem a necessidade da mesma, poderemos ter uma medida cautelar decretada sem que haja inquérito instaurado, fato que contraria a jurisprudência do STF.

Neste contexto, Cabette afirma que deve haver grande zelo por parte do delegado de polícia e de Membros do Ministério Público com este prazo, uma vez que se o mesmo não for cumprido, as provas obtidas durante o processo investigatório serão consideradas ilícitas, já que, segundo o autor, haverá ´´violação de norma constitucional afora a norma processual (art. 13-B, §3º, CPP c/c art. 5º, X, CF)``.

 

3 CONSIDERAÇÃO ACERCA DA INFLUENCIA DA LEI 13344/16 NA INVESTIGAÇÃO PRELIMINAR.

 

Renato Brasileiro (2012) esclarece que a investigação preliminar policial tem por objetivo a obtenção de dados informativos para que o órgão acusatório examine a viabilidade de propositura de dados da ação penal. É claro que com a validação de uma lei surgem duvidas em relação a sua efetivação no ordenamento jurídico brasileiro.

Assim mudanças trazidas pela lei 13344 de 2016 ao Código de Processo Penal trouxeram significativas mudanças ao processo de investigação preliminar policial. O autor Henrique Hoffmann Monteiro de Castro comentou algumas dessas alterações, como o fato de a coleta de dados poder ser feita não apenas em relação ao suspeito, mas também da vítima. O autor diz que, “Chama a atenção, além do exíguo prazo de 24 horas para atendimento da requisição, o fato de poder ser referir a dados não só do investigado, mas da própria vítima”.

Castro aponta ainda para o fato de que os dados podem ser acessados sem necessidade de autorização judicial, sendo esta necessária apenas para a requisição de comunicação de dados.

 

Importante grifar que nem toda medida investigativa está sujeita à cláusula de reserva de jurisdição. É perfeitamente possível que o legislador atribua à autoridade policial a possibilidade de adotar manu propria uma série de ações, pois o desenho constitucional adotado nem sempre exige prévia chancela do Judiciário para os atos investigatórios, o que em nada prejudica o controle judicial posterior. Destarte, enquanto as comunicações de dados demandam anterior autorização judicial, os dados em si mesmos podem ser acessados por autoridades investigativas. Por isso é que não há óbice para a apreensão e análise de agenda com dados sigilosos. [4] E, quanto ao aparelho celular, pode a autoridade policial acessar diretamente a agenda eletrônica e registros de ligações (histórico de chamadas),[5] não possuindo autorização apenas para verificar em tempo real as mensagens enviadas e recebidas e chamadas efetuadas e recebidas.[6] De igual forma, é lícita a requisição junto à operadora de telefonia, pelo delegado de polícia, de informações pretéritas das ERBs utilizadas pelo investigado.(CASTRO, 2016)

 

 

Os autores Cleopas Isaías Santos e Bruno Taufner Zanotti apontam para o fato de que o texto legislativo fala em requisição, mas que por depender de decisão judicial trata-se na verdade de representação, como ocorre com as medidas cautelares. Eles afirmam que:

 

... que se trata de uma medida cautelar probatória ou meio de obtenção de prova que visa à localização de investigados e vítimas de crimes relacionados a tráfico de pessoas. Mostra-se, portanto, também como uma medida eficaz na salvaguarda da vítima. A redação no mencionado dispositivo não possui a melhor técnica legislativa, pois ao mesmo tempo em que diz que o Delegado de Polícia poderá requisitar, condiciona à autorização judicial. Ou seja, aparentemente de requisição não se trata, mas de representação, como ocorre normalmente com as demais medidas cautelares. Entendemos, contudo, que se trata mesmo de requisição e que, portanto, não depende de autorização judicial. (SANTOS e ZANOTTI, 2016).

 

 

Em seu texto sobre o tema, Zanotti e Santos citam os fatos que os fazem acreditar que o referido ato não depende de autorização judicial.

 

A uma, porque os sinais, informações e outros meios técnicos que possibilitem localizar vítimas e investigados não são protegidos por sigilo. A duas, esta medida só pode ser requisitada quando algum dos crimes acima elencados estiver em curso. E todos são crimes permanentes, ensejadores, portanto, de medidas restritivas de direitos fundamentais importantes como a inviolabilidade do domicílio e até mesmo a liberdade de locomoção, já que estariam em situação flagrancial. A três, esta medida não permitirá o acesso ao conteúdo da comunicação de qualquer natureza. Caso se deseje ter acesso também ao conteúdo, será necessária autorização judicial, conforme disposto na Lei nº 9.296/1996, conforme previsto no § 2º, inc. I, do art. 13-B do CPP. A contrario sensu, o acesso apenas à localização de vítimas e investigados não depende de autorização judicial. A quatro, nas hipóteses autorizadoras da requisição desses dados de localização, por serem todos de crimes permanentes e por estarem em curso, portanto, em situação flagrancial, a requisição do Delegado de Polícia seria lícita, pois acobertada pelo estrito cumprimento de um dever legal ou pela legítima defesa de terceiro. Seria, desse modo, lícita. A cinco, pela leitura conjunta dos incs. II e III do § 2º do mencionado art. 13-B, a autorização judicial só seria necessária para o fornecimento das informações requisitadas por período superior a 60 (sessenta) dias. Ou seja, até este prazo, ela seria dispensável. Por todas essas razões é que entendemos que o fornecimento dos meios técnicos para se localizar vítimas e investigados nos crimes de tráfico de pessoas não depende de autorização judicial. . (SANTOS e ZANOTTI, 2016).

 

 

4 OBSERVAÇÕES E CRITICAS A RESPEITO DOS ARTIGOS 13-A E 13-B DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL.

 

Com o ingresso de novas codificações e lei(s) é comum ao meio jurídico debates e observâncias feitas por doutrinadores e especialistas, na finalidade de se fazer analises e criticas a respeito do acabado texto legal. Com os artigos 13-A e 13-B não foi diferente, inclusive porque ficou evidenciado a falta do legislativo em vislumbrar possíveis obscuridade dos novos preceitos.

A respeito do artigo 13-A do CPP, Renato Brasileiro (2016) norteia que o mesmo não é muito claro acerca dos dados e informações cadastrais a que o Delegado de Policia e o Ministério Público poderão ter acesso independentemente de prévia autorização legal, nem tampouco em relação aos órgãos de do poder público e às empresas de iniciativa privada que estão obrigadas a atender à requisição no prazo de 24 horas.

Outra anuência que Brasileiro (2016) faz é em relação do novo artigo 13-A do CPP com a consonância da garantia fundamental da intimidade, já que este autoriza o acesso a dados dos suspeito  e das vítimas. Nessa linha o autor afirma que:

 

Preferimos, entender que esses dados não estão protegidos pela garantia constitucional da intimidade (CF, art. 5°, X). Afinal, se empresas de concessão de crédito ou mesmo pessoas jurídicas que assinam determinado serviços a elas disponibilizados têm fácil acesso aos dados cadastrais dos clientes ou potenciais clientes, não se pode negar este mesmo acesso às autoridades públicas, independentemente de previa autorização judicial. (LIMA, Renato, 2017, p.138).

 

 

Por fim o autor analisa que tal acesso se demonstra importante, uma vez que é frequente os contato entre aliciadores e as vítimas de tráfico de pessoas, quer por telefone, quer pela internet, tais informações podem ser extremamente úteis ao longo das investigações, seja para fins de identificação dos suspeitos, ou mesmo para a localização das próprias vitimas.

Como observa Tércio Sampaio Ferraz Júnior, deve se partir da premissa de que a inviolabilidade dos dados referentes à vida privada só tem pertinência para aqueles associados aos elementos identificadores usados nas relações de convivência, as quais só dizem respeito aos conviventes. (BRASILEIRO apud JÚNIOR, 2017, p.138). Comenta Tércio Sampaio (2016): “os elementos de identificação só são protegidos quando compõem relação de convivência privadas: a proteção é pra elas, não para eles. Em consequência, simples cadastros de elementos identificadores (nome, endereço, RG, filiação, etc.) não são protegidos”.

Henrique Hoffman (2016) atenua que além do artigo 13-A do Código de Processo Penal, o referido autor também critica o legislador ao comentar sobre o artigo 13-B, ressaltando que houve falta de técnica legislativa na criação desta norma, uma vez, que a mesma prevê que membro do Ministério Público e delegados só podem requisitar meios técnicos adequados para a localização da vitima e dos suspeitos, junto às empresas prestadoras de serviços de telecomunicações, por meio de autorização judicial.

Assim complementa Renato Brasileiro (2017) o novel dispositivo é extremamente dúbio e há de provoca intensas controvérsias, porquanto ora exige prévia autorização judicial para o acesso a tais informações (CPP, art. 13-B, caput), ora dispensa (CPP, art. 13-B, §4°). Inclusive o autor ressalta dois posicionamentos acerca do assunto.

Primeiro Renato Brasileiro (2017) se afere que o acesso ao posicionamento das estações rádio base (ERB’s) não depende de previa autorização judicial. Uma vez, que não podemos confundir a interceptação das comunicações telefônicas com a obtenção de informações quanto ao posicionamento das ERB’s, verdadeira espécie de dados telefônicos, que podem ser obtidos pelas autoridades responsáveis pelas investigações preliminares independentemente de previa autorização judicial.

 

A propósito com já se pronunciou a 6° Turma do STJ, “(...) o teor das comunicações efetuadas pelo telefone e os dados transmitidos por via telefônica são abrangidos pela inviolabilidade do sigilo – artigo 5°, inciso XII, da Constituição Federal –, sendo indispensável a previa autorização judicial para sua quebra, o que não ocorre no que tange aos dados cadastrais, externos ao conteúdo das transmissões telemáticas. Não se constata ilegalidade do proceder policial, que requereu à operadora de telefonia móvel responsável pela Estação de Radio-Base o registro dos telefones que utilizaram o serviço na localidade, em dia e hora da pratica do crime. A autorização policial atuou no exercício do seu mister constitucional, figurando a diligência dentre outras realizadas ao longo de quase 7 (sete) anos de investigação. Ademais ao controle judicial, a fim de se verificar qualquer achincalhe ao regramento normativo pátrio. In casu, a autoridade policial não solicitou à operadora de telefonia o rol dos proprietários das linhas telefônicas ou teor do colóquio dos interlocutores, apenas os numerários que utilizaram a Estação de Rádio-Base na região, em período adstrito ao lapso delitivo, não carecendo de anterior decisão judicial para tanto, sobressaindo, inclusive a necessidade da medida policial adotada, que delimitou a solicitação para a quebra de sigilo das conversas dos interlocutores dos telefones e da identificação dos números que os contactaram, feita perante o Juízo competente, que aquiesceu com a obtenção do requestado. (...). (STJ, HC 247.331/RS).

 

 

Destarte, Brasileiro (2017) afirma que é imperioso submeter o art.13-B, caput, do CPP, a uma interpretação restritiva, porquanto o dispositivo disse mais do que pretendia dizer. Assim, conquanto o referido dispositivo faça pontuação à necessidade de autorização judicial, também faz uso do verbo requisitar, no sentido de ordem, do que se concluiu que não há necessidade de prévia autorização judicial.

 

O mesmo autor vislumbra, que não bastasse a contradição inequívoca do caput do art. 13-B, que faz menção à requisição mediante autorização judicial, verdadeira contradictio in terminis, a desnecessidade de previa autorização judicial para que a Polícia e o Ministério tenham acesso a tais informações é corroborada pelo teor dos próprios parágrafos do art. 13-B. Consoante disposto no art.13-B, §2°, inciso II, do CPP, para períodos superiores a 60 (sessenta) dias, será necessária a apresentação de ordem judicial. Ora, se a execução dessa diligencia depende de prévia autorização judicial em toda e qualquer hipóteses, como explicar, então o inciso III do §2° do art. 13-B do CPP, que impõe ordem judicial nas hipóteses em que a medida se prolongar por período superior a 60 dias?  Se assim o fez, parece-nos possível concluir que a diligencia pode ser executada sem prévia autorização judicial por ate no máximo 60 dias. Ultrapassado este prazo, aí sim se impõem a chancela do Poder Judiciário. O art. 13-B §4°, do PP, também confirma a desnecessidade de previa autorização judicial ao prever que o decurso do prazo de 12 horas sem a manifestação do magistrado autoriza que as empresas prestadoras de serviços de telecomunicações disponibilizem o acesso imediato ao posicionamento das estações da rádio-base. Fosse a medida sujeita a cláusula de reserva da jurisdição, certamente não seria o decurso de um prazo tão exíguo circunstância hábil a afastar a necessidade de controle jurisdicional. (LIMA, Renato, 2017, p.140).

 

 

Em relação ao posicionamento de que tais dados dependem de autorização judicial, Renato Brasileiro (2017) (posicionamento doutrinário do mesmo) alui que há se compreender que a obtenção dessas informações guarda relação direta com o direito fundamental da intimidade e à vida privada.

 

Afinal, por meio delas, é possível obter informações acerca da localização aproximada de uma pessoa, desde que esta traga consigo um aparelho celular ligado, o que, de certa forma, tangencia o direito à intimidade e à vida privada, porquanto nem sempre o indivíduo esta disposto a revelar sua localização aos outros. Firmando a premissa de que é indispensável previa autorização judicial para a obtenção dessas informações, forçosos é concluir que o §4° do art. 13-B é inconstitucional, por quanto não se pode admitir que o mero decurso do prazo de 12 horas sem manifestação judicial acerca da representação policial (ou requerimento ministerial) tenha o condão de dispensar a ordem judicial. (LIMA, Renato, 2017, p.141).

 

 

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

Diante da análise do tema, tem-se que houve falta de técnica legislativa na modificação feita pela lei 13.344 no Código Processual Penal, de maneira que o conteúdo dos artigos modificados não é claro quanto ao procedimento a ser adotado. Torna-se evidente tal afirmação no fato de que o artigo 13-B menciona o prazo de 72 horas para instauração do inquérito policial, sendo que em casos de ausência de resposta do juiz, por mais de 12 horas, acerca de medida cautelar, a mesma pode ser requisitada diretamente pela autoridade policial. Fica evidente a incerteza em questão, visto que há, então, possibilidade de requerimento de medida cautelar sem que esteja instaurado inquérito policial, segundo análise destes artigos do CPP.

A incerteza acerca do procedimento a ser adotado durante inquérito policial pode trazer sérias consequências às provas obtidas, podendo chegar a inviabilizar a utilização das mesmas no posterior processo judicial. Portanto, a questão deve ser tratada de maneira emergencial, para que haja universalização acerca de um entendimento de como deve ocorrer o processo de investigação preliminar quanto aos pontos controversos, já que a intenção de tornar mais célere este processo, e também de aumentar a capacidade punição dos autores da conduta, pode, na verdade, acabar por dificultar tal objetivo, visto que se obtidas de forma ilegal, as provas serão desconsideradas no processo judicial.

 

 

6 REFERÊNCIAS

CASTRO, Henrique Hoffmann Monteiro de. Lei de tráfico de pessoas traz avanços e causa perplexidade. Disponível em: < http://www.conjur.com.br/2016-out-11/academia-policia-lei-trafico-pessoas-traz-avancos-causa-perplexidade >. Acesso em: 23 de março de 2017.

GIL, Antônio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. - 4. ed.- São Paulo: Atlas, 2002._______. Métodos e técnicas de pesquisa social. - 6. ed. - São Paulo: Atlas, 2008.

LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo Penal. Vol. I, 2° ed. Niterói: Rio de Janeiro, 2012. 

ZANOTTI, Bruno Taufner; SANTOS, Cleopas Isaías. Ressonâncias da lei nº 13344/2016 na investigação policial. Disponível em: < http://emporiododireito.com.br/ressonancias-da-lei-no-13-3442016-na-investigacao-policial-por-bruno-taufner-zanotti-e-cleopas-isaias-santos/ >. Acesso em: 23 de março de 2016.

CABETTE, Eduardo Luiz Santos. Novos meios operacionais de investigação de dados, informações, cadastros e sinais trazidos pela Lei 13.344/16 que versa sobre o tráfico de pessoas. Disponível em: < http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=18085&revista_caderno=22 >. Acesso em: 10 de abril de 2017.

STJ, 6° Turma. HC 247.331/RS. Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 21/08/2014, DJe 03/09/2014.

MARÇAL Vinícius; MASSON, Cleber apud JÚNIOR, Tércio Sampaio Ferraz.. Sigilo de Dados: o Direito à Privacidade e os Limites à Função Fiscalizadora do Estado. 2° ed. São Paulo: Método, 2016.

LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo de Penaç: Volume Único. 5 ed. ver., ampl e atual. – Salvador: Ed. JusPodivm, 2017.

 

[1] Paper apresentado à disciplina Direito Processual Penal I, da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco- UNDB.

[2] Professor da disciplina Direito Processual Penal I da UNDB.