A ANÁLISE DA IMPUTABILIDADE DO PSICOPATA SOB O PRISMA DA LEGISLAÇÃO PENAL BRASILEIRA* 

 

Anna Karenina de Oliveira Vieira 

 

Antônio Pereira Barbosa Neto 

 

Janaína Morais Barreto 

 

RESUMO:  

 

Este artigo traz uma abordagem sobre a imputabilidade do psicopata sob o prisma da legislação penal brasileira. Estudar o que a doutrina e a legislação penal brasileira orientam sobre a culpabilidade, a imputabilidade, a inimputabilidade e a semi-imputabilidade, faz-se necessário para adentrar a psicopatia e suas características, a fim de que se permita uma análise que encontre o elo que liga a figura do psicopata na realidade penal brasileira dentro da imputabilidade. 

 

 

 

PALAVRAS-CHAVE:Psicopatia, Direito Penal Brasileiro, Imputabilidade. 

 

 

 

ABSTRACT: 

 

This article presents an approach to the liability of the psychopath from the perspective of Brazilian criminal law. Study what the doctrine and Brazilian criminal law guidance on the guilt, the accountability, the unaccountability and semi- imputability, it is necessary to enter psychopathy and its characteristics, so that it allows an analysis to find the link connecting the psychopath figure in Brazilian criminal reality in accountability. 

 

KEYWORDS: Psychopath; Psychopathy; Brazilian Criminal Law; Unaccountability and semi-imputability. 

 

 

 

INTRODUÇÃO 

 

 

 

A psicopatia é um transtorno de personalidade que merece notória atenção por parte do sistema jurídico atual.  

 

Estudos demonstram que os sujeitos diagnosticados com esse transtorno, são desprovidos no campo dos afetos e emoções em relação aos outros, ao tempo em que a parte cognitiva racional é perfeita. Dentre os níveis possíveis de classificação, o mais leve engloba a maioria dos psicopatas, estes são os que praticam furtos, roubam e dissimulam em qualquer situação. Os pertencentes ao grau mais grave são responsáveis por crimes que chocam a sociedade, podendo chegar ao ponto de se transformarem em Serial Killers.  

 

Analisar a imputabilidade do psicopata sob o prisma da legislação penal brasileira é o que objetiva este artigo. Desenvolvido por meio do método indutivo,o presente trabalho utiliza-se do instrumental oferecido pela pesquisa bibliográfica, com referências pautadas nos ensinamentos de renomados especialistas de Direito Penal do país, como Rogério Greco e Guilherme Nucci, na área da medicina, com orientações da Psiquiatra especialista no tratamento de transtornos mentais no Brasil, Ana Beatriz Barbosa da Silva, assim como de pesquisadores que colaboraram significativamente com informações advindas de artigos científicos interessados no tema proposto. 

 

Cumpre-se, então, estudar o que a doutrina e a legislação penal brasileira orientam sobre a culpabilidade e a imputabilidade, diretamente correlatas, de modo que permear um aprofundamento sobre a imputabilidade, a inimputabilidade e a semi-imputabilidade, e conhecer o que é a psicopatia e suas características, permitirá o desenvolvimento de uma análise mais sólida para encontrar-se, por meio da compreensão e reflexão, onde se liga a figura do psicopata na realidade penal brasileira. 

 

 

 

  1. A CULPABILIDADE NO DIREITO PENAL BRASILEIRO 

 

 

No contexto da culpabilidade, a legislação penal brasileira adota a teoria normativa pura, a informar que a ação humana deve ser consciente e revestida de uma finalidade. Isto é, a conduta do agente também deverá ser analisada para o cometimento do delito. O mesmo é dizer que na teoria normativa pura, a culpabilidade está intrínseca ao próprio fato.  

 

Cabe ao juiz analisar para saber se o dolo ou a culpa foram determinantes na conduta do criminoso.Pois, tanto o dolo, quanto a culpa, são impossíveis de serem separados da ação, ambos fazem parte da formação psicológica do agente. 

 

Segundo Rogério Greco, a culpabilidade diz respeito ao juízo de censura, ao juízo de reprovabilidade que se faz sobre a conduta típica e ilícita praticada pelo agente. Reprovável ou censurável é aquela conduta levada a efeito pelo agente, que nas condições em que se encontrava, podia agir de outro modo. 

 

Aliado ao pensamento do ilustre autor, surgiu a teoria psicológica normativa da culpabilidade, na qual, há a necessidade de se acrescentar o juízo de reprovabilidade do agente ao estudo do crime.Isto porque, a culpabilidade passa a ser um juízo de valoração relacionada a um fato doloso ou culposo. Sendo assim, o dolo e a culpa são considerados elementos da culpabilidade como potencial de consciência sobre a ilicitude, bem como a imputabilidade e a exigibilidade de conduta diversa, conforme converge a doutrina dominante. 

 

 

 

2.1 A IMPUTABILIDADE, A INIMPUTABILIDADE E A SEMI-IMPUTABILIDADE 

 

 

 

“A imputabilidade é o conjunto de condições pessoais envolvendo inteligência e vontade, que permite o agente ter conhecimento do caráter ilícito do fato, comparando-se de acordo com esse conhecimento”, é o que entende o penalista Guilherme Nucci. Isto nos permite afirmar, que é imputável o agente que sabe sobre o caráter ilícito do fato, e, mediante sua vontade, o pratica. 

 

Já a inimputabilidade decorre da norma inscrita no caput do artigo 26 do Código Penal brasileiro, que informa: 

 

Art. 26 - É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento”. 

 

 

 

Desse modo, o inimputável é o criminoso que ao tempo do cometimento do crime não possuía completamente nenhuma capacidade de entender a ilicitude do fato ou de se determinar de acordo com esse entendimento. Destarte, estar-se-á presumida a ausência de sanidade mental, averiguada através de três critérios: biológico, psicológico e biopsicológico. 

 

O critério biológico analisa se o agente possui ou não um desenvolvimento mental incompleto ou retardado. O critério psicológico verifica a capacidade do agente apreciar o caráter ilícito do fato ou de comportar-se de acordo. O último critério, é o biopsicológico, que reúne os critérios anteriores, levando à uma análise mais completa do agente. Caso seja determinada a inimputabilidade, o agente será absolvido, porém, deverá cumprir medida de segurança. Este é o critério utilizado pela nossa legislação.  

 

Já a semi-imputabilidade fica clara ao ser trazida à baila pelo parágrafo único do artigo 26 do Código Penal: 

 

Redução de pena 

 

Parágrafo único - A pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente, em virtude de perturbação de saúde mental ou por desenvolvimento mental incompleto ou retardado não era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento”. 

 

 

 

 É permitido afirmar que pena poderá ser reduzida de um a dois terços, se restar comprovado o agente que, em virtude de perturbação de saúde mental ou por desenvolvimento incompleto ou retardado, não era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato, ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.  

 

Segundo Pazanesse (2009), a semi-imputabilidade é a redução da capacidade de compreensão ou vontade, mas ela não exclui a imputabilidade. Constatada tal redução, o autor afirma que o magistrado estará obrigado a diminuir a pena, de 1/3 a 2/3, de acordo com o grau de perturbação, ou aplicar a medida de segurança. Para isto, o laudo de insanidade mental precisa indicar essa opção como recomendável. 

  1. A PSICOPATIA E SEUS TRAÇOS 

 

 

 

Em se tratando dos psicopatas, seriam estes conscientes dos seus atos? A psicopatia trata-se de uma doença mental reconhecida? À luz dos estudos de Ana Beatriz Barbosa Silva, será dedicada atenção especial à figura do psicopata para encontrarmos uma resposta razoável para tais indagações, a fim de que o elo que liga o psicopata à imputabilidade na legislação penal brasileira seja encontrado, ao serem permeados conhecimentos pormenorizados a respeito da psicopatia e suas características. 

 

Uma rápida resposta para saber se os psicopatas têm capacidade de compreensão, é trazida pelos estudos do renomado psiquiatra canadense, Robert Hare, abordados por Silva na obra “Mentes Perigosas, o Psicopata Mora ao Lado”. Hare afirma que os psicopatas têm total ciência dos seus atos (a parte cognitiva ou racional é perfeita), ou seja, sabem perfeitamente que estão infringindo regras sociais e por que estão agindo dessa maneira. A deficiência deles (e é aí que mora o perigo) está no campo dos afetos e das emoções. (HARE apud SILVA, 2008, p. 35). 

 

Do grego, a palavra “psicopatia” vem etimologicamente de “psychépathos”, sendo psyché igual a mente/alma e phatos igual a doença/enfermidade. Doença da mente, no sentido literal da palavra. Embora a tradução etimológica aponte a psicopatia como uma doença da mente, a Psiquiatria não a reconhece dentro da visão tradicional das doenças mentais (SILVA, 2008, p. 33). 

 

Quanto ao termo empregado para identificar a psicopatia, Silva aborda que não foi encontrado consenso entre a Associação de Psiquiatria Americana e a Organização Mundial de Saúde, que trazem expressões como Transtorno da Personalidade Anti-social e Transtorno de Personalidade Dissocial, respectivamente, para o que ela chama de psicopatia. Destaca a autora que ambas as terminologias, trazem à tona o perfil transgressor do psicopata. 

 

Mas afinal, o que é a Psicopatia? Embora existam diversas definições de estudiosos para conceituar a psicopatia, a autora Fabíola dos Santos Araújo coteja ser certo de que a psicopatia é um transtorno da personalidade, do comportamento, e não uma doença mental. Por transtorno da personalidade, temos que  

 

“[...]exige a constatação de um padrão permanente de experiência interna e de comportamento que se afasta das expectativas da cultura do sujeito, manifestando-se nas áreas cognoscitiva, afetiva, da atividade interpessoal, ou dos impulsos, referido padrão persistente é inflexível, desadaptativo, exibe longa duração de início precoce (adolescência ou início da idade adulta) e ocasiona um mal-estar ou deteriorização funcional em amplas gamas de situações pessoais e sociais do indivíduo”. (ARAÚJO, 2011 apud GOMES; GARCÍA-PABLOS DE MOLINA, 2008, p. 284) 

 

No mesmo entendimento corrobora Silva, ao afirmar que os psicopatas não são considerados loucos, nem apresentam qualquer tipo de desorientação. Também não sofrem de delírios ou alucinações (como a esquizofrenia) e tampouco apresentam intenso sofrimento mental (como a depressão ou o pânico, por exemplo). (SILVA, 2008, p. 32).  

 

Para designar esses indivíduos, a pesquisadora Camila Cavalcante explica que alguns pesquisadores os denominam “sociopatas” em razão de fatores sociais desfavoráveis como causadores do problema, inseridos nas tendências sociais. Outros, adotam “psicopata” como o termo adequado para designar a relação na origem do transtorno com os fatores genéticos, biológicos e psicológicos, residentes nos aspecto orgânico-psicológico. Tal bipolaridade, segundo a supracitada pesquisadora, se fundiu ao longo dos anos no curso da evolução dos conceitos sobre a psicopatia, sendo a influência biopsicossocial como a mais sensata para o estudo desse transtorno de personalidade. 

 

A maioria dos casos da psicopatia se remete à infância, estágio em que se mostram os sinais da falta de afetividade e rebeldia perante o genitor. É ingrato, egoísta, narcisista. Exige a satisfação de seus desejos a qualquer tempo, custa o que custar. Eles diferem do resto da população em razão de uma personalidade anormal, sobretudo, não aceitam qualquer ética moral, cultural, familiar, social ou legal. (CAVALCANTE, Camila). 

 

Silva ilustra seus estudos com números trazidos pelo psiquiatra canadense Hare, ao revelar que, para se ter uma ideia, a prevalência dos psicopatas se aproxima de 20% na população carcerária, sendo que esses 20% são responsáveis por mais de 50% dos graves crimes cometidos se compararmos aos demais encarcerados. Silva corrobora acrescendo que tais números se aplicam para os psicopatas que estão fora do sistema prisional. (HARE apud SILVA, 2008, p. 126) 

 

“Assim, para eles, tanto faz ferir, maltratar ou até matar alguém que atravesse o seu caminho ou os seus interesses, mesmo que esse alguém faça parte de seu convívio íntimo. Esses comportamentos desprezíveis são resultados de uma escolha, diga-se de passagem, exercida de forma livre e sem qualquer culpa. (SILVA, 2008, p. 35).  

 

Destarte, à claridade dos estudos de Silva, o psicopata possui características como raciocínio frio, é calculista, possui total incapacidade de tratar as outras pessoas como seres humanos pensantes e com sentimentos, de estabelecer vínculos afetivos - daí a ausência da capacidade de colocar-se no lugar do outro, ter empatia -, são inescrupulosos, dissimulados, mentirosos, sedutores e visam apenas o próprio benefício. São desprovidos de culpa ou remorso e podem revelar-se agressivos e violentos.  

 

Segundo a supracitada autora, os psicopatas são verdadeiros "predadores sociais", em maior ou menor nível de gravidade e com formas diferentes de manifestarem os seus atos transgressores. A principal marca dos psicopatas é a falta de consciência nas relações interpessoais estabelecidas nos diversos ambientes do convívio humano (afetivo, profissional, familiar e social), associando-se à flagrante violação criminosa das regras sociais. Poder e autopromoção às custas dos outros é por onde permeiam suas redes, sendo capazes de atropelar tudo e todos com total egocentrismo e indiferença.  

 

Os psicopatas, à luz dos estudos de Silva, absorvem suas vítimas até o limite improvável de uso e abuso, de modo que sua matemática é o acréscimo unilateral e predatório, com benefício exclusivo, reconhecendo apenas as suas próprias regras e leis. Quando desmascarados, demonstram total falta de preocupação, constrangimento e nem a menor vergonha quando flagrados na mentira. Eximem-se de quaisquer responsabilidades e atribuem às outras pessoas a culpa pelos próprios atos, de modo que encaram os problemas como falta de sorte ou que são derivados de uma realidade injusta advinda de pessoas incompetentes. Eles não se afetam por dívidas contraídas, problemas legais ou pessoais. São egocêntricos, megalomaníacos, fascinados pelo poder e controle sobre os outros, e demostram uma reação de satisfação misturada com prazer, sensação de poder e indiferença face a situações de violência física, intimidação ou provocações. Desprovidos da capacidade de sentir qualquer arrependimento perante o mal causado, os psicopatas possuem o dobro da capacidade de cometer novos crimes em relação aos demais criminosos, principalmente quando relacionados a crimes ligados à violência, em que a capacidade de reincidência triplica. 

 

Cavalcante também destaca outras características centrais como encanto superficial e manipulação, mentiras sistemáticas e comportamento fantasioso, amoralidade; incorrigibilidade; falta de adaptação social etc. Ademais, 

 

“É importante ter em mente que todos os psicopatas são perigosos, uma vez que eles apresentam graus diversos de insensibilidade e desprezo pela vida humana. Porém, existe uma fração minoritária de psicopatas que mostra uma insensibilidade tamanha que suas condutas criminosas podem atingir perversidades inimagináveis. Por esse motivo eu costumo denominá-los de psicopatas severos ou perigosos demais. Eles são os criminosos que mais desafiam a nossa capacidade de entendimento, aceitação e adoção de ações preventivas contra as suas transgressões. Seus crimes não apresentam motivações aparentes e nem guardam relação direta com situações pessoais ou sociais adversas”. (SILVA, 2008, p. 124). 

 

Vale destacar a ressalva trazida por Silva de que apesar de muito perigosos, os psicopatas não são necessariamente assassinos, mas transgressores e criminosos em delitos sociais como tráfico de drogas, corrupção, roubos, assaltos à mão armada, estelionatos, fraudes no sistema financeiro, agressões físicas, violência no trânsito etc. Animador seria se os psicopatas fossem penalizados pelos crimes cometidos, mas como orienta Silva, na maioria das vezes não são descobertos e nem penalizados por tais práticas. 

 

  1. ANÁLISE DA IMPUTABILIDADE DO PSICOPATA 

 

 

À guisa do exposto em tela, fica claro o ato volitivo e cognitivo dos psicopatas quanto à transgressão de leis e cometimento de crimes.  

 

Nesse sentido, ao ser feita a retomada de aspectos da inimputabilidade trazidos pelo caput do artigo 26 do Código Penal, no que se refere aos critérios biológico, psicológico e biopsicológico, observa-se que a psicopatia não incide na ausência de sanidade mental. Pois, como trazido pelos estudos ora abordados, a psicopatia, um transtorno de personalidade, possui a parte cognitiva racional perfeita, de modo que a deficiência do psicopata recai é no campo dos afetos e emoções em relação às outras pessoas.  

 

Assim sendo, não se trata aqui de um desenvolvimento mental incompleto ou retardado, e nem na incapacidade de o agente apreciar o caráter ilícito do fato. Isto porque, vale relembrar a colocação de Hare, os psicopatas têm total ciência dos seus atos (a parte cognitiva ou racional é perfeita), ou seja, sabem perfeitamente que estão infringindo regras sociais e por que estão agindo dessa maneira. (SILVA, 2008, p. 35). 

 

Dessa forma, o caput do artigo 26 do Código Penal, no que tange a inimputabilidade, esta não se aplica aos psicopatas.  

 

A outro giro, não há consenso quanto à culpabilidade dos psicopatas. Conforme aponta Cavalcante, se por um lado alguns doutrinadores entendem que os psicopatas têm total capacidade de entendimento por manterem sua percepção, outros divergem ao alegar que eles possuem capacidade de discernimento parcial, chegando alguns a defenderem a exculpação dos crimes cometidos por psicopatas. A ótica sobre a capacidade parcial de discernimento dos psicopatas, encontra amparo no entendimento dos Tribunais – TJSP, como ilustra a pesquisadora Lane Ribeiro, ao reproduzir que “os psicopatas são enfermos mentais, com capacidade parcial de entender o caráter criminoso do ato praticado, enquadrando-se, portanto, na hipótese do parágrafo único do artigo 22 (art. 26 vigente) do Código Penal (redução facultativa de pena)”, o que os classificaria como semi-imputáveis. Ainda sobre esta visão, Ribeiro ilustra que: 

 

“Quando declarada a psicopatia pela perícia técnica, podemos dizer que o psicopata entende o que é crime, possuindo ‘capacidade cognitiva preservada, mas poderá não controlar seus estímulos à prática criminosa (...)’. Contudo, isto poderá ‘comprometer sua liberdade de opção no momento do fato, por ter sua vontade reduzida em decorrência da perturbação de comportamento anteriormente presente’.” (RIBEIRO)  

 

O entendimento supramencionado não converge com os levantamentos ora realizados, já que resta claro que o campo cognitivo e racional do psicopata não possui deficiências, daí que não se fundaria o argumento de que a pessoa com transtorno de personalidade não possa controlar seus estímulos à prática criminosa. 

 

Nessa direção, Ribeiro aponta que a psiquiatria em unanimidade tem desenvolvido a tese de que o psicopata possui consciência dos seus atos, coadunando-se, assim, com a responsabilização do indivíduo conforme a compreensão acerca da sua conduta, em que a aplicabilidade da sanção adequada dependerá da conduta que o psicopata se insere. O entendimento a que é chegado, reside na psicopatia diretamente ligada à imputabilidade, dada a capacidade cognitiva e racional do psicopata, isto é, aquela de discernir a ilicitude de seu ato ou não, afastando-a inclusive da semi-imputabilidade, esta defendida por outro entendimento. 

 

Resta relembrar que os psicopatas são responsáveis por mais de 50% dos graves crimes cometidos, e estes, representam 20% da população carcerária e fora da prisão. Ademais, a taxa de reincidência dos acometidos pelo transtorno de personalidade é dobrada em relação às outras pessoas, triplicando a incidência em crimes de violência, como bem pontuou Silva. 

 

Esta realidade, aliás, preocupa os pesquisadores brasileiros da área. Em países onde a escala Hare (PLC) é usada para identificar os psicopatas e cuidar para que estes fiquem presos por mais tempo, com a finalidade de reduzir de modo significativo as taxas de reincidência de crimes mais graves e violentos, se constatou uma redução de 2/3 de cometimento desses crimes, segundo Silva.  

 

A autora, informa que “no sistema carcerário brasileiro não existe um procedimento de diagnóstico para a psicopatia quando há solicitação de benefícios, redução de penas ou para julgar se o preso está apto a cumprir sua pena em um regime semi-aberto (SILVA, 2008, p. 129). Para Silva, este tipo de medida reduziria a violência na sociedade como um todo. Daí resulta a perspectiva de no momento da concessão da liberdade condicional e a redução de pena, serem considerados aspectos como a reincidência, não arrependimento e mínima probabilidade de ressocialização dos psicopatas. 

 

 

  1. CONSIDERAÇÕES FINAIS 

 

 

 

Não ficam dúvidas quanto à potencial periculosidade do psicopata, sua frieza, indiferença e ausência de empatia em relação às outras pessoas. Além de ser reincidente, o psicopata não evidencia arrependimento, e, por isso, representa uma ameaça constante à ordem e à vida em sociedade.  

 

Perturbadores, manipuladores, dissimulados e egoístas, não se sabe o que eles são capazes de cometer para atenderem suas aspirações egoísticas. Como personificações do mal, ficam os psicopatas como objeto de investigação científica da Medicina e do Direito, para que haja uma fusão interdisciplinar que objetive amortecer os impactos negativos que as ações dos psicopatas geram na família, nas relações profissionais, sociais e interpessoais como um todo. 

 

Trindade aborda que tratamentos aplicados aos indivíduos com transtornos de personalidade não têm reduzido a violência e criminalidade por eles praticadas, assim como, a ciência, até o momento, não dispõe de um tratamento eficaz para sanar a psicopatia, vigorando a presença maléfica dessas pessoas para o meio social. 

 

A pesquisadora Fabíola dos Santos Araújo bem pontua que “a construção de uma sociedade solidária e livre de violência passa pela proteção às pessoas em terem o direito de não conviverem com criminosos dissimulados e insensíveis”. 

 

Ao abarcar as considerações até aqui trazidas, reafirma-se a imputabilidade dos psicopatas, de modo que devam ser aplicados tratamentos penais diferenciados e mais rígidos à eles. A punibilidade sem benefícios deve ser instituída de modo persistente, como redução de pena e liberdade condicional ou provisória.Ainda que não seja o remédio que venha curar este mal, ao menos,a punibilidade sem os benefícios, preserva a maioria das pessoas o mais longe possível e pelo maior período de tempo da convivência com estes indivíduos muito perigosos, que agem com cognição e racionalidade, reconhecendo o caráter lícito ou ilícito de suas condutas. 

 

Trata-se de um transtorno, até o presente momento, sem possibilidade de cura. No entanto, estudos devem continuar a mergulhar neste mote, para desvendar se os indivíduos acometidos por este transtorno de personalidade podem um dia encontrar a cura, seja com medidas sociais, medicamentosas e/ou espirituais. 

 

 

 

5. REFERÊNCIAS 

 

 

 

ARAÚJO, Fabíola dos Santos. O Perfil do Criminoso Psicopata. Disponível em: < http://www.conteudojuridico.com.br/artigo,o-%20perfil-do-criminoso-psicopata,32921.html > Acesso em: 08 de março de 2016. 

 

 

 

BARBA, ClaridesHenrich. Orientações Básicas na Elaboração do Artigo Científico. Disponível em:<http://www2.ouvidoria.pe.gov.br/c/document_library/get_file?p_l_id=199119&folderId=201492&name=DLFE-17774.pdf> Acesso em: 28 de abril de 2015. 

 

 

 

CAVALCANTE, Camila Maria Santiago. A punibilidade dos Psicopatas sob a análise da ciência criminológica. Disponível em: < http://ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=15003 > Acesso em 09 de março de 2016. 

 

 

 

GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal. 12 ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2010. 

 

 

 

NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Direito Penal: parte geral, parte especial. 2 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006 

 

 

 

PAZZANESE, Ronaldo. Qual a consequência da semi-imputabilidade? Disponível em: http://lfg.jusbrasil.com.br/noticias/102052/qual-a-consequencia-da-semi-imputabilidade-ronaldo-pazzanese?ref=home > Acesso em 05 de março de 2016. 

 

 

 

RIBEIRO, Lane. Efeitos jurídico-penais: portadores de psicopatia. Disponível em: < https://jus.com.br/artigos/38351/efeitos-juridico-penais-portadores-de-psicopatia > Acesso em 5 de março de 2016. 

 

 

 

SILVA, Ana Beatriz Barbosa. Mentes Perigosas - O psicopata mora ao lado. Ed.1, editora Fontamar. Disponível em: <http://www.projetovemser.com.br/blog/wp-includes/downloads/Ana%20Beatriz%20Barbosa%20Silva%20-%20Mentes%20perigosas%20-%20O%20Psicopata%20Mora%20ao%20Lado.pdf> Acesso em 08 de março de 2016. 

 

 

 

TRINDADE, Jorge. Psicopatia: da máscara da sanidade à mascara da justiça. Disponível em: <https://www.passeidireto.com/arquivo/6050531/psicopatia-da-mascara-da-sanidade-a-mascara-da-justica > Acesso em 10 de março de 2016. 

 

 

RODRIGUES, Roberto Elias; BELOMO, Valquiria; GIOVANETTI, Francisco Carlos; NETO, José Moreira Barbosa. O Código Penal e as causas de inimputabilidade. Disponível em: < http://www.direitoceunsp.info/revistajuridica/ed6/rje/6a_edicao/artigos_professores/o_codigo_penal_e_as_causas_de_inimputabilidade.pdf > Acesso em 6 de março de 2016.