Análise crítica sobre texto "Imagens da Família"


A expressão Idade Média surgiu no séc. XIV, durante o Renascimento. Segundo os renascentistas, esse período compreendeu séculos de trevas, ignorância e barbárie, dominados pelo misticismo religioso. A história medieval, todavia, é riquíssima e tem importância fundamental para a compreensão do mundo ocidental, em que vivemos. O texto "Imagens da Família", da obra História Social da Criança e da Família, de Felipe Áries, tem por característica descrever e detalhar a vida cotidiana dos homens, mulheres, crianças e as famílias formadas nos séculos passados.

É intrigante e muito interessante a maneira detalhista e minuciosa com que as cenas são descritas, na medida em que ao longo do texto vão se desvendando as inúmeras e até exóticas formas de se conviver e de criar uma sociedade, suas leis, seu modo de viver. A iconografia ganha destaque, por suas análises e contribuições para o desenvolvimento da história, na medida em que é também através dela que muitos autores acharam a fonte para estudar, pesquisar, escrever e complementar suas obras a cerca dos aspectos relacionais das sociedades vigentes.

Dentre todas as representações sociais apresentadas no capítulo, o que mais nos chamou a atenção foi a história da criança, o lugar que esse ser ocupava na sociedade e a forma que ela se encaixava na sua família, sendo que a mesma até o período histórico denominado Idade Media, não possui espaço no ceio familiar, são pequenos adultos, criados nas famílias. O autor afirma que a construção do amor pela criança foi durante muito tempo, despercebido, sufocado, chegando mesmo até a não existir, indicando que apenas no século XVII, houve o surgimento de noção de infância, junto com a s transformações que começam a processar na transição para a sociedade moderna. Na história da construção do sentimento da infância a trajetória da criança é marcada pela marginalização, discriminação e exploração.

Baseados nos fatos a cima descritos entra a questão do afeto ou a falta dele. Até que ponto esse sentimento era visto como necessário, já que todos criados de forma tão fria, "sobreviveram"? Ao analisar o papel das relações interpessoais, sobretudo as que envolvem o desenvolvimento afetivo e intelectual da criança podem citar Wallon (1998) como um dos autores que fala sobre esse aspecto: As primeiras relações utilitárias da criança não são relações com o mundo físico, as quais, quando aparecem, começam a ser puramente lúdicas; as relações humanas, relações de compreensão cujo instrumento necessário são os meios de expressão. Durante esse período as crianças são de posse das amas de leite que se encarregam de alimentar e suprir as primeiras necessidades.

Para mais adiante, o autor fala de maneira como as crianças começaram a participar dos eventos familiares, agora então a invenção da infância como um período de desenvolvimento, em que algumas das necessidades básicas das mesmas eram supridas por seus familiares, prevendo assim um novo papel para a criança, onde se prevê a estimulação e o incentivo para deste modo oportunizar-se um crescimento saudável e feliz, conseqüentemente um adulto bem resolvido.
O aparecimento do tema da família não foi um simples episódio, mas uma evolução maciça durante os séculos XVI e XVII.O sentimento da família, que emerge nos séculos XVI e XVII, é inseparável do sentimento da infância. Surgem os Tratados Práticos de Educação: conselhos aos pais sobre como educar seus filhos. A educação não é mais voltada para as boas maneiras, é importante a escolha de uma escola e um ofício. O objetivo era instruir a própria família sobre seus deveres e suas responsabilidades, e aconselhá-la em sua conduta com relação às crianças

Ariés (1981) se utiliza da descrição de figuras que falam sobre infância e família, partindo da idéia de que a importância dada ao ofício e manuseio da iconografia medieval era um símbolo de expressão cultural e que tinha um valor sentimental para com as pessoas que as utilizavam.
A iconografia tradicional dos 12 meses do ano foi fixada no século XII, onde é possível ao leitor reviver como se constituíam os trabalhos e as divisões das classes assim como as atividades que se passavam durante os dias e o que definiam as estações. Ao longo do século XVI, essa iconografia dos meses sofreria uma transformação significativa, agregando a família combinando-se com o simbolismo de uma alegoria tradicional: as idades da vida.

A vida cotidiana da idade média girava em torno do comércio e da fé cristã. É assim que as ruas se transformaram em um espaço público destinado a essas atividades, cujas distâncias foram pensadas a partir do cidadão comum. As ruas, assim como as praças, os parques e os jardins constituem um espaço urbano caracterizado por estar delimitado por edifícios e por regularizar as atividades humanas de ordem pública. Tudo que era privado tornara-se público, ou seja, quase todas as atividades eram desempenhadas nas ruas, sem que houvesse pudor ou qualquer outra forma de repreensão.

Meses de novembro e de dezembro do livro de horas de Turim são ilustrados com o tradicional sacrifício do porco. Mas aqui, ele se passa na rua, e os vizinhos estão de suas portas para observá-lo. No calendário do livro de horas de Adelaide de Savoie, aparece o mercado: moleques cortam as bolsas das donas-de-casa ocupadas e distraídas ? reconhecemos aí o tema dos pequenos batedores de carteiras, que se iria manter na pintura picaresca ao longo de todo o século XVII. Outra cena do mesmo calendário representa a volta do mercado: uma comadre pára para falar com sua vizinha, que está na janela; alguns homens descansam sentados num banco, protegidos por um telheiro, e distraem-se vendo meninos jogando péla e lutar. Essa rua medieval, assim como a rua árabe de hoje, não se opunha à intimidade da vida privada; era um prolongamento dessa vida privada, o cenário familiar do trabalho e das relações sociais. Os artistas, em suas tentativas relativamente tardias de representação da vida privada, começariam por mostrá-la na rua, antes de segui-la até dentro de casa. Talvez essa vida privada se passasse tanto ou mais na rua do que em casa: (ARIÉS, 1981).

Quando se fala em mulher na idade média, vem o retrato de uma pessoa totalmente submissa ao seu esposo, sem poder de fala e nem de decisão. O casamento era um pacto entre duas famílias, seu objetivo era simplesmente a procriação. A mulher era ao mesmo tempo doada e recebida, como um ser passivo, sendo sua principal virtude, dentro e fora do casamento, à obediência e submissão. Independente de ser filha, irmã, esposa: esta servia somente de referência ao homem que estava servindo.
Áries (1981) relata como eram realizados os casamentos e de que forma essas cerimônias ocupavam um papel de autoridade e de respeito na sociedade vigente:

Empenhavam-se um papel no folclore do casamento, a terceira face representava a cerimônia do casamento, no momento em que um dos cônjuges segurava uma coroa sobre a cabeça do outro: rito que substituía na liturgia oriental. Então, os noivos têm o direito de se beijar. Na quinta face, eles estão deitados nus no leito nupcial. Nasce uma criança, que aparece enroladas em cueiros e segura pelo pai e a mãe juntos. Suas roupas parecem mais simples do que na época do noivado e do casamento: eles se tornaram pessoas sérias, que se vestem com certa austeridade ou segundo a moda antiga. A sétima face reúne toda a família, que posa para um retrato. O pai e a mãe seguram a criança pelo ombro e pela mão. Já é o retrato familiar; Nessa parte do texto nos mostra como cada fase da vida do homem era cheia de simbolismo, de cultos que deviam ser respeitados a "família" só devia ser fotografada quando estivesse realmente completa: pai, mãe e filhos.

Muitas das vezes o casamento significava a celebração de um contrato entre os noivos, estipulando os direitos de cada um. A herança e a propriedade eram os principais motivos que fundamentavam estes casamentos arranjados.
É claro que também existiam casamentos por amor, casamentos medievais, quando celebrados entre membros da nobreza, tinham muitas vezes lugar nos seus castelos. Eram grandes festas com vários divertimentos e comida farta. Nesse dia, os mendigos vinham de longe para receberem as sobras do banquete e era tradição o senhor do castelo libertar alguns prisioneiros, mas estes verificavam-se sobretudo entre as classes sociais mais baixas. Não era incomum o casamento arranjado. E muitas vezes para essa mulher escapar de um casamento desse tipo, o único jeito era seguir a vida religiosa "negava o casamento por amor a Deus". O casamento tinha um intuito maior do que somente a união de duas pessoas que se amavam, mais importante que o amor eram os bens, ou seja, a estabilidade financeira que o essa união poderia proporcionar as famílias dos respectivos noivos, enfim segundo a igreja o amor que deveria existir era o amor ao próximo, o casamento era uma instituição que servia apenas para a reprodução da espécie e uma união de riquezas. O autor ainda completa:
De modo geral, a cena do gênero moderna nasceu da ilustração das alegorias tradicionais da Idade Média. Mas a distancia entre o tema antigo e sua nova expressão é enorme. Esquecemo-nos das alegorias das estações e do inverno quando contemplamos um quadro de Stella, representando uma noite ao pé do fogo: de um lado da grande sala, os homens ceiam, enquanto do outro, em volta da lareira, as mulheres fiam ou traçam o junco e as crianças brincam ou são levadas. Não é mais o inverno, é o serão. Não é mais a virilidade ou a terceira idade, é a reunião de família.
Podemos perceber que o matrimônio no período medieval tinha também outro objetivo que era o da procriação visando a continuidade da linhagem, ou seja, gerar filhos para herdar os bens e o nome da família construindo uma dinastia, garantindo a perpetuidade de sua propriedade. Como já foi dito, os casamentos arranjados eram comuns e cuidadosamente escolhidos pelos pais dos noivos para que os bens familiares não fossem dispersos e para que mantivesse uma a linhagem tradicional. Segundo Bloch, o casamento era um tratado, um pacto ou aliança negociada entre as famílias que inclusive acarretava em multa caso não fosse cumprido. (BLOCH, 1995).
O desenvolvimento do sujeito não é um processo previsível, universal, linear ou gradual. O desenvolvimento está intimamente ligado ao ambiente sócio-cultural em que a pessoa se insere e se processa de forma dinâmica e dialética através de rupturas e desequilíbrios. Os processos elementares são de origem biológica e as funções psicológicas superiores, de origem sócio-cultural. Por isso devemos analisar e conhecer sobre as diversas culturas e épocas em que foram elementares, para que com isso possamos formar opiniões e construir uma base sólida de informações úteis na construção da nossa história.








Referências Bibliográficas:
BLOCH, R. Howard. "Misoginia medieval e a invenção do amor romântico" Ocidental. Rio de Janeiro: Ed. 34, 1995.
WALLON, H. A evolução psicológica da criança. Lisboa, Edições 70, 1998.
ARIÈS, Philippe. História Social da Criança e da Família. 2ª ed. Ed. LTC. Rio de Janeiro. 1978.