1 - INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem por objetivo realizar estudo comparado entre os artigos 94, inciso III e os artigos 168 a 178 da Lei 11.101/2005, intitulada Lei de Falências e Recuperação Judicial.
O artigo 94, III refere-se aos atos de falência que são aqueles atos que ensejam ao credor ou interessado pedir a decretação de falência do devedor empresário.
Quanto aos artigos de 168 a 178 da referida lei tratam dos chamados "crimes falimentares", que tem como condição objetiva de punibilidade a decretação da falência por sentença, conforme art. 180 da mesma lei.


















2 - DOS ATOS DE FALÊNCIA

A antiga lei de falência, no exame da caracterização da falência, procurava indagar as causas, que as dividia em três para efeitos penais e econômicos. Assim, a falência deveria ser examinada pelo aspecto causal, culposa ou fraudulenta. Causal, quando o falido não teria dado motivo à quebra. Ela decorria de fatos econômicos, de dificuldades administrativas ou de causas supervenientes alheias à vontade do comerciante.
A falência culposa ocorria quando o devedor concorria para a quebra, com atos prejudiciais aos credores, atos de administração desastrosa que, se o devedor fosse cuidadoso e zelasse pelos atos de comércio, jamais os praticaria. Na área penal esta causa imputava ao falido pena cominada como crime falimentar, com pena de detenção.
Por último, examinava-se a falência fraudulenta, onde havia crime praticado pelo comerciante, no exercício do negócio e, de acordo com a tipicidade desses crimes fraudulentos o devedor era punido com pena severa de reclusão.
A lei atual também deixou de consignar o exame da insolvência e da insolvabilidade para caracterizar a falência. O que interessa atualmente, objetivamente, pragmaticamente é saber se o devedor pagou ou não o título. Se não honrou o compromisso no dia do pagamento, é impontual e esta impontualidade é caracterizadora da falência.
Por outro lado, a lei ampliou a possibilidade de caracterização da falência, instituindo um elenco de atos que, se praticados pelo devedor, antes da falência, também caracteriza esta, ressalvando-se a previsão contida próprio art. 94, III que estabelece que caso estes atos sejam praticados dentro dos parâmetros do estipulado no plano de recuperação judicial, não haverá motivo para se pedir a decretação da falência.
Pela análise efetuada, temos: a existência de uma impontualidade no pagamento de obrigação líquida, constante de título que legitima a ação executiva; ou a prática de certos atos ou fatos que revelam a insolvência ou denunciam o propósito do devedor em prejudicar os credores; a existência de credores como sujeitos ativos do processo concursal; a existência de uma sentença declaratória de falência, transformando aquele estado de fato em estado de direito e a existência de um devedor comerciante, pessoa natural ou jurídica, como sujeito ao processo falimentar.

3 - DOS CRIMES FALIMENTARES

A Lei Nº. 11.101/2005 adota posição rigorosa na tipificação e sanção de crimes falimentares decorrentes da inobservância regras legais e de boas práticas de escrituração e registros contábeis.
O art. 178 atribui pena de um a dois anos de detenção ao empresário que deixar de elaborar, escriturar ou autenticar, antes ou depois da sentença que decretar a falência, conceder a recuperação judicial ou homologar o plano de recuperação extrajudicial, os documentos de escrituração contábil obrigatórios.
O art. 168 agrava a pena prevista para os atos fraudulentos com que o falido pretenda obter vantagem indevida para si ou para outrem, quando se tratar de atos relativos aos registros contábeis. A pena, de reclusão de três a seis anos, é aumentada em um sexto, se: I ? elabora escrituração contábil ou balanço com dados inexatos; II ? omite, na escrituração contábil ou no balanço, lançamento que deles deveria constar, ou altera escrituração ou balanços verdadeiros; III ? destrói, apaga ou corrompe dados contábeis ou negociais armazenados em computador ou sistema informatizado; IV ? simula composição do capital social; V ? destrói, oculta ou inutiliza total ou parcialmente, os documentos de escrituração contábil obrigatórios. A pena será aumentada de 1/3 até a metade se "o devedor manteve ou movimentou recursos ou valores paralelamente à contabilidade exigida pela legislação".
Verifica-se ainda que as condutas típicas poderão ser cometidas antes ou depois da decretação da falência ou concessão da recuperação judicial ou extrajudicial, mas só poderão ser consideradas como crime falimentar, se houver decretação da falência ou concessão da recuperação judicial ou extrajudicial, caso contrário, ou serão atípicas ou caracterizarão outros crimes que não os falimentares.

4 - ANÁLISE COMPARATIVA ENTRE OS ATOS DE FALÊNCIA E OS CRIMES FALIMENTARES

Os atos de falência são a possibilidade de os credores sem título vencido demonstrarem que o devedor empresário não pode solver suas dívidas. Isso porque ele comete atos que não são compatíveis com uma atividade empresarial regular.
Quanto aos crimes falimentares, ademais, pesa a imputação pelo Ministério Público de atos dolosos que também restam incompatíveis com o anseio regular de recuperar as atividades empresariais ou de pelo menos resolver as dívidas. Colhe-se da doutrina: "O elemento subjetivo do crime falimentar é a culpa ou o dolo, que devem sempre estar presentes pois não se pune a falência, mas o crime que se verifique por ocasião ou no curso dela" (Fábio Ulhoa Coelho, 1997).
Cabe salientar que o tipo penal previsto no artigo 168, por se tratar de previsão bastante genérica, tem identificação com qualquer um dos atos de falência elencados no art. 94, III.
A previsão contida no art. 172 coaduna-se com o estabelecido nas alíneas "b" e "e" do inciso III do art. 94, haja vista que todos tratam de atos cometidos pelo empresário devedor que tenta favorecer ou outros credores em detrimento dos demais ou terceiros ou a ele mesmo em prejuízo da massa falida. Os atos de alienação ou de garantia quando feitos de forma que prejudiquem a massa falida são tidos como atos de falência, mas quando feito com o animus de prejudicar outros credores, caracterizam crime falimentar.
Outro aspecto relevante diz respeito à previsão de atos de simulação cometidos pelo devedor, tanto no art. 94, III, b, quando o empresário ou sociedade empresária tenta retardar pagamentos ou fraudar credores por meio de negócio simulado, quanto no art. 173, quando há apropriação, desvio ou ocultação de bens do devedor.
5 - CONCLUSÃO

Conclui-se, portanto, que as condutas caracterizadoras de atos ou de crimes falimentares podem até mesmo se confundir, mas a intenção e o momento em que são praticadas são elementos fundamentais em sua distinção.
Vale acrescentar, ademais, que os atos de falência não se caracterizam quando forem praticados a título de cumprimento do plano de recuperação judicial.

6 - REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

COELHO, Fábio Ulhoa. Manual de Direito Comercial, 18ª Edição. São Paulo: Saraiva, 1997.

DÓRIA, Dylson. Curso de Direito Comercial. 13ª ed. São Paulo: Saraiva, 1.998, v.2.

MAMEDE, Gladston. Falência e Recuperação de Empresas, 3ª Edição. São Paulo: Atlas S.A., 2009.

PAES DE ALMEIDA, Amador. Curso de Falência e Recuperação de Empresa, 25ª Edição. São Paulo: Saraiva, 2009.