Associar S. Valentim ao dia dos namorados, ou vice-versa, é inevitável, porque o destaque que aqui se pretende dar contempla o Santo e os Namorados (ou Enamorados), muito embora, o fio condutor do tema, o núcleo central, o objetivo que se pretende, apontem no sentido do amor, não necessariamente o “amor-paixão” que, eventualmente, será efémero.

Pensa-se ser muito importante o amor que fundamenta uma amizade sólida, para toda a vida, entre duas pessoas que se gostam, se respeitam, se cuidam e comungam as alegrias e as tristezas, os sucessos e os fracassos, a cumplicidade, a confiança, a solidariedade e a lealdade, de resto, excelentes bases para um namoro que conduza, justamente, a um casamento feliz, se possível, para sempre.

Num breve resumo da vida de S. Valentim, resulta logo numa análise despretensiosa, sem qualquer manifestação elitista ou hagiográfica, que o padroeiro dos namorados é uma entidade santificada, muito popular e querida no sei da humanidade, independentemente do escalão etário de cada pessoa, porque nunca se é demasiado velho, nem muito novo para as “coisas” do coração, que quantas vezes se sobrepõem à racionalidade calculista.

A história do “Padroeiro dos Namorados” resume-se, neste trabalho, ao seguinte: «Há muitos anos, o Imperador Cláudio pretendia reunir um grande exército pois queria aumentar o império romano. Mas nem todos os homens queriam alistar-se no exército porque já estavam cansados de tantas guerras e de estarem muito tempo sem as suas famílias. O Imperador ficou furioso. Então teve uma ideia: se os homens não fossem casados, nada os impediria de ir para a guerra. Assim decretou que não seriam permitidos mais casamentos. Os jovens acharam aquela lei cruel e injusta.

Um sacerdote chamado Valentim, que também discordava da lei imposta pelo Imperador, decidiu realizar casamentos às escondidas. Uma noite, durante um desses casamentos secretos, ouviram-se passos. O casal que nesse momento estava a casar conseguiu fugir mas o padre foi capturado. Durante o seu cativeiro, jovens passavam pelas janelas da sua prisão e atiravam flores e mensagens onde diziam acreditar também no poder do amor. Entre os jovens que admiravam Valentim, encontrava-se a filha do carcereiro. O pai dela deixou que ela o visitasse na sua cela e ficavam horas a conversar. No dia da sua execução, Valentim deixou uma mensagem à sua amiga agradecendo a sua amizade e lealdade. Dizem que essa mensagem foi o início do costume de trocar mensagens de amizade no dia de São Valentim, celebrado no dia da sua morte, a 14 de Fevereiro do ano 269.» (Disponível em http://www.cybertic.net/images/Hotpotatoes/respostatextos_multipla/saovalentim/saovalentimjogo1.htm, consultado em 20.01.2013).

Namorar, amar, casar, estimar, cuidar, são atitudes e sentimentos que não têm idade e ninguém pode provar que uma amizade, dita tardia, sentida, vivida, oferecida por uma pessoa sénior, seja menos intensa, menos verdadeira e menos sólida do que esse mesmo sentimento, experienciado aos vinte ou trinta anos porque, em boa verdade, há valores, sentimentos e emoções que vivenciados ao longo da vida, poderão ter exuberâncias, causas e consequências diferentes e, cientificamente, parece que ainda não há conclusões sobre qual a faixa etária em que aquelas atitudes e sentimentos são mais autênticos e sólidos.

Partindo-se do princípio de que o namoro poderá ser um período de aprofundamento de uma amizade, ainda na sua fase embrionária, com o objetivo de estreitar o relacionamento, conhecimento mútuo do casal, projetos que serão comuns aos dois e, eventualmente, a união matrimonial, então será necessário que os futuros cônjuges se abram plenamente um ao outro, que confiem, que consolidem os seus propósitos, para estarem preparados para constituírem uma família, iniciarem uma vida a dois, com todas as responsabilidades inerentes.

O namoro, tendo por objetivo projetos sérios, de constituição de família será bem diferente do namoro de ocasião, que visa apenas a conquista fácil, a posse e fruição do corpo, para prazeres erótico/sexuais, enquanto nenhuma das partes se saturar da outra, porque onde não existe amizade sincera, o amor, muito dificilmente, surgirá e vencerá. Importa, por isso mesmo, nesta breve reflexão, dedicada, primeiramente, ao dia dos namorados, abordar o namoro na perspectiva de constituição de uma família honrada, respeitada, em que os futuros cônjuges, para além de se amarem, comportam-se com respeito, consideração, estima e confiança na fidelidade um do outro para, de seguida, abordar o namoro a partir de uma amizade sincera, que se transformará num expoente mais elevado.

Na perspectiva do casamento, o namoro é um período de conhecimento recíproco, de confissão, de gestos, desejos, sucessos, fracassos no passado, portanto e por um lado: «Manter seu namoro moralmente limpo dá evidência clara de que você tem autocontrolo e que o interesse altruísta no bem-estar do outro está acima de seus próprios desejos» e, por outro lado: «O namoro honroso inclui também a comunicação honesta. À medida que seu namoro se encaminha para o casamento, certos assuntos terão de ser considerados francamente. (…) Além disso, é muito justo revelar coisas, talvez do passado um do outro que possam afetar o casamento.» (Sociedade Torre de Vigia de Bíblias e Trados, 1996:24-25)

Culturalmente, em certas sociedades, entre o namoro e o casamento, haverá um outro período em que o casal de namorados experiencia uma nova vivência, que tradicionalmente se pode designar por noivado. Acredita-se que este ciclo já é a antecâmara do casamento, em que se acertam pormenores, se confidenciam situações, se afirmam e clarificam desejos. Também nesta época se deve consolidar o conhecimento recíproco, sem sombras, sem passados duvidosos. É o tempo de tudo clarificar, definitiva e assumidamente.

O noivado é, portanto, o primeiro passo para o casamento e, nesse sentido, é necessário que seja encarado como uma espécie de “ensaio geral”, de resto, ainda  em relação ao noivado admite-se que: «Há quem imagine que vem a ser um jogo romântico ou um passatempo divertido, como qualquer outro, ou uma vaga e ‘sentimentaloide’ aventura para satisfazer a descoberta do coração que se abre para um mundo desconhecido. Nada disso merece o qualificativo de noivado. O que entendemos aqui por noivado é o trato particular, assíduo e sério de um jovem com uma jovem que normalmente costuma acabar em casamento.» (GUERRERO, 1971:31).

Estipulou-se para os namorados um determinado percurso, que culminaria numa situação que, felizmente, ainda é desejada por muitas pessoas, certamente jovens, mas não só, porque se tem entendido o casamento como mais um patamar para a felicidade, para a família, para a responsabilidade conjugal, para a fundamentação da sociedade. Mas nem todos os namoros e noivados se consolidam no casamento, porque uma outra consequência também é possível: a ruptura, quantas vezes com especial dramatismo e violência, ao ponto de se verificar um desfecho fatal, para ambos ou para um dos namorados. Eventualmente, não terá havido total abertura, lealdade e reciprocidade.

É interessante, agora, abordar-se o namoro na perspetiva da amizade íntima, entre duas pessoas, que ao longo de um relacionamento geram uma simpatia salutar, que depois se transforma numa amizade sincera e, finalmente, surge o verdadeiro “Amor-de-Amigo”. Aqui já se pode aceitar, perfeitamente, sem qualquer receio, e neste contexto muito especial, que: «Amar não é apoderar-se egoisticamente. É viver uma atitude de dádiva desinteressada. Amar é também receber. Humildemente, agradecidamente. E isto, às vezes, é mais difícil do que dar. O amor é o intercâmbio de dois seres em tudo. Amar é compreender. Amar é sentir-se responsável pelo outro e conduzi-lo desinteressadamente. É abrir-se ao serviço do outro.» (Ibid.:22-23).

Todos os anos, a catorze de Fevereiro celebra-se o “Dia dos Namorados” e também, todos os anos, a trinta de Julho se comemora o “Dia do Amigo”, da amizade. A conjugação das duas figuras: namorado e amigo, pode resultar numa nova situação intermédia, cujos sentimentos até se enquadram, entre o namoro e o casamento, que não são incompatíveis com os valores do matrimónio, porque este novo sentimento tem a suportá-lo: amor, fidelidade, entrega, respeito, compreensão, tolerância, solidariedade, reciprocidade, companheirismo, doação.

Aceite-se, portanto, sem reservas nem preconceitos, uma nova noção  de namorados, na perspetiva de uma amizade sincera, solidária, leal, recíproca, em que tal afeição se transforma num genuíno “Amor-de-Amigo”, que realmente é possível cultivar e consolidar e, com base neste sentimento tão nobre: regular as relações de quem realmente se quer muito bem; de quem se gosta sem reservas; com respeito pela honra e dignidade pelo outro; de quem nos orgulhamos e com quem partilhamos alegrias e tristezas, vitórias e derrotas, projetos, desejos, aflições na vida, dificuldades familiares, profissionais e sociais.

Este dia dos namorados, que S. Valentim, pelo seu exemplo, apadrinha, é, perfeitamente, extensível aos amigos que se enamoram no âmbito de uma amizade íntima, em que o respeito prevalece, a consideração, a estima, o carinho, o estar do lado do amigo, incondicionalmente, em quaisquer circunstâncias, é o denominador comum aos dois e o limite para este amor muito especial é balizado pelo respeito e pela felicidade do outro.

Ser e ter um amigo, nestas condições, é maravilhoso. Pode-se afirmar que um amigo assim é um privilégio que não está acessível a qualquer pessoa, é uma dádiva divina, que se deve preservar, com total carinho, preocupações pelo bem-estar desse amigo, cumulando-o, sempre de atenções, gentilezas, amabilidades sem fim. É, comparativamente com muitas situações de namorados e matrimónios, muito mais sólido, mais genuíno, mais sublime.

É pertinente, incluir aqui, algumas frases, tão célebres quanto dignas de reflexão, a propósito da amizade e dos amigos: «Quando defendemos os nossos amigos, justificamos a nossa amizade.» (MARQUÊS DE MARICÁ); «Para conhecermos os amigos é necessário passar pelo sucesso e pela desgraça. No sucesso, verificamos a quantidade e, na desgraça, a qualidade.» (CONFÚCIO); «A amizade é uma predisposição recíproca que torna dois seres igualmente ciosos da felicidade um do outro.» (PLATÃO); «Ter muitos amigos é não ter nenhum.» (ARISTÓTELES); «Para conseguir a amizade de uma pessoa digna é preciso desenvolvermos em nós mesmos as qualidades que naquela admiramos.» (SÓCRATES); «Dos amores humanos, o menos egoísta, o mais puro e desinteressado é o amor da amizade.» (CÍCERO); «A verdadeira amizade é aquela que nos permite falar, ao amigo, de todos os seus defeitos e de todas as nossas qualidades.» (MILLÔR FERNANDES).

É fundamental e condição indispensável para o reforço de uma felicidade, oriunda da família nuclear: esposos e filhos, cultivar-se um “Amor-de-Amigo” pelo qual se possa ser, ainda mais feliz, porque a felicidade, não tendo medida nem dimensão, ela é sentida e tanto pode ser prejudicada, por fatores externos à família, como beneficiada e ampliada, justamente, pelo amor que os verdadeiros amigos se dedicam reciprocamente.

O sentimento que se designa por “Amor-de-Amigo” não é nenhuma traição ao matrimónio, não constitui nenhuma infidelidade por parte de quem o dá e recebe e, neste “Amor-de-Amigo” os comportamentos e gestos carinhosos só vêm demonstrar o quanto se pode gostar de uma pessoa, na qual se confia, com quem se deseja partilhar, desabafar, encostar a cabeça num ombro amigo, saber que se tem um rumo para um porto seguro, em quaisquer circunstâncias.

O dia dos namorados também se pode aplicar a todas as pessoas de quem verdadeiramente se gosta, de quem se recebe permanentes manifestações de amizade, de consideração, de estima, de ajuda, enfim, de genuíno, inédito e infalsificável “Amor-de-Amigo”. Adapte-se o dia dos namorados, também, aos “Amigos, Carinhosamente Enamorados”, porque os sentimentos destes, em certas situações, até se podem considerar bem melhores do que aqueles. Em bom rigor vale muito mais um amigo solidário, leal, companheiro, carinhoso e cuidador do que alguns namorados, noivos ou cônjuges, apenas interessados numa conquista e/ou manutenção de comportamentos meramente sexuais, onde o corpo de um não passa, de facto, de um objeto de prazer, quantas vezes efémero, em função da vitalidade do outro.

Entretanto, o percurso da vida ensinará, numa fase mais adiantada, no período em que os valores, princípios, sentimentos e emoções se destacam sem complexos, estão consolidados e proporcionam momentos de autêntica felicidade, um amor nobre que prevalece, além dos aspetos físicos, dos prazeres eróticos passados, quantas vezes esquecidos ou, então, esgrimidos como troféus de caça mansa e indefesa, de pessoas desorientadas na vida.

É nesta perspectiva que também se pode celebrar este dia, como sendo o de um outro tipo de namorados, que aqui se conceptualiza como sendo o dia dos “Amigos, Carinhosamente Enamorados”, cujo objetivo final será sempre uma amizade íntima, no seu sentido mais notável, mais eloquente, puro, que por sua vez proporcionará legítima felicidade, que será acrescida à felicidade que, por via do casamento, por exemplo, já se adquiriu ou, então, uma felicidade que no matrimónio se chegou a ganhar ou já se perdeu.

A felicidade complementar, ou paralela, que se pode obter através do “Amor-de-Amigo” é um direito pelo qual todas as pessoas podem (e devem) lutar, procurando uma amizade sincera, incondicional e duradoura, de uma pessoa que se deseja, que seja sempre nossa verdadeira amiga, que nos dê provas permanentes do seu sincero “Amor-de-Amigo”.

Fica aqui, portanto, um novo conceito de namorados, numa dimensão nobre, consolidado pelos valores da solidariedade, da amizade, da lealdade, da cumplicidade, da confiança, da reciprocidade, do companheirismo. Namorados para um “casamento” de amizade íntima, de confidencialidade, de ombro amigo, que navega para o porto seguro da estabilidade deste sentimento tão necessário, quanto maravilhoso e supremo.

Enalteçam-se os “Amigos, Carinhosamente Enamorados”, para além da família, do casamento, da sexualidade, dos “amigos de ocasião”. Defendam-se amigos para a proteção recíproca, para a entre-ajuda, para a consolidação do sentimento mais puro, mais desejado, como é o “Amor-de-Amigo”, que acompanha para todo o sempre quem tem a felicidade de o sentir, de dá-lo e recebê-lo, sem reservas. “Amigos, Carinhosamente Enamorados”, resguardados num cantinho do coração de cada um dos amigos, guardados a sete chaves, para todo o sempre.

Bibliografia.

GUERRERO, José Maria, (1971). O Matrimónio Hoje, à Luz do Vaticano II, Trad. José Luís Mesquita, Braga: Editorial Franciscana.

SOCIEDADE TORRE DE VIGIA DE BÍBLIAS E TRATADOS, (1996). O Segredo de uma Família Feliz, Edição Brasileira, São Paulo: Cesário Langue

Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo

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