Alterações nucleares observáveis ao microscópico óptico preditoras de necrose 

         A célula constitui a unidade básica do ser vivo, e as alterações em sua fisiologia, irão refletir no funcionamento do organismo. Vários componentes estão envolvidos na formação e manutenção celular. Podemos identificar nas células eucariotas dois grandes compartimentos, delimitados pela membrana nuclear, o citoplasma, fora desta, e o núcleo, dentro desta.  O núcleo é a porção da célula responsável por abrigar o material genético celular, que controla todo metabolismo da célula. Além disso o núcleo é responsável pela manutenção  de quase toda informação genética celular, só excluindo-se o DNA mitocondrial, e também controla  ciclo celular. As alterações no núcleo celular são em sua maioria reparadas por um complexo sistema protetor que além de reparar as alterações sofridas durante a divisão celular, também responde por alterações de agentes mutagênicos, que podem induzir a lesões no DNA nuclear.

            O sistema de reparo celular , é um sistema complexo, que pode atuar reparando as lesões sofridas no DNA, evitando assim a ocorrência de aberrações cromossômicas. Esse sistema também ocorre no ciclo celular, conhecido como controle do ciclo celular (checkpoint control), sendo representado por mecanismos que podem parar a progressão do ciclo célula quando alguma anormalidade é detectada . Se ocorrer o reparo a célula retoma o ciclo normalmente, caso não ocorra esse reparo, três destinos são possíveis: a célula tenta novo reparo; segue o ciclo gerando novas células que terão este dano ao seu DNA; morre por apoptose. No caso e dano nuclear exógeno, além da apoptose, pode ocorrer a necrose.

            A necrose é a morte celular em que ocorre em decorrência de injuria celular aguda, onde não há tempo para a célula reparar o dano, ou, optar pela via apoptótica, que gera menos dano local, uma vez que não ativa a resposta infamatória. Ela se refere ao espectro de alterações morfológicas que ocorrem após a morte celular em um tecido vivo resultando, em grande parte, da ação progressiva de enzimas nas células que sofreram uma lesão letal (as células fixadas imediatamente estão mortas, mas não necróticas). Rotineiramente, a necrose é o correspondente macroscópico e histológico da morte celular que ocorre devido a uma lesão exógena irreversível. As células necróticas são incapazes de manter a integridade das membranas e seu conteúdo geralmente extravasa. Isso pode causar inflamação no tecido adjacente.

            Como passo inicial da necrose, a primeira alteração diz respeito ao seu volume, onde obsevaremos um aumento significativo do volume celular, dado por destruição dos compartimentos  membranosos celular, levando a perda da homeostase hidro-eletrolítica. Isto levará ao rompimento da célula despejando seu conteúdo nas células vizinhas, ativando assim a resposta imune, que cursará de forma danosa a essas células, gerando dano tecidual local. A sua aparência morfológica resulta da desnaturação das proteínas intracelulares e da digestão enzimática da célula. As enzimas se originam ou dos lisossomos das próprias células mortas e, neste caso, é denominada de autólise, ou e lisossomos de leucócitos que migram para a região durante o processo inflamatório.

            Sendo assim, o termo necrose se refere a todas as alterações fisiológicas da maquinaria celular, que resultam nas alterações morfológicas que se seguem à morte celular em um tecido ou em órgãos vivos. Dois processos são responsáveis pelas alterações morfológicas básicas da necrose: desnaturação de proteica e digestão enzimática das organelas e de outros componentes do citosol.

            Essas alterações na morfologia celular recebe o nome de necrofanerose e podem ser facilmente observadas no microscópio.  O tempo para necrofanerose varia com o tipo de tecido, temperatura, circunstâncias metabólicas e o método de observação empregado. Por exemplo, ao microscópio óptico, o tempo para necrofanerose é tipicamente de 6 horas. Com o microscópio eletrônico, alterações irreversíveis (ruptura da membrana celular, degeneração das mitocôndrias), são demonstráveis já minutos após a necrose.         

            As células necróticas apresentam um aumento da eosinofilia atribuível, em parte, à perda da basofilia normal causada pelo RNA do citoplasma e, em parte, ao aumento da ligação da eosina às proteínas citoplasmáticas desnaturadas. A célula necrótica pode ter uma aparência vítrea mais homogênea do que as células normais, principalmente devido à perda dos grânulos de glicogênio. Depois que as enzimas digerirem as organelas citoplasmáticas, o citoplasma apresenta vacúolos e um aspecto corroído. Finalmente,  pode ocorrer calcificação da célula morta. As células mortas podem, eventualmente, ser substituídas por grandes massas de fosfolipídios, chamadas de figuras de mielina. Esses precipitados de fosfolipídios são geralmente fagocitados por outras células ou são posteriormente degradados em ácidos graxos; a calcificação de tais resíduos de ácidos graxos resulta na saponificação.

            As modificação ocorridas no citoplasma são oriundas das alterações nucleares, que levam a perda da função celular, com consequente degeneração da mesma. Essas modificações citoplasmáticas observadas ao microscópio óptico (sendo visíveis mais tardiamente) consistem na presença de granulações e espaços irregulares no citoplasma. Este torna-se opaco, grosseiro, podendo estar rompida a membrana citoplasmática. Intensa eosinofilia é característica, decorrente de alterações lisossomais e mitocondriais.

            As alterações nucleares podem ser vistas, assim como as demais, com a utilização da microscopia ótica, sendo elas um forte marcador da morte celular. Ao falarmos dessas alterações deve-se ter noção dos elementos que compõe o núcleo celular. O primeiro deles, é a membrana celular, que possui a função de delimitar o espaço nuclear e selecionar o intercambio de materiais entre o compartimento nuclear e citoplasmático. Alterações em sua constituição e formato, são um forte indicativo de morte celular iminente.

            Na membrana nuclear podemos encontrar tanto a cariorrexe como a cariólise. Na cariorrexe temos a cromatina adquirindo uma distribuição irregular, podendo se acumular em grumos na membrana nuclear, havendo perda dos limites nucleares. Com a degeneração adicional, o núcleo torna-se fragmentado em várias diminutas partículas que representam pedaços do material nuclear degenerado, representando a distribuição irregular da cromatina. Já na cariólise temos uma dissolução da comatina com perda da coloração do núcleo, e o mesmo desaparece completamente, o que também é incompatível com a sobrevivência da célula. Por fim temos picnose que é representada pela diminuição do volume nuclear, que se contrai, tornando-se hipercorado e tendo sua cromatina condensada. Em consequência, o núcleo reduz seu volume e aparece hipercorado. Este tipo de  alteração é mais característica da apoptose. 

             Uma outra alteração na visualização da membrana nuclear, que notadamente representa o desfecho das alterações supracitadas, é a ausência nuclear, consequência da total lise nuclear, onde observamos na microscopia uma célula, que deveria ser nucleada, com formato anucleada, devido  a lesão intensa do núcleo.

            As alterações  envolvendo o compartimento nuclear são alterações graves para a célula, podendo, em última análise levar a sua morte. A identificação e elucidação dessas alterações são de suma importância para reconhecer os eventos futuros na vida celular, bem como auxiliar no entendimento de certas entidades patológicas, que ocorrem com os tecidos e órgãos. Por isso seu estudo e compreensão é de suma importância para várias áreas das ciências biológicas e biomédicas.    

 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 

1. MALUF, S. W.; RIEGEL, M. Citogenética Humana. Porto Alegre: Artmed,  2011. 334 p.

2. ALBERTS, B.; et al. Fundamentos da Biologia Celular. 2 ed. Porto Alegre, 2006.  740 p.

3.MIRANDA, S. A. DE PAULA. Micronúcleo e outras alterações nucleares: um teste de predição para o câncer bucal. Disponível em: http://www.repositorio.ufc.br:8080/ri/bitstream/123456789/1882/1/2006_dis_maspmiranda.pdf. Acesso em: 16  mai. 2013, às 09:00:00. 

4. TEIXEIRA, M. C. F. A célula - unidade na constituição dos seres vivos. Disponível em: http://repositorio.utad.pt/handle/10348/202.  Acesso em: 10 mai. 2013,  as 09:05:00. 

5. BATISTA, A.; et al. Herpes Simplex 2 e citomegalovírus. Efeitos citopáticos vs. mecanismos de infecção. Revista brasileira de análises clínicas, vol: 42, nº4, p.265-267. 2010.