NOÇÕES INTRODUTÓRIAS.

            A origem etimológica do termo fidúcia está na confiança (considere), que é o ato de quem espera que o outro se conduza como o desejado, pois tem fé ( fidúcia) no cumprimento da palavra empenhada.

            A propriedade fiduciária adentrou o rol de direitos reais do art. 1.225 do código civil de 2002. Em principio, o dispositivo não trata de referencia a ela. Sobeja implícita no inciso I, como uma espécie de propriedade resolúvel. Antes do advento do código civil, era tratada como alienação fiduciária, expressão que agora só reserva ao tipo contratual, mas não ao direito real de garantia que se forma posteriormente pelo registro.

            Não podemos negar o fato de a propriedade fiduciária ser verdadeiro direito real de garantia, assim como hipoteca e penhor. Contudo, tratando-se de uma nova roupagem de direito de propriedade, assim, estuda-se tal modelo jurídico ao lado das demais formas diferenciadas de propriedade, como a propriedade resolúvel, aparente e superficiária.

            Com a incorporação da disciplina material da propriedade fiduciária pelos artigos 1.361 a 1.368 do código civil, o decreto- lei de nº 911/69, não foi de todo revogado, pois normatização instrumental do processo de busca e apreensão lá se mantém presente, tendo, porém, sofrido relevantes alterações pela lei nº 10.931/04.

            O artigo 58 da lei nº 10.931/04 imprimiu algumas alterações ao código civil, especificamente em sede de propriedade fiduciária.  Tal lei, incorporou ao código civil o art. 1.368-A, pelo qual “as demais espécies de propriedade fiduciária ou de titularidade fiduciária submetem-se a disciplina especifica das respectivas leis especiais, somente se aplicando as disposições deste código naquilo que não for incompatível com a legislação especial”.

            Podemos dizer, que este aditivo, se apresenta com grande relevo, pois realça a necessidade de o interprete manter o foco na lei nº 4.728/65 ao operar com a alienação fiduciária no âmbito do mercado financeiro e de capitais (com as alterações dadas pelo art. 57 da lei nº 10.931/04).

 

 

CONCEITO E NATUREZA JURÍDICA

 

            Negocio jurídico bilateral, perfaz-se a alienação fiduciária quando o credor fiduciário adquire a propriedade resolúvel e a posse indireta de bem móvel ( excepcionalmente de imóvel), em garantia de financiamento efetuado pelo devedor alienante  que se mantém na posse direta da coisa, resolvendo-se o direito do credor fiduciário com o posterior  adimplemento da divida garantida.

            O objetivo da propriedade fiduciária é garantir uma obrigação assumida pelo alienante, em prol do adquirente. O credor fiduciário converte-se automaticamente em proprietário, tendo no valor do bem dado em garantia o eventual numerário para satisfazer na hipótese de inadimplemento do debito pelo devedor fiduciante.

             No código civil não será a confiança (fidúcia) que determinará o retorno da propriedade ao devedor, mas a própria cláusula inserida no negocio jurídico originário, que impõe a obrigação do credor restituir a coisa ao tempo do adimplemento. Por isto, o artigo 1.361, caput, do código civil é explicito ao analtercer a precípua função de garantia de propriedade fiduciária. 

            A confiança é a base e substrato de qualquer relação obrigacional em sua concepção finalista de processo. Ou seja, o negocio jurídico de alienação fiduciária é um conjunto de atos coordenados que, desde a fase pré-contratual até a fase pos-contratual requer que os contratantes atuem com lealdade e cooperação, a fim de que não sejam lesadas as legitimas expectativas comuns, concretizadas pelo principio da boa fé objetiva ( art.422 do CC).

            Sujeito ativo do negocio jurídico é o fiduciário (aquele em que se deposita confiança). O devedor é o representado pela pessoa natural ou jurídica que busca o credito, é o fiduciante( aquele que confia) também, identificado como alienante, possuidor direto  ou simplesmente, devedor. Em principio, o fiduciante é o proprietário da coisa, que cuidará de aliená-la ao credor, surgindo a propriedade fiduciária. Entretanto, o  § 3º, do  artigo. 1361, do código civil, permite que o negocio jurídico seja encetado pelas partes, com a concessão de credito ajustado, mesmo que o devedor ainda não tenha adquirido a propriedade da coisa, bastando que em momento superveniente se promova tal aquisição, que produzirá efeitos retroativos a data da alienação fiduciária, como se desde o dia em que concretizou o devedor alienante já fosse o dono.

            O artigo 1.368 do CC é inovador, tendo em vista que concede ao terceiro interessado ou não a possibilidade se sub-rogação no credito, sendo bastante que proceda ao pagamento do debito do fiduciante em prol do credor fiduciário. Trata-se de regra excepcional no sistema, pois defere a sub-rogação legal, mesmo em prol de um terceiro não interessado, para o qual, em principio,l a teoria geral das obrigações só autorizaria o direito de reembolso, sem os privilégios que gozava o credor originário.

            O objeto do contrato de alienação fiduciária será um bem móvel, por natureza durável e inconsumível. No modelo de propriedade  fiduciária do código civil   só se insere o bem infungível, que não pode ser substituído por outro, da mesma espécie, qualidade ou quantidade. A infugibilidade resultará da  intervenção dos contratantes  em tornar infungíveis certas coisas naturalmente fungíveis. Assim, o bem será identificado no instrumento, no interesse do credor que visa a resguardar-se de futuras dificuldades em eventual ação de busca e apreensão. A própria volatidade dos bens fungíveis impede que eles sirvam ao propósito de garantia, sendo certo que serão mais bem regulados pela disciplina do mutuo, como uma espécie de deposito irregular.  

            A propriedade fiduciária sobre bens imóveis, bens fungíveis e demais espécies de titularidade fiduciária submetem-se a disciplina especifica das respectivas leis especiais, somente se aplicando o código civil naquilo que não for incompatível com a legislação especial. Assim, é viável a cessão fiduciária de direitos sobre coisas moveis como títulos de credito. A alienação fiduciária do sistema financeiro imobiliário recai sobre bens imóveis. De acordo com a nova redação conferida ao § 3º, doa artigo. 66 da lei de nº 4.728/65, é permitida a alienação fiduciária de bens fungíveis e a cessão fiduciária de direitos sobre coisas moveis, bem como, títulos de credito. 

            Nada impede que a propriedade fiduciária incida sobre bens que já pertenciam anteriormente ao próprio devedor, consoante a dicção da sumula nº 28 do superior tribunal de justiça. Normalmente, o devedor utiliza o referido negocio jurídico quando necessita de um aporte imediato de capital, mas não pode prescindir da posse imediata do bem que antes lhe pertencia.

            Em nosso sistema, os contratos não possuem eficácia real, sendo indispensável que se proceda a tradição e ao registro, respectivamente, como modos de transmissão da propriedade mobiliaria e imobiliária. O contrato de alienação é apenas o titulo, a causa da futura aquisição da propriedade. Mas o código civil- que restringe este direito real aos bens moveis infungíveis, exige que o titulo seja seguido o modo de aquisição especifico, que na hipótese é a tradição da coisa móvel, pelo procedimento  descrito no artigo 1.361, § 1º, do código civil.

            Os contratos de alienação fiduciária estão sujeitos ao registro no  cartório de oficio de títulos e documentos do domicilio do devedor. Se o contrato não for registrado, haverá mero direito de credito. Ocorre que a conjunção alternativa ou equivocadamente inserida no art. 1.361, § 1º, do CC, transmite a falsa idéia de que em matéria de veículos seria dispensado  o registro no cartório de títulos e documentos, posto suficiente a anotação no CRV- certificado de Registro de veículos.

            É inadmissível o êxito da pretensão reivindicatória contra o terceiro de boa-fé. Isso, decorre da impossibilidade pratica de o adquirente pesquisar perante o cartório de títulos e documentos a situação do veiculo, sendo mais pratico que tal consulta seja obtida do DETRAN.  

 

CARACTERISTICAS DA PROPRIEDADE FIDUCIÁRIA.

 

Art. 1361 Considera-se fiduciária a propriedade resolúvel de coisa móvel infungível que o devedor, com o escopo da garantia, transfere ao credor.

A alienação fiduciária passa a ser propriedade fiduciária quando a registra, porque passa a ter eficácia de direito real, vira direito real chamado propriedade fiduciária.

No C.C propriedade fiduciária além de ser em coisa móvel devera ser infungível. Pois como é que uma pessoa vai dar em garantia algo que seja fungível, pois, não há possibilidade de conservação da coisa.

Isso ocorre para que haja garantia da instituição financeira. Como é que a instituição financeira vai ter garantia que você vai pagar alguma coisa se o bem é fungível e ele pode ser depreciado. Por isso é que a coisa tem que ser infungível.

A vantagem da alienação fiduciária é que o bem da alienação não pode ser penhorado por outros credores, somente pelo credor ao qual ele foi alienado.

 

DAS CARACTERÍSTICA DA PROPRIEDADE FIDUCIÁRIA .

 

a)     desdobramento da posse;

b)     constitutivo possessório

c)     propriedade resolúvel

d)     patrimônio de afetação, ou seja, são bens que não estão no patrimônio geral do devedor, ele pertence ao devedor, estão no nome do devedor, mas formam um patrimônio separado, imune a ação dos credores.

 

BUSCA E APREENSÃO

 

A busca e apreensão tem a natureza de demanda reivindicatória. É exatamente isso que uma instituição financeira faz. Ela ajuíza a ação de busca e apreensão pelo procedimento do decreto-lei 991/69, justamente para reaver aquele bem, contra quem injustamente o possua, ou seja, a ação de busca e apreensão é o modo em que a pessoa tem em reaver o bem contra quem injustamente o possua.

Para que haja a busca e apreensão o fiduciário, por ex: Eu tinha que pagar a prestação dia 05/10/2011, e não o fiz, eu automaticamente cai em mora, quando acontece de eu cair em mora minha posse já é injusta, art. 397 do C.C. Agora para que a instituição financeira consiga a liminar, se no caso, o devedor for notificado pelo cartório de títulos e documentos, comprovando o protesto cambiário. Apesar de o devedor já esta em mora, ele precisar ser protestado, pois a mora esta desde o dia do vencimento, este protesto é para comprovar a mora, ou seja, caráter comprobatório, só para comprovar. Depois disso a instituição financeira consegue a liminar, e o devedor tem prazo de cinco dias para o pagamento integral da divida. Caso não o faça e não tem interesse em pagar, este sofrera a busca e apreensão.

 

 

A PRISÃO DO DEPOSITÁRIO INFIEL E A CONSTITUIÇÃO FEDERAL

 

Se a liminar de busca e apreensão for deferida e o bem alienado não seja encontrado ou fora da posse do devedor, ocorrerá a ação de deposito, com o objetivo de exigir alternadamente, a restituição do bem ou a consignação do equivalente em dinheiro ao saldo devedor em aberto, além da simples contestação.

O devedor deverá ser citado para defender-se da nova ação. Se a pretensão for julgada procedente, o novo processo é dispensado, porque a sentença é executiva lato sensu. A prisão civil do depositário, a partir do transitado em julgado, poderá ser prevista caso o autor tenha formulado o pedido expressamente, tendo como pena máxima um ano. Também será licito ao credor ajuizar execução por quantia certa para haver saldo remanescente que a sentença reconheceu-lhe.

A ação de depósito com a incidência de prisão civil só ocorre em casos em que o depositário recebe a coisa para guardar, conservar e restituir.

Depósito atípico da alienação fiduciária é a mera garantia do credor, enquanto isso, o contrato de depósito clássico visa à custodia do objeto do devedor, com posterior e imprescindível devolução da coisa.

Neste caso o depositário retém a coisa em virtude da compra à prestação, com animo de definitividade, pois pretende adquirir o bem, à medida que o pagamento final concede-lhe o domínio e resolve a propriedade do credor.

  Portanto, podemos concluir que a prisão seria pela divida, tratando-se de emprego de coerção pessoal como meio de constranger o devedor ao pagamento do debito.

A responsabilidade do devedor incide sobre o seu patrimônio, garantia do credor. Ultrapassar isto, interfere na liberdade do ser humano. Entretanto o STF entende pela viabilidade da prisão, tendo em vista o art. 5º da CF/88, LXVII que aduz:

“não haverá prisão civil por dívida, salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e a do depositário infiel”

Neste caso, o Excelso Pretório proíbe a prisão civil por divida, mas não a do depositário.

Apesar disso, o entendimento da suprema corte era digno de reparos, tendo em vista que foram utilizadas a Emenda Constitucional nº 45/04, as convenções internacionais dos direitos humanos e direito local, além de jurisprudências do STJ, o STF reconheceu, finalmente, a incompatibilidade da prisão civil do devedor fiduciante com a orientação constitucional.

 

A PROPRIEDADE FIDUCIÁRIA DE BENS IMÓVEIS

 

A lei 9.514/97 instituiu a alienação fiduciária de coisa imóvel, mediante registro no oficio imobiliário, sendo aquele pelo qual o devedor, ou fiduciante, com o escopo de garantia, contrata a transferência ao credor, ou fiduciário, da propriedade resolúvel da coisa imóvel.

O sistema consiste na transmissão da propriedade do devedor ao credor como garantia, ou seja, o credor, não deseja a coisa, mas investe na condição de seu titular temporário, como forma de pressionar o devedor a pagar o financiamento de debito. Uma vez pago, consolida-se definitivamente a propriedade com o devedor fiduciante. E é concedido um prazo de 30 dias ao credor para emitir um termo de quitação em prol do devedor, para fins de cancelamento do registro da propriedade fiduciária.

Se a inadimplência for constatada, será simplificado o procedimento extrajudicial de retomada e desapossamento do bem pelo credor, pela via extrajudicial, com conseqüente venda do bem em leilão no prazo de 30 dias a contar da consolidação da propriedade pelo credor. Em seguida, o credor deverá promover o leilão no prazo Maximo de 30 dias, a contar do registro que efetivou a consolidação. Em caso de resistência á desocupação do imóvel, o credor fiduciário que já consolidou a propriedade para si, poderá manejar ação de reintegração de posse, sendo deferida liminarmente para desocupação em 60 dias.

A lei 9.214/97 procurou atender as demandas decorrentes da evolução social, estimulando o financiamento imobiliário mediante a implantação de maiores garantias pela via fidúcia.

 

A PROPRIEDADE FIDUCIÁRIA E O ARRENDAMENTO MERCANTIL

 

O código civil de 2002 não disciplinou o arrendamento mercantil, ao contrario do que ocorreu com a propriedade fiduciária.

O leasing é o contrato pelo qual uma pessoal natural ou jurídica, desejando utilizar determinado equipamento ou certo imóvel, procede para que uma instituição financeira adquira o referido bem e alugue-o por prazo certo, ficando estabelecido que finda a locação, haverá a tríplice opção de devolução, renovação ou aquisição do bem por preço residual.

O financiador é uma empresa intermediaria. A principal modalidade de arrendamento mercantil no país é o leasing financeiro, seja para bens moveis ou imóveis. O arrendamento mercantil se assemelha a propriedade fiduciária pois em ambos os modelos há desdobramento da posse direta, em favor do usuário, e indireta em favor do proprietário.

No arrendamento mercantil não se cogita de propriedade resolúvel, pois as prestações sucessivas pagas pelo arrendatário possuem titulo de locação.Na propriedade fiduciária, o fiduciante amortiza o debito a cada prestação, resgatando o domínio, sem que lhe seja licito impor qualquer resíduo ao tempo do adimplemento, o que não acontece no arrendamento mercantil.

               A súmula nº 293 aduz que “A cobrança antecipada do valor residual garantido (VRG) não descaracteriza o contrato de arrendamento mercantil.

               Há também o leasing operacional, mas não é aceito no Brasil, e o lease back.

 

A PROPRIEDADE FIDUCIÁRIA E RESERVA DE DOMÍNIO

 

               A modalidade da reserva de domínio consiste em pacto adjeto a compra e venda em que o vendedor mantém consigo a propriedade da coisa móvel sob a condição suspensiva do pagamento integral das prestações pelo comprador. Com o adimplemento da ultima prestação o comprador obtem o domínio da coisa.

               A reserva de domínio e a propriedade fiduciária tem em comum o desdobramento da posse e a propriedade condicional,bem como o desiderato de propiciar a circulação massiva de propriedade mobiliaria.

               A propriedade fiduciária gera a imediata transferência da propriedade,na reserva de domínio a passagem da propriedade fica sujeita  a uma condição suspensiva.

               Há previsão legal de propriedade fiduciária imobiliária, sendo que reserva de domínio abrange apenas bens moveis.

               A propriedade fiduciária anteriormente era reservada a instituições financeiras, porem não se opera mais ressalvas quanto a legitimidade para o negocio, aproximando-se mais da reserva de domínio, que é aberta para qualquer pessoa, física ou jurídica.

 

BIBLIOGRAFIA
CHAVES DE FARIA, Cristiano/ ROSENVALD, Nelson. Direito Reais 6º edição.