LETRAMENTO E ALFABETIZAÇÃO

O conceito de alfabetização vem sendo discutido sob novas perspectivas a partir da segunda metade dos anos 80. Essas mudanças advindas das diferentes áreas e atividades sociais vêm exigindo novos desempenhos em leitura e escrita. Até a década de 1940, definia-se um indivíduo como analfabeto ou alfabetizado se ele soubesse ou não assinar o próprio nome. A partir das décadas seguintes, alfabetizado era a pessoa que sabia ler e escrever um bilhete simples.

Hoje os tempos são outros, a comunicação entre as pessoas e o mundo mudou já não se concebe esse tipo de conceito então um novo termo e uma nova área de estudo e trabalho foram criados para atender às necessidades sociais: o letramento, fenômeno que deve ser objeto de ensino na escola, devendo ser desenvolvido como um processo específico e indissociado da alfabetização e seu conceito é amplo e complexo.

Pode-se definir letramento como um conjunto de práticas sociais que usam a leitura e a escrita, enquanto que a escrita é o sistema simbólico (representação de ideias) e a leitura a tecnologia (representação gráfica organizada e organizável das ideias).

Por práticas sociais entendemos todas as formas de uso da escrita, encontradas nos filmes, cartas, livros de oração, jornais, livros literários, textos de outdoors, telegramas, e-mails, receitas culinárias, médicas, contas de água, de luz e assim por diante. Por práticas sociais entendemos ainda, o uso do sistema tecnológico.

Letramento, então é o resultado da ação de ensinar ou aprender a ler e escrever: é estado ou a condição que adquire um grupo social ou um indivíduo como consequência de ter se apropriado da escrita.

A alfabetização deve ser compreendida na sua especificidade. Alfabetizado é o cidadão capaz de codificar e decodificar discursos orais e escritos e também de, na escrita, representar ideias e apresentá-las articuladamente, utilizando palavras escritas segundo as normas da Língua Portuguesa. Não é suficiente que o aluno registre as relações letra-som, mas é necessário que ele as faça escrevendo palavras corretamente. Na leitura o cidadão deve ser capaz de sonorizar os símbolos e dar-lhes significado.

As crianças autoras de seu processo de aprendizagem da linguagem e escrita são trabalhadoras ativas sobre a língua e juntam a este conhecimento o de outras pessoas para construírem seus próprios.

ORIGEM DA PALAVRA LETRAMENTO

Onde, como e porque foi criado este termo?

Letramento é uma tradução para o português de palavra inglesa "literacy" que pode ser traduzida como a condição de ser letrado.

Constatou-se que uma das primeiras menções feitas deste termo ocorreu em "No mundo da escrita: uma perspectiva psicolinguística" (1986) por Mary A. Kato, segundo Magda Soares. Foram feitas buscas em dicionários da Língua Portuguesa quanto ao significado da palavra, no dicionário "Aurélio" (1999) e "Michaelis" (1998), por exemplo, nada foi encontrado, bem como também, não foi encontrado o verbo "letrar", porém, o Dicionário Contemporâneo da Língua Portuguesa de Caldas Aulete, com edição constando de mais de um século, contém o verbete com simples significado de "escrita". Magda ressalta ainda que o mesmo dicionário classifique o vocábulo como "antiquado". Podemos, portanto dizer que a palavra letramento e o conceito recentemente entraram no nosso vocabulário.

Nos Estados Unidos e na Inglaterra, embora a palavra "literacy" já constasse no dicionário desde o final do século XIX, foi nos anos 80, que o fato tornou-se foco de atenção e de estudos nas áreas da educação e da linguagem, onde há grande preocupação com o que consideram um baixo nível de literacy da população, pois periodicamente, realizam-se testes nacionais para avaliar as habilidades de leitura e escrita da população adulta e orientar políticas de superação do problema.

Na França, os franceses diferenciam "illettrisme" muito claramente "illettrisme de analphabétisme". Este último é considerado um problema já vencido com exceção para os imigrantes analfabetos de língua francesa. A palavra "illettrisme" (letramento) surge como problema recente da população francesa, pois a palavra só entrou no dicionário nos anos 80. Em Portugal é recente a preocupação com a questão do letramento, que lá ganhou a denominação de "literacia", numa tradução mais próxima da palavra literacy do inglês.

No Brasil não se trata propriamente de aparecimento de um novo conceito, mas do reconhecimento de um fenômeno que, por não ter, até então, significado social, permanecia submerso.

Desde os tempos do Brasil Colônia, e até muito recentemente, o problema que enfrentávamos em relação à cultura escrita era o analfabetismo, o grande número de pessoas que não sabiam ler e escrever. Assim a palavra de ordem era alfabetizar. Esse problema foi, nas últimas décadas, relativamente superado, vencido de forma pelo menos razoável. Mas a preocupação com o letramento passou a ter grande presença na escola, ainda que sem o reconhecimento e o uso da palavra, traduzido em ações pedagógicas de reorganização do ensinar e reformulação dos métodos e modos de ensinar.

Mais recentemente, a LDB/1996 criou os ciclos básicos na organização do ensino. Isso significa que pelo menos no que se refere ao ciclo inicial, o sistema de ensino e as escolas passaram a reconhecer que alfabetização, entendida apenas como a aprendizagem da mecânica do ler e escrever e que se pretendia que fossem feito em um ano de escolaridade, nas chamadas "classes se alfabetização", verificou-se ser insuficiente, pois além de aprender a ler e escrever, a criança deve ser levada ao domínio das práticas sociais de leitura e escrita.

Os procedimentos didáticos de alfabetização acompanham essa nova concepção: os antigos métodos e as antigas cartilhas, baseados no ensino de uma mecânica transposição da forma sonora da fala à forma gráfica da escrita, são substituídas por procedimentos que levam as crianças a conviver, experimentar e dominar as práticas de leitura e de escrita que circulam na nossa sociedade tão centrada na escrita.

"A cada momento, multiplicam-se as demandas por práticas de leitura e escrita, não só na chamada cultura do papel, mas também na nova cultura da tela, como meios eletrônicos" (Soares 2006, p.46), ou seja, se uma pessoa ou uma criança sabe ler, mas não é capaz de ler um livro, uma revista, um jornal e se sabe escrever palavras e frases, mas não é capaz de escrever uma carta, ela é alfabetizada, mas não é letrada. E isso vale para qualquer camada social, pois tanto faz a criança ser de classe mais favorecida ou de classe mais popular. Se todos convivem com a prática de leitura e escrita cotidianamente, vivem em ambientes de letramento.

LETRAMENTO

"Letrar é mais que alfabetizar, é ensinar a ler e escrever dentro de um contexto onde a escrita e a leitura tenham sentido e façam parte da vida do aluno" (Soares, 2009). Doutora em educação, Magda Soares, explica que ao olharmos historicamente as últimas décadas, observaremos que o termo alfabetização já foi superado e ampliado. Já não basta aprender a ler e escrever, é necessário mais que isso para ir além da alfabetização funcional (denominação dada às pessoas que foram alfabetizadas, mas não sabem fazer uso da leitura e da escrita).

Letramento segundo Magda Soares, designa práticas de leitura e escrita. A entrada da pessoa no mundo da escrita se dá pela aprendizagem de toda a complexa tecnologia envolvida no aprendizado do ato de ler e escrever. Além disso, o aluno precisa saber fazer uso e envolver-se nas atividades de leitura e escrita, ou seja, para entrar nesse universo do letramento, ele precisa apropriar-se do hábito de buscar um jornal para ler, de frequentar revistarias, livrarias e com esse convívio efetivo com a leitura apropriar-se do sistema de escrita, logo Magda Soares afirma "é preciso compreender, inserir se, avaliar, apreciar a escrita e a leitura" (2006).

Segundo Kleiman (1995, p. 19) letramento são as práticas de leitura e escrita: "Podemos definir hoje o letramento como um conjunto de práticas sociais que usam a leitura e a escrita em eventos relacionados com uso, função e impacto social da escrita".

Já Tfouni (1988, p. 16), conceitua o letramento: "Enquanto a alfabetização ocupa-se da aquisição da escrita por um indivíduo, ou grupo de indivíduos, o letramento focaliza os aspectos sócio-históricos da aquisição de um sistema escrito por uma sociedade".

A alfabetização refere-se à aquisição da escrita enquanto aprendizagem de habilidades para leitura, escrita e as chamadas práticas de linguagem. Isso é levado a efeito, em geral, por meio do processo de escolarização e, portanto, da instrução formal. A alfabetização pertence, assim, ao âmbito do individual.

O letramento, por sua vez, focaliza os aspectos sócio-históricos da aquisição da escrita. Entre outros casos, procura estudar e descrever o que ocorre nas sociedades quando adotam um sistema de escrita de maneira restrita ou generalizada; procura ainda saber quais práticas psicossociais substituem as práticas "letradas" em sociedades não letradas.

Assim, para Tfouni, letramento são as consequências sociais e históricas da introdução da escrita em uma sociedade, "as mudanças sociais e discursivas que ocorrem em uma sociedade quando ela se torna letrada" (1995, p. 20).

O PAPEL DO EDUCADOR NO LETRAMENTO

O professor quando assume o papel de "professor-letrador", ele assume a condição de troca de conhecimento, interação com o seu aluno, pois o educador deve estar sempre adquirindo novos conhecimentos, lançando novos saberes, e isto, resulta em mudanças, gera o enriquecimento tanto para o educador quanto para o educando.

O letramento não está restrito ao sistema escolar, mas cabe à escola, fundamentalmente, levar os educandos a um processo nas práticas sociais que envolvam a leitura e a escrita.

Para o educador se tornar um "professor-letrador" é necessário que abra mão de suas "certezas" e da cristalização dos "saberes pedagógicos", pois o conhecimento nunca se finda, se completa e a sociedade contemporânea está sempre num processo de mudança
Alguns passos fundamentais para o desempenho do papel do "professor-letrador"
Investigar práticas sociais que fazem parte do cotidiano do aluno, adequando-as à sala de aula e aos conteúdos a serem trabalhados;
Planejar suas ações visando ensinar para que sirva a linguagem escrita e como o aluno poderá utilizá-la;
Desenvolver no aluno, através da leitura, interpretação e produção de diferentes gêneros de textos, habilidades de leitura e escrita que funcionem dentro da sociedade;
Incentivar o aluno a praticar socialmente a leitura e a escrita, de forma criativa, descobridora, critica autônoma e ativa, já que a linguagem é a interação e, como tal, requer a participação transformadora do sujeito sociais que a utilizam;
Recognição, por parte do professor, implicando assim o reconhecimento daquilo que o educando já possui de conhecimento empírico, e respeitar, acima de tudo, esse conhecimento;
Não ser julgativo, mas desenvolver uma metodologia avaliativa com certa sensibilidade, atentando-se para pluralidade de vozes, a variedade de discursos e linguagem diferentes;
Avaliar de forma individual, levando em consideração as peculiaridades de cada indivíduo;
Trabalhar a percepção de seu próprio valor e promover a autoestima e a alegria de conviver e cooperar;
Ativar mais do que o intelecto em um ambiente de aprendizagem, ser um professor-aprendiz tanto quanto os seus educandos;
Reconhecer a importância do letramento, e abandonar os métodos de aprendizado repetitivo, baseados na descontextualização.

PRÁTICAS DE LEITURA E ESCRITA DENTRO DA PERSPECTIVA DE ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO
A alfabetização desenvolve-se a partir de práticas sociais. Na medida em que praticamos a comunicação cotidianamente, aprendemos a entender os tipos de estratégias de leitura que vamos empregar como e quando implemantá-los, e que texto teremos de produzir.
Quando as crianças chegam à escola, trazem pelo menos um conhecimento mínimo sobre os usos e funções da escrita como: logomarcas de empresas famosas, rótulos de produtos, entre outros.
Para alcançar as competências mínimas, que permitem aprender a aprender, além de serem alfabetizados, é necessário que os alunos frequentem por um tempo mínimo a escola. O processo de escolaridade é a continuidade do aprendizado. Na escolarização, as práticas de leitura e escrita da Língua Portuguesa ampliam e transformam o conhecimento.
Outro essencial fator é o ambiente alfabetizador, onde a leitura e a escrita são processos cognitivos que são desencadeados e elaborados em um ambiente socialmente favorável. Assim, quanto mais características alfabetizadoras tiverem o ambiente, mais possibilidades o aluno terá para acessar e absorver toda a dinâmica dos processos.
Um ambiente alfabetizador se constrói com músicas, filmes, leitura de jornais, história em quadrinhos, desenhos, trabalhos expostos feitos pelos próprios alunos, leitura compartilhada, entre outros.

FUNDAMENTAÇÃO ACERCA DAS HIPÓTESES DE LEITURA E ESCRITA
Aprender a ler e escrever é um processo natural e, que cada indivíduo no seu devido tempo e espaço acaba por desenvolver. Geralmente na infância domina-se essas habilidades importantes para a autonomia do indivíduo numa sociedade letrada.
Documentos Legais como metas do Compromisso Todos pela Educação-MEC- que consiste na alfabetização de todos os alunos até os oito anos de idade e de acordo com a Resolução n° 07, de 14 de dezembro de 2010 que coloca a alfabetização e letramento nos três primeiros anos de escolarização.

Estudo das obras de Ferreiro e Teberosky (1999), que tiveram como base Piaget, comprovam que a escrita é uma produção social e, como tal, sofreu inúmeras transformações ao longo da história da humanidade.

Demonstram ainda que, por meio de seus estudos, que as crianças têm ideias próprias sobre como se escreve o que se pensa e formulam hipóteses de como isso ocorre, ao expressar-se por meio da escrita. Em atividades de leitura e escrita, essas hipóteses vão sendo progressivamente testadas pelas crianças, até se tornarem alfabetizadas, isto é, saber quais e quantas letras são necessárias para escrever uma palavra e em que ordem deve ser colocada para que outras pessoas possam ler e compreender.

Não há idade para se aprender a ler e escrever o que existe são condições culturais específicas, um ambiente letrado ou oportunidades de acessos a bens culturais.

Emília Ferreiro e Ana Teberosky no livro Psicogênese da Língua Escrita apresentam os níveis de leitura e escrita correspondente à idade cronológica a fim de, mensurar cada nível em que as crianças de sua pesquisa se encontravam, vale ressaltar que cada criança apresenta maturidades diferenciadas.

De um modo geral Emília Ferreiro apresenta idades cronológicas para cada hipóteses de leitura e escrita das crianças.
Garatuja- 2 anos e meio a 3 anos;
Pré-silábico- 4 a 5 anos;
Silábico- 5 a 6 anos;
Silábico-alfabético- 6 a 7 anos;
Alfabético- 7 a 8 anos.

NÍVEIS DE LEITURA E ESCRITA DOS ALUNOS

GARATUJA: Risca o papel sem ter um sentido próprio, ou ainda faz desenhos para representar à escrita.
PRÉ-SILÁBICO: É quando a criança começa a utilizar as letras (às vezes números) para escrever uma palavra. O importante desta fase, é que ela percebeu a função das letras. Geralmente ela repete muito a letra A (pois é a primeira que aprende), ou usa as letras do seu nome trocando a ordem.
Exemplo: Para escrever GATO: RIAMA
SILÁBICO SEM VALOR SONORO: É quando a criança coloca a quantidade de letras conforme as sílabas da palavra, não se importando com o som. O mais importante nesta fase é observar o modo como lê o que ela acabou de escrever.
Exemplo: Para escrever GATO: MA, leitura: Ela deve colocar o dedo, ou o lápis, apontando para o M dizendo GA e para o A dizendo TO; Para escrever JANELA: RMI, leitura: Aponta para o R dizendo JA, para o M dizendo NE e para o I dizendo LA.
SILÁBICO COM VALOR SONORO: É quando a criança começa a perceber que cada letra tem um som, então ela as usa de maneira proposital.

Exemplos:
- GATO: GO;
- JANELA: JNA;
- CASA: KZ
- BORBOLETA: BOLT
Normalmente nesta fase a criança tem certeza absoluta do que escreve e lê.
Ela lê silabicamente.
SILÁBICO ALFABÉTICO: É quando ela consegue começar a entender que necessita de duas ou mais letras para formar o som certo da sílaba em questão, mas não usa em todas.
Exemplo:
- GATO: HTO
- JANELA: JNELA
- CASA: KZA
- BORBOLETA: BOBOLTA
ALFABÉTICO: É quando a criança já sabe escrever e ler, mas ainda têm pequenos "erros ortográficos" Como trocar:
E por I;
G por J;
C por K;
S por Z;
CH por x; etc.
Exemplo: CAZA, XAPÉU, BUNECA, TOMATI, etc.









REFERÊNCIAS

Ferreiro, Emília e Teberosky, Ana. Psicogênese da língua escrita. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.
GARCIA, Maria Mello. Ler e conhecer: Livro de Alfabetização. Escala Educacional, 1 ed. São Paulo 2007.
Soares, Magda. Letramento: um tema em três gêneros. Autêntica, 2 ed. Belo Horizonte, 2006.
www.cadernosdapedagogia.ufscar.br ? Acessado em 31/05/2011.