AlcoolismoComprometimento Orgânico/Emocional e suas conseqüências para o trânsito

                                                                   

                                                                  Fátima Rassul especialista em psicologia de trânsito

O etanol ou o “espírito do vinho”, expressão proveniente do latim spiritus vini, cuja fórmula química é C2H5OH, é um líquido incolor encontrado na maioria das bebidas alcoólicas.

Desde os tempos mais remotos da humanidade, o homem já havia descoberto a tecnologia para produzir o álcool, entretanto, foi somente no término do século XVIII e inicio do século XIX que surgiu a preocupação com o beber excessivo, uma vez que até o século XVIII, a produção do álcool era feita de forma artesanal.

Com o advento da revolução industrial Inglesa, houve uma mudança nos padrões do uso de álcool pela sociedade devido a facilidade em obter a bebida. Basicamente a produção do álcool passou a ser industrializada e produzida em grandes quantidades com um teor muito maior do que na produção artesanal. O aumento da produção fez o preço do álcool diminuir, facilitando assim o consumo do produto. 22

No inicio o álcool era uma bebida consumida apenas durante as refeições. Porem com todas essas transformações, um número muito maior de indivíduos passou a consumir o álcool, de modo frequentemente e a partir daí começou-se a perceber uma série de complicações físicas, mentais e psicológicas provocadas pelo consumo abusivo, sendo que as primeiras definições do que atualmente chamamos de alcoolismo, foi descrita pela primeira vez pelo médico sueco Magnus Huss em 1849.

Normalmente define-se como alcoolismo o consumo exagerado da bebida, a ponto desse comportamento interferir na vida pessoal, profissional e familiar do individuo.

Segundo alguns autores, o uso do álcool promove a cordialidade, alivia tensões, libera inibições e geralmente aumenta a diversão.

Na sociedade o ato de beber é tido como um comportamento de interação e integração ao grupo.  Bebe-se para brindar a saúde de alguém, para comemorar alguma data festiva ou para homenagear o próprio sucesso ou de algum amigo.

Desde os mais remotos tempos da humanidade o comportamento de beber traduz uma situação festiva ou de muito regozijo.

O consumo de álcool em sociedade segue um curso e um padrão que visa facilitar o entrosamento do grupo, proporcionando um bem estar e uma sensação de descontração.

Dentro de uma curva uni modal (curva de Gauss), a maioria dos indivíduos está concentrada no meio da curva, uma minoria em extremos (no caso, não toma álcool de forma nenhuma ou o consome em flagrante excesso). Essa curva é fortemente influenciada pelo consumo médio da população estudada1.

As pessoas bebem para ficarem mais alegres, mais soltas, e em alguns casos, acabam ficando mais ousadas tendo uma percepção irreal do mundo, e no caso do trânsito o motorista acaba negligenciando por completo a direção segura.

O conceito global de alcoolismo abrange diversos estados agudos ou crônicos da intoxicação alcoólica. Existem várias definições, mas quase todas incluem a incapacidade para abster-se da bebida.

O Brasil ocupa o terceiro lugar mundial no consumo e na produção das bebidas alcoólicas, sendo que a dependência alcoólica é uma doença que atinge o homem em sua saúde mental, física e social.

De acordo com a região os índices mudam porem os estudos realizados indicam que a media nacional varia em torno dos3 a6% da população, sendo 5 vezes maior na população masculina.

A saúde física é afetada pela ação patológica sobre os tecidos, órgãos aparelhos e sistemas do organismo alterando significativamente o funcionamento do corpo humano, alterando o funcionamento dos órgãos comprometendo, inclusive, a vida do indivíduo.

Os efeitos fisiológicos devido ao uso abusivo do álcool são altamente comprometedores podendo levar o individuo a morte.

O alcoolismo é caracterizado pela ingestão repetitiva de bebida alcoólica, num grau que agride o bebedor na sua saúde, e também nos aspectos social e econômico, acompanhado por uma consistente incapacidade de controlar o uso no que se refere a quantidade e ocasião 1.

Alcoolismo, ou Dependência Alcoólica que é o termo recomendado atualmente pela OMS, refere-se a uma grande variedade de distúrbios que são associados à ingestão repetida de álcool durante longo período de tempo e em quantidades que o indivíduo é incapaz de controlar fisiológica, emocional ou socialmente. Por definição o alcoolismo é um distúrbio crônico e geralmente progressivo.

Em sua saúde mental a afecção mostra-se pela desestabilização do sistema nervoso central (SNC) e do periférico, e pelas alterações do seu comportamento adotando atitudes de autodestruição (por ex: continuar bebendo mesmo depois de diagnosticada uma cirrose hepática).

È considerado uma doença social porque afeta os relacionamentos afetivos e familiares, desequilibrando toda estrutura de funcionamento da mesma; e afeta inclusive a vida profissional do indivíduo baixando seu nível de interesse e nível de produção. (abandonar o emprego e a família para viver na rua mendigando).

Jellinek diferenciou várias formas de dependência alcoólica:

1-)- dependência psicológica do álcool, que é usado para aliviar sofrimentos corporais ou emocionais; não há perda de controle nem sinais de progressão para a dependência fisiológica....Este tipo de alcoolismo é, por vezes, designado como beber problemático, beber de evasão, alcoolismo sintomático ou reativo beber dissocial quando os efeitos se manifestam principalmente na família, na esfera social ou profissional, ou beber timogênico quando o álcool é usado num esforço consciente e deliberado para superar o desconforto social ou aliviar uma dor emocional;

2-) embora não seja demonstrável a dependência física ou psicológica, a bebida leva a complicações físicas como no trato intestinal, fígado, pâncreas, coração, sistema vascular, rins, pulmões músculos estriados, cérebro, mecanismos de defesa e resistência ( manifestando propensão à infecções.....) A esse tipo de alcoolismo dá-se, por vezes, o nome de beber somatopático....

3-) o tipo usual de alcoolismo observado nos EUA, Canadá, e outros países anglo-saxões onde os consumidores de bebidas fortes; caracterizam-se pela tolerância cada vez maior, adaptação celular à repetida ingestão da substancia depressiva, precipitação da síndrome de supressão ou abstinência (tremores.....) quando  a ingestão de álcool é suspensa. Este tipo de alcoolismo também é conhecido como essencial, regressivo, maligno ou idiopático; e                                                                                                                   

4-) .....caracterizado por uma tolerância cada vez maior, metabolismo celular adaptativo e sintomas de supressão,....este tipo de alcoolismo é também conhecido como beber inveterado- epsilon- um padrão de acessos paroxísmicos, durante o qual o alcoólico bebe durante dias ou semanas a fio, até cair prostrado; após a recuperação de um episódio, ele pode abster-se totalmente de bebida por semanas ou meses, até o acesso seguinte. O alcoolismo epsilon também é conhecido como dipsomania ou beber paroxísmico ou beber periódico2

A Composição Química e o Teor de Álcool nas Bebidas

O álcool que compõe as bebidas, geralmente é derivado da fermentação, isto é, da oxidação de açúcar por fungo em um ambiente anaeróbico1

Esse processo quando acabado, resulta nas bebidas com teor de álcool entre 12 e 14% como no caso dos vinhos de mesa.  Já a cerveja tem menos teor alcoólico, de4 a5% uma vez que a concentração inicial de açúcar é menor.

Nas bebidas destiladas como os licores, conhaques e cachaças os teores de álcool podem atingir de40 a50%.

Clinicamente, é habitual relatar os teores de álcool em múltiplos de 15g de etanol puro. Assim, um drinque corresponde a cerca de 35ml dos destilados mais fortes, 120ml de vinho de mesa, ou 350 a400ml de cerveja 1.

Daí a importância de controlar a quantidade e o tipo de bebida que o sujeito vai ingerir, para obter um controle seguro ao volante.

Bebendo de2 a3 drinks, dependendo do peso do indivíduo, em 30 minutos atinge-se a alcoolemia de 0,6g/l, que a lei estabelece como limite para o motorista. 

Metabolismo do Álcool Etílico

As enzimas hepáticas são responsáveis pela transformação do álcool etílico em acetaldeido e depois em CO2 (gás carbônico), e água.

A eliminação do álcool do organismo é mínima pelas vias excretórias (urina, fezes e respiração).

Algumas pessoas, e na raça japonesa é muito comum as dificuldades na metabolização do álcool etílico o que ocasiona sintomas como a vermelhidão no rosto, nas mãos, sensação de calor e taquicardia.

Portanto a eliminação do álcool etílico (96%) do organismo se faz através de sua metabolização no fígado pela ação de enzimas transformando em gás carbônico e água. O fígado sadio metaboliza aproximadamente cerca de 15g/l por hora.

O Dissulfiran atua bloqueando o metabolismo do álcool etílico e causando acumulo de acetaldeido, provocando aquelas sensações desagradáveis relatadas acima. Existem outras drogas que não atuam sobre o metabolismo do álcool etílico, e que são empregadas no tratamento do alcoolismo.

Critérios Estabelecidos para o Diagnóstico de Alcoolismo

Segundo os pesquisadores, até o presente momento não há “um padrão claramente definido do que seja um beber moderadamente nem do que seja beber doentiamente”.

Para complicar mais ainda o diagnóstico, é uma característica marcante do alcoolismo a negação, por parte do doente, de que ele é uma de suas vítimas. Por isso, enquanto o beber não atinge patamares alarmantes, nem o leva a comportamentos evidentemente destrutivos e/ou anti-sociais, o indivíduo doente não percebe o perigo. Para complicar ainda mais um pouco, ao atingir esses patamares, o bebedor já não é capaz de percebê-lo, pois o desejo de ingerir a substância  entorpecedora  determina  o  aparecimento  de  mecanismos   mentais, chamados mecanismos de defesa, que tendem a desvirtuar a capacidade de perceber a realidade.

O futuro dependente de álcool, começa pouco à pouco a modificar o seu comportamento e as situações que envolvem o uso da bebida tornando-se o ponto central de sua vida, antes que a compulsão se manifeste claramente,  quando surge o comportamento de autodestruição. Todos os aspectos da vida cotidiana, que antes eram prazerosos, são afetados pelo desinteresse.                                                                                                                                          

Segundo o DSM-III o diagnóstico para o dependente de álcool, requer a presença de pelo menos duas das seguintes características: supressão, tolerância, complicações médicas e descontrole (dependência psicológica).

Abuso de álcool é a terminologia usada para a pessoa cuja história de vida sugere a dependência do álcool, sendo que para este diagnóstico são necessários sintomas dos seguintes agrupamentos:                                                                                                                      

a) legais - detenções, acidentes de trânsito;

b) profissional - absenteísmo, suspensão ou terminação;              

c) dificuldades sociais - brigas, abusos conjugais ou contra os filhos, etc  

d) padrões anormais ou desviantes - amnésias durante o período de ingestão de álcool, embora  não haja perda da consciência. 

A expressão beber problemático é utilizada como equivalente à expressão abuso do álcool.

No modelo do DSM-IV, o abuso e a dependência são padrões mal adaptativos de uso, ao longo de um período de 12 meses, de substâncias que levam necessariamente a incapacitação ou ao desconforto (distress) 1.

Para alguns estudiosos do assunto, a ingestão de álcool per se, não é geralmente considerada um comportamento desviante ou anormal. Concorda-se, porém, que nos EUA de5 a10% dos consumidores de álcool tenderão a ser reconhecidos como dependentes, com o passar do tempo, sendo que esse processo pode levar 20 anos para chegar a este estágio.

Segundo dado de pesquisas realizadas, constatou-se que o alcoolismo é três vezes mais freqüente em homens do que em mulheres, e seu reconhecimento estava concentrado na faixa etária de 35 à 55 anos, o que atualmente está sendo modificado, pois a dependência esta se tornando cada vez mais reconhecida também, como um problema significativo entre indivíduos mais jovens.

 

Critérios para o Diagnostico de Dependência do Álcool e Outras Substancias

(DSM-IV) Segundo seu Significado

Dependência física ou fisiológica: Tolerância considerada quando são necessárias doses crescentes para obter o mesmo efeito, ou efeito diminuído com uso da mesma dose.

Abstinência: sintomas de abstinência quando da suspensão da droga, ou uso da substancia (ou outra semelhante) para prevenir ou aliviar sintomas.

Descontrole no uso: tomar a droga em grandes quantidades ou por períodos maiores do que o previsto

Desejo persistente ou esforços frustrados de controlar ou reduzir o uso.

Preocupação com a substancia e importância do uso para a pessoa

Gastar muito tempo com a compra ou uso, ou para se recuperar de seus efeitos.

Reduzir ou resistir, por causa do uso, de atividades sociais, ocupacionais ou recreativas importantes.

Uso continuado apesar do conhecimento da existência de um problema físico ou psicológico persistente ou recorrente e que é causado ou exacerbado pelo uso do álcool.

Vários distúrbios mentais e/ou orgânicos podem ser ou estar associados à ingestão do álcool e ao alcoolismo, como por exemplo:

*alucinação de supressão alcoólica

*delírio de supressão

*demência alcoólica

*intoxicação alcoólica

*intoxicação idiossincrásica ou patológica

*síndrome amnésica alcoólica

*supressão alcoólica

Os fenômenos e as perturbações comportamentais da pessoa embriagada caracterizam-se pela desproporção entre quantidade de bebida ingerida e a intensidade da reação do indivíduo ou a duração das manifestações auto e hetero-agressivas. O desajuste da personalidade pode ser uma das causas que promove o consumo de álcool e que acaba levando a inadequação social e aos acidentes de trânsito.  Um motorista mal adaptado na sociedade pode ser conduzido a uma fadiga psicológica e emocional onde procura justificar sua necessidade de beber para superar suas dificuldades e combater o stress.

Diferença do Alcoolismo entre os Homens e as Mulheres

O alcoolismo entre os homens tende a se manifestar geralmente na adolescência ou em torno dos vinte anos de idade, sendo que os mesmos só reconhecem a doença e a necessidade de tratamento entre os 30 e 40 anos de idade.

Nas mulheres a doença surge mais tarde tendo um curso variável e freqüentemente associado a um quadro depressivo. Tanto nos homens como nas mulheres o comportamento torna-se descontrolado, visando unicamente a busca do prazer, principalmente no que se refere à conduta sexual. Devido aos valores sociais estabelecidos e difundidos, o homem acaba tendo uma aceitação maior, pois desde cedo é incentivado a demonstrar potência e virilidade, enquanto que a mulher esta sujeita a censuras e sua conduta é tida como imoral. È importante ressaltar que atualmente que alguns homens quanto algumas mulheres têm iniciado o habito de beber já na fase da infância ou da pré adolescência.

É muito mais comum constatar-se a doença em homens, não apenas pela maior incidência - por razões genéticas homens são mais propensos ao alcoolismo. Por razões culturais, o alcoolismo encontra maior facilidade de expressão entre os homens1

O abuso do álcool é associado ao consumo de bebidas fortes, e as mulheres tendem a ingerir bebidas mais suaves, pelo menos em público, para evitar o rótulo de dependente alcoólica, reforçando o comportamento de negação em relação à doença.

- Para cada dose ingerida, a concentração de álcool no sangue é maior na mulher do que no homem, sendo que as mulheres são mais propensas a complicações do Sistema Nervoso Central, problemas do coração e do fígado, e está comprovado que essas complicações orgânicas progridem mais rapidamente entre elas.

- A relação estimada no consumo de álcool entre homens e mulheres é na proporção de 2,5 para 1 entre os jovens; e de 5 para 1 entre os mais velhos, o que sugere que o número de homens alcoólatras é maior que o de mulheres.

- Fatores psiquiátricos são mais comuns entre mulheres alcoólatras do que em homens.

- Mulheres possuem um nível reduzido de álcool-desidrogenase no estomago1, que influi na capacidade de metabolizar o álcool, fazendo com que a concentração de álcool no sangue da mulher seja maior que a concentração de álcool no sangue do homem logo após a ingestão da mesma quantidade de bebida. O peso corpóreo também é um fator importante na metabolização do álcool

- O mal estar provocado pelos efeitos colaterais desagradáveis após a ingestão, como tonturas, enjôos e perda do controle, faz com que as mulheres consumam em média 20% menos álcool.                                           

Todos os fatores compilados servem para mostrar que são variados os efeitos tanto fisiológicos como comportamentais, que interferem no desenvolvimento do alcoolismo.

Vários distúrbios mentais e orgânicos podem ser associados a ingestão de álcool e ao alcoolismo, como por exemplo:

- Alucinose por supressão alcoólica

- Delírio de supressão

- Demência alcoólica

- Intoxicação alcoólica

- Intoxicação idiossincrásica ou patológica

- Síndrome amnésica alcoólico

- Supressão alcoólica

Os fenômenos e as perturbações comportamentais da pessoa embriagada caracterizam-se pela desproporção entre quantidade de bebida ingerida e a intensidade da reação do individuo ou a duração da manifestação auto e hetero-agressivas.

O risco de desenvolver a doença do alcoolismo ocorre quando:

*Os homens consomem 15 ou mais doses de bebida alcoólica por semana

*As mulheres que tomam 12 ou mais doses de bebida alcoólica por semana

*Qualquer pessoa que tome mais de cinco doses de bebida alcoólica por vez pelo menos uma vez por semana.

Problemas de Ordem Social Devido ao Consumo de Álcool

O uso abusivo da bebida alcoólica além de prejudicar o indivíduo em seus aspectos físicos, emocionais e sociais, causa também danos à sociedade como um todo, considerando o custo anual que este dependente representa para os cofres públicos.

Nos EUA este custo anual chega a casa dos US$ 100 bilhões de dólares.                                                                                                                      

Além das conseqüências orgânicas que exigem tratamento médico especializado, outros fatores importantes devem ser considerados, como por exemplo:

 -aposentadorias precoces (cerca de 15 anos antes da média populacional)

-absenteísmo

-acidentes de trabalho

-mortes violentas e conseqüências médicas da violência1

De acordo com pesquisas realizadas, 50-60% da população bebe socialmente, 20% faz uso abusivo de álcool e 10% são dependentes da bebida. Estes dados fazem com que pensemos em um problema de Saúde Pública, onde a verba destinada para aposentadorias precoces, ou licença por doença ou leitos hospitalares para atender ao usuário da bebida, as autoridades poderiam estar disponibilizando esta verba na melhoria da educação e da saúde à população geral, ou em programas de prevenção contra o uso abusivo do álcool. Há necessidade de se realizar um projeto popular para a orientação, educação e informações sobre o perigo da dependência alcoólica, numa tentativa de resguardar e proteger a comunidade em geral.                                                                                                                

Podemos citar o trânsito, que com sua violência, também se tornam um problema de saúde pública, apontando que em mais de 50% dos acidentes automobilísticos com vítimas fatais, pelo menos um dos envolvidos fez uso do álcool.

O álcool é responsável pela violência nos mais diversos contextos da vida humana, tendo mais uma agravante importante: os efeitos danosos nas pessoas que não bebem e são as vítimas da violência, as vítimas de assassinatos, assaltos, e dos acidentes de trânsito, onde o carona pode perder a vida, além do sofrimento causado aos familiares, tanto do réu como das vítimas.

Problemas do Alcoolismo no Trânsito

A ingestão de álcool tem uma grande participação nos acidentes com mortes no trânsito, sendo que o número de homens mortos é nove vezes maior que o numero de mulheres, segundo pesquisa realizada pela Superintendência de Polícia Técnico Científica da SSP/SP.

Outro dado importante da pesquisa é que o nível de álcool encontrado no sangue dos motoristas acidentados superava em três vezes o valor estabelecido pelo Código de Trânsito Brasileiro - CTB. Segundo trabalho realizado no HC entre 1997 e 1998 aponta que 25% das vítimas de acidentes de trânsito estavam alcoolizadas no momento do acidente. Diante desses fatos assustadores, é mister formar-se grupos multidisciplinares para o estudo sobre o alcoolismo e suas conseqüências na vida das pessoas, incluindo os problemas relacionados ao trânsito. Claramente o problema mais sério são os acidentes automobilísticos que causam a morte de jovens entre 18 e 24 anos. 

Quando a idade legal para beber foi baixada de 21 para 18 anos, em vários estados nortes americanos, as fatalidades no trânsito entre jovens de18 a19 anos aumentaram de20 a50%.  Desde então, a maioria dos estados aumentou a idade mínima para o consumo do álcool, e houve uma diminuição significativa nos acidentes.

Cerca de 2/3 dos norte-americanos relatam uso de álcool e 10% têm problemas sociais, psicológicos ou médicos resultantes do consumo da bebida.

Como vimos anteriormente, existem várias definições sobre alcoolismo, ou melhor, sobre a dependência alcoólica, mas quase todas incluem a incapacidade para abster-se. A tolerância ao nível do álcool no sangue aumenta gerando necessidade de quantidades cada vez maiores para obtenção do mesmo efeito.

Um dos caminhos para tornar-se dependente do álcool, é o indivíduo que usa habitualmente a bebida para conseguir lidar com o stress e a ansiedade da vida, sendo que este comportamento pode tornar-se um circulo vicioso.

Problema

 

aumento do consumo                              ingestão de  álcool

                                                      de álcool

 

baixa autoestima                solução ineficaz

 

 

aumento da ansiedade

  

O efeito estimulante inicial supostamente ocorre porque as sinapses inibitórias no cérebro são levemente suprimidas antes das excitantes, resultando em uma sensação de excitação ou estimulação.                  

Entretanto as sinapses excitantes logo são suprimidas e os efeitos estimulantes são cancelados causando sonolência e lentidão nas funções sensoriais e motoras.

Em concentração de 0,5 à 0,6g/l o álcool produz turvação mental, relaxamento e liberação moderada das inibições. A autoconfiança pode aumentar, enquanto as reações motoras começam a diminuir. Um par perfeito que torna perigoso dirigir após a ingestão de álcool.

Na concentração de 1,0g/l alguns indivíduos tendem a tornarem-se zangados e agressivos; outros silenciosos e morosos. Em nível de 2,0g/l a pessoa está seriamente incapacitada, e acima de 4,0g/l pode causar a morte.

 

Nivel de alcool no sangue

Álcool no sangue

Alcool no sangue (gramas/litro)

Estados

Sintomas

0,1 a0,3

Sobriedade

Nenhuma influência aparente

0,3 a0,9

Euforia

Perda de eficiência, diminuição da atenção, julgamento e controle

0,9 a1,8

Excitação

Instabilidade das emoções, descoordenação muscular. Menor inibição. Perda do julgamento crítico

1,8 a2,7

Confusão

Vertigens, desequilíbrio, dificuldade na fala e distúrbios da sensação.

2,7 a4,0

Estupor

Apatia e inércia geral. Vômitos, incontinência urinária e fezes.

4,0 a5,0

Coma

Inconsciência, anestesia. Morte

Acima de 5,0

Morte

Parada respiratória

 

A intoxicação por álcool depende do peso corporal, da velocidade de consumo, da e idade, do sexo da pessoa, e do metabolismo individual.

O ápice do consumo, para a maioria das pessoas, ocorre entre 16 e 25 anos.  Na 3º década de vida o bebedor médio diminui o consumo. Já o alcoólico mantém ou aumenta seu consumo e tem seu primeiro problema importante relacionado ao uso da bebida.  O alcoólico médio busca auxílio na faixa dos 40 anos, após uma década de problemas.

Aspectos Psicológicos do Alcoolismo

Além das conseqüências médicas gerais, problemas sociais, existem também os distúrbios que afetam psicologicamente o sujeito, fazendo com que sua baixa auto estima o deixe “sem forças” para combater a doença. A distinção entre o alcoólatra e o bebedor social está na incapacidade do primeiro, em parar de beber quando desejar.

São muitas as teorias da etiologia do alcoolismo. Os primeiros estudos psicanalíticos propuseram um apetite oral específico para a gênese do alcoolismo - frustração excessiva por uma mãe superindulgente, combinada com um pai incoerente ou ausente, impõe uma retirada para a primitiva fase megalomaníaca de satisfação passiva via oral2

Todos os fatores reunidos servem para mostrar que são variados os efeitos tanto fisiológicos como comportamentais, que interferem no desenvolvimento do alcoolismo.

A baixa tolerância à frustração pode levar a pessoa a uma depressão podendo gerar uma culpa com manobras masoquistas e tendências autodestrutivas.

Num ambiente, onde a estrutura familiar está abalada, o desenvolvimento da personalidade sofrerá danos, as vezes irreversíveis, fazendo com que o indivíduo, por  sentir-se  incapaz,  tente aliviar  seu  sofrimento  sufocando  suas  mágoas  no álcool.  Os sentimentos não são tão simples e tão evidentes como parecem, e a psicologia enquanto ciência que se ocupa da mente e dos processos mentais busca através do seu conhecimento proporcionar ao sujeito condições para um autoconhecimento na tentativa de aliviar o sofrimento humano.

Entre os leigos, é muito propagada a idéia de que o alcoolismo é conseqüência de uma infelicidade, uma tristeza, uma depressão. Numa crise depressiva a pessoa tem sua energia reduzida, diminuição de sua atividade e nível de produção, arrefecimento na capacidade de concentração e rebaixamento do humor. O indivíduo assim afetado quase sempre perde a autoconfiança e a capacidade de gostar de si mesmo. O paciente costuma relatar idéias de culpa e de incapacidade. Também é comum a perda do apetite e, conseqüentemente, perda de peso, acompanhada muitas vezes de perda do interesse sexual1.

Em muitos casos, foi relatado pelos pacientes que após situações semelhantes as citadas anteriormente, começaram a beber excessivamente. Porém a experiência dos pesquisadores mostra que, em 90% dos casos onde existe a presença simultânea do alcoolismo e da depressão, a doença principal é o alcoolismo. A comprovação dessa afirmativa está no fato de que a depressão só faz piorar com o uso do álcool e melhora com a abstinência. Em outras palavras: é o alcoolismo que alimenta a depressão1.

São várias as características psicológicas que podem ajudar a entender e a definir o problema do alcoolismo como doença.  O bebedor percebe que a ingestão do álcool está sendo prejudicial à sua saúde, queixa-se de cansaço, perda de memória, mas ao mesmo tempo resiste a sua constatação, não acreditando no que  verificou, e essa descrença faz com que continue bebendo.

As tentativas de tratamento embatem em resistências egóicos muito primitivas que impedem o paciente de aderir espontaneamente ao tratamento, destacando-se os seguintes mecanismos de defesa:

Negação

Este mecanismo de defesa tem por objetivo proteger-nos de notícias ruins que possam trazer sofrimento. É uma característica marcante  definitiva e central  da doença, e diz respeito a um mecanismo de defesa universalmente presente no alcoolismo1.

O indivíduo doente utiliza o álcool como um grande aliado no alívio para suas angústias encontrando muita dificuldade em desistir dessa suavização que já deixou marcas em sua memória e em sua alma1

Pelo fato do alcoolismo ser censurado socialmente, o diagnóstico não é aceito, pois no entender do usuário isso o desmoraliza, e por não acatar o diagnóstico e aceitar o tratamento, fatalmente acabará morrendo desmoralizado.

Projeção

É outra característica, igualmente perigosa, do alcoolismo, e consiste em atribuir a outras pessoas, ou às circunstâncias da vida, a responsabilidade pelo mal-estar que toma conta do bebedor. “É o caso mais clássico daquele que bebe porque a vida está difícil” muitas vezes invertendo causa e efeito 1.

Racionalização

A capacidade intelectual do indivíduo é canalizada para encontrar os mais variados argumentos que justifiquem a necessidade de beber, fazendo do bebedor um manipulador ricoem argumentos. Utiliza-sede sua inteligência como arma poderosa na manutenção do vício, dando desculpas de todo tipo.

Arrogância

Convém não esquecer que estamos falando de um ser que, freqüentemente sofre de algum mal-estar físico com perda de saúde, com significativa queda no desempenho em todos os aspectos de sua vida. Um ser que silenciosamente constata que algo não vai bem, mas, ao mesmo tempo, nem quer ouvir falar nisso. O bebedor é desse modo, tomado por sentimentos contraditórios, percebe uma coisa, mas quer acreditar em outra, e isso o faz afundar cada vez mais no vício.

Para alguém nessa situação, a melhor defesa é o ataque, o que o torna muitas vezes agressivo, petulante, arredio......e quando alguém  tenta alertá-lo, costuma ouvir o clássico  Não se meta com a minha vida. “Cuide dos seus problemas, que dos meus cuido eu”. E pior, afirma categoricamente: Eu sei que posso parar quando quiser. Infelizmente, quando alguém faz esse último tipo de afirmação, já foi atingida a fase em que é impossível parar sem ajuda1.

Ao longo do tratamento outros mecanismos de defesa mais sofisticados misturam-se ou substituem as formas mais primitivas de defesa, como por exemplo: Intelectualização; Euforia reativa (reacional); Repressão e Sublimação.

Conceitos de Embriaguez

O conceito de embriaguez difere entre os pesquisadores e estudiosos do assunto que atribuem diferentes definições para o problema.

Para Arbenz a embriaguez é um distúrbio temporário causado por excesso de bebida alcoólica. Já para Almeida Jr e Costa Jr refere-se ao grau de intoxicação alcoólica a ponto de prejudicar a conduta do indivíduo.

No British Medical Association é considerada embriaguez quando o indivíduo perde o governo de suas faculdades a ponto de ser incapaz de executar com prudência o seu trabalho.                                                                                                                                         

O quadro clínico da embriaguez, segundo Almeida Jr e Costa Jr, caracteriza-se pela liberação dos impulsos recalcados, graças ao entorpecimento das inibições morais. O álcool atua de cima para baixo; isto é, primeiro entorpece o córtex e depois as atividades instintivas de conservação.

Na Psicanálise a concepção de embriaguez é quando o álcool primeiro silencia o Superego e depois o Id.  Ao suprir as inibições (superego) o álcool libera os impulsos sexuais, onde o flerte sob a ação do álcool é grosseiro e por vezes agressivo. No comércio sexual em estado de embriagues, há uma estatística muito alta dos níveis de contaminação venérea decorrente da precariedade nos cuidados, somados à demora no contacto.

Sheakespeare em Macbeth cita que, o vinho provoca e ao mesmo tempo inibe a libido, acende o desejo, mas impede a execução.

O bêbado se faz inconveniente e audacioso. O exibicionismo é outra modalidade da embriaguez, e Platão cita o seguinte pensamento: não apenas o velho, mas também o bêbado se torna criança uma segunda vez.

A embriaguez patológica assemelha-se ao estado crepuscular epilético, caracterizando-se qualitativa e quantitativamente pela variação da reação inebriante simples. Há a instalação súbita de excitação vital extrema, com comportamento agressivo, defensivo ou fugitivo, além da tendência à violência, seguida de um sono terminal.

As barreiras morais são as primeiras a desmoronar, minadas pela bebida. Soltam-se os impulsos agressivos, a voz aumenta até que no final chega a grosseria ofensiva com gestos de crescente violência podendo o ébrio em casos extremos encaminhar-se para o crime ou suicídio.

As manifestações clínicas apresentam uma seqüência evolutiva, dependendo do grau de intoxicação:

1-) excitação  ou euforia onde ocorre: vivacidade motora; associação de idéias superficiais; as inibições adormecem; as pupilas dilatam; pulso e respiração acelerados  e pele úmida 

2-) confusão ou agitação: confusão psíquica; perturbações  sensórias; diminuição da sensibilidade tátil e dolorosa; percepções erradas (ilusões, alucinações); impulsividade; desatenção; impotência sexual; diminuição do tempo de reação; incoordenação motora, não conseguindo andar em linha reta,   ou manter-se em  equilíbrio de pé e olhos  fechados  ( sinal de Romberg positivo); fala pastosa, disartria, dificuldade em articular as palavras; inconveniência de atitudes, e

3-) sono: não consegue manter-se em pé e as vezes nem sentado; pupilas contraídas; pele pálida; respiração e pulso lentos; queda na pressão arterial; perda da consciência até a inconsciência, só reagindo a estímulos muito fortes, podendo chegar ao estado de coma e as vezes até à morte por intoxicação alcoólica.

A divisão da embriaguez em três fases, apoia-se na lenda árabe dividindo os 3 graus de embriaguez em fases caracterizadas pelos seguintes animais: o macaco, o leão e o porco.

  1. Fase de excitação (macaco) - a pessoa apresenta um comportamento inquieto, falante, mas ainda consciente de seus atos e palavras e além disso as vezes consegue atingir níveis de persuasão - por estar mais eloquente - que talvez não fosse capaz antes.
  2. Fase de confusão (leão) - quando o embriagado torna-se eventualmente (dependendo do temperamento da pessoa) nocivo: fica voluntarioso, age irrefletida e violentamente.
  3. Fase superaguda (porco) - dá-se a embriaguez completa, provocando o coma ou sono, onde o perigo representado dá-se apenas quanto ao próprio indivíduo que, sem mais freios, cai em toda parte, descuida completamente de sua higiene, como o bêbado contumaz.

Sheakespeare em sua obra “Véspera de Reis”, parte I, também divide a embriaguez em três fases:

-na primeira fase o bêbado é um tolo

-na segunda fase o bêbado é um louco

-na terceira fase o bêbado parece-se com um afogado.

Antes das alterações motoras que ocorrem com o consumo da bebida, como por exemplo:

*alteração da visão (dupla imagem)

* perda dos reflexos,

* incoordenação motora

*redução no tempo de reação; acontecem as alterações psicológicas que distorcem por completo o comportamento do indivíduo, trazendo graves conseqüências inclusive as relacionadas ao trânsito, como segue:

-redução na capacidade de atenção; euforia ou depressão (envolvendo toda sua esfera afetiva); perda da orientação tempo-espacial, colocando em risco a sua vida e a vida dos usuários do sistema trânsito.

No Brasil, segundo dados da pesquisa, temos dez vezes mais acidentes com vítimas que no Japão e cinco vezes mais que nos EUA. A exemplo dos outros paises, geralmente as causas reais que provocaram os acidentes de trânsito não são mencionadas.

De acordo com dados do DENATRAN, em 2001 morreram 20.038 pessoas e 307.287 saíram feridas dos acidentes de trânsito.

Após a ingestão de álcool ou qualquer outra droga que provoca a obnubilação da consciência e da capacidade de concentração da atenção, existem outros fatores humanos, como a imprudência, a negligência e a imperícia, que podem causar os acidentes, tornando-se necessário uma investigação psicológica e/ou psicofisiológica mais aprofundada dos motivos reais que levaram o motorista a causar o desastre.

Outros motivos que podem levar o motorista a envolver-se em acidentes podem ser de origem:                                                                                                        

Natural - ambiente

Técnica-condição e manutenção do veículo

Orgânica-saúde e bem estar do condutor

Subjetiva-personalidade do condutor, o que sugere uma relação entre causa real e conseqüência.

Conduzir um veículo em trânsito congestionado, veloz e agressivo é fatigante, cria tensões, perturbações psíquicas e até moléstias orgânicas. A falta de controle sobre os sentimentos e as emoções, pode agravar este quadro levando o indivíduo a uma situação de desconforto e descontrole emocional. 

A fadiga nervosa e psíquica se manifesta na falta de atenção tornando o tempo de reação mais  lento  e  menos  preciso,  o  que  acaba  levando  fatalmente ao acidente. O consumo da bebida alcoólica entra com a desculpa de ser um alíviador da tensão gerada no dia-a-dia.

Contribuições da Psicologia na Prevenção e no Tratamento do Alcoolismo

Para a maioria das pessoas afetadas pelo alcoolismo (85%), o fator genético não é o principal determinante. Cerca de 10% de uma população exposta desenvolverá alcoolismo, independente de raça ou de qualquer outro fator..... Entretanto é comum a aglomeração de indivíduos afetados numa mesma família, e estudos utilizando irmãos, principalmente gêmeos, confirmam uma tendência familiar ao alcoolismo.

Geralmente fatores genéticos tendem a ser mais importante em etilistas graves..... e naqueles que iniciam o consumo de álcool na adolescência e juventude 1.

Na maioria dos casos, existe uma combinação de fatores sociais e constitucionais que justificam o surgimento da doença, sendo mais freqüente o desenvolvimento da doença, principalmente nos indivíduos com traços de personalidade e temperamento como: imaturidade, impulsividade, comportamento anti-social ou explosivo.

Alguns instrumentos psicológicos tem sido de fundamental importância e são utilizados com sucesso, por psiquiatras, psicólogos e psicoterapeutas para o diagnóstico e para a conscientização do paciente a respeito da probabilidade ou possibilidade de estar diante um problema sério, e podem constituir também um início de tratamento. 

Os médicos têm nos testes psicológicos uma arma eficiente para a triagem (detecção) do alcoolismo. É importante lembrar que existe uma diferença clara entre triagem e avaliação. O objetivo da primeira é descobrir se existe um problema 1.

......é preciso conscientizar-se de que testes psicológicos, além de instrumentos eficazes na  elucidação do diagnóstico, funcionam também como uma via de acesso às dificuldades interiores do paciente 1.

É muito comum o dependente de álcool, ou o indivíduo que tenha qualquer outro mal estar emocional, apresentar defesas que dificultam a aproximação do profissional como também a abordagem de sua problemática vivencial, ou motivo de seu sofrimento. Os testes psicológicos constituem um meio de comunicação entre os profissionais e o cliente, sendo um agente facilitador na aceitação da doença e do tratamento.

Alguns dos instrumentos psicológicos mais utilizados na triagem são o CAGE, o TACE, o Questionário RAFF que é valioso no uso com adolescentes.  A Escala de Hamilton avalia o grau de depressão que é muito comum entre os dependentes e que aflige o paciente. Existem outros instrumentos que podem também ser utilizado e com a mesma eficácia dos citados anteriormente.

Outro aspecto emocional que está relacionado com o alcoolismo é a ansiedade. 

Ansiedade (Angst-alemão) foi definida por S.Freud como um estado específico de esperar o perigo ou preparar-se em relação ao mesmo, ainda que seja desconhecido.

Angst é uma palavra aparentada com “eng” que em alemão significa estreito, apertado, restrito. Ansiedade ou Angústia em português deriva do latim “angere”, ou seja, sufocar, afogar ou apertar. Ambas as palavras dizem respeito a “sentimentos angustiantes, asfixiantes e caracterizam uma forma grave do estado psicológico do indivíduo, gerando graus variáveis de perturbação emocional e tensão psíquica.

Segundo o Diagnóstic and Statistical Manual of Mental Disorders da American Psyquiatric Association a angústia, ou ansiedade é conceituada como uma reação difusa e não restrita à situações definidas ou objetos definidos, como nos casos das reações fóbicas. A síndrome do pânico é uma das formas de manifestação da ansiedade.

Em psicologia, este sofrimento pode ser entendido como um mal estar intenso e mais ou menos intolerável que afeta o psiquismo. É uma experiência subjetiva relacionada a emoção e ao afeto que contamina a relação consigo mesmo e com o mundo de modo geral.

A ajuda, o apoio e a orientação do psicólogo entram numa tentativa de amenizar esse sofrimento humano, empregando meios para conseguir fazer com que o indivíduo aproprie-se de sua vida e de sua identidade, e que possa ser capaz de aceitar os seus limites, buscando uma coerência interior e exterior.

Conclui-se que o desconforto emocional causado pelo stress e pelos conflitos vivenciados e não resolvidos, por si só, já são um agravante para os distúrbios da personalidade. O problema toma uma proporção maior quando a toda esta gama de dificuldade soma-se o consumo descontrolado do álcool.

Álcool e Condução Veicular

 

“A evidência epidemiológica disponível, de acordo com a Organização Mundial de Saúde (WHO, 1983), indica que o consumo de álcool pelos condutores é responsável por 31% a 50% dos acidentes com vítimas mortais, por 15% a 35% dos que causam lesões graves, e por 10% dos que não causam qualquer outro tipo de lesão”.

O aumento da probabilidade de sofrer um acidente de trânsito já é significativo a partir de 0,50g/l  de álcool no sangue (Salleras, 1982). Com 1,0g/l o risco é sete vezes maior do que para os condutores que não beberam. A partir deste nível, o risco se incrementa de forma exponencial: é de 30 vezes maior com 1,5g/l, e 70 vezes maior com 1,75g/l. 

O incremento do risco observa-se em todos os tipos de acidentes, porém a concentração elevada de álcool no sangue encontra-se em maior freqüência nos acidentes graves e naqueles que costumam estar envolvidos, majoritariamente os jovens com idades compreendidas entre 16-24 anos 3.

Em janeiro de 1989, em cumprimento à Resolução nº 670/87 do CONTRAN, iniciou-se o atendimento para os condutores envolvidos em acidentes, na cidade de Florianópolis. No início este atendimento era realizado pelo Serviço de Psicologia do Trânsito, do Departamento de Trânsito de Santa Catarina, e em julho 1990 passou a ser desenvolvido na Escola de Trânsito daquele órgão.

Através da reeducação, o programa tinha por objetivo levar os acidentógenos a uma reflexão sobre os problemas do trânsito, e uma conscientização da incompatibilidade do álcool com a condução veicular. Em 1995 iniciou-se um procedimento com todos os condutores que foram atendidos pela infração “dirigir em estado de embriagues alcoólica”, fornecendo aos mesmos uma lista  contendo  todos  os  endereços  das  entidades publicas e privadas que realizavam tratamentos e davam suporte aos dependentes de álcool ou de outra droga.                                                                                                                                                                                                                             

Em pesquisa realizada em SC no ano de 1996, pelo Programa de Orientação Psicológica Preventiva (POPP), 124 motorista envolvido em acidentes incluídos no artigo 101, levantou-se os seguintes dados: dos 124 entrevistados, 96% são do sexo masculino, onde 63% estavam na faixa etária de 25-44 anos; 31,45% possuem ensino médio completo; 80% estavam habilitados para a categoria B; e onde 59% tinham uma renda entre 1-10 salários mínimos.  A média do nível de concentração alcoólica (NAS) ficou em 1g/l caracterizando uma direção perigosa onde existe uma depressão das áreas motoras provocando movimentos oscilantes, passos cambaleantes, grosserias, linguagem descoordenada. 3

Em dados obtidos através de uma outra pesquisa realizada no Detran-SP, com avaliação de 487 prontuários de motorista acidentógenos, incluídos no art.160, chegou-se aos seguintes dados:

os motoristas incluídos no art.160 que foram submetidos a avaliação psicológica e considerados  inaptos temporários ou definitivos para exercerem a função de motorista, dos 487 prontuários avaliados, 187 dos casos, ou seja, 39% desses motoristas tiveram como causa do acidente o envolvimento com álcool. O que é um dado alarmante, considerando-se que são motoristas profissionais,

Os indivíduos que compuseram a amostra eram motoristas na faixa etária de39 a52 anos,  sexo masculinos, casados, naturais  das regiões  Sudeste e  Nordeste,  grau de escolaridade 4ª série do lº grau, como mostra a tabela abaixo:

Tabela 1

Perfil do Alcoolista

Dados Pessoais e Causas do Acidente

 

Quant.

Percent.

Idade 39 - 52

126

67,74%

Casado

124

66,67%

Masc.

183

98,39%

Motorista Profissional

69

37,10%

SE - NE

130

69,89%

4a série - 1o G

61

32,80%

Colisão e Atropelamento

143

76,88%

Vítima Leve e Fatal

91

48,92%

 

Os principais tipos de acidente em que estiveram envolvidos foram:

 * colisão (259 casos – 53,18%) e

* atropelamento, com vítimas leves ou vítimas fatais (105 casos – 21,56).

 

Tabela 2

Distribuição dos Acidentógenos por

Tipo de Acidente

 

Quant

Percent.

Colisão

259

53,18%

Atropelamento

105

21,56%

Condição Adversa

35

7,19%

Frenagem

16

3,29%

Capotamento

13

2,67%

ND

59

12,11%

Total

487

100,00%

Gráfico 1

Gráfico 7

 

Dos prontuários pesquisados, chegou-se a conclusão que 28,95% dos motoristas que foram pesquisados fazem uso de álcool com freqüência, sendo que no momento do acidente 15,20%  dos motoristas estavam alcoolizados.

É importante ressaltar que o consumo abusivo do álcool é uma das causas importantes que provoca as mortes prematuras, que acontece tanto em acidentes de trânsito ou por doenças que poderiam ser evitadas bem como em situações de violência urbana onde ocorrem as chacinas e os assassinatos.

O álcool ingerido pode ser detectado em quase todos os fluídos orgânicos; urina, sangue, suor e saliva. Como possui a capacidade de se volatilizar nos pulmões, é a única droga de abuso que pode ser detectada na respiração: daí a importância da utilização dos bafômetros1. A certeza da impunidade faz com que os motoristas continuem abusando do uso de álcool, na certeza de que não haverá punição.

A gravidade do problema do álcool no trânsito coloca um desafio as autoridades, no sentido de desenvolverem programas educativos e informativos numa tentativa de implementar medidas legais, culturais e outras, objetivando um trabalho preventivo tornando o trânsito mais seguro.

          Perfil Psicológico do Motorista Acidentógeno Alcoolista

Dados Pessoais e Causas de Acidente

Motorista profissional (37,10%), faixa etária de39 a52 anos (67,74%), sexo mascu­lino (98,39%), casado (66,67%), natural das regiões Sudeste / Nordeste (69,98%), grau de es­colaridade 4 série (32,80%), causas de acidente colisão e atropelamento (76,88%), com víti­mas leves e fatais (478,92%). Tabela 1

                                                                 

Tabela 1

Distribuição dos Acidentógenos por Estado Civil

  

Quant.

Percent.

Casado

332

68,17%

Solteiro

60

12,32%

Divorciado

58

11,91%

Amasiado

20

4,11%

Viúvo

8

1,64%

ND

9

1,85%

Total

487

100,00%

Tabela 1-A

Distribuição dos Acidentógenos por

Grau de Escolaridade

Escolaridade

Quant.

Perc.

1a série – 1o G

17

3,49%

2a série – 1o G

19

3,90%

3a série – 1o G

24

4,93%

4a série – 1o G

144

29,57%

5a série – 1o G

50

10,27%

6a série – 1o G

40

8,21%

7a série – 1o G

33

6,78%

8a série – 1o G

68

13,96%

1a série – 2o G

5

1,03%

2a série – 2o G

8

1,64%

3a série – 2o G

43

8,83%

4a série – 2o G

0

0,00%

Superior

27

5,54%

ND

9

1,85%

Total

487

100,00%

Resultado dos Testes Cognitivos

Teste de nível mental R1 67,35%, e INV 68,35% na média e abaixo da média esperada para o grau de escolaridade ver tabela 2 denotando característica de raciocínio mais concreto. Com dificuldade de tomada de decisões, ou de elaborar soluções para problemas não rotineiros.

Tabela 2

Teste de Nível Mental

R1 e INV

 

R1

INV

Total

Perc.

Inferior

10

97

107

21,97%

Médio Inferior

11

103

114

23,41%

Médio

26

106

132

27,10%

Médio Superior

19

73

92

18,89%

Superior

13

24

37

7,60%

ND

5

 

 

1,03%

Total

84

403

 

100,00%

Teste de Atenção concentrada A C. 50,54% obtiveram percentis abaixo da média. Ver tabela 3, registrando grande número de omissões, que leva a uma atitude distraída e nível de percepção grosseiro, tendo dificuldade  de concentração, não vendo sinalização ou obstáculos.

Tabela 3

Teste de Atenção Concentrada – A. C.

 

Quant.

Perc.

Inferior

90

18,48%

Médio Inferior

40

8,21%

Médio

135

27,72%

Médio Superior

90

18,48%

Superior

130

26,69%

ND

2

0,41%

Total

487

100,00%

Testes de Personalidade

Teste Reprodução de Figuras R.F.45%, registrou tremores intensos ver tabela 4. Que associados a estereotipias apresentadas nos outros instrumentos de avaliação, indicam um comprometimento do S.N.C. e quadro típico de indivíduos alcoolistas.

Tabela 4

RF/Tremor

 

Quant.

Perc.

Com Tremor

176

36,14%

Sem Tremor

311

63,86%

Total

487

100,00%

Testes de Personalidade palográfico apresentou alinhamento ascendente 30,65%, ver tabela 5, associado a produtividade baixa, indicando grande vigor físico, elação mas que não esta canalizando de forma  adequada, podendo apresentar um entusiasmo com fantasias nem sempre pautado pela realidade.

Tabela 5

Palográfico – Pressão

 

Quant.

Perc.

Pastosa

228

46,82%

Pastosa, Nutrida

150

30,80%

Nutrida

50

10,27%

Leve

32

6,57%

Nutrida, Leve

25

5,13%

Pastosa, Leve

2

0,41%

Total

487

100,00%

Pressão excessivamente forte e sombreamento no Wartegg 20,03%, denotando um controle lábil dos impulsos podendo reagir com rebeldia em relação a normas e valores fazendo com que o individuo apresente reações de insegurança e impulsividade. Tabela 6

Tabela 6

Seqüência do Wartegg

 

Quant.

Perc.

Ordenada

391

80,29%

Caótica

96

19,71%

Total

487

100,00%

Os resultados dos testes psicológicos sugerem indivíduos com traços de impulsividade, agressividade e comportamento invasivo acompanhados de uma dificuldade em manter o controle afetivo emocional.

Infelizmente, no Brasil não existe o hábito em se manter as estatísticas atualizadas sobre os acidentes de transito. Isso dificulta e muito os trabalhos de pesquisa e os estudos para sabermos o que podemos fazer efetivamente para tornar o transito menos violento.

Entre os anos de 2000 e 2006, foi registrado no Brasil, mais de 146 mil óbitos relacionados ao consumo de álcool, gerando uma média de 57 mortes por dia de acordo com o Ministério da Saúde. O aspecto mais alarmante é que essas mortes poderiam ter sido evitadas se houvesse tratamento e prevenção da enfermidade.

A ciência medica e psicológica ajuda a compreender a origem da doença diminuindo os problemas relacionados ao alcoolismo.

Alguns cientistas dividem os alcoolistas em 2 tipos “A” e “B” diferentes devido as suas diferenças comportamentais.

Consideram que o alcoolista do tipo A tem uma disposição maior a ser introvertido. É o tipo de bebedor solitário. Um número eqüitativo de homens e mulheres pode padecer desse tipo de alcoolismo que, em geral inicia-se depois dos 25 anos. A enfermidade tem uma progressão mais vagarosa, com menos complicações e maior probabilidade de cura. Nesses casos, o fator ambiental é mais relevante do que o fator genético para o aparecimento da doença.

Já no alcoolismo do tipo B, a genética tem uma grande participação, sendo comum que os doentes sejam filhos de pais alcoólatras.

Outra contestação sobre esse tipo aponta a existência de mais homens do que mulheres doentes e, nessas pessoas, o abuso do álcool. Normalmente começa antes dos 25 anos, onde o individuo busca situações que desencadeiem grandes emoções, que provoquem aumento da adrenalina, ou aqueles que têm um comportamento mais impulsivo agindo de acordo com sua sensação sem se preocupar com as conseqüências e também pelos indivíduos mais agressivos. Quando bebem perdem totalmente a noção de perigo.

É necessário informar que um alcoolista não é exclusivamente aquela pessoa que bebe todos os dias, mesmo sozinha. Pode ser também aquele convidado que só bebe de vez em quando, mas sempre que consome o álcool dá vexame nas festas.

Examinar as causas e decorrências da doença ajuda a instituir programas especializados de auxílio aos alcoolistas, elevando suas possibilidades de cura, o que ajuda a melhorar sua qualidade de vida, inclusive na convivência com a família, com a sociedade e com um  transito mais seguro.

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