ÁGUAS DO CARINHANHA

Lúcidas, transparentes,
transcorrem mansas,
indiferentes.

O leito traçado por mãos invisíveis lhe define o rumo ? a vastidão.
O trajeto sinuoso não disfarça os sonhos que, submersos aos olhos humanos, emergem à superfície como se para beijar a ave canora que em seu vôo rasante parece afrontar a soberania da líquida planície.
As margens verdejantes tentam respeitar o curso estabelecido e fingem impor limites à insensatez humana.

Um projeto de vida e esperança parece sobreviver nas mãos de cada lavadeira que, na persistência do labor, atesta a tenacidade do rio em seguir alimentando e amparando a luta da existência.

Águas do Carinhanha,
límpidas, velozes, seguem formatando conchavos, definindo silhuetas, na linha imaginária de horizontes inexistentes, presentes, porém, no espectro etéreo dos padecimentos voluntários a assoberbar a frágil criatura humana.

Águas do Carinhanha,
belas, soberanas,
buscam refúgio na suavidade de uma voz feminina que, imensa de afazeres, lhe dedica as notas de uma singela canção.

Cai a tarde.
Uma brisa suave emoldura a meiga voz que canta;
e acaricia ternamente a líquida superfície.
A noite já debulha raios acinzentados,
forrando o chão antes de estender o seu delicado manto negro.

Águas do Carinhanha,
envoltas no véu da noite
seguem confiantes, majestosas;
magnificamente belas
na profundidade de um mistério inconteste.


João Cândido da Silva Neto
(Escrito em Juvenília-Mg, à margem do Rio Carinhanha).