É lógico que o título não reflete a realidade. Sabemos muito bem a importância sócio-econômica da pecuária e o que o mercado internacional representa para que os preços ao produtor não despenquem mais ainda. Também é do conhecimento de muitos que somente o PIB da atividade contribuiu com R$ 65 bilhões em 2006, além da relevância na balança comercial e principalmente do lugar de destaque que a atividade ocupa no mercado mundial, sobretudo a partir de 2005. Para completar, sabemos ainda que boa parte dessa riqueza fica na indústria frigorífica.

Apesar da importância demonstrada, a julgar pela organização dos produtores, do alinhamento e das estratégias desenvolvidas pelo conjunto da Cadeia de Produção Pecuária (CPA) parece que o mercado internacional e as suas exigências não têm a menor importância.

Algumas posturas talvez justifiquem o fato de ser a cadeia que melhor representa a estratégia oportunista das firmas, ao invés de estratégias de coopetição, conforme já discutido anteriormente. Nota-se que dentre as principais cadeias que compõem o agronegócio nacional foi justamente a que mais perdeu renda nos últimos anos.

O primeiro destaque para essa irrelevância dada ao mercado, vem dos pecuaristas e está na comunicação que circula ao longo da cadeia e parece não ultrapassar o varejo. As mensagens do consumidor simplesmente não chegam ao produtor. Ou o produtor faz de conta que não é com ele e continua produzindo ao seu modo.

É de conhecimento de todos que as exigências do mercado mundial estão cada vez maiores, principalmente em se tratando da segurança do alimento e, por conseguinte, da garantia da qualidade. Neste quesito, levanto dois exemplos de ineficiência.

Uma é histórica, e remonta a década de 70. Fazem mais de 30 anos que ouço falar das campanhas de vacinação contra a aftosa. É uma vergonha nacional. Se depois desse tempo todo ainda precisamos gastar dinheiro público para convencer um picareta a vacinar o seu gado, alguma coisa está errada.

Até hoje temos produtores que fazem de conta que vacinam o seu gado. Chegam ao cúmulo (assim como a 30 anos atrás) de pagarem as vacinas para apresentarem as notas e não aplica-las, jogando os frascos no lixo. Para estes, proponho que sejam enquadrados como crime lesa pátria e, por conseguinte, a cadeia.

Outra discussão a se destacar está na rastreabilidade que vem sendo debatida ou protelada, como queiram, a quase dez anos. Enquanto outras cadeias se organizam e se antecipam às demandas do mercado e eles próprios propõem processos de certificação e garantia da qualidade dos seus produtos, a pecuária parece que está brincando com o mercado, e sai na contramão.

O programa não atende os interesses da classe produtora? Pode-se garantir porém, que o nível de organização é pouco para representar ameaça à decadência. Alguns escassos gatos pingados tentam manter e defender os interesses da classe produtora. Infelizmente ainda temos muitos maus pecuaristas persistindo na atividade.

Para quem ainda não se convenceu da gravidade da situação, é só lembrar que o SISBOV antigo vai ser substituído pelo novo no final do ano. Acontece que faltando 6 meses para o fim do programa ainda temos quase 40.000 propriedades cadastradas e pouco mais de 2.000 no sistema novo. Um vácuo de falta de oferta de animais rastreados está no horizonte. O que faremos para não perdermos o mercado?

A falta de organização e consciência das demandas do mercado dá margem a outro problema crônico no agronegócio e principalmente neste setor: a coordenação da cadeia nas mãos da indústria, que está cada vez mais concentrada, organizada e também atuando oportunisticamente ao dar guarida para as inconseqüências do elo produtor.

Ainda estamos atuando com um modelo ultrapassado (vide figura) onde o principal está na demanda do elo subseqüente, para frente, num fluxo que vai do processo produtivo para o mercado, quando na verdade o fluxo é da informação, e vai do consumidor para o elo produtor. O fluxo de produção é mera conseqüência.

Neste sentido, ganha a cadeia que se organizar e adaptar melhor e mais rápido a essas demandas. Não temos consciência da demanda, portanto não nos afligimos com o que não conhecemos.

Se continuarmos a desempenhar esse papel, é quase certo que perderemos o mercado conquistado a duras penas. Temos nos revelado craques em chorar sobre o leite derramado. Uns sobre as dívidas, e outros sobre o mercado perdido.

Até a próxima. Obrigado pela leitura.