AGRICULTURA FAMILIAR NO BRASIL: POLÍTICAS E FORMAÇÃO, PERSPECTIVAS DE AGRONEGÓCIO NO ASSENTAMENTO BOJUÍ MUNICÍPIO DE DIAMANTINO-MT.

Junior Costa Mori[1]

 

RESUMO:

A agricultura familiar no Brasil possui grande relevância econômica. Ela tem gerado, ano a ano, significativo número de empregos no campo além de contribuir para a segurança alimentar da população brasileira. Historicamente, a emergência da agricultura familiar está atrelada às lutas sociais e ao desenvolvimento de políticas e programas capazes de conduzir uma parcela da população, sobretudo os mais pobres, para o campo através da chamada reforma agrária. O assentamento Bojuí, fruto desse processo, possui importância econômica para o município de Diamantino, Mato Grosso. Este artigo tem como objetivo apresentar o processo das políticas de organização da agricultura familiar dando visibilidade ao assentamento Bojuí e sua importância econômica local.

PALAVRAS-CHAVE: Políticas Públicas; Agricultura Familiar; Desenvolvimento Regional; Agronegócio.

INTRODUÇÃO

O movimento de reforma agrária no Brasil iniciou-se com o I Plano Nacional de Reforma Agrária - I PNRA,ainda no Governo de José Sarney (1985 -1990).Ele foi reestruturado pelo II PNRA, já no governo Luís Inácio Lula da Silva (2003 – 2010). Estes planos tinham como objetivo fazer cumprir a “função social da terra”que havia sido antes estabelecida pelo Estatuto da Terra[2]que contribuiu para a diminuiçãodo êxodo rural no país, além de permitir o desenvolvimento de áreas do território nacional, como o Centro-Oeste, por exemplo, e nele Mato Grosso.

Para consolidar o modelo proposto pela política agrária o governo lançoutambém o PRONAF – Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar[3] - que consistia na concessão de linhas de crédito para que o agricultor pudesse investir no seu estabelecimento familiar.

Através do PRONAF o governo reconhecia novamente a importância da agricultura familiar para reversão do êxodo rural e a partir de sua criação lançou outros programas de incentivo e fortalecimento do setor.

Foi neste conjunto que surgiu o “Assentamento Bojuí”, resultado do I Plano Nacional de Reforma Agrária.Este assentamento está localizado no município de Diamantino, Mato Grosso, situado numa área de influência da Agência Regional de Comercialização Médio Norte.

Criado em agosto de 1995, esse assentamento corresponde a uma área de 15 mil hectares que foram distribuídos a 277 famílias. Embora essas famílias tenham conseguido algum desenvolvimento, hoje, no ano de 2015,o assentamento vivencia certa estagnação. Os assentados buscamuma resposta para a estagnação econômica, o que os leva aquestionar sobre quais políticas públicas poderiam ser implantadas para reversão desse quadro? Tentam conhecer também o impacto socioeconômico de sua estagnação para o município de Diamantino?

O nosso objetivo é apresentar um quadro acerca da organização dos projetos, programas e políticas públicas que historicamente correspondem ao processo de reforma agrária e desenvolvimento da agricultura familiar. E também apresentar o processo histórico de formação do Assentamento Bojuí e sua perspectiva de negócios atual.

Esse artigo se sustenta metodologicamente através de pesquisa bibliográfica e análise documental - com a finalidade de levantar os dados e a história do Assentamento, que para tanto contou com pesquisa de campo (visita ao assentamento), análise documental (dos documentos que estabelecem os programas) e levantamento bibliográfico.

PLANEJAMENTOS, PLANOS, PROJETOS E PROGRAMAS

O planejamento[4] surge diante de necessidades básicas de uma sociedade. É um processo administrativo vital para a sobrevivência de qualquer organização, quer seja pública ou privada.Nas organizações públicas, foco de nossa investigação,o planejamento se relaciona ao provimento e a qualidade de serviços públicos essenciais.

O planejamento é um processo contínuo de pensamento sobre o futuro e envolve os seguintes questionamentos: O que fazer?Como?Quando?Quanto?Para quem?Onde?E como? É, portanto, um processo de estabelecimento de estado futuro desejado e delineamento dos meios efetivos de torná-lo realidade (OLIVEIRA, 2007).

A alternativa ao planejamento é a improvisação, ou seja, a resignação.Sem um plano coerente ninguém consegue ser bem sucedido em coisa alguma.Já o plano[5] é a bússola norteadora das ações a serem executadas no planejamento. Sem um plano, de nada adianta uma superestrutura organizacional e gerencial.

Misoczkye Guedes (2011, p.18-9) definem que a noção de um plano pressupõe um conjunto de ideias, tais como previsão, organização, coordenação de esforços, acompanhamento, controle de ações e avaliação de resultados. A razão de ser de um plano inclui: reduzir as incertezas e as surpresas; guiar a ação até chegar à situação desejada; e organizar os meios para atingir tal situação.

Segundo Matias Pereira (2010), o objetivo estratégico é orientado para os grandes objetivos da organização. São os objetivos de longo prazo; o objetivo tático é traduzido nos planos de ação concretos, em acordo com plano estratégico; e o operacional está orientado para a ação concreta, a cobrança de resultados.Então, na elaboração do planejamento, as ideias são desdobradas em planos, estes planos são desmembrados em projetos a serem executados dentro da organização, órgão, empresa, ou secretaria sob constante avaliação e monitoramento.

Carvalho (2011, p.18), entende que para que situações-problemas relevantes - ideias e oportunidades consideradas inovadoras e/ou empreendedoras se tornem realizáveis -, os gestores públicos ou seus idealizadores devem vislumbrar a possibilidade de criar soluções para atender às necessidades pontuais de uma comunidade em especial ou para a sociedade em sua totalidade. Então, para cada situação-problema existem inúmeras possibilidades de soluções. Essas soluções podem resultar ou não em um novo serviço público, na diferenciação de serviço já existente ou em novo formato de prestação de serviços para a sociedade.

 Em cada decisão, tem-se algum problema a ser resolvido ou algum objetivo a ser alcançado; diferente daquilo que já está funcionando e é conhecido. Em ambas as situações, existe a necessidade de se empregar recursos humanos, tecnológicos, materiais e financeiros para sua implementação. Assim, é prudente termos preliminarmente uma noção da viabilidade do ponto de vista econômico, financeiro, social e ambiental para saber se a ideia agrega ou não valor às comunidades específicas e a toda a sociedade.

 A esse esforço gerencial temporário desenvolvido especificamente com o intuito de analisar e subsidiar a decisão sobre se uma ideia inovadora ou sugestão comunitária ou proposta de governo beneficia ou não a sociedade denominamos projeto[6].

O projeto apresenta um ciclo de vida que começa com o início ou a conceituação da ideia, do problema a ser resolvido; após, dá-se início a etapa do planejamento; execução, ou produção; monitoramento, ou acompanhamento e por fim a conclusão do projeto.Os projetos podem tornar programas permanentes dentro de uma organização. Para isso é fundamental que o projeto atinja o objetivo para o qual foi criado.

Cury (2001) entende que na perspectiva do sistema de planejamento, uma políticaé um processo de tomada de decisões que “começa com a adoção de postulados gerais que depois são desagregados e especificados”. Assim, a política social global prioriza setores e estabelece a integração que manterá entre si, num determinado marco teórico, histórico e espacial.

 Quando esta priorização é plasmada em um modelo que relaciona: meios e fins, concatenando-os temporalmente, se obtém um plano. O plano fornece um referencial teórico e político, as grandes estratégias e diretrizes que permitirão a elaboração de programas e projetos específicos, dentro de um todo sistêmico articulado e, ao mesmo tempo, externamente coerente ao contexto no qual se insere. Em um plano, os problemas são selecionados, estabelecendo-se áreas de concentração, e para essas áreas elaboram-se programas que, não raro, se derivarão em projetos.

O programaé o aprofundamento do plano, o detalhamento por setor das políticas e diretrizes do plano. Podemos definir um programa como um conjunto de projetos que buscam os mesmos objetivos. Ele estabelece as prioridades nas intervenções, ordena os projetos e aloca os recursos setorialmente. Geralmente, as organizações responsáveis pelos programas são governamentais, mas isso não significa que não possam existir instituições privadas que operem dentro das diretrizes das políticas públicas.

Percebendo-se a diferença apresentada entre planejamento, plano, projeto e programa é que nos foi possível se entender que o “Assentamento Bojuí” se estabeleceu dentro de um programa, que passou por suas etapas e, foi pensado como algo a funcionar de forma mais profunda para a manutenção das ações que nele se desenvolveriam, porém, infelizmente esses aprofundamentos, necessários, não ocorreram.

POLITICAS PÚBLICAS

 De acordo com Souza e Carvalho (1999), a reformulação do papel do Estado no Brasil, principalmente a partir da década de noventa, pode ser dividido em estágios: o primeiro é voltado para a abertura dos mercados, desregulamentação e privatizações, e enfatiza principalmente a racionalização dos recursos fiscais. O segundo estágio de reformas persegue objetivos adicionais, pois segundo as autoras:

  • Eficiência dos serviços públicos, a ser alcançada pela otimização dos recursos humanos e financeiros via o estímulo à competição administrada pelo governo e do que as organizações sociais são um exemplo;
  • Efetividade;
  • Democratização com envolvimento da comunidade nas decisões relativas às ações públicas;
  • Descentralização “para as esferas subnacionais das responsabilidades de provisão de infraestrutura e dos serviços sociais” (SOUZA E CARVALHO,1999, p.188).

O segundo estágio teria, de acordo com as autoras, tarefas de mais longo prazo e estruturais, relacionadas com a construção de melhor capacidade administrativa (eficiência nos serviços públicos) e maior capacidade institucional, aqui entendida como busca de incentivos que aumentem os estímulos para a cooperação, formulação e implementação sustentada das decisões governamentais.

Segundo Souza e Carvalho(Idem, p.197), diz que durante o governo de Fernando Henrique Cardoso se deu o formato definitivo e conceitual à chamada “Reforma do Estado”, principalmente através da criação do Ministério da Administração e Reforma do Estado (MARE). Desta forma, “as propostas do MARE voltam para o segundo estágio de reformas”, são, portanto, propostas mais complexas, voltadas principalmente para:

  • Busca da melhoria da atuação burocrática (...);
  • Separação das atividades de regulação de execução, transferindo a execução, principalmente, para as organizações sociais (...);
  • Descentralização vertical dos serviços sociais (...) que tem grande relevância nos efeitos tanto para as esferas locais como para a execução decomo a ampliação da efetividade, universalização e democratização dos serviços públicos sociais.

 A emergência das políticas públicas e as ações do Estado em prol da Agricultura Familiar no Brasil a partir de meados da década de noventasão decorrentes desse contexto macroeconômico que a reforma do Estado imprime no período recente. Foram dois os fatores principais que motivam o surgimento destas políticas públicas, mais consolidadas e estruturadas do que as anteriores, para a agricultura familiar.

A primeira tem haver com a crescente necessidade de intervenção estatal frente ao quadro crescente de exclusão social. Sendo a agricultura familiar a maior fonte empregadora de mão de obra no setor agrícola do país; e o setor industrial vivendo a sua reconversão, que traz como consequência a baixa oferta e flexibilidade do mercado de trabalho, as ações públicas dirigidas à agricultura familiar encontra espaço ideologicamente aceitável e passível de expansão no Estado globalizado brasileiro.

Essas ações públicas, em favor da agricultura familiar, conseguem se desenvolver sem mudanças macroestruturais na economia agrária brasileira. Chegando, em nosso caso, a mudar a estrutura organizativa do Governo Federal, fato este, inédito, que resultou na retirada da tutela do Ministério da Agricultura de ações e programasgovernamentais relativosaos agricultores familiares.

Os programas da Agricultura Familiar foram deslocados, em 1999, para o então recém-criado Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), órgão Público Federal dirigido aos “pobres do campo”: sem terras e agricultores familiares. Do outro lado, ficou o Ministério da agricultura, responsável pelo “agribusiness” (agricultura patronal).

Neste trabalho se desejou tratar da agricultura familiar e, mais especificamente, das condições para sua produção rural e o desenvolvimento de um agronegócio pensado na lógica do desenvolvimento familiar ou da união de famílias em prol do seu crescimento econômico e do próprio assentamento.  

REFORMA AGRÁRIA, POLÍTICAS PÚBLICAS E AGRICULTURA FAMILIAR.

Na visão de Abramovay e Carvalho Filho (1993, passim) a reforma agrária pode ser definida como o processo que permite ampliar a quantidade de pobres rurais capazes de se incorporar como produtores na vida nacional pelo apoio que receberem de instrumentos de política agrícola.

 Assim, esse processo pode permitir que esses excluídos se incorporem como produtores e consumidores através da reestruturação do minifúndio, da transformação de arrendatários em proprietários, da incorporação dos filhos dos agricultores como produtores rurais, dinamizando o processo de crescimento econômico e fundamentando o desenvolvimento sobre bases mais sustentáveis.

Abramovay et. al. (2006) afirma que a valorização da agricultura familiar no país foi pautada a partir de três planos distintos. O primeiro diz respeito ao plano intelectual, devido ao surgimento de diversos estudos e pesquisas que permitiram estratificar e capturar toda a heterogeneidade da agricultura familiar no país, bem como avaliar a sua relevância socioeconômica. O segundo plano é o das políticas públicas, principalmente após o lançamento do PRONAF e a intensificação dos projetos de assentamentos de reforma agrária durante a década de 1990.

Essas e outras políticas foram responsáveis pela geração de novasoportunidades de ocupação e negócios no campo a milhares de famílias.

Por último, a agricultura familiar corresponde a um conjunto de forças organizadas cuja principal bandeira de luta foià afirmação da viabilidade econômica da produção familiar, e,posteriormente, sua consolidação como seguimento importante para a economia social.

O Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar - PRONAF, instituído no ano de 1996,através do Decreto nº 1.946. Seu intuito principal era o de estabelecer diversas ações e garantir os recursos para o apoio às atividades produtivas do segmento da agricultura familiar no Brasil.

Dessa forma, de acordo com o artigo 1º de seu Decreto, o PRONAF buscou “promover o desenvolvimento sustentável do segmento rural constituído pelos agricultores familiares, de modo a propiciar-lhes o aumento da capacidade produtiva, a geração de empregos e a melhoria da renda” [7].

A reforma agrária estabelecida no II PRNA pelo governo LULA (2003 – 2010) reconheceu a importância da pequena propriedade rural para o desenvolvimento do país e apontou as causas da pobreza no campo, estabelecendo o fortalecimento da agricultura familiar como estratégia para reversão do êxodo rural com políticas voltadas para a manutenção da família no campo.

De acordo com os dados do Censo Demográfico de 2000, cinco milhões de famílias rurais vivem com menos de dois salários mínimos mensais – cifra esta que, com pequenas variações, pode ser encontrada em todas as regiões do país.

É no meio rural brasileiro que se encontram os maiores índices de mortalidade infantil, de incidência de endemias, de insalubridade, de analfabetismo. Essa enorme pobreza decorre das restrições ao acesso aos bens e serviços indispensáveis à reprodução biológica e social, à fruição dos confortos proporcionados pelo grau de desenvolvimento da nossa sociedade[8].

Essa situação nos leva a pensar acerca do conceito de programa trazido acima e a questão da continuidade, além de tudo, acerca da questão dos objetivos que se possuía ao se promover o programa. O que também nos leva a preparar a ideia de que essa situação, embora seja diferente, também apresenta o mesmo abandono em Bojuí, como em outras partes do país.

A maioria dos autores nos leva a crer que os pobres do campo não tiveram acesso suficiente a terra ou as políticas agrícolas adequadas para gerar uma produção apta a satisfazer as necessidades próprias e de suas famílias. As terras são muito pequenas, pouco férteis, mal situadas em relação aos mercados e insuficientemente dotadas de infraestrutura produtiva ou possui a logística necessária para o escoamento da produção.

O desempenho econômico da agricultura familiar, em que pese todas as dificuldades, mostra que se trata de um setor que produze emprega e que responde rapidamente às políticas públicas de fomento e garantia da produção. Desta forma, acreditamos que as maiores falhas se encontram na continuidade dos programas estabelecidos e, sobretudo no acompanhamento.

Voltando aos dados do Censo Agropecuário 95/96, enquanto a agricultura familiar gerava, em média, uma ocupação a cada oito hectares utilizados, a agricultura patronal demandava 67 hectares para gerar uma única ocupação. Na região Centro Oeste a agricultura patronal chegou a demandar 217 hectares para gerar uma ocupação. O que depõem em favor da agricultura familiar.

A capacidade da agricultura familiar em gerar postos de trabalho e sua eficiência produtiva contesta a visão que sobrevaloriza os efeitos das economias de escala na agricultura. Ela promove uma ocupação mais equilibrada do território nacional e por meio de sua multifuncionalidade e da pluriatividade impulsiona diferentes atividades econômicas e o desenvolvimento territorial. Além de ser uma ação estruturante, geradora de trabalho, renda e produção de alimentos, portanto, fundamental para o desenvolvimento sustentável da nação.

E isso é exaltado por Abramovay (2003), quando entende que:

(...) a distribuição de terras é um importante meio de combate à pobreza. Ela se pauta por um imperativo de justiça, mas se apoia num postulado econômico decisivo: unidades produtivas ao alcance das capacidades de trabalho de uma família podem afirmar-se economicamente e ser, portanto, um fator de geração sustentável de renda.

É claro que para isso são necessárias condições de acesso à mercados dinâmicos, à créditos, à informações, à educação e a tecnologias. Mas o importante está numa particularidade da agricultura, em que a combinação de diversas atividades, o uso intensivo e flexível da mão-de-obra faz das unidades familiares de produção um segmento potencialmente competitivo e que muitas vezes tem uma capacidade de resistência a situações adversas até superior à das unidades patronais.

O que está em questão não é a capacidade de transferência de ativos – e antes de tudo, da terra. Para os pobres rurais isso constituir-se em base para sua emancipação social: mas um ambiente institucional capaz de reger essa transferência em condições eficientesde recursos públicos nas mãos dos beneficiários. Entender a razão disso e discuti-la abertamente com a sociedade é a condição para que a própria causa da reforma agrária continue representando um caminho estratégico na luta pelo desenvolvimento rural no Brasil.

 

ASSENTAMENTO BOJUÍ

O Assentamento Bojuí foi criado em agosto de 1995. Com uma área correspondente a 15.638 mil hectares e com 595,40 hectares para a produção coletiva. Veja no mapa abaixo sua localização e dimensões, bem como as devidas relações de proximidade:

Mapa 01 – Projetos de Assentamento na Região de Diamantino

Fonte: www.icv.org.br

Esse assentamento atendeu, à época, 277 famílias.É interessante destacar que essas famílias apresentavam uma forte participação das mulheres, inclusiveem atividades produtivas, além da significativa influência delas nos processos de tomada de decisões sobre os rumos do PA – Projeto de Assentamento Bojuí.

Ao longo de seu processo de estruturação os agricultores começaram a se destacar economicamente pela criação de frangos, ação ligada ao projeto/parceria com um frigorífico instalado no município de Nova Mutum-MT, logo nos anos 2000. Esse negócio se mostrou bastante rentável para os assentados, mas foi perdendo força até acabar devido à falta de condições de produção e logística.

Paralelamente a esse processo as famílias também viviam da produção de farinha de mandioca, queijo, requeijão, o cultivo do abacaxi, maracujá, amendoim, soja e banana, os quais eram comercializados nos municípios da região, em feiras, comércios e em atendimento a merenda escolar. Porém, as condições de manutenção e consistência da produção impede a continuidade do atendimento da oferta regular da produção.

Uma saída para superar os problemas de desenvolvimento foi o arrendamento de uma parcela da terra para a produção de soja. Outra parcela da terra, ainda poderia ser utilizada para a pequena produção familiar. Situação que para o seu incremento, necessita de ações capazes de dar condições de negócio ao conjunto dos proprietários.

O assentamento Bojuí apresenta muitos desafios a serem enfrentados com políticas públicas voltadas ao suprimento das necessidades dos produtores rurais. E é somente o enfrentamento desses desafios que permitirá a produção de alimentos diversificados com a participação ativa do assentamento na economia local.

Existe precariedade nas estradas que dão acesso aos assentamentos rurais. Este mesmo obstáculo e a ausência de parcerias firmadas que atendam essa questão acabam afetando de alguma forma as condições e meios de comercialização da produção nas unidades produtivas, representadas pela dificuldade de logística para acesso aos mercados consumidores e com custos de transporte, por exemplo.

Ações municipais tentam melhorar a situação dos pequenos produtores, embora não sejam suficientes para reverter o quadro e promover o seu desenvolvimento. A Câmara de Diamantino apresentou propostas ligadas à logística do local solicitando o:

(...) patrolamento da estrada que dá acesso ao assentamento Bojuí tendo inicio na entrada da Fazenda 7 Placas na BR 364, passando pela ponte 3 Lagoas seguindo até a saída do “Silinho” MT 010. (...) [com] justificativa a necessidade de eliminar as causas da grande trepidação nos veículos por solapamentos na via conhecidos popularmente como “costela de vaca”. Ainda solicita que se faça o contato com os produtores locais para a verificação se a referida ponte 3 Lagoas encontra-se com avarias(www.camaradiamantino.mt.gov.br/Noticias)

.

Embora pareça uma proposição legitima do município, essa ação está vinculada diretamente ao governo federal, através da Superintendência Regional do Incra no Mato Grosso, que:

(...) firmou convênios, nesta terça-feira (22), no valor de R$ 28 milhões com 38 prefeituras do estado para implantação de obras de infraestrutura em 55 assentamentos. A ação beneficia aproximadamente 7.350 famílias. As obras previstas são a recuperação de 1.293 quilômetros de estradas vicinais e a construção de 193 quilômetros e de uma ponte de 80 metros (www.incra.gov.br/incra-destina-r-27-milhoes-para-construcao-e-reforma-de-estradas-de-55-assentamentos).

.

Embora não se deva entender que o grande problema do assentamento esteja apenas ligado a questão do escoamento da produção, essa ação ajudaria imensamente a produção familiar a chegar com o máximo de qualidade ao consumidor.

Existe, por parte do poder público, a percepção de que é necessário trabalhar a agricultura familiar com profissionalismo, oportunizando ao homem do campo suporte técnico, capacitação e linhas de crédito para que os que ali permaneçam possam ter condições de produzir e abastecer o comércio local e regional, gerando o seu empoderamento e o de seus herdeiros. Entretanto, na prática toda percepção fica enevoada pelos descaminhos das ações políticas.

Hoje a realidade não é a de comprometimento público com o desenvolvimento do assentamento. Grande parte dos agricultoresmigrou para a cidade e os sítios encontram-se quase em abandono sem qualquer atividade econômica capaz de gerar uma nova realidade. Clandestinamente, como forma de prover o seu sustento, algumas famílias têm desmatado o restante da floresta para a produção de carvão vegetal. Como noticiou o Diário de Cuiabá em 05/08/2009:

 

Uma operação desencadeada neste final de semana pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente e a Polícia Civil interditou 55 fornos de carvoaria situados no assentamento Bojuí, a 30 quilômetros do município de Diamantino (208 quilômetros de Cuiabá). Conforme o diretor da unidade da Sema em Tangará da Serra, Alvino de Oliveira Filho, os locais estavam funcionando sem licença ambiental (www.diariodecuiaba.com.br)

 

Essas alternativas não devem ser entendidas como saída para uma condição de incapacidade de produção das famílias, mas representa uma incapacidade pública de apontar e direcionar caminhos que neste caso, estariam dentro da previsibilidade pública de apoiar os negócios rurais e permitir o desenvolvimento regional.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A agricultura familiar se caracteriza pela mão de obra familiar na produção e na gerência da unidade familiar. Sua organização, dentro das políticas públicas do governo federal, teve o intuito de promover o desenvolvimento da capacidade produtiva no campo permitindo um impacto positivo para a economia local com a implementação dos negócios rurais.

Entretanto, a dificuldade, falta ou descontinuidade dos programas e investimentos tornaram-se desafios para a permanência do agricultor familiar nas terras de origem e a falta de infraestrutura ao longo do tempo acabou por dificultar ainda mais seu desenvolvimento. A pequena unidade produtora perde a capacidade produtiva e sua continuidade se torna um desafio para os que ali permanecem com baixa produtividade ou quase nenhuma,o que impacta a economia do município, pois na falta de produção os comerciantes adquirem produtos de fornecedores de outros municípios aumentando o custo de logística, o que gera aumento no preço final.

Essa realidade também é algo para ser vencido no assentamento Bojuí cujas dificuldades de investimento, capacitação e logística levaram os moradores a enfrentarem uma diminuição de um crescimento que se iniciou com o projeto de criação de frangos ligado à Nova Mutum, podendo se diversificar com a produção de itens hortifrutigranjeiros capazes de atender às necessidades do município de Diamantino e seus arredores.

Essa possibilidade foi sendo apagada ao longo dos anos 2000 devido a falta de incentivos capazes de manter as famílias no campo percebendo nele a melhor forma de manutenção de sua existência material e de oportunidade de negócios e crescimento.

 

REFERÊNCIAS

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ABRAMOVAY, Ricardo. Agricultura familiar e desenvolvimento territorial. Publicado em 1993. Disponível em:<http://www.econ.fea.usp.br/abramovay/artigos>. Acesso: 25/05/15.

BRASIL: II PLANO NACIONAL DE REFORMA AGRÁRIA. Paz, Produção e Qualidade de Vida no Meio Rural. Edição Especial para o Fórum Social Mundial 2005. Brasil: 2005

CAMARANO, A; ABRAMOVAY, R. Êxodo rural, envelhecimento e masculinização no Brasil: panorama dos últimos 50 anos. Disponível em: <http://www.ipea.gov.br/pub/td/1999/td_0621.pdf >. Acesso 28/08/2015.

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CARVALHO, Claudinê Jordão de. Elaboração e Gestão de Projetos. Florianópolis: Departamento de Ciências da Administração / UFSC; [Brasília]: CAPES: UAB, 2011.

CURY, Maria Christina Holl. Elaboração de projetos sociais. In: ÁVILA, Célia M. de (Coord.). Gestão de projetos sociais. São Paulo: AAPCS, 2001. p. 37-58.

Decreto nº 91.766, de 10 de Outubro de 1985, I Plano Nacional de Reforma agrária, disponível em: < http:// www.mda.gov.br/arquivos/PNRA_2004.pdf > Acesso em 10/12/2015.

MATIAS PEREIRA, José. Curso de Administração Pública: Foco nas instituições e ações governamentais. São Paulo: Editora Atlas, 2010.

MISOCZKY, Maria Ceci Araujo; GUEDES, Paulo. Planejamento e Programação na Administração Pública. Florianópolis: Departamento de Ciências da Administração, UFSC; [Brasília]: CAPES: UAB, 2011.

SOUZA, Celina; CARVALHO, Inaiá m. m. de. Reforma do Estado, descentralização e Desigualdades. Revista Lua Nova, n. 48, ano 1999. Disponível em: /www.scielo.br. Acesso em: 25/11/2015.

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ZANELLA, L.. Metodologia de estudo e pesquisa em administração. Florianópolis. Departamento de Ciências da Administração/UFSC. Brasília. CAPES UAB, 2009.



[1]Especialização em Gestão em Agronegócios pela FID – Faculdades Integradas de Diamantino. E-mail: [email protected].

[2]Estabelecido pela Lei nº 4.504, de 30 de novembro de 1964.

[3]O Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) destina-se a estimular a geração de renda e melhorar o uso da mão de obra familiar, por meio do financiamento de atividades e serviços rurais agropecuários e não agropecuários desenvolvidos em estabelecimento rural ou em áreas comunitárias próximas. Retirado de: www.bcb.gov.br/pre/bc_atende/port/PRONAF.asp#1 Acesso em: 20/11/2015.

[4]Segundo Chiavenato (2000), o planejamento é uma das primeiras funções administrativas. Surge dentro da Teoria Clássica quando Fayol define as quatro funções administrativas: planejar, organizar, dirigir e controlar.

[5] Pode-se definir plano como sendo uma sequência ordenada de operações previstas para alcançar um objetivo. Trata-se de um conjunto de ações orientadas ao cumprimento de um objetivo estabelecido no curto, médio e longo prazo.

[6]Segundo a Organização das Nações Unidas – ONU, “Um projeto é um empreendimento planejado que consiste num conjunto de atividades inter-relacionadas e coordenadas, com o fim de alcançar objetivos específicos dentro dos limites de um orçamento e de um período de tempo dados.” (ONU, 1984). Para o Guia do Conjunto de Conhecimento em Gerenciamento de Projetos – PMBOK, um projeto é um “esforço planejado e executado com a finalidade de criar novos serviços, produtos e/ou para introduzir mudanças e inovações em processos organizacionais”.

[7] Fonte: Decreto nº 1.946 de 1996.