Administração Paulistana

A LÓGICA DO CONTRÁRIO

* Eneida Souza Cintra

Sou brasileira, paulista, paulistana e moradora da zona oeste, desde que nasci transitando pela Pompéia, Lapa, Vila Romana.; dentre esse meu parco conhecimento, incluo o centro que rodeia Praça da República (Barão de Itapetininga, Vinte e Quatro de Maio, Praça Ramos) por ter estudado por lá e ali freqüentado os melhores cinemas dos anos 60. Sendo assim, vou me ater ao que conheço, com pinceladas daquilo que as imagens televisivas mostram de lugares desprovidos de tudo. Para ser didática, separo em itens:

Limpeza e Alagamento: Na gestão atual, a prefeitura lançou a campanha "cidade limpa", impondo medidas padrões de out-door para melhorar o visual do município e a lei foi cumprida por temor às multas. Ao ver o mato tomar conta de ruas e canteiros, imagino que devo estar errada ´quanto à concepção de limpeza pois o governo faz questão de colocar em cada praça uma placa indicativa mostrando que aquele local está sob seu cuidado. Tenho que reconhecer que a honestidade impera neste aspecto: assumem que estão dando este tratamento: o mato que aumente, os ratos que venham, o lixo que se amontoe; nossos governantes devem achar belo e higiênico, fato que originou o nome da campanha.

Ao fazer uma compra no referido centro acerca de mais ou menos um mês, o mau cheiro que exalava deu-me a idéia de que nosso prefeito talvez seja (mesmo que distante), aparentado do nosso antigo príncipe regente D. João VI, que, se não era muito limpinho, pelo menos foi uma figura simpática e muitos benefícios trouxe ao nosso país; recordando um pouco da história – fundou o Banco do Brasil, inaugurou a Casa da Moeda, organizou a Biblioteca Nacional. Sua sujeirinha ficou desculpada ... Como ando meio esquecida, não consigo me lembrar de algo significativo que nosso governante tenha feito ...

Enquanto no período colonial, Aleixo Gari foi contratado para limpar as ruas da então capital Rio de Janeiro, deixando inclusive o legado do nome "gari", há na capital paulista, necessidade de desviarmos dos montes de lixo acumulados, ao mesmo tempo que ziguezagueamos para não trombarmos com moradores de rua que se drogam dia e noite.

Como meus conceitos são diferentes, eu alteraria o nome da campanha, colocando interrogação que sugeriria uma proposta: "Vamos tentar minimamente limpar a cidade?" Como esta propositura se opõe à nomenclatura do que é afirmado, está justificado o título que dei a este registro; como não entendo de marketing e não sou política, humildemente reflito: devo estar errada por ser inconcebível alguém que exerce cargo público se dignar a fazer perguntas ou buscar apoio ou fazer convites para que haja participação popular.

Ao invés de termos escoamento facilitado, passamos a ter enchentes de grandes proporções; mas, posso estar errada e talvez, todos os buracos que aumentam tanto em dimensão como em quantidade, sejam os substitutos dos bueiros entupidos."Mas a população não ajuda pois jogam lixo em terrenos baldios, deixam na rua; vem a chuva e carrega tudo ... entopem as bocas de lobo ..."é o jargão que se ouve e eu pergunto: onde estão os lixeiros? Ah ...já sei...novamente estou errada: o lixo provavelmente deve ser guardado em casa!!!

Soube que há recomendação para que não se coloque lixo na calçada com mais de duas horas de antecedência ao horário que o caminhão passa. Como sou obediente, fui saber qual a hora estabelecida para a minha casa: 16 horas. Perfeito: o site da prefeitura me forneceu a informação; beleza!!! Busquei e encontrei!! Bem organizado, pensei; já estamos melhorando ... Hum ... ledo engano!!! O lixeiro não recolhe antes das 21 horas!!Olha só o oposto aparecendo novamente: marcam determinada hora e passam em outra..

Agrego a isto, a presença da ameaça que surgiu a poucos dias: quem puser o lixo antes do prazo estabelecido, será multado!!! Portanto, atenção: a população deve ficar de plantão para, quando ouvir o som que tipifica o carro de lixo, sair correndo para depositá-lo na calçada!! Portanto, todos a postos, de ouvidos atentos!! Ninguém mais sai e nem trabalha porque se você errar no horário ... lá vem multa... A teoria dos opostos que eu inventei continua valendo porque se o horário estabelecido não for respeitado pelos garis, a administração pública não terá nenhum ônus.

Árvores, desmoronamentos: Coitado do cidadão que ousar cortar uma árvore ou podá-la!!! A multa vem, com nome e sobrenome: tantos reais, infringiu a lei.

Como não posso cortar a árvore e nem podar para que não se emaranhem nos fios, devemos permitir que caiam sobre nossas casas – claro!! Puxa, como não pensei nisto antes! Preciso ficar mais esperta nestas interpretações: a árvore pode cair, o telhado pode ser atingido, as pessoas podem se machucar, os carros podem ser amassados mas, é necessário que se respeitem as árvores, principalmente as velhas, cheias de cupins; devemos respeitar a natureza e deixá-las morrer no dia que for determinado pela natureza; aliás, há também os cupins que também são filhos de Deus (são "gente", como diria nosso então Ministro do Trabalho Rogério Magri) e precisam se alimentar. Lá venho eu novamente com a idéia dos opostos: o cidadão não pode se proteger porque toma multa mas a prefeitura deve ser respeitada: não paga nada pela displicência, susto e dissabor do cidadão atingido!! Como quem ficou sem telhado não consegue viver sem ele, o responsável pelo imóvel manda consertar e depois abre processo. Com absoluta certeza, vai ganhar a causa – quando? Não sei ... acho que estou querendo saber demais ... mais uma vez, estou errada com tanta exigência!!

Moradias em lugares inabitáveis são erguidas, córregos que passam perto contribuem para doenças; saneamento básico inexiste. Mediante catástrofes, funcionários que nunca apareceram, surgem do nada com ordem de desocupação. A responsabilidade recai sobre as pessoas que lá construíram. Mas, é claro!!! Onde já se viu erguer sua casinha num lugar impróprio. Para onde vamos? Não sabemos ... Há ordem e não há solução – oposição mínima à lógica.

Termino, concluindo:

- quem são vocês, além de empregados do povo?

-que poder é este que tão erradamente dizem que tem, se dependem do povo para aí estarem?

- que petulância é esta para determinarem o "cumpra-se" só depois das desgraças aparecerem quando pessoas são tragadas pelos rios que se formam com as enchentes?

- que inatividade é esta que não conseguem ou não querem antecipar?

- que pessoas são nossos governantes que mantém impostos altíssimos, sem nada ofertarem?

- a casa cai mas o IPTU vem ... o rio transborda mas a conta da água não deixa de chegar ... o apagão se instala mas a luz é cobrada ...

- os chamados dos paulistanos para que cortem os ramos das árvores que já ultrapassaram os fios, com temor de queda são simplesmente ignorados: ninguém aparece!!!!!!!!!!!! O cidadão apesar de atuar como fiscal gratuitamente, é eternamente ignorado ...

Ah ... São Paulo, minha São Paulo, esqueceram de você!! A esperança de encontrarmos competência foi com a água da enxurrada ... morreu como tantas pessoas morreram ...

A incapacidade e incompetência é tão grande que a então mais importante cidade da América do Sul permanece às escuras 10, 12 horas ...

Porque? Porque o poste caiu.

Porque? A árvore derrubou.

Porque? Não há pessoas para controlar, separar, estudar, verificar quais as árvores sadias e quais as que estão prestes a cair. As ruas são fechadas por particulares com escadas improvisadas, caixas de papelão, evitando que carros caiam nas crateras ou colidam com as o que caiu porque não há funcionários que possam atender a tantos chamados.

Ao Sr. Governador José Serra

Ao Sr. Prefeito Gilberto Kassab

À Sra. Sub-Prefeita Soninha, da Lapa

Respondam-me: em que trabalham? Como preenchem a vida? Ninguém é plenamente feliz se não tiver nada para fazer. Vejam o exemplo dos aposentados: correm atrás de algo para fazer para não morrerem de tédio. Faço estapergunta pois, certamente não é com as funções que o povo lhes deu que se distraem ... e, quem deu, tira!!!!!!!!!!!

Evidentemente, mais uma vez devo estar errada pois manter status, dá trabalho, né? E é por isso que não espero resposta: não terão tempo de ler ou responder e nem ordenar que o secretário do secretário do secretário do secretário se incumba disso

Retrato-me: estou errada. Nada do exposto tem razão de ser: a mãe natureza é que é culpada. Também ... com tanta chuva ... quem agüenta?