Domingos Sávio Henriques Malta1; Giovanni Gomes Lessa1; Thales Cerqueira Mendes1; Aécio José Araújo Passos Duarte1

1Professores do Campus de Senhor do Bonfim, BA.
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Resumo

Adequar o ensino de química a um público proveniente da zona rural do semi-árido e ao curso de agropecuária é um grande desafio que está sendo superado no IF Baiano, Campus de Senhor do Bonfim, na Bahia. Os alunos provenientes do ensino fundamental trazem sérias deficiências em matemática básica, na ortografia, gramática e interpretação de textos. Alguns chegam sem mesmo saberem a tabuada. Estudam, em sua maioria, em classes multi-seriadas e convivem com as deficiências e dificuldades dos professores do ensino médio. Além da deficiência nas operações básicas da álgebra, há grandes dificuldades no entendimento de textos e de enunciados de problemas, onde e principalmente, em física e em química um mesmo enunciado e equação matemática pode ser usado em diversos tipos de situação-problemas. Foi realizado um remanejamento dos conteúdos da disciplina de química, adequando às necessidades de matemática e português, notadamente no primeiro ano letivo. Esta modificação iniciou em 2008 e já duas turmas estão em acompanhamento apresentando melhoras sensíveis.

Palavras-chave: Ensino médio, Química fundamental, Zona Rural.

Introdução

Já há algum tempo o ensino da matemática e das ciências naturais está se tornando um problema grave no país. Os alunos entendem que a matemática é um verdadeiro monstro e este bloqueio os leva a não se dedicarem nas disciplinas que possuem a matemática como ferramenta, notadamente química e física.

Segundo Pinto Neto (2009) a linguagem é transformadora e em sentido amplo, as condições de produção incluem o contexto sócio-histórico, ideológico sem nos esquecermos da história. Informa que um texto é algo que media o que já existiu com algo que irá existir e para se compreender o que se fala é necessário relacioná-lo com outros dizeres exteriores a ele e, que se constitui como elementos de sentimento e crenças.

Observa-se que a contextualização na disciplina de química é algo que não é tão fácil de ser realizada, pois depende, principalmente, da compra de reagentes, vidraria e equipamentos mínimos para que se processem os experimentos e suas medidas.

Queiroz (2004) analisou um grupo de alunos que participaram de programas de iniciação científica, na área de química, comparando com os respectivos aprendizados e observou que havia poucos trabalhos publicados por eles. Também informa que as pesquisas não buscam estabelecer diretamente o "fazer ciência" e o "compreender ciência". Mesmo com estes problemas, conclui que a participação em projetos científicos traz uma "aculturação" aos alunos que aprendem melhor a linguagem científica e os tira da mesmice em concluir um curso teórico sem muitas práticas laboratoriais.

A grade curricular dos alunos que cursam Licenciatura em Química ou Física é bem menor que os alunos do curso de Bacharelado respectivo. Por que continuar com esta grade, uma vez que o aporte de maior conhecimento é mais produtivo para o desenvolvimento e entendimento das situações-problema a serem superadas? Observa-se também que o número de disciplinas que os levam aos laboratórios é também reduzido, o que acaba trazendo um desestímulo maior em praticar laboratórios como regente dos alunos do ensino médio. Muitas vezes, o número de cadeiras pedagógicas acaba superando as técnicas, principalmente por serem disciplinas que não trazem despesas com reagentes e manutenção de equipamentos.

Zanon (2004) informa que a necessidade de haver um maior incentivo aos docentes que queiram fazer um aperfeiçoamento nos conhecimentos que o levam a melhorar a qualidade do ensino é indicado como prioritário pelos grandes educadores do mundo. No Brasil, entretanto, sair para um programa de aperfeiçoamento em pós-graduação, para os profissionais do ensino superior, ainda é visto como algo desnecessário e dispendioso. Ora, imagine o que pensam em relação aos profissionais do ensino médio.

É necessário que os profissionais do ensino médio reflitam na qualidade da transmissão das informações das ciências. Felizmente há no Brasil bons livros tanto de química quanto de física e de matemática. Mas, é necessário haver uma melhor distribuição dos conteúdos teóricos na contextualização diária, adequando os conteúdos à realidade do aluno. Se estão aprendendo química dentro de um curso de agropecuária, a química tem que ser contextualizada para esta realidade e colocada de forma interdisciplinar com as outras disciplinas principalmente as de conteúdo técnico específico ao curso.

Metodologia

Foi aplicado um teste de matemática envolvendo conteúdos de todo o ensino fundamental, desde a tabuada a equações do segundo grau. Este teste foi aplicado em todas as salas e turmas, ou seja, dos primeiros aos terceiros anos do curso de técnico em agropecuária. O resultado, em todas as turmas, deixou muito a desejar.

Também está sendo aplicado um questionário sócio-econômico para poder avaliar as condições de cada aluno.

A grade de conteúdos das disciplinas de química foi modificada. Foi feita uma redistribuição dos conteúdos de modo a que no primeiro ano fosse eliminado qualquer conteúdo que utilizasse a matemática. Para isso, os gases e cálculos químicos, por exemplo, foram transferidos para o primeiro bimestre do segundo ano.

Foi dado maior ênfase na Feira de Ciências, chamada internamente de Tema Transversal, em experimentos de química e física sendo processados pelos alunos, simultaneamente na mesma sala, com o tema "A Evolução da Ciência e da Tecnologia", onde participaram alunos de todas as séries, indistintamente em todos os experimentos, promovendo além da integração natural uma melhor aprendizagem na transmissão dos conhecimentos inter-classe.

Resultados e Discussão

As tabelas 01 a 03 apresentam as modificações realizadas na grade curricular da disciplina de química do curso de técnico em agropecuária do IF Baiano ? Campus de Senhor do Bonfim.


Tabela 01: Grade curricular da disciplina de química no primeiro ano do curso de técnico em agropecuária do IF Baiano ? Campus de Senhor do Bonfim.
Primeiros anos Conteúdos
1º Bimestre Estudos da matéria, suas transformações e estados. Processos de divisão e purificação da matéria.
2º Bimestre Distribuição eletrônica, estados energéticos dos elétrons, ligações químicas, tabela periódica e suas propriedades.
3º Bimestre Funções inorgânicas, nomenclaturas e simbologia.
4º Bimestre Funções orgânicas, nomenclaturas e simbologia.


Tabela 02: Grade curricular da disciplina de química no segundo ano do curso de técnico em agropecuária do IF Baiano ? Campus de Senhor do Bonfim.
Segundos anos Conteúdos
1º Bimestre As leis dos gases.
2º Bimestre Dispersões, soluções e cálculos de variáveis de concentração.
3º Bimestre Número de mol, tipos de reações químicas, leis de Proust e Lavoisieur e cálculos químicos (estequiometria).
4º Bimestre Propriedades coligativas e Termoquímica.


Tabela 03: Grade curricular da disciplina de química no terceiro ano do curso de técnico em agropecuária do IF Baiano ? Campus de Senhor do Bonfim.
Terceiros anos Conteúdos
1º Bimestre Velocidade das reações químicas e Equilíbrios químicos.
2º Bimestre Eletroquímica: Eletrólise, pilhas e baterias.
3º Bimestre Estrutura e propriedades físicas dos compostos orgânicos e Isomeria
4º Bimestre Glicídios, aminoácidos, proteínas, polímeros e reações orgânicas.

A modificação da grade curricular do curso de química ocorreu nas turmas que se iniciaram em 2008. As turmas estão sendo acompanhadas e o rendimento letivo aumentou na disciplina de química. Atualmente, se observa que os alunos conseguem melhor entender a química. Entretanto, quando a situação-problema exige cálculos, como eles não têm domínio com a matemática, há um bloqueio natural. Conseguem estruturar a resolução do problema, mas não desenvolvem a álgebra necessária a obtenção do resultado. Isso também pode ser observado na física, onde a situação se repete.

A aplicação do teste de matemática em todas as turmas do Curso Técnico em Agropecuária provou a deficiência em matemática dos alunos. A CGE e o DDE decidiram oferecer aulas de reforço de matemática que estão sendo ministradas para todas as turmas, principalmente para os que iniciam o curso, que recapitulam grande parte do conteúdo do ensino fundamental.

Conclusões

Houve um maior aproveitamento dos alunos. O estresse provocado pelo não entendimento da química e da física, em função das dificuldades apresentadas em matemática foram minimizadas. Notadamente quanto às operações básicas e a interpretação de gráficos.

As aulas de reforço de matemática e as aulas normais de português melhoraram o entendimento geral na interpretação dos enunciados dos exercícios e situações-problemas.

Houve uma maior interação com a grade curricular do curso de técnico em agropecuária, trazendo uma maior interdisciplinariedade, principalmente com as disciplinas de Agricultura e Pecuária.

Agradecimentos
Aos alunos e a equipe gestora do IF Baiano ? Campus de Senhor do Bonfim.

Referências

PINTO NETO, P. C., QUEIROZ, S. L E ZANON, D. A. V. As disciplinas pedagógicas na formação e na construção de representações sobre o trabalho docente: visões de alunos de licenciatura em Química e Física. Educar, n. 34, p. 75-94. 2009.

QUEIROZ, S. L. e Almeida, M. J. P. M. Do fazer ao compreender ciências: reflexões sobre o aprendizado de alunos de iniciação científica em química. Ciência & Educação, v. 10, n. 1, p. 41-53. 2004.

ZANON, D. A. V., OLIVEIRA, J. R. S e QUEIROZ, S. L. O "saber" e o "saber fazer" necessários à atividade docente no ensino superior: visões de alunos de pós-graduação em química. Ensa10. vol. 11, n. 1. 2004.
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Projeto: Melhoria contínua no ensino da química.