Adão e Eva: Verdade ou Mentira?


Manoel Felizardo dos Santos
Doutorando em Ciências da Educação


Mais do que nunca todos os dias as pessoas são acossadas por uma série de perguntas e questionamentos acerca da fé e dos seus ensinamentos e essas perguntas surgem no nosso dia a dia, pois vivemos num mundo de um contexto social muito plural, religioso e intercultural onde a sociedade quer esclarecer dúvidas para a consistência da fé e do povo de Deus.
Assim percebemos que não basta fomentar sentimentos Cristãos ou recomendar comportamentos fiéis aos valores evangélicos. Faz-se necessário oferecer aos membros da sociedade e das comunidades uma fundamentação sólida da verdade que professam em resposta ás exigências de compreensão e justificação da própria pessoa e do seu meio em que vivem.
Palavras chave: Adão e Eva ? Bíblia - Pessoa humana

Introdução

O Gênesis nos convida a fazer um elenco dos males que estão a nossa volta, a tomarmos consciência que Deus nos convida a construir uma sociedade mais justa e solidária, a não praticarmos a injustiça, a olharmos as crianças abandonadas, a nos livrarmos da corrupção social e não sermos egoístas. Descobri a justiça a tempo é o grande desafio, desmascará-la é continuar escutando a Palavra de Deus colocando-a em prática para que possa surgir o paraíso que tanto falamos e almejamos.

A História de Adão e Eva é verdadeira, sem dúvida, mas não deve ser compreendida ao pé da letra. A Bíblia usa símbolos concretos para explicar coisas espirituais que não podemos ver. Quando a Bíblia diz que o mundo foi criado em seis dias ou que Deus formou Adão do pó da terra e Eva de uma costela de Adão, está usando uma linguagem simbólica, o ensinamento da Bíblia não é uma explicação científica da origem da espécie humana, mas uma mensagem religiosa sobre o sentido de nossa vida. Nem por isso deixa de ser verdadeiro como é uma declaração de amor da esposa e do marido.

Não precisamos acreditar que o primeiro homem se chamou Adão e a primeira mulher Eva, porque não é isso que Deus nos quer ensinar através da Bíblia. Adão significa em Hebraico simplesmente "homem" e Eva significa "mãe dos viventes" (cf. Gn 3,20).

Ao ler a Bíblia o leitor tem que ter uma visão que está diante de um livro religioso, portanto ele deverá ter uma visão religiosa, se assim não for, tudo que vai está a sua frente, ficará sem explicação e sem sentido, uma vez que para se entender as leituras Bíblicas o leitor primeiro tem que saber o que quiseram dizer os autores aquelas comunidades que liam os textos
Sagrados, pois sem saber o que disseram os autores aquelas comunidades, jamais poderão saber o que a Bíblia nos diz hoje.

Uma das maiores contribuições dos estudos modernos da Bíblia foi ter descoberto em grande parte do texto sagrado o que denomina "a intenção do autor", como por exemplo, quais foram às razões que o levaram a escrever aquilo. Como resposta as dúvidas que sempre surgem aos Cristãos acerca da criação, da figura de Adão e de Eva, elaboramos um artigo dessa história tão bela e tão inquietante que tanto fascina o homem.

Na procura da sua compreensão, deixando de lado o fundamentalismo, buscamos informar sem querer escandalizar, aqueles que têm os olhos e coração voltado para a verdade, e essa verdade só pode ser descoberta a luz do conhecimento e da pesquisa, tendo sempre como guia a Palavra de Deus.

Para poder amenizar a inquietação e o desconforto dos Cristãos e poder de alguma forma explicar este fato tão grandioso da história iniciamos dizendo que a história de Adão e Eva é verdadeira, sem dúvida, mas não deve ser compreendida ao pé da letra.

Por exemplo, quando cantamos o Hino Nacional ao falarmos que o Brasil está "deitado eternamente em berço esplêndido", ninguém vai pensar que existe um berço enorme no qual o Brasil está deitado. Mas através dessa linguagem poética, o autor do hino exprime uma verdade: os brasileiros vivem dentro de um território magnífico, comparável ao berço onde se põe uma criança.

Assim, também a Bíblia usa símbolos concretos para explicar coisas espirituais que não podemos ver. Diz que Deus formou o homem do pó da terra e insuflou em suas narinas um sopro de vida (Gn 2,7). Mas não pretendemos que se acredite que Deus tem mãos como nós para modelar uma imagem e que o sopro de sua boca deu vida a uma estátua de barro. Isso é apenas um modo de dizer, utilizado na Bíblia, para revelar verdades muito profundas sobre a nossa vida.

Quer dizer em primeiro lugar que somos criados por Deus: nossa existência é um presente gratuito dele. Não existimos por acaso, nem somos donos da nossa vida, mas a recebemos de Deus. Ele nos criou à sua imagem e semelhança (Gn 1,27), num gesto de amor, para nos comunicar a sua felicidade. Nós somos felizes à medida que reconhecemos Deus como criador e assim também colaboramos com o seu plano para que reine a justiça e a paz em toda a família humana.

A história bíblica da criação do mundo contém ainda muitas verdades importantes para a nossa vida. Por exemplo: Tudo o que Deus fez é bom: o mal não vem de Deus. A pessoa humana é o ponto alto da criação: Tudo o mais no céu e na terra foi criado para o nosso bem.

O ser humano não é um espírito que está provisoriamente aprisionado na matéria: ele faz parte deste mundo e na sua totalidade, corpo e alma, foi criado por Deus, para se ajudarem e completarem. O homem não é superior à mulher. Os dois merecem o mesmo respeito.

Este é o verdadeiro sentido da história de Adão e Eva. A Bíblia, não é um livro científico nem uma história como qualquer outra. É um livro religioso. Ela só pode ser entendida quando você, procura nela a mensagem de Deus para sua vida.

Não existe contradição entre a verdadeira fé e a verdadeira ciência. Elas tratam da origem do ser humano sob aspectos diversos. Quando a Bíblia diz que o mundo foi criado em seis dias ou que Deus formou Adão do pó da terra e Eva de uma costela de Adão, está usando uma linguagem simbólica, como quando o marido chama sua mulher de "meu coração". Nem por isso deixa de ser verdadeiro, como é verdadeira a declaração de amor da esposa para o marido.

A ciência não pode verificar se as afirmações da fé são verdadeiras ou não. A religiosidade só se entende pela fé e a fé não pode contradizer o texto bíblico que devem ser estudados fazendo as exegeses e as hermenêuticas para serem compreendidos.

Portanto, não há nenhuma oposição entre a narração bíblica e a ciência, quando esta afirma que a evolução do universo desde a sua origem até o aparecimento da vida humana levou bilhões de anos. Nem é contrário à fé cristã também admitir que o ser humano surgiu por evolução, a partir duma série sempre mais perfeita de animais, chamados pelos cientistas primatas e antropóides.

Os primeiros capítulos do livro do Gênesis têm um estilo próprio e muito especial. Comer o fruto proibido é ceder à tentação e desobedecer à ordem divina. Afastar-se de Deus para seguir os próprios caminhos é a causa de toda miséria humana. É verdade, a cena da serpente tentando Eva a comer do fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal emprega uma linguagem figurada, como a que se usa na poesia ou mesmo nas histórias para crianças. É uma história muito infantil.

Ninguém deve pensar que uma serpente falou que o pecado de Adão e Eva consistiu em comer uma fruta. Mas através dessas imagens a Bíblia oferece-nos um ensinamento religioso muito profundo. A narração bíblica explica que a culpa é do próprio ser humano: prefere seguir o seu desejo egoísta a obedecer à orientação de Deus.

Em vez de comportar-se como uma criatura, pretende "ser como Deus", decidindo o que é bom e o que é mau, segundo a sua vontade Você, não é obrigado a aceitar nem recusar a teoria da evolução. Podemos aceitar a evolução, mas devemos acrescentar que todo esse universo em transformação, e especialmente o homem foi criado por Deus.

Jardim do Édem, paraíso, fruto proibido, diálogo da mulher (Eva) com a serpente tentadora são elementos simbólicos, do mesmo modo que os próprios nomes de Adão e Eva. Não se trata da narração exata de um fato que aconteceu no princípio, mas de uma espécie de parábola. Numa linguagem aparentemente simples, a Bíblia transmite-nos uma verdade muito profunda.

O fato que a Bíblia quer nos ensinar é, portanto, que os seres humanos pecaram desde o começo. Esse pecado é transmitido a toda família humana. A Bíblia nos ensina que Deus não é responsável por nosso pecado. Ele é bom e nos criou para o bem e a felicidade.

É o homem que é responsável por seu próprio pecado, quando rejeita livremente a amizade de Deus. A Bíblia nos quer ensinar é que os seres humanos pecaram desde o começo e esse pecado é transmitido a toda família humana.

Assim, constata-se que a história narrada na Sagrada Escritura em seu primeiro livro, o Genesis, em que relata os primeiros seres humanos identificados como Adão e Eva têm sua forma simbólica, poética em forma de parábolas, que nos ensina que a primeira narrativa da criação (1,1-2,4) apresenta as águas disformes como caos, desordem e ausência de vida. Já a segunda narrativa, elaborada no tempo do rei Salomão (séc. X a.C), originou-se entre os nômades que viviam no deserto; para eles, terra seca é ausência de vida.

Por isso imagina como início da criação, a chuva e a possibilidade de o homem encontrar água. A grande benção inicial é, portanto, a água. Narram à história do Édem, um paraíso na terra, para onde confluem os maiores rios do mundo então conhecido, e onde as árvores e frutos são abundantes. Deus criou a terra para que o homem usufrua dela e possua vida plena (árvore da vida).

A condição única é o homem se subordinar a Deus: Obedecer ao seu projeto de vida e fraternidade, e não querer decidir por si mesmo o que é bem e o que é mal (comer o fruto da árvore do bem e do mal), a fim de não ser causa a espécie alguma de opressão e morte. Os versículos 18-25 salientam duas coisas: primeiro, que o homem tem domínio sobre a criação "dando nome aos animais" e, por isso, participa do poder criativo de Deus; segundo, que "a mulher não foi tirada da cabeça do homem para mandar nele, nem foi tirada dos pés dele para ser sua escrava; mas foi tirada do lado, para ser sua companheira".

O texto procura explicar a origem do mal. O centro dessa questão é a pretensão do homem querer ser como Deus (v.5), usurpando o lugar do Deus verdadeiro para tornar-se auto-suficiente, isto é, um falso deus. Pois, a autosuficiência é a mãe de todos os males, que são apenas conseqüência
dela. Deus é o Senhor absoluto, e seu projeto é vida e liberdade para todos, no clima de fraternidade e partilha.

O homem sonha possuir liberdade e vida plena: porém, na sua autosuficiência, ele produz o contrário: escravidão e morte. As relações de fraternidade transformam-se em relação de poder e opressão; a relação de partilha transforma-se em exploração, e esta produz riqueza de poucos e a pobreza de muitos. Desse modo, as relações ficam distorcidas e quebradas tanto dos homens entre si como dos homens com a natureza.

Nesse clima gerado pelo mal, que tende a se multiplicar, o caminho já não leva para a vida, mas para a morte (vv 22-24). Mas, através do seu amor misericordioso de Pai, Deus mantém a sua oferta de salvação para conosco. Graças à fidelidade de Jesus Cristo, os nossos irmãos podem voltar a sua amizade, não por nosso esforço pessoal, mas pela fé no amor de Deus que se revela em Jesus.
Assim, como a desobediência de Adão trouxe infelicidade para todos, assim também a obediência de Cristo abre para todos a via da salvação (Rm 5,19). Porque todos pecam, todos precisam ser salvos do pecado por Jesus Cristo (Rm 3,23-24).

A Bíblia ensina que Deus nos criou à sua imagem e semelhança para partilhar conosco sua vida e felicidade. Esse é o sentido da história do paraíso onde Deus colocou Adão e Eva. É evidente que não se trata de um fato histórico como, por exemplo, a morte de Jesus na cruz, mas de uma espécie de parábola, que serve para explicar uma verdade religiosa.

Não existiu um jardim paradisíaco muito agradável onde Deus passeava e conversava com o homem e a mulher. Mas com essas imagens a Bíblia quer mostrar qual era o plano original de Deus. Ele criou os seres humanos para viverem na sua amizade como filhos queridos.

A situação paradisíaca era apenas uma oferta, recusada pelo primeiro homem, nunca foi uma realidade histórica. Portanto esse fato não interferiu na evolução, nem modificou as condições de vida dos primeiros seres humanos, como são descritos pela investigação científica. Mas o pecado de Adão e Eva é um fato histórico.

Apesar de não se manifestar externamente, teve conseqüências negativas. Se o dom de Deus tivesse sido acolhido pelo homem, a história da humanidade teria sido bastante diferente. A qualidade moral de uma pessoa e a intensidade de sua fé religiosa não depende do grau de evolução cultural. De fato, existem pessoas consideradas altamente civilizadas, que não demonstram possuir nenhum sentimento moral.

Ao contrário, existem pessoas culturalmente simples que tem uma sensibilidade moral e religiosa muito fina e distinta: são plenamente capazes de distinguir entre o bem e o mal. O grau de evolução cultural não deve abalar a fé na verdade cristã do pecado original. A crença da Igreja no pecado original só pode ser entendida a partir da verdade mais fundamental de nossa fé: Jesus Cristo é o Salvador de toda humanidade.

Só poderemos descobrir essa fantástica notícia no momento que abrimos o nosso coração para essa grande e maravilhosa mensagem de amor. Ao fazer a leitura da Sagrada Escritura abra o seu coração para a mensagem que está lendo, medite o texto, contemple o texto, pergunte-se o que esse texto quer dizer aos homens e mulheres daquela época, o que esse texto nos diz na nossa época, como podemos viver através desse texto e, logo em seguida guardar no fundo do coração.

Como Maria, a Mãe de Jesus fazia. Nunca duvide da palavra de Deus Ela só vem fortalecer, e confortar os homens e dizer que não estamos sozinhos.
Esperamos ter contribuído para amenizar as dúvidas acerca desse assunto tão instigante, tão pesquisado e tão discutido desde os primórdios da história. Observamos que a Bíblia foi escrita para aquecer os corações das inquietações da procura de Deus, bem como confortar e dar a conhecer um pouco do nosso criador, dos seus mandamentos e do seu amor.

Essa descoberta só será possível a partir do momento que nos abrimos para o outro através da prática do amor e da partilha. Não devemos apenas fazer cultos frios e sem vida, de uma forma externa, sem comprometimento, mas com a participação com a comunidade.

PS. "tenham certeza que antes de Adão e Eva já existiam multidões de pessoas". "Esses dois personagens foram incluídos na história como referências de nossa desobediência a Deus". Não podemos e não devemos nunca ser fundamentalistas, por isso faz-se necessário sempre a procura da verdade.

Referências:
Álvarez Valdés, Ariel. Que sabemos sobre a Bíblia?/ Ariel Álvarez Valdés; / tradução Mario Gonçalves//. - Aparecida, SP: Editora Santuário, 2003.
Mac Dowell, João A. Religião também se aprende / João A. Mac Dowell. - Aparecida, SP: Editora Santuário, 2000. - (Coleção Religião também se aprende; 2)
Bíblia de Jerusalém. Nova edição, revista e ampliada, Terceira impressão, Paulus. 2004
Bíblia Sagrada. Edição Pastoral, Paulus. 1990.


E-mail: [email protected] Artigo proposto para a complementação do Doutorado em Ciências da Educação pela Universidad San Carlos- PY.