O espelho pode-se inferir que é o objeto surrealista por excelência! Assim como Lewis Carroll antes, quão Borges depois, Lacan o encarou curiosamente. Contudo o mesmo não permaneceu encarcerado apenas no caráter ilusório desse espelho, ao contrário, decifrou em sua teoria algumas esfinges. Encontrou a idéia de espelho pelo intermédio da poesia conduzida por Louis Aragon, poeta e militante. E, pela via clínica, após várias tentativas de teorizar os arcabouços teóricos advindos de Freud acerca das manifestações da paranóia: o narcisismo, o delírio de grandeza, auto-referência, e o sugestivo vínculo no qual se estabelece entre aquele que se sente perseguido e aquele a quem o perseguido o considera como perseguidor. Muitas vezes, a relação encontrada em ambos os casos se passa apenas com o caráter de puro fascínio, uma miscelânea entre ódio e também de amor, ao ponto que um não poder existir sem a presença do outro.

Temas antes de Lacan a respeito do espelho já haviam sido abordados pela literatura do século XIX, em algumas obras de Stevenson, Dostoievski, Maupassant, Hoffmann, e outros que registraram sobre a temática do “duplo”, ou “alter ego”.

No entanto, “seria bom que o espelho fosse um pouco mais reflexivo antes de nos devolver nossa própria imagem”, suspirava Lacan, aludi Cocteau.

Contudo, Lacan não era persuadido pelos efeitos de suas miragens. Buscava, além das aparências, um juízo coeso que ilustraria os fenômenos da esfera do imaginário. O inconsciente freudiano era o arquétipo, sucedido de novas elaborações; junto com a sistemática dos efeitos, em decorrência dessa função da linguagem no homem, pois a lógica ainda jazia da ordem do dia. Para Lacan, o estádio de espelho se dá partindo do desenvolvimento do sujeito, em sua fase inicial, que é quando brota o nosso primeiro conhecimento do “eu”, tendo essa noção um caráter completamente imaginário, pois essa noção do “eu” ocorre das concepções que outras pessoas implantam no seu âmbito vivente (a mãe, pai, irmãos, e etc.), por intermédio de uma atividade reflexiva do eu para com as outras pessoas que estão inseridas em seu meio, sendo que alguns desses laços são difíceis de desvencilhar, tal relação (de espelho) está inserida na esfera (no registro) do Imaginário, como é assistido após essa breve explanação de como se dá o desenvolvimento do estádio de espelho:

 

“O desenvolvimento é vivido como uma dialética temporal que projeta decisivamente em história a formação do indivíduo. O estádio do espelho é um drama cuja ação interna se precipita da insuficiência à antecipação; e que para o sujeito, presa da ilusão da identificação espacial, produz as fantasias que se sucedem desde uma imagem fragmentada do corpo até uma forma que chamaremos de ortopédica de sua totalidade - à armadura por fim assumida de uma identidade alienante, que vai marcar com sua estrutura rígida todo seu desenvolvimento mental” (Lacan, 1987, p. 90).

 

Tendo Freud como face de fundo, há uma inalterável na obra de Lacan que abarca diversas épocas e textos, adotando, em cada momento de sua teorização, novas perspectivas e precisões, sem nunca ter perdida tal alusão. Trata-se da alusão onipresente – tácita ou explícita- aos registros de Imaginário, Simbólico e Real, expostos por ele como sendo as esferas na qual é habitada pelos seres racionais, e são reveladas em um ensaio de caráter analítico.

“O Imaginário é o registro no qual compõe a esfera de onde se revela o ego. Devem ser considerados dois dos sentidos possíveis desta palavra: por um lado quer dizer falso, apontando desta maneira à ilusão de autonomia da consciência. Por outro lado, tem a ver diretamente com as imagens, a matéria-prima da qual se estrutura o estádio de espelho, por meio de identificações.

Em termos Freudianos, corresponde à dimensão do narcisismo, etapa intermediária entre o auto-erotismo e as relações objeta da libido. É o momento fundamental da cristalização da imagem do corpo, que dá lugar à instalação, no psiquismo, da matriz do ego.

O registro do Simbólico tem, na linguagem, sua expressão mais concreta: é o âmbito da palavra e suas conseqüências na constituição do ser humano, chamado tautologicamente de falante, por depender da qualidade humana de fala.

Este registro inclui o inconsciente, condicionado pela linguagem, assim como também a lei que ordena a vida humana e nos diferencia dos animais, e etc. Ou seja, é o que presentifica a cultura.

Na teoria freudiana, podemos identificar o simbólico nos textos que ilustram o funcionamento do inconsciente. Mas também naqueles que falam sobre o complexo de Édipo, por ser a função do pai ligada a esse registro.

O real, ou a terceira dimensão, define-se inicialmente pela negativa: é aquilo que não pode ser simbolizado nem integrado narcisicamente. A reflexão a seu respeito traz de novo velho problema filosófico da relação imediata entre o sujeito e objeto. Relação inviável, por estar o objeto sobredeterminado, e o sujeito condicionado pelo seu desejo. Portanto o Real é o que é, além de qualquer interferência, independe dos outros registros.”[1]

No sistema de freudiano, era a referência à base biológica do ser, baseada no meio no qual iria se constituindo o aparelho psíquico. Contudo, era o lugar outorgado ao trauma nos princípios de sua teorização: aquela coisa que, por brotar de repente, não consente que o sujeito se ampare, desestruturando-o.

Esses três registros estão presentes na teoria de Lacan, formando seu pino, a partir da primeira variante do estádio de espelho. Porém, em épocas distintas, Lacan destinou seus esforços à formalização de cada um deles especificamente, sem nunca deteriorar a coerência explicativa acerca do seu funcionamento. Daí é admissível decompor o ensino lacaniano em três momentos, segundo as perspectivas teóricas correspondentes a cada tópico temático ligado a seu contexto histórico:

I)                  O período inicial divide-se em duas partes, principiando-se em 1936, com a produção teórica do Imaginário, período no qual também se forma a primeira noção a respeito do estádio de espelho, e vai até 1953. Neste ano, com a fusão movimento psicanalítico francês, Lacan inseriu sua tese do inconsciente estruturado como linguagem e, até 1963, destinaria seu seminário ao estudo dos textos de Freud no qual Lacan por proferiria a distinção entre o Imaginário e o Simbólico. Para isto, fomentou a utilização de uma “álgebra” especialmente traçada para poder, então, elucidar algumas das questões em jogo.

II)               Em 1964, desabrocha o conflito entre Lacan e a Sociedade Francesa de Psicanálise, quando esta instituição o “excomunga” de seus exercícios de cunho didático, condição decretada pela Sociedade Internacional para adotar oficialmente o seu caráter formativo. Diante do impasse, Lacan cria a Escola Freudiana de Paris, e dedica seu seminário aos quatro importâncias essenciais da psicanálise – o inconsciente, repetição, pulsão e transferência – e, a partir daí, devota sua energia à criação dos termos no qual propusera para formalizar o registro do Simbólico, sendo explanados da seguinte forma: O sujeito dividido ($); o objeto a, causa do desejo; a cadeira significante (S1 e S2); e Outro (A); o sujeito que se supõe saber (no estadio de espelho), pivô da transferência, e etc. Os problemas decorrentes de sua articulação substituem as proposições iniciais. Nesta ocasião, que se dá inicio com a fundação da “Escola” e vai até 1973, qualifica-se pela exatidão dos elementos constitutivos do discurso lacaniano. Seu porta-voz, arranjado como mestre tinha como responsabilidade a tarefa de concretizar a base retórica sobre a qual levantaria essa nova instituição.

III)            A partir de 1974, o ensino de Lacan tem como objetivo o de elucidar os alicerces de sua teoria, empregando com isso faz uma alusão constante aos três registros, tendo uma atenção particular ao registro do Real.

O meio escolhido para do Real – impossível, por vias diretas – fez da matemática um imperativo imprescindível. Lacan se aproveitou dos raciocínios do da esfera da lógica e das manifestações topológicas para obter uma verdadeira “metateoria”, cujo intuito era levar até as ultimas conseqüências seu peculiar pensamento e a probabilidade de sua transmissão.

Nesta ultima etapa, entra em cena um novo componente, no qual é definido como arcabouço alegórico e perfeito de sua lavra. Trata-se do “nó borromeano”.

No informe de Roma de 1953, Lacan dizia analogicamente que os três registros jaziam laçados, lacrados, vinte anos após tal afirmação este informe abandonaria essa imagem retórica, se tornando real, um nó de fato.

Todavia, o que é um nó borromeano? E por que é preciso utilizá-lo para falar do lugar do sujeito na teoria psicanalítica?

Pode se inferir que o nó borromeano é um recurso à topologia – no qual esse é, por sua vez, uma seção da geometria ligada às propriedades essenciais que permanecem inalteráveis quando os espaços são deformados – permite impedir erros intuitivos de apreciação, por esses terem em suas estruturas e relações acessíveis derivados de preceitos lógicos. Os modelos topológicos, além da superação dos esquemas planimétricos ou cartesianos, justificam seu uso pela sua funcionalidade, isto é, pela capacidade de articular. Ou seja, de juntar coisas distintas e mantê-las unidas.

Os nós, tomados como objetos formais, encontram-se inseridos em um campo da topologia. Concretamente, eram conhecidos desde sempre por marinheiros e pescadores, bem como por artesãos e tecedores, da maneira pragmática. Mas pouco se sabe, em definitivo, sobre eles. O pouco que se sabe também a respeito desse nó é inserido no contexto histórico das culturas pré-colombianas, pois essas dispunham de um sistema (semiológico? matemático?) constituído só de nós – os kipus – que nunca chegaram a ser decifrados por completo.

O “nó borromeano” é formado por três círculos (que podem ser de barbante ou de qualquer outro material) e sua característica única e fundamental consiste em que, cortando um deles, não importando qual o seja, os outros dois não se mantêm unidos.

Essa amarração é a propriedade matemática que permite enlaçar – em três dimensões distintas – as categorias que decorrem da leitura lacaniana a respeito de Freud.

Em um dado momento, Lacan admitiu ser estruturalista, acrescentando em seguida, que sua estrutura em especial era constituída deste nó. Embora conhecido de acordo com a tradição pelos tecedores de macramê, seu nome sugere ser procedido do brasão com o qual era ornamentado o escudo de armas de uma nobre família do norte da Itália, Os Borromeu.

Este nó se faz favorável para perseverar a concatenação dos registros, na sua interdependência mútua, e evitar que seja analisado de forma separada, laborando-os em uníssono. Assim sendo, cada um dos três possui sua importância por igual, sendo, então, que nenhum deles é mais ou menos destacado que os outros, atuando, por conseguinte, juntos.

Até a presente ocasião, foram inseridas as propriedades do nó, a capacidade de se servir dele em razão das necessidades do pensamento lacaniano, assim como os elementos conceituais que ele conjuga. Porém, sempre é útil alçar algumas questões e examinar os sistemas de idéias, por mais sólidos que eles estejam. Para que serve tudo isto? Tratar-se ia tão somente de uma maquete abstrata e formal, passível de aparelhar uma teoria?Ou poderia ter alguma outra aplicação além desta?

As respostas para ambas as perguntas são afirmativas. Pois, além de servir como arquétipo de uma determinada concepção de uma dada teoria analítica, sua utilidade de caráter mais importante incidiu nas possibilidades na qual essa oferece para refletir a prática. Questão esta que pode ser dividida em duas perspectivas: por um lado, o que se passa na sessão de análise, entre o analista e o analisando e por outro lado, fundamentalmente, o nó sugerido por Lacan resulta como eficaz para determinar uma nova psicopatologia. Freud mencionara, a partir de suas anotações, o que necessita ser avaliado como histeria, neurose obsessiva, e etc., mas na medida em que a origem desses quadros clínicos provinha do campo da psiquiatria, sempre houve confusões a seu respeito, e não é raro se deparar – particularmente em alguns autores pós-freudianos – com a idéia de a psicanálise não ser nada mais que uma variante modernizada dos velhos elementos psiquiátricos.

Lacan, após ter necessitado dos postulados freudianos, procurou aprimorar estas dificuldades através de uma formalização exata. Foi o período em que Lacan direcionou sua preocupação para a lógica do significante, que desembocaria na experiência de exprimir taxativamente os elementos que compõem seu discurso analítico.

Tal recurso, embora seja inserido até os dias atuais, de larga utilização pelos analistas lacanianos, teria descoberto sua superação com a proposta do “nó borromeano”. Dos três registros, enlaçados desta maneira, pode-se determinar uma clínica, exclusivamente apresentada segundo a experiência analítica, sem nada dever à medicina.

A hipótese é a seguinte, desdobrada em diferentes passos lógicos: primeiro o nó – adequadamente amarrado, ou seja, acatando sua consistência formal – é concebido como uma figura topológica cujo seu traçado se compreende na localização do sujeito; segundo: a cada uma das interseções dos campos dos registros corresponderia uma determinada ordem de superposições, de tal maneira que o “Simbólico limitaria o Imaginário, o Imaginário limitaria o Real, e o Real limitaria o Simbólico”[2]; terceiro: as falhas plausíveis na constituição do nó indicaria as desestruturações “patológicas” do analisado, relacionados a sua vida, e as modificações dadas na ordem dos registros.

O efeito da explanação analítica precisaria ser ao nível das palavras, a aptidão de atuar o Simbólico com o télos de reorganizar a estabilização do “nó psíquico” dos três registros de tal maneira que o analisado tornar-se à livre da angústia, superasse suas inibições e eliminasse seus sintomas.

Os benefícios encontrados neste modo de pensar a clínica advêm de que não se avaliaria os conjuntos patológicos a priori, como categorias conectadas onde se condizem com os pacientes, mas que, pelo contrário, se procuraria decompor o que cada sujeito possui de singular, para poder proporcionar a emergência e o reconhecimento do seu desejo, que é singular em cada caso. Para isso, torna indispensável não confundir os registros para poder atender aos seus vínculos recíprocos.

Lacan esteve ligado ao movimento analítico por quase 50 anos. Sua produção é de uma extensão enorme e de uma dificuldade considerável.

Tentar resumi-la leva a um reducionismo nem sempre pertinente ao sentido do seu desenvolvimento. Entretanto, toda leitura implica a uma interpretação. Embora se pareça que o “nó borromeano” é a condensação que melhor exemplifica as teses lacanianas, há outra série de alternativas que representam contribuições importantes para a formalização da teoria analítica.

É o fato da lógica do fantasma, do ato analítico, do lugar do analista, e etc.

Dentre estas, proporei o aspecto do lugar do analista, para que possa dar um encadeamento lógico, com o intuito de elucidar o que é típico na sua ação.

O sintoma, acentuado como “a inscrição do Simbólico no Real”, admite que a pergunta Por que uma pessoa procura uma análise? Tivesse um caráter mais elucidativo.

Quando alguma pessoa se dispõe a começar uma análise, ao menos duas questões são pertinentes. A primeira seria aquele no qual esta na qualidade de ser o analisando interpreta o que o está fazendo sofrer como sintomático, ou seja, algo que no qual necessite de “cura”. Ao passo que a segunda, que é de caráter denotativo e dedutivo, conclui que sozinho não pode resolver seu problema e, portanto, necessita de ajuda.

Seguramente, se essa pessoa busca um analista, se supõe que o mesmo tenha um conhecimento prévio, talvez uma solução para os incômodos que o atormentam.

Esta atribuição de um “saber” relacionados aos sintomas e sofrimentos, que faz com que um indivíduo venha a solicitar o auxilio de outra, tal atribuição não é exclusiva da psicanálise, pois a mola impulsora que possibilita qualquer intervenção é dada no sentido terapêutico, tanto médico quanto psicoterápico.

O que distingue a psicanálise como uma prática ímpar esta relacionado com a posição no qual o analista se coloca perante os pedidos de quem o procura.

O médico, por exemplo, diante da queixa do paciente, conta com um arcabouço teórico e prático de uma acumulação codificada acerca experiência, que o permite, perante a certas manifestações, asseverar certas causas, e operar sobre elas.

O analista não. O que ele possui ciência é que os sintomas não estão relacionados com a fisiologia ou a anatomia, entretanto, está relacionado com os eventos ocorridos na vida da pessoa, e que isso não é determinado ou estereotipado.

Cada pessoa tem uma história singular, cada sintoma tem um sentido característico para cada um dos indivíduos, não sendo de utilidade as sumas de causa-efeito, como ocorre na medicina.

Como o analista deduz o que um sintoma constitui para uma pessoa em especial?

Inicialmente, o analista se coloca fora do lugar de quem possui um conhecimento de “tudo”, o que faz com que o mesmo possa ouvir a veracidade alheia. Após esse exercício, o analista pede para que o indivíduo que está na qualidade de analisado expresse-se, fale de tudo o que vier em sua mente, pois nos deslizes, nos tropeços que o analisado faz que brote o que encontrará no “problema” específico daquele sujeito.

Para isso, o analista usa um método de investigação denominado “sui generis”, e esse incide em solicitar para que a pessoa lhe fale tudo que vier à cabeça, sem arranjar nenhum tipo de censura ou alternativa das idéias a serem compartilhadas.

Como decorrência, ocorrerá que quem abriga esta sugestão talvez não atinja o fim de um pensamento, já que essa conversa com o analista difere de um diálogo normal, no qual a pessoa teria de se esforçar para ser lógico e conciso.

Como na analise ele pode discorrer qualquer coisa com qualquer coisa, vai assemelhar-se a uma conversa de loucos, no qual uma acontecimento se passa para outro sem terminar o diálogo anterior.

Este método é adequado a psicanálise, e é denominado de “associação livre”. O que, além disso é uma calúnia, pois, como Freud demonstrara exaustivamente pela “Interpretação dos Sonhos”, na definição da psicopatologia da vida habitual e no estudo dos chistes, toda lavoura psíquica é sobredeterminada.

“Quem fala nem sempre sabe o que diz, ou quando diz o que quer dizer, não sabe o que está falando”. Precisamente para aperfeiçoar esse efeito de receptor da fala do analisando é que o analista emprega o divã. Para que o paciente possa se concentrar de forma adequada em seu oportuno fluxo discursivo, facilitando que se abisme consigo mesmo e, ao não ter o analista como perspectiva, dessa forma tornar-se à mais fácil falar para ele, e não a respeito dele.

Pois é claro que o analista, na posição de demonstrar seus próprios gostos, este não fala o que quer ouvir, o analisando, buscando interessá-lo, falará do que supostamente o agradará. Desta forma, a confiança na qual se fazia uma declaração passa a ser relativizada por uma série de fatos “coincidentemente” agregados.

É assim que várias vezes o individuo que odeia demais admite amor e quem menospreza quer obter.

A pessoa conclui “confessando” o que ininterruptamente soube, mas que não queria acatar. Pois, mais que respostas, se depara com seus próprios enigmas e apreende que a chave para decifrá-los é a sua história.

Processo necessariamente lento, durando o quão deva para cada um. Quem faz a analise, então, é o analisando. O analista dá condições para que aquilo que o sujeito ignora de si mesmo possa ser conectado por este, como sendo característico dele.

O analista faz isto valendo-se do efeito que Lacan intitulou de “semblante”, que por sua vez consiste em tolerar o que não se admite, sem demonstrá-lo. Este é o emprego do silencio, a condição da escuta.

O analista, além disso, intervém às vezes no discurso do analisando. Porém, ao não estar comprometido com o que este pensa que diz, e, portanto, não ter de aconselhar, opinar, ou sugerir, suas intervenções vão se dirigir a pontos desta fala onde ele terá aprendido a encontrar as manifestações do inconsciente.

Se corretas, tais pontuações irão dar novas cadeias associativas, diferentes das que encontravam se seguidos, e se relacionam entre si por um anseio desconjuntado.

A questão central do ato analítico consiste na modificação subjetiva que dá-se efeito quando o analisando, que no começo desconhecia o porquê do seu sintoma, e padecia por isso, a partir da interpretação do desejo, passa a reconhecê-lo como elemento característico de si, com todos os efeitos que isto alude em sua vida.

Era muito mais simples vender certezas. O método freudiano estabelecia que o analista ofuscar-se ia, ou seja, não se admitisse levar se pelas suas emoções, valores, opiniões, para, assim, brincando de “morto”, poder atuar de forma que o analisando produzisse suas próprias verdades, ainda que alarmantes.

Este intuito, de maneira mais elaborada, pode também ser percebido como verossímil o emprego do “morto” dos jogos de carteado, onde, a partir de certas jogadas, se podem inferir as cartas que o constituem.

Tal posição de caráter difícil no sentido de lidar acabou sendo substituído, como é mostrado no exemplo da psicanálise americana, que o traz como parâmetro de sadio, avaliar-se a “doença” do analisando, reformulando-o pelos seus valores.

O papel do analista sugerido por Freud é dificílimo. Pois nenhum analista poderia arrastar ao limite o ideal da neutralidade; o limite do analista é sua humanidade.

Freud, ao distinguir a psicanálise das psicoterapias, definiu-as como antagônicas, ou seja, o que não é analise seria sugestão. Criou, também, a semelhança dos processos analíticos com a mineração do ouro

Esta, assim como psicanálise, possui um ideal de pureza. Tanto uma quanto a outra serão melhores e mais preciosos logo que apresentam um grau menor de impurezas, é importante salientar que ouro 100% puro não existe bem como a psicanálise.

Dando continuidade a essa semelhança, pode-se sobrepor que assim como a mineração do ouro progrediu, admitindo maior pureza e precisão nos resultados obtidos, o mesmo ocorre na analise, com a atualização que ocorre a partir de Lacan, esta proporcionou maiores probabilidades de eficiência na sua busca, seja esta de caráter ético quanto técnico.

3. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

  • DIAS, M. G. L. V. 2006, Ágora: Estudos em Teoria Psicanalítica. Vol. 9 n°1 Rio de Janeiro Jan/Junho 2006
  • LACAN, Jaques O Seminário de Jacques Lacan. Livro II: O eu na teoria de Freud e na técnica da psicanálise 1954-1955(Le Séminaire de Jacques Lacan. Livre II: Le moi dans la théorie de Freud et dans la technique de la psychanalyse (1954-1955)). Ed. Zahar, São Paulo, 1987
  • MILNER, Jean-claude, Os Nomes Indistintos / COMPANHIA DE FREUD;
  • SAFATLE, V. P. Lacan, 1ª Ed., 2007 Publifolha;
  • SAFATLE, V. P. Mirrors without images: Adorno and Lacan on mimesis and recognition. Radical Philosophy, v. 139, p. 2-12, 2006;
  • SAFATLE, V. P. Uma clínica do sensível: sobre a relação entre destituição subjetiva e primado do objeto em Jacques Lacan. Interações (Universidade São Marcos), São Paulo, v. X, n. 19, p. 123-149, 2005.
  • Lacan, J. (1987). El estadio del espejo como formador de la funcion del yo. In L. Lacan, Escritos I (pp. 86-93). México: Siglo Ventiuno.

 

 

 

 

 

 

 



[1]  Parte constituinte do seminário apresentado a respeito dos “Nomes Indistintos (R.S.I.)” de Milner, pelos discentes: Jefferson, Mariana e Pedro; realizado no dia 23/11/2009

[2]  Milner.Jean-Claude.Os nomes Indistintos