A história conta de forma bondosa e humana o episódio em que Moisés foi abandonado num cesto ao longo do rio Nilo e criado por uma princesa com valores nobres. Daí por diante os recém nascidos abandonados não tem tido a mesma “sorte”. O desfecho em torno de abandonos passa por outras questões que vale a pena buscar reflexões íntimas. .A partir do século XVII, o número de bebês abandonados começou aumentar em proporções que deixaram à opinião pública incomodadas. Relatos da época mostram que eram tantas crianças deixadas pelas próprias mães na calada da noite, em ruas desertas e que muitas delas foram comidas por cães famintos ou morriam de frio e fome. Era comum também serem deixada à beira da praia, e acabavam morrendo afogadas assim que levadas pelas marés. Diante desta barbárie contra inocentes as igrejas e conventos criaram as “rodas de abandono”. Esta prática amenizava o problema social criado nesta época, a criança teria a “sorte” de ser criada por algum padre ou freira até que lhe conseguisse uma família.


Em nosso País as primeiras rodas apareceram no Rio de Janeiro e em Salvador, caracterizando os primeiros sintomas de um problema urbano, que hoje ainda choca a população. Nesta medida, percebem-se falhas das intenções, tanto sociais como políticas, pois, só serviu para garantir o anonimato da criminosa (o), além das dificuldades para o direito da identidade do inocente. Nesta época a culpa era puramente atribuída ás famílias. Agora que passamos pelo século XX e em pleno século XXI; era da comunicação, do algoritmo, da mundialização da economia livre, (para os que podem pagar). Enfim não faltam chavões para justificar o processo de desumanização que vem ocorrendo com a sociedade.

Em alguns países é comum mas (não  aceitável)   encontrar bebês principalmente do sexo feminino apodrecendo nas sarjetas. Estamos presenciando gradativamente esta prática no Brasil.  Seria  redundante  perguntar de quem é a culpa? Continua sendo por falta de apoio familiar? Ainda são as convenções sociais e religiosas que seqüestram suas decisões? Podemos culpar a sociedade que tem gerado filhos desprovidos de presença materna e paterna e do saudoso aconchego familiar? Será culparemos o cerceamento das políticas assistenciais reduzidas?  Ou será que é o fim da luta pela sobrevivência digna que estamos perdendo em tempos de globalização? ...

Ainda podemos buscar culpados na televisão que difunde desde a vitalícia novela Malhação às minisséries fora de hora, os modelos de comportamento que servem apenas para jovens providas de recurso? Que civilização é essa que só tem um processo seguro para os mais afortunados?  Cada bebê que nasce hoje se torna um fardo pesado demais para as famílias carentes e miseráveis. Como cuidar então, de uma criança que foi gerada contra a vontade ou falta de informação ou de acesso a métodos contraceptivos? Parte das mães é adolescente, com as exceções, a grande maioria não tem condições materiais, psicológicas para criar e educar e sustentar esses filhos, que as fazem abandonar os estudos, deixar de trabalhar e buscar melhores perspectivas de vida. 

Longe de mim justificar este ato. Quero que pensemos na “lei da oferta e da procura”.  Em tempo de globalização não há emprego, alimentação, habitação, sistema público de saúde ou de educação para todos. Mesmo que o governo crie as “Bolsas” é preciso fazer muito mais, é preciso criar políticas publicas a médio e em longo prazo para que a população não cresça além dos recursos que a sociedade possa oferecer. Um País só cresce quando sua população atinge índices de desenvolvimentos humanos no mínimo aceitáveis para estabelecer a dignidade de seu povo.

Lançando aqui uma questão um tanto polêmica, indago e fico tenebrosa com as respostas que virão... Será que é possível a aqueles que enriqueceram furtando o resto da nação aceitem a redistribuição da riqueza que acumularam? Será que a riqueza oriunda da corrupção histórica amolecerá os corações dos corruptos a cada bebê, deixados em sacos de lixo, boiando em represas ou atirado em córregos imundos? São tempos de globalização e de desumanização! Como acreditar que seria possível uma revolução social desta natureza?

No ano passado o atual Ministro Saúde do Brasil mostrou seu interesse em discutir a Legislação para legalização do aborto no Brasil, justificou afirmado que fazia esta fala em nome das inúmeras mães e crianças que morrem praticando aborto clandestino: Foi excomungado! Nós a população, dividimo-nos entre enfrentar a “maldição” e a ação de grupos religiosos enfurecidos, que defendem ideologias medievais contra qualquer método de contracepção, e preferimos ficar com o “politicamente correto”. Preferimos cometer o crime da omissão?

Ah! Faltam poucos meses para que as criancinhas abandonadas nas ruas, semáforos, orfanatos, virem vítimas preferenciais da mídia brasileira. Ah!  Faltam poucos meses para que nossos corações amoleçam com a imagem sagrada do Menino cercado de presentes, junto de seu Pai e de Sua Mãe, aquecida numa cestinha, adentre nossos lares. Isso em “tempos de globalização”.