Levando em conta as idéias expostas na teoria de Gardner, surgem inúmeras novas metodologias educacionais que trabalham com a multiplicidade das inteligências presentes no indivíduo. Algumas dessas metodologias trazem versões diferentes de como as inteligências devem ser educadas para as chamadas disfunções psiconeurológicas da aprendizagem da leitura e da escrita (afasia, dislexia, discalculia, disgrafia, disfunção cerebral mínima etc.).
Gardner identificou as inteligências linguística, lógico-matemática, espacial, musical, corporal cinestésica, interpessoal e intrapessoal.

Em nossa vivência em sala de aula, é possível observar que cada aluno apresenta - a princípio - uma gama ampla de diferentes características intelectuais, e que o convívio escolar vai permitir ao professor, mesmo não especialista no assunto, constatar que cada aluno apresenta algumas delas como mais evidentes. Essas especificidades dependem, essencialmente, de sua origem e/ou formação genética e influenciadas pelo meio onde cada um vive e com quem se relaciona, ou seja, o padrão original pode sofrer alterações durante todo o seu ciclo de vida. Dentro desta visão, fica claro que a possibilidade de alterar os padrões inteligíveis do aluno depende quase que inteiramente do orientador, e do método aplicado no processo de ensino-aprendizagem.

Em vista dessa complexidade, é necessário reconhecer que não é tarefa fácil para os educadores compreenderem essa pluricausalidade. Portanto, torna-se comum constatar que as escolas, a maioria das vezes inconscientemente ou falta de conhecimento têm a tendência de rotular alunos com dificuldade de aprendizagem para uma determinada área do conhecimento humano como menos inteligentes ou problemáticos. Condenam esse tipo de aluno à repetência ou multirrepentência e, agindo assim, determinam a exclusão desse indivíduo do seu grupo de amizades e a todas as consequências psicológicas daí resultantes. Além disso, rotulam esse tipo de aluno como “sem solução” e vítimas da desigualdade social.

Para que este contexto se modifique, é imprescindível que o educador desenvolva uma autocrítica extremamente apurada, tarefa nada fácil a qualquer ser humano, mas imprescindível para um educador consciente de sua missão emancipatória.

O processo de auto-avaliação permite a detecção de deficiências pessoais que, por muitas vezes, acabam contribuindo para o aumento das dificuldades de administração dos problemas de aprendizagem. Muito comum nos trabalhos apresentados por diversos profissionais da área é o estabelecimento do foco deficitário no aluno. Cremos que dadas às características construtivas do caráter e da inteligência serem crescentemente mutáveis, quanto mais novo o indivíduo, menor é sua construção dogmática. Ou seja, os indivíduos mais novos, ainda não têm cristalizado dentro de si dogmatismos provenientes das gerações mais velhas e são, consequentemente, muito mais fáceis de serem trabalhados pelo educador se este for capaz de agir pedagogicamente de forma crítica a seus próprios dogmatismos, que só prejudicam seu desempenho como docente, um profissional do ensino que precisa estar comprometido com o amanhã.

Segundo Scoz (2000), frente a problemas de aprendizagem dos alunos relativas a sintomas, os professores nem sempre conseguem expressar-se com clareza. Algumas vezes, por falta de conhecimento, outras, pela complexidade dos problemas. Quando se referem a obstáculos, os professores relatam interferências funcionais, como ausência de orientação espacial e temporal. Falta-lhes, segundo informam os professores, coordenação motora nas interferências sócio-afetivas, principalmente, enfatizam, nas relações familiares já que a indiferença dos pais torna os alunos extremamente carentes do ponto de vista afetivo explícitas na falta de autoestima. A desorganização familiar, a ausência de limites, a agressividade nas relações familiares, as perdas, a falta de interação com materiais gráficos e a pobreza também são vistos como obstáculos. Como lembra ainda Scoz (2000: 82), “A origem de toda a aprendizagem está nos esquemas de ação que o indivíduo desenvolve e que dependem, por sua vez, da integridade orgânica e corporal.” Dessa forma, sob o olhar do professor, o problema de aprendizagem tem uma causa única, e não uma pluricausalidade, como se tem argumentado e embasado até então.

Bassedas (1996) salienta que o papel solicitado ao professor é o de uma atuação constante, de modo que privilegie todo o grupo e intervenha de forma particular com cada aluno. Essa tarefa é difícil e exige bastante conhecimento e atenção do professor no que tange ao processo de aprendizagem de cada aluno para uma intervenção seja, pelo menos, adequada.
A realidade escolar tem mostrado um alto índice de fracasso e evasão, principalmente nas classes de alfabetização para as quais, muitas vezes, as escolas elegem o professor que acaba de ingressar no magistério. Para este docente, atuar nas primeiras séries é uma experiência sem experiência uma vez que desconhece a didática diferencial de um professor alfabetizador.
Diante deste quadro, o professor se angustia e tenta, de alguma forma, camuflar ou desculpar-se diante do problema. Fini (1996, p. 65), a respeito, afirma:
 [...] com frequência, os professores procuram explicar por que o aluno não aprende, atribuindo à culpa, apressadamente, a aspectos isolados, deficiências de natureza biológica, psicológica e cultural, carências de diferentes tipos, em detrimento de pesquisas mais abrangentes e de análises mais criteriosas capazes de esclarecer a situação.
A criança, quando tem a oportunidade de expor suas idéias, acaba demonstrando em que etapa do processo de aprendizagem ela se encontra Ao falar, trocar ideias entre os colegas, quando explica, argumentando sobre suas hipóteses está interagindo, reelaborando o conhecimento já adquirido. O professor precisa incentivar o aluno a expor suas ideias, sem se deixar levar por um reducionismo conceitual do tipo certo/errado, já que o aluno pode estar levantando hipóteses sobre um fato conhecido (erro construtivo). Portanto, o professor deve perceber que o “erro” do aluno pode ser útil para facilitar o desenvolvimento da aprendizagem. Aliás, a pedagogia do “erro” é um desastre para o processo ensino-aprendizagem já que o erro, neste caso, desempenha um papel fundamental já que se constitui numa importante etapa da aquisição do conhecimento.

Segundo Paz, (op. cit Pain, 1992, p. 28), podemos considerar o problema de aprendizagem como um sintoma, no sentido de que “o não aprender não configura um quadro permanente, mas ingressa numa constelação peculiar de comportamento em que se destaca como sinal de descompensação”.

Esses problemas de aprendizagem referem-se às situações difíceis que a criança encontra, mas sempre com expectativas de que, a longo prazo, terá sucesso. Eles interferem de forma significativa no rendimento escolar individual. Um aluno que não consegue acompanhar o ritmo de seus colegas apresenta dificuldades para ajustar-se aos padrões e normas estabelecidos pela escola, ou sente-se desmotivado e perturbado emocionalmente. Quando enfrenta uma metodologia inadequada, é agrupado aos alunos que já estão rotulados como possuidores de problemas de aprendizagem.

Scoz (2000, p. 45) agrupa os problemas de aprendizagem segundo a concepção de Visca (1987) para quem as dificuldades de aprendizagem referentes à escrita e à leitura apresentam-se no nível dos sintomas. Assim, esses problemas devem ser entendidos como produtos emergentes de uma pluricausalidade e não como decorrente de causa única.
Diante dessa complexidade é necessário reconhecer que não é tarefa fácil para os educadores, compreender a pluricausalidade das quais decorrem os problemas e/ou dificuldades de aprendizagem, assim, torna-se comum constatar que as escolas acabam rotulando e condenando o aluno com esse perfil à repetência ou multirrepentência, colocando-o à margem do processo e qualificando como aluno “sem solução” e vítima das desigualdades sociais.

De acordo com Pain (1992, p. 30), os problemas de aprendizagem não são considerados como o contrário de aprender já que entendidos como “sintoma” está cumprindo uma função positiva, tão integrativa como a desta última, mas com outra disposição dos fatores que intervém.
Talvez esteja nesse ponto um dos maiores impasses para se compreender os problemas de aprendizagem, em parte pela complexidade e também pelo desconhecimento do significado do “não-aprender”.
Pain (1992), afirma que o problema de aprendizagem é entendido como uma patologia, considerada em dois sentidos; um amplo, pouco estudado e explorado; e outro, em sentido mais estrito, mais comum nos consultórios e escolas, não tão profundo e mais aceitável para um sujeito que aprende. Para essa autora, existem quatro fatores que atuam sobre os problemas de aprendizagem: os orgânicos, os específicos, os psicógenos e os ambientais. Tais fatores devem ser levados em consideração no momento do diagnóstico, pois quase sempre mais de um deles estão comprometidos.

Ao tratar sobre os fatores orgânicos, Pain (1992, p. 29) esclarece: “a origem de toda aprendizagem está nos esquemas de ação desdobrados mediante o corpo.” Como o indivíduo é um todo e não partes que trabalham isoladas é necessária uma integração entre anatomia, bom funcionamento de todos os órgãos, bem como do sistema nervoso central.

No que se refere aos fatores específicos, a autora afirma existirem diversas desordens específicas ligadas a determinadas áreas também específicas, as quais perpassam questões cognitivas e motoras. Quanto aos fatores psicógenos, subsidia-se na teoria psicanalítica, mas afirma que se devem levar em consideração também as disposições orgânicas e ambientais do sujeito. Ela destaca (1992, p. 32) que, na concepção de Freud, os problemas de aprendizagem não são erros, mas “[...] são perturbações produzidas durante a aquisição e não nos mecanismos de conservação e disponibilidade [...]”; é necessário procurar compreender os problemas de aprendizagem não sobre o que se está fazendo, mas sim sobre como se está fazendo.

Nos fatores ambientais, encontram-se os elementos que muitos professores vêm levando em consideração com prioridade, ou seja, as questões de moradia, bairro, escola e oportunidades de lazer, “considerando que o ambiente é mais gerador de problemas escolares do que de aprendizagem” (Op. Cit). Somados a outros fatores contribuem para dificuldades de aprendizagem, mas considerados isoladamente são eles geradores de problemas escolares como a evasão.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BASSEDAS, E. (1996). Intervenção Educativa e Diagnóstico Psicopedagógico. Porto Alegre, Artes Médicas.

FINI, L. D. T. (1996). Rendimento Escolar e Psicopedagogia. In: SOUZA, Maria Thereza Costa Coelho de; BRENELLI, Rosely Palermo (Orgs.). Atuação Psicopedagógica e Aprendizagem Escolar. Petrópolis RJ: Vozes.

GADNER, H (1995). Inteligências Múltiplas: A Teoria na Prática, Porto Alegre: Artes Médicas.

PAIN, S. (1992). Diagnóstico e Tratamento dos Problemas de Aprendizagem. Porto Alegre: Artes Médicas.

SCOZ, B. (2000). Psicopedagogia e Realidade Escolar: o Problema Escolar e de Aprendizagem. 4ª ed. Petrópolis, RJ: Vozes.

VISCA, J. (1987). Clínica Psicopedagógica: Epistemología Convergente. Porto Alegre: Artes Médicas.