As espetaculares ações da polícia, exército, marinha e polícia federal terão impactos bastante negativos na mídia internacional. Aos olhos das pessoas em todo o mundo, estamos muito parecidos com o Iraque, Afeganistão, Faixa de Gaza etc. Provavelmente os iraquianos e afegãos devem estar até se sentindo muito mais confortáveis e menos pessimistas depois de verem os noticiários pela televisão ou pelos jornais sobre a violência carioca. Helicópteros militares, carros de combate semelhantes aos utilizados nos campos de batalha, dão a impressão de que o Rio de Janeiro é apenas um cartão postal escondendo uma realidade muito diferente. Sob os braços do Cristo Redentor se esconderia uma carnificina de fazer inveja a qualquer praça de guerra.
Não é para menos, depois de carros e ônibus incendiados, postos policiais atacados com fuzis e metralhadoras fica a impressão de que ninguém pode sair nas ruas na cidade chamada maravilhosa. Evidentemente nem tudo é exatamente como parece ser. Ontem mesmo liguei para um amigo que mora no Rio para perguntar sobre a situação e ele respondeu com muita tranqüilidade: "Por enquanto está tudo calmo por aqui. Estou no trabalho e de vez em quando dou uma olhadinha para a vista maravilhosa do Rio. O problema é lá nos morros, sabe como é que é".
E o que estarão pensando os membros do Comitê Olímpico e da FIFA? Provavelmente devem estar se questionando se fizeram a escolha certa com tantas opções mais tranqüilas, sem problemas de infra-estrutura, sem necessidade de endividamento dos países para receber os eventos.
São preocupantes as imagens que as pessoas constroem a distância. Um casal de ingleses que se hospedou em casa em 2008, ficou estarrecido com as imagens que viram ao longo do caminho entre o aeroporto de Guarulhos e São Paulo. "O Lula não resolveu este problema?". Para eles o presidente operário teria dado uma guinada de 180 graus no país, acabando com a pobreza por decreto. Para um olhar distante parece ser fácil, mas o problema é muito mais complexo. De qualquer forma os ingleses, levaram um choque de realidade quando conheceram algumas favelas e saíram daqui com uma imagem bem diferente da que construíram no conforto de Londres.
Da mesma forma os iraquianos ou os israelenses devem tocar as suas vidas normalmente e os ataques suicidas, são eventos episódicos que não alteram o cotidiano das pessoas. Evidentemente há uma tensão constante com os filhos, esposa ou maridos que estão nas ruas, mas é preciso viver.
Voltando ao problema das ações militares na Vila Cruzeiro e depois no Complexo do Alemão, que muita gente chegou a pensar que Freud já teria decifrado, fica a impressão, para os menos avisados que o tráfico vai se render a um governo capaz de colocar o exército nas ruas. Talvez as lutas intestinas entre as quadrilhas sim, mas o tráfico, como negócio que movimenta centenas de milhões não vai parar. Primeiramente, porque os consumidores das classes mais abastadas continuarão consumindo o pó branco e suas variantes e para isso é preciso à mobilização de um exército de "funcionários" para atendê-los no varejo ou a domicílio. Muita gente vive disso e não podemos tampar o sol com a peneira. Nas grandes capitais do mundo o tráfico funciona como um negócio marginal, mas tolerado pelo estado e pela polícia. Quem viu o filme "As invasões bárbaras" tem idéia do que seja isso. Amigos que moram na Suécia, Dinamarca, Paris e Londres provam que o filme é até menos real do que a realidade.
Talvez depois deste confronto pesado com o Estado, as quadrilhas cariocas se darão conta de que enfrentar o Estado não é uma boa estratégia. O sociólogo alemão Max Weber lembra que o estado é uma estrutura que reivindica com êxito, num determinado território, o monopólio legítimo da violência. Assim, o Estado que abdicar dessa condição poderá deixar de sê-lo. Ao perceber que estava perdendo terreno ou território, as nossas autoridades chegaram à conclusão que precisavam agir.
O hasteamento da bandeira nacional no meio da favela é também emblemático. A primeira vista tem um sentido simbólico de reconquista do território perdido, reforçando o sentimento nacionalista. Numa outra perspectiva pode significar que o Estado brasileiro perdeu o controle da situação em no seu próprio quintal. Ao expor o pavilhão nacional como simbolo de reconquista em um bairro de uma grande capital, ficou a impressão de se acordou agora ou que o crime organizado é capaz de desafiar o Estado. Considerando que no Rio de Janeiro existem mais de mil favelas, a situação é realmente preocupante.